Fonte: Dizer o Direito
Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/07/info-698-stj-1.pdf
DIREITOS REAIS (CONDOMÍNIO COMUM) - No exercício do direito de preferência legal, é possível que o condômino contraia um
empréstimo para o cumprimento do requisito de depósito do preço do bem
O art. 504 do CC enumera taxativamente os requisitos necessários para o exercício do direito
de preferência: a) a indivisibilidade da coisa; b) a ausência de prévia ciência, pelo condômino
preterido, acerca da venda realizada a estranho; c) o depósito do preço, que deve ser idêntico
àquele que fora pago pelo estranho na aquisição; e d) a observância do prazo decadencial de
180 dias.
O fato de o condômino tomar um empréstimo para cumprir o requisito de depósito do preço
do bem, por si só, não é suficiente para a configuração de abuso de direito.
A origem do dinheiro utilizado para o depósito do preço do bem não tem qualquer relevância
para o exercício do direito de preferência. É possível, portanto, que o montante necessário seja
obtido pelo condômino através de empréstimo.
A declaração de nulidade do negócio jurídico por simulação não pode se fundamentar apenas
em deduções ou suspeitas. No empréstimo, a comprovação de renda ou a prestação de
garantia são faculdades do mutuário. A não exigência de garantias não é suficiente para a
constatação da existência de simulação do negócio jurídico.
Assim, tais fundamentos baseados na origem do depósito, no abuso de direito ou na simulação,
não são hábeis a tolher o exercício do direito de preferência do condômino.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.875.223-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021 (Info 698).
Condomínio comum
Condomínio consiste na copropriedade exercida sobre um mesmo bem. É o exercício simultâneo do direito
de propriedade por duas ou mais pessoas sobre uma mesma coisa.
Direito de preferência
Se um dos condôminos de uma coisa indivisível decidir vender a sua parte, ele terá que, antes de efetivada
a venda, dar ciência aos demais condôminos, os quais terão preferência na aquisição da quota, desde que
assim requeiram, no prazo decadencial de 180 dias, depositando o preço equivalente àquele ofertado ao
terceiro. Trata-se do direito de preferência, previsto no art. 504 do CC:
Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro
consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda,
poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo
de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.
O direito de preferência é baseado na função social da propriedade, ou seja, o objetivo da norma foi o de
estimular que a propriedade permaneça somente com os titulares originários, evitando
desentendimentos com a entrada de um estranho no grupo.
A partir de quando se inicia esse prazo de 180 dias?
Inicia-se com a notificação feita pelo alienante ao outro condômino.
E se não for feita essa notificação?
Se não houver a notificação, o prazo decadencial do exercício do direito de preferência inicia-se com o
registro da escritura pública de compra e venda da fração ideal da coisa comum indivisa.
O prazo decadencial de 180 dias para o exercício do direito de preferência do condômino, previsto no art.
504 do CC, inicia-se com o registro da escritura pública de compra e venda da fração ideal da coisa comum
indivisa.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.628.478-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 03/11/2020 (Info 683).
Requisitos do direito de preferência:
1) a indivisibilidade da coisa;
2) a ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido, acerca da venda realizada a estranho;
3) o depósito do preço, que deve ser idêntico àquele que fora pago pelo estranho na aquisição; e
4) a observância do prazo decadencial de 180 dias.
Assim, cumpridos os requisitos exigidos pelo art. 504, CC, inclusive o depósito do preço, cria-se verdadeiro
direito potestativo do condômino reivindicar a propriedade das demais frações ideais que haviam sido
vendidas.
Esse direito de preferência é o mesmo previsto nos arts. 513 a 520 do Código Civil?
NÃO. O direito de preferência ou preempção, tratado nos arts. 513 a 520 do CC, é o contratual, ou seja,
dependerá de um ajuste entre as partes.
O direito de preferência objeto deste julgado é o direito de preferência legal, previsto no art. 504 do CC,
não dependendo de qualquer contrato ou ajuste entre as partes.
DIREITO DE PREFERÊNCIA LEGAL
(art. 504 do CC)
É o direito que o condômino tem de adquirir a fração ideal do outro condômino que deseje alienar sua fração ideal a terceiros.
Recai sobre coisa indivisível em condomínio.
Não depende de previsão contratual (decorre da lei).
É um direito real.
O condômino deve efetuar o pagamento e requerer para si a propriedade, no prazo de 180 dias.
Caso o condômino não observe o dever de notificação, o condômino preterido deverá propor uma ação anulatória.
Por ser um direito real, transmite-se aos herdeiros junto com a coisa.
DIREITO DE PREFERÊNCIA CONTRATUAL
(arts. 513 a 520 do CC)
É uma cláusula contratual que obriga o comprador
a oferecer ao vendedor a coisa, caso resolva
aliená-la no futuro a terceiro.
Recai sobre qualquer coisa alienável.
Depende de previsão contratual (é uma expressão
da autonomia privada).
É um direito contratual. Caso a cláusula esteja
registrada, terá oponibilidade erga omnes.
As partes poderão ajustar os prazos.
Todavia, o prazo máximo de vigência da cláusula
será de:
- 180 dias para móveis
- 2 anos para imóveis
Já o prazo para responder à notificação (ou seja,
para requerer para si a propriedade), não havendo
previsão contratual, será de:
- 3 dias para móveis
- 60 dias para imóveis;
Caso o comprador venda o bem sem ter dado
ciência ao vendedor, este poderá ajuizar ação
indenizatória, requerendo o pagamento das
perdas e danos.
Por ser um direito obrigacional personalíssimo,
não se pode ceder nem passa aos herdeiros.
Feita esta necessária revisão sobre o tema, imagine a seguinte situação hipotética:
João e Regina viviam em união estável há mais de 40 anos.
João tinha dois filhos (Joaquim e José), que não eram filhos de Regina.
João faleceu e deixou uma fazenda como único bem a ser partilhado.
Assim, os três herdeiros (Regina, Joaquim e José) viraram proprietários da fazenda, cada um possuindo
1/3 da fração ideal do bem.
Desse modo, no caso concreto, existe um condomínio comum.
Alienação do imóvel
Joaquim e José, mesmo sabendo da existência da união estável, alienaram a fazenda por R$ 300 mil, para
a empresa ABC Ltda., sem dar ciência a Regina.
Regina resolveu exercer seu direito de preferência, dentro do prazo de 180 dias, conforme autoriza o art.
504 do Código Civil.
Como Regina não tinha R$ 300 mil, ela tomou emprestado o dinheiro com uma incorporadora imobiliária.
Com a quantia na conta, ela fez depósito do preço do bem.
Os demais coproprietários alegaram que o contrato de empréstimo firmado entre Regina e a
incorporadora imobiliária teria sido uma simulação. Isso porque Regina não possuía patrimônio suficiente
e a empresa não exigiu qualquer garantia ou comprovação da renda. Assim, haveria suspeitas da realização
do negócio simulado e abuso de direito no exercício do direito de preferência.
É possível a tomada de empréstimo para o cumprimento do requisito do depósito do preço para o
exercício do direito de preferência?
SIM. O simples fato da coproprietária tomar um empréstimo para o depósito do valor não é apto, por si
só, a configurar o abuso de direito. É irrelevante a origem do dinheiro para o depósito exigido no direito
de preferência.
De acordo com o STJ, não se podem admitir deduções ou suspeitas como ensejadoras de nulidade do
negócio jurídico. A exigência de comprovação da renda ou a prestação de garantia é uma faculdade do
mutuário.
O fato de ser concedido um empréstimo sem comprovação da renda ou sem a prestação de garantia, por
si só, não é suficiente para se considerar o negócio jurídico simulado ou a existência de abuso de direito.
Irrelevância da origem do depósito
O STJ considerou, ainda, que não tem relevância a discussão a respeito da origem do depósito do preço.
O art. 504 do CC exige apenas que o condômino preterido realize o depósito do preço da coisa. Não se faz
qualquer menção a respeito da origem do dinheiro.
Portanto, é plenamente possível a tomada de empréstimo para o cumprimento do requisito do depósito
do preço, não se configurando abuso de direito.
Boa-fé
Apesar de os coproprietários terem argumentado que houve abuso de direito por parte de Regina, o STJ
entendeu que, na verdade, quem agiu de má-fé foram os herdeiros que alienaram o imóvel.
Joaquim e José tinham pleno conhecimento da união estável de Regina com João, tanto pela longa duração
da relação, como pela existência da sentença reconhecendo a união estável. Mesmo assim, eles alienaram
totalmente o imóvel, sem respeitar o direito de preferência, e sem respeitar a fração ideal de propriedade
da condômina.
Em suma:
O exercício do direito de preferência, previsto no art. 504 do CC, exige a observância dos seguintes
requisitos: 1) a indivisibilidade da coisa; 2) a ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido,
acerca da venda realizada a estranho; 3) o depósito do preço, que deve ser idêntico àquele que fora
pago pelo estranho na aquisição; e 4) a observância do prazo decadencial de 180 (cento e oitenta) dias.
O fato de o condômino tomar um empréstimo para cumprir o requisito de depósito do preço do bem,
por si só, não é suficiente para a configuração de abuso de direito.
A origem do depósito do preço do bem não tem relevância para o cumprimento do requisito previsto
no art. 504 do CC. É possível, portanto, que o montante necessário seja obtido pelo condômino através
de empréstimo.
Ademais, a declaração de nulidade do negócio jurídico por simulação não pode se fundamentar apenas
em deduções ou suspeitas. No empréstimo, a comprovação de renda ou a prestação de garantia são
faculdades do mutuário. A não exigência de garantias não é suficiente para a constatação da existência
de simulação do negócio jurídico.
Assim, tais fundamentos baseados na origem do depósito, no abuso de direito ou na simulação, não são
suficientes para tolher o exercício do direito de preferência do condômino.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.875.223-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021 (Info 698).
DOD PLUS – INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES
Caso Joaquim tivesse vendido sua fração ideal para José, e não para um terceiro, Regina, ainda assim,
poderia exercer o direito de preferência?
NÃO.
O direito de preferência previsto no art. 504 do CC aplica-se ao contrato de compra e venda celebrado
entre condômino e terceiro, e não àquele ajustado entre condôminos.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.137.176-PR, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 16/2/2016 (Info 577).
A literalidade do art. 504 demonstra que o direito de preferência deve ser observado somente nos casos
em que o contrato de compra e venda seja celebrado entre o condômino e um estranho. Não se aplica,
portanto, às hipóteses de venda entre os consortes (condôminos).
O objetivo da norma foi o de estimular que a propriedade permaneça somente com os titulares originários,
evitando desentendimentos com a entrada de um estranho no grupo.
A alienação da fração ideal de um condômino para o outro não ofende a finalidade intrínseca do direito
de preferência do art. 504 do CC, uma vez que não se tratará de hipótese de ingresso de terceiro/estranho
à comunhão. Pelo contrário, serão mantidos os consortes, apenas com alterações no percentual da parte
ideal daquele que adquiriu a parcela de outrem.
Este direito de preferência do art. 504 do CC aplica-se também nos casos de condomínio edilício? Ex: em
um prédio, se um dos moradores quiser vender seu apartamento, terá que oferecer primeiro aos demais
condôminos?
NÃO. A regra do art. 504 do CC aplica-se somente ao condomínio tradicional e não ao condomínio edilício.
“Assim, um condômino em prédio de apartamentos não precisa dar preferência aos demais proprietários.
Mas se a unidade pertencer também a outras pessoas, estas devem ser notificadas para exercer a
preferência legal, pois instaurou-se, nesse caso, um condomínio tradicional dentro do horizontal”
(GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 242).