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24 de abril de 2021

EMBARGOS DE TERCEIRO. CÔNJUGE MEEIRO. RESERVA DE MEAÇÃO. ART. 655-B DO CPC/1973. DÍVIDA RELATIVA A HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. RESPONSABILIDADE DE QUEM É PARTE NA DEMANDA. LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.670.338 - RJ (2014/0196661-2) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. CÔNJUGE MEEIRO. RESERVA DE MEAÇÃO. ART. 655-B DO CPC/1973. DÍVIDA RELATIVA A HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. RESPONSABILIDADE DE QUEM É PARTE NA DEMANDA. LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA. 

1. Recursos especiais interpostos contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

2. Nos termos do art. 655-B do CPC/1973, incluído pela Lei nº 11.382/2006, havendo penhora de bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução deve recair sobre o produto da alienação do bem. 

3. Para impedir que a penhora recaia sobre a sua meação, o cônjuge meeiro deve comprovar que a dívida executada não foi contraída em benefício da família. Precedentes. 

4. Tratando-se de dívida proveniente da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais em demanda da qual o cônjuge meeiro não participou, é inegável o direito deste à reserva de sua meação. 

5. Os honorários advocatícios consagram direito do advogado contra a parte que deu causa ao processo, não se podendo exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família. 

6. Recursos especiais não providos. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, decide a Terceira Turma, por maioria, negar provimento aos recursos especiais, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 04 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): 

Trata-se de recursos especiais, ambos interpostos com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro assim ementado: 

"APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO – RESERVA DA MEAÇÃO – CÔNJUGE VIRAGO – POSSIBILIDADE – DÍVIDA QUE NÃO FOI CONTRAÍDA EM BENEFÍCIO DO CASAL – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. - Cuida a hipótese de Embargos de Terceiros opostos por Suely Aun Nahas em face da Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA e da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro – BVRJ, em que alega que é casada com o Executado Naji Robert Nahas, sob o regime da comunhão universal de bens e quer ver protegida a sua meação da constrição incidente sobre o imóvel descrito na inicial. - Sentença que rejeitou os Embargos de Terceiro sob o fundamento de que a Embargante não se desincumbiu do ônus de provar que a dívida assumida por seu marido não se reverteu em proveito da família. - Há que se ponderar, todavia, que a dívida objeto da execução é proveniente da condenação do marido da Embargante em honorários advocatícios sucumbenciais, na demanda por este ajuizada em face das Embargadas, não respondendo portanto a Embargante com a sua meação por ausência de presunção de que teria se beneficiado diante do sucesso da ação. - A dívida foi contraída individualmente pelo Executado e não foi revertida em benefício do casal, o que por decorrência lógica, evidencia que não há como se deixar de se garantir à Embargante, em sendo o bem alienado, a reserva da metade do produto da arrematação. - Provimento do Recurso" (e-STJ fl. 189). 

Os embargos de declaração opostos na origem foram rejeitados. 

No primeiro recurso (e-STJ fls. 354-368), ASSOCIAÇÃO BOVESPA aponta, além de divergência jurisprudencial, violação dos arts. 535 e 592, IV, do Código de Processo Civil de 1973 e 1.667 do Código Civil. 

No segundo recurso (e-STJ fls. 380-412), BOLSA DE VALORES DO RIO DE JANEIRO - BVRJ aponta, além de dissídio interpretativo, violação dos arts. 20, 458, II, 535, I e II, 592, IV, e 655-B, do Código de Processo Civil de 1973, e 1.663, § 1º, 1.667 e 1.668 do Código Civil. 

Em ambos os recursos, os recorrentes alegam, de início, a existência de negativa de prestação jurisdicional no julgamento dos aclaratórios. 

No mérito, sustentam que a condenação a título de honorários advocatícios sucumbenciais em desfavor de um cônjuge não recai sobre a meação do outro somente se demonstrada que a dívida não foi contraída em benefício da família. 

Transcorrido o prazo para apresentação das contrarrazões (e-STJ fl. 436), e inadmitidos os recursos na origem, determinou-se a reautuação dos agravos (AREsp nº 560.109/RJ) como recursos especiais para melhor exame da matéria. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): O acórdão impugnado pelos recursos especiais foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). As irresignações não merecem prosperar. 

1) Breve resumo da demanda 

Trata-se, na origem, de embargos de terceiro opostos por SUELY AUN NAHAS, por meio dos quais a embargante pretende ver preservado seu direito de meação sobre imóvel penhorado em execução de sentença que, ao julgar improcedente a Ação Ordinária nº 0171251-40.2007.8.19.0001, proposta por NAJI ROBERT NAHAS, condenou-o ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para cada um dos escritórios de advocacia que defenderam os interesses das rés na referida demanda. 

Na inicial dos embargos, a ora recorrente afirma que: a) está casada com NAJI ROBERT NAHAS pelo regime de comunhão universal de bens desde 10/11/1967; b) o imóvel penhorado foi adquirido pelo seu cônjuge em 25/3/1980; c) nos termos do art. 655-B do CPC/1973, havendo penhora de bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação. 

O magistrado de primeiro grau de jurisdição julgou improcedente o pedido sob a seguinte fundamentação: 

"(...) a embargante não se desincumbiu do ônus de comprovar que a dívida objeto da execução embargada não foi adquirida em benefício dela também. A propósito, a dívida em questão foi originada em razão de ônus de sucumbência em ação judicial onde o cônjuge da embargante pretendia a obtenção de indenização que somar-se-ia ao patrimônio do casal. Ora, se a embargante se beneficiaria, caso o pedido tivesse sido julgado procedente, é justo que arque com os ônus da derrota juntamente com o seu cônjuge" (e-STJ fl. 104). 

Ato contínuo, a Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro deu provimento à apelação para julgar procedentes os embargos de terceiro, de modo a reservar à embargante a metade do preço alcançado com a alienação do imóvel constrito sob o fundamento de que "(...) a dívida objeto da execução é proveniente da condenação do marido da Embargante em honorários advocatícios sucumbenciais, isso em demanda por aquele ajuizada em face das Embargadas, não respondendo por isso a Embargante, que não foi parte, com a sua meação por absoluta ausência de presunção de que teria disso se beneficiado" (e-STJ fl. 194). 

Cinge-se à controvérsia, portanto, a saber se o cônjuge meeiro, para fazer jus à reserva de sua meação, tem o dever de comprovar que a dívida relativa a honorários advocatícios não foi contraída em benefício da família. 

2) Da negativa de prestação jurisdicional 

No que tange ao art. 535 do Código de Processo Civil de 1973, não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o Tribunal local, ainda que por fundamentos distintos daqueles apresentados pelas partes, adota fundamentação suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 

No caso em apreço, o Tribunal local enfrentou a matéria posta em debate na medida necessária para o deslinde da controvérsia, concluindo pela procedência dos embargos de terceiro, reservando-se à embargante o seu direito de meação. 

Frisa-se que, mesmo à luz do art. 489 do Código de Processo Civil de 2015, o órgão julgador não está obrigado a se pronunciar acerca de todo e qualquer ponto suscitado pelas partes, mas apenas a respeito daqueles capazes de, em tese, de algum modo, infirmar a conclusão adotada pelo órgão julgador (inciso IV). 

A motivação contrária aos interesses das partes ou mesmo omissa em relação a pontos considerados irrelevantes pelo julgador não autoriza o acolhimento dos declaratórios. 

3) Do direito de meação 

Ao tempo da penhora, vigia o art. 655-B do Código de Processo Civil de 1973, incluído pela Lei nº 11.382/2006, que assim dispunha: 

"Art. 655-B. Tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem." 

É bem verdade que, para excluir da penhora a meação, o cônjuge meeiro alheio à execução deve comprovar que a dívida executada não foi contraída em benefício da família, conforme decidido nos seguintes julgados: 

"PROCESSO CIVIL E CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA. MEAÇÃO DA MULHER. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO MARIDO. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. INCLUSÃO NA EXECUÇÃO. ÔNUS DA PROVA. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. I - A meação da mulher casada não responde pela dívida contraída exclusivamente pelo marido, exceto quando em benefício da família. II - É da mulher o ônus de provar que a dívida contraída pelo marido não veio em benefício do casal, não se tratando, na espécie, de aval." (REsp 282.753/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 16/11/2000, DJ 18/12/2000). 

"DIREITO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. MEAÇÃO. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO CÔNJUGE VARÃO. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA. 1. Tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é a de que cabe ao meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, haja vista a solidariedade entre o casal. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido." (AgRg no AREsp 427.980/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/2/2014, DJe 25/2/2014). 

"AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEAÇÃO. DÍVIDA CONTRAÍDA PELO CÔNJUGE VARÃO. BENEFÍCIO DA FAMÍLIA. ÔNUS DA PROVA. NÃO PROVIMENTO. 1. 'A mulher casada responde com sua meação, pela dívida contraída exclusivamente pelo marido, desde que em benefício da família. - Compete ao cônjuge do executado, para excluir da penhora a meação, provar que a dívida não foi contraída em benefício da família.' (AgR-AgR-AG n. 594.642/MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 08.05.2006). 2. Se o Tribunal estadual concluiu que os agravantes, sucessores do devedor principal e de seu cônjuge, ambos falecidos, não se desincumbiram do ônus de provar que a dívida contraída por um dos cônjuges não beneficiou a entidade familiar, ao reexame da questão incide a Súmula n. 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no Ag 1.322.189/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2011, DJe 24/11/2011). 

"EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE DE OBJETO. JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. (...) 2. Tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é de que é do meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, em face da solidariedade entre o casal. Tratando-se de ato ilícito praticado por apenas um dos cônjuges, não há presunção de solidariedade, recaindo sobre o credor o ônus da prova de que o enriquecimento resultante do ilícito reverteu em proveito também do meeiro, não havendo falar em divergência jurisprudencial qualquer, por se tratarem de hipóteses distintas. 3. 'Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado.' (Súmula do STJ, Enunciado nº 168). 4. Embargos de divergência não conhecidos." (EREsp 866.738/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 4/5/2011, DJe 24/5/2011) 

No entanto, tratando-se de dívida proveniente da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais em demanda da qual o cônjuge meeiro não participou, é inegável o direito deste à reserva de sua meação. 

Com efeito, em precedente firmado pela Corte Especial sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, versando sobre o cabimento de embargos infringentes relativamente a questões acessórias, a exemplo da fixação de verba honorária (Tema nº 175), muito se debateu a respeito da natureza jurídica dos honorários advocatícios de sucumbência, valendo transcrever trecho do voto proferido pelo Relator, Ministro Castro Meira: 

"(...) O arbitramento dos honorários não é questão meramente processual, porque tem reflexos imediatos no direito substantivo da parte e de seu advogado.Não por outra razão, CHIOVENDA catalogou os honorários como pertencentes a uma terceira categoria, intermediária entre o direito processual e o direito material, intitulado direito processual material, justamente porque situado em uma faixa de estrangulamento entre o processo e o bem da vida perseguido em juízo. (Istituzioni di Diritto Processuale Civile, vol. I, § 4º, n.º 23, p. 73) Apesar de sua natureza eminentemente processual, por estarem inseridos na técnica do processo como decorrência de sua instauração e ter por objetivo tutelar de modo integral o direito reconhecido em juízo, os honorários conferem um direito subjetivo de crédito ao advogado perante a parte que deu causa ao processo. Trata-se, inegavelmente, de um efeito externo ao processo, de relevante repercussão na vida do advogado e da parte devedora, do que decorre seu enquadramento no âmbito do direito processual material. (LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho, Honorários Advocatícios no Processo Civil, São Paulo: Saraiva, 2008, pp. 9-10) Assim, os honorários advocatícios, não obstante disciplinados pelo direito processual, decorrem de pedido expresso, ou implícito, de uma parte contra o seu oponente no processo e, portanto, formam um capítulo de mérito da sentença, embora acessório e dependente. FREDIE DIDIER JR. e LEONARDO JOSÉ CARNEIRO DA CUNHA afirmam que a parte do julgado que trata dos honorários advocatícios constitui um capítulo de mérito, ainda que conste de uma sentença terminativa: (...) Esta conclusão está correta. Os honorários advocatícios, ainda que fixados em sentença terminativa, constituem capítulo de mérito, já que consagram direito do advogado contra a parte que deu causa ao processo. (...) A sentença definitiva, ou seja, em que apreciado o mérito da causa, constitui, basicamente, duas relações jurídicas: a do vencedor em face do vencido e a deste com os advogados da parte adversa. Na primeira relação, estará o vencido obrigado a dar, fazer ou deixar de fazer alguma coisa em favor do seu adversário processual. Na segunda, será imposto ao vencido o dever de arcar com os honorários sucumbenciais em favor dos advogados do vencedor. Já na sentença terminativa, como o processo foi extinto sem resolução de mérito, forma-se apenas a segunda relação, entre o advogado e a parte que deu causa ao processo. Embora inserido em uma sentença terminativa, o capítulo que trata dos honorários, justamente porque disciplina uma relação autônoma, titularizada pelo causídico, é de mérito, embora dependente e acessório, de modo que poderá ser discutido por meio de embargos infringentes se a sentença vier a ser reformada, por maioria de votos, no julgamento da apelação." (REsp 1.113.175/DF, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, CORTE ESPECIAL, julgado em 24/5/2012, DJe 7/8/2012). 

Em recente julgado a respeito das regras de aplicação da lei processual no tempo no tocante à fixação de honorários advocatícios, considerando as inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, a Corte Especial tornou a se pronunciar sobre a natureza natureza jurídica dos honorários de sucumbência. 

No voto encaminhado pelo Relator, Ministro Luis Felipe Salomão, acolhido à unanimidade pelos membros daquele Órgão Colegiado, ficou consignado que 

"(...) os honorários advocatícios são instituto de direito processual-material, pois, apesar da previsão em diploma processual, conferem direito subjetivo de crédito ao advogado em face da parte que deu causa à instauração do processo, versando assim sobre situação jurídica substancial" (EAREsp 1.255.986/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 20/3/2019, DJe 6/5/2019 - grifou-se). 

Desse modo, considerando que os honorários advocatícios consagram direito do advogado contra a parte que deu causa ao processo, não se pode exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família, até mesmo em função dos limites subjetivos da coisa julgada, de que trata o art. 472 do CPC/1973: 

"Art. 472. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros." (grifou-se) 

Seguindo esse mesmo raciocínio, esta Corte Superior já decidiu que "a verificação do princípio da causalidade deve ser realizada dentro e em razão do próprio processo e não pode extrapolar as partes que nele atuaram em homenagem aos limites subjetivos da coisa julgada (art. 472, do CPC)" (REsp nº 1.095.765/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/3/2009, DJe 16/4/2009 - grifou-se). 

Nesse contexto, não tem nenhuma relevância para a solução da causa saber se o cônjuge meeiro obteria ou não proveito econômico em caso de procedência da ação proposta em juízo, salvo se estivesse o advogado do próprio autor da referida demanda a cobrar os honorários contratuais pelos serviços prestados. 

4) Dispositivo 

Ante o exposto, nego provimento aos recursos especiais. 

É o voto. 

VOTO-VISTA 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI: 

Cuida-se de recursos especiais interpostos por ASSOCIAÇÃO BOVESPA e por BOLSA DE VALORES DO RIO DE JANEIRO, em que se impugna acórdão do TJ/RJ que deu provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrida, SUELY AUN NAHAS, a fim de determinar que seja reservada a meação da referida cônjuge sobre o produto da alienação do bem imóvel indivisível. 

Voto do e. Relator, Min. Ricardo Villas Bôas Cueva: nega provimento aos recursos especiais, ao fundamento de que: (i) não houve negativa de prestação jurisdicional; (ii) de que, em se tratando de dívida proveniente da condenação em honorários de sucumbência fixados em demanda da qual a recorrida não fez parte, deveria ser reservada a sua meação, especialmente porque o direito do advogado se estabelece contra a parte que deu causa ao processo (na hipótese, NAJI ROBERT NAHAS), não se podendo exigir da recorrida a comprovação de que a dívida não teria sido contraída em benefício do casal ou da família. 

Tendo em vista o aparente ineditismo da matéria versada no presente recurso especial, pedi vista na sessão de julgamento ocorrida em 12/11/2019 para melhor exame da controvérsia. 

Revisados os fatos, decide-se. 

Inicialmente, acompanho o e. Relator no que se refere a alegada violação ao art. 535 do CPC/73, na medida em que todas as questões essenciais à compreensão da controvérsia foram definitivamente examinadas e estão efetivamente prequestionadas. 

Quanto ao mérito, entendeu o e. Relator pela incidência, na hipótese, do art. 655-B do CPC/73, segundo o qual “tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem”. 

Diante do contexto bastante singular da questão submetida a exame no presente recurso especial, é preciso destacar, igualmente, três outros dispositivos legais que se relacionam com a matéria em debate, a saber, o art. 592, IV, do CPC/73, e os arts. 1.643, II e II, e 1.644, ambos do CC/2002. 

CPC/73 

Art. 592. Ficam sujeitos à execução os bens: IV – do cônjuge, nos casos em que os seus bens próprios, reservados ou de sua meação respondem pela dívida; (...) 

CC/2002 

Art. 1.643. Podem os cônjuges, independentemente de autorização um do outro: I – comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica; II – obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas possa exigir. 

Art. 1.644. As dívidas contraídas para os fins do artigo antecedente obrigam solidariamente ambos os cônjuges. 

O exame sistemático desses dispositivos legais se mostra imprescindível, na medida em que somente se aplicará a regra do art. 655-B do CPC/73, protetiva da meação, se porventura se entender que a hipótese não é de responsabilidade secundária ou solidária do cônjuge, ainda que não tenha sido ele parte na relação de direito material ou processual que deu origem à dívida ou à constrição. 

Para melhor compreensão acerca da existência, ou não, de benefício ao casal, concreto ou potencial, que justifique a incidência da regra do art. 655-B do CPC/73, é preciso examinar os pedidos formulados por NAJI ROBERT NAHAS na ação indenizatória por ele ajuizada, em litisconsórcio ativo com SELECTA COMÉRCIO E INDÚSTRIA S.A., SELECTA PARTICIPAÇÕES E SERVIÇOS S/C LTDA. e COBRASOL – COMPANHIA BRASILEIRA DE ÓLEOS E DERIVADOS, contra as recorrentes, da qual se originaram as dívidas objeto do presente recurso especial: 

a) condenar a BVRJ e a BOVESPA, na proporção de suas responsabilidades, a indenizar os Autores pelos prejuízos causados pelo confisco de parte da sua carteira de ações que não estava envolvida nas operações financiadas, pela cotação de 08.06.1989, devidamente corrigido pelas mesmas taxas que remuneram as aplicações financeiras das Rés (v.g., CDU, ou, alternativamente, no valor equivalente ao que seria obtido pelos Autores com a aplicação financeira desses recursos, desde 08.06.1989 até o seu efetivo pagamento, cujos montantes se apurarão na perícia, a ser realizada na fase probatória deste processo, ou em liquidação; 

b ) condenar a BVRJ e a BOVESPA, na proporção de suas responsabilidades, a pagar lucros cessantes equivalentes à diferença entre a valorização que as ações confiscadas teriam, com todos os seus desdobramentos tais como bonificações, juros sobre capital próprio, dividendos - estes atualizados pelos critérios estabelecidos nas 'alíneas supra, a partir de cada concessão – entre outros eventos, e o valor apurado na alínea “c” supra; 

c) condenar a BOVESPA a indenizar os Autores nas perdas sofridas nos mercados à vista, de opções e de futuro, considerados os valores de 08.06.1989, devidamente corrigido pelas mesmas taxas que remuneram as aplicações financeiras das Rés (v.g., CDU, ou, alternativamente, no valor equivalente ao que seria obtido pelos Autores com a aplicação financeira desses recursos, desde 08.06.1989 até o seu efetivo pagamento, cujos montantes se apurarão na perícia, a ser realizada na fase probatória deste processo, ou em liquidação; 

d ) condenar a Ré BOVESPA a indenizar à massa liquidanda da Selecta Comércio e Indústria S/A, nas perdas sofridas nos mercados à vista, de opções e de futuro, considerados os valores de 08.06.1989, devidamente corrigido pelas mesmas taxas que remuneram as aplicações financeiras das Rés (v.g., CDI), ou, alternativamente, no valor equivalente ao que seria obtido pelos Autores com a aplicação financeira desses recursos, desde 08.06.1989 até o seu efetivo pagamento, cujos montantes se apurarão na perícia, a ser realizada na fase probatória deste processo, ou em liquidação; 

e) condenar as Rés a indenizar o 1° Autor pelos danos morais sofridos em valor a ser arbitrados por este MM. Juizo, proporcionalmente ao limite de suas responsabilidades; 

Do exame dos referidos pedidos, verifica-se, claramente, que as pretensões reparatórias deduzidas por NAJI ROBERT NAHAS, SELECTA COMÉRCIO E INDÚSTRIA S.A., SELECTA PARTICIPAÇÕES E SERVIÇOS S/C LTDA. e COBRASOL – COMPANHIA BRASILEIRA DE ÓLEOS E DERIVADOS eram de cunho essencialmente patrimonial, ressalvado o pedido de letra “e” acima, formulado exclusivamente por NAJI ROBERT NAHAS. 

Diante desse cenário, é correto afirmar que, se porventura os referidos pedidos houvessem sido julgados procedentes, os valores dos danos a serem reparados, correspondentes às carteiras de ações alegadamente confiscadas, perdas e lucros cessantes, seriam efetivamente revertidos em benefício de ambos os cônjuges, na medida em que é fato incontroverso que a recorrida e NAJI ROBERT NAHAS se casaram no ano de 1967 pelo regime da comunhão universal de bens e os supostos fatos danosos ocorreram no ano de 1989, ou seja, na constância da sociedade conjugal. 

As particularidades da hipótese em exame, todavia, são: (i) que o benefício ao casal não era concreto, certo e imediato, mas, ao revés, singularmente potencial, incerto e futuro, na medida em que condicionado à eventual procedência dos pedidos formulados por NAJI ROBERT NAHAS naquela ação de reparação de danos; (ii) que, a depender do resultado obtido na ação judicial, poderia ser estabelecida uma condenação em custas, despesas e honorários advocatícios. 

Nesse contexto, não é razoável, simétrico e isonômico que a recorrida, que induvidosamente se beneficiaria do bônus decorrentes da eventual procedência de ação de reparação de danos ajuizada pelo seu cônjuge, não deva arcar com o ônus, materializado na sucumbência, que decorre da improcedência ocorrida nessa mesma ação, ainda que não tenha ela sido parte. 

Não significa dizer que o cônjuge será sempre corresponsável pela sucumbência nas ações ajuizadas exclusivamente pelo outro, mas, sim, que também nessa hipótese se aplicará o entendimento consolidado desta Corte no sentido de que “tratando-se de dívida contraída por um dos cônjuges, a regra geral é de que é do meeiro o ônus da prova de que a dívida não beneficiou a família, em face da solidariedade entre o casal” (EREsp 866.738/RS, Corte Especial, DJe 24/05/2011). 

Com efeito, é lícito ao cônjuge que oponha exceções pessoais na defesa de sua meação, a fim de que se faça incidir a regra do art. 655-B do CPC/73 (atual o art. 843, caput, do novo CPC) e não as regras que estabelecem a corresponsabilidade dos cônjuges. 

Na hipótese, poderia a recorrida ter comprovado, para a reserva de sua meação, que não se beneficiaria, em hipótese alguma, de eventual êxito na ação indenizatória ajuizada por NAJI ROBERT NAHAS, como, por exemplo, demonstrando que a carteira de ações supostamente confiscada não teria sido adquirida na constância do casamento ou, ainda, que não seria ela sócia das empresas que compunham o litisconsórcio ativo naquela ação de reparação de danos, confessadamente geridas por NAJI ROBERT NAHAS. 

Forte nessas razões, rogando venias ao e. Relator e ao judicioso voto de S. Exa., CONHEÇO e DOU PROVIMENTO aos recursos especiais, a fim de restabelecer a sentença de improcedência dos embargos de terceiro ajuizados por SUELY AUN NAHAS.