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17 de fevereiro de 2022

É cabível condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece espontaneamente para apresentar defesa

Processo

Rcl 41.569-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 09/02/2022.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Reclamação. Indeferimento inicial. Comparecimento espontâneo. Angularização. Relação processual. Honorários advocatícios. Cabimento.

 

DESTAQUE

É cabível condenação em honorários advocatícios no julgamento de reclamação indeferida liminarmente na qual a parte comparece espontaneamente para apresentar defesa.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Com a vigência do Código de Processo Civil de 2015, a jurisprudência se firmou no sentido de que a reclamação possui natureza de ação, prevendo o artigo 989, III, do referido Código, a angularização da relação processual, com a citação do beneficiário, que passou a ter um tratamento semelhante ao da parte, podendo promover a defesa de seus interesses, com a consequente condenação ao pagamento de honorários de acordo com a sucumbência.

Assim, na hipótese de indeferimento inicial da reclamação, é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que a relação processual não se aperfeiçoou, não sendo cabível a condenação em honorários.

É preciso diferenciar, porém, o simples indeferimento da inicial daquelas situações em que o reclamante ingressa com recurso contra a decisão que indefere a petição inicial ou contra a que julga o pedido improcedente liminarmente.

Com efeito, de acordo com o artigo 331 do CPC/2015, nas hipóteses em que a petição inicial é indeferida e contra essa decisão é interposta apelação, não havendo reconsideração, o réu é citado ou, se já tiver comparecido aos autos, é intimado para apresentar defesa e, sendo mantida a decisão, é cabível a condenação em honorários.

Assim, trazendo a situação para a reclamação, uma vez interposto recurso contra decisão que liminarmente indeferiu a petição inicial, não sendo o caso de reconsideração, o beneficiário que comparecer aos autos, apresentando contrarrazões, faz jus ao recebimento de honorários advocatícios.



15 de fevereiro de 2022

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC

 PROCESSO CIVIL - RECLAMAÇÃO

STJ. 1ª Seção. Rcl 41.894-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 24/11/2021 (Info 720).

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC

Caso julgado

STJ, ao julgar o recurso especial interposto pela autora em um caso concreto, reconheceu o nexo causal entre a conduta da ré e dano e determinou que o processo retornasse ao TJ para julgar a ação de indenização com base nessa premissa

STJ não determinou imediatamente o pagamento da indenização, mas que fosse julgado o pedido de indenização da autora com base nas premissas estabelecidas – nexo causal

TJ, contudo, voltou a dizer que não havia nexo de causalidade - desconsiderando a decisão do STJ

Cabe reclamação contra essa decisão, sem que seja necessário interpor outro recurso especial, sem necessidade de garantir a possibilidade de juízo de retratação por parte do TJ e mesmo antes do acórdão do TJ ser publicado

Reclamação

Ação proposta pela parte interessada ou pelo MP com o objetivo de cassar uma decisão judicial ou um ato administrativo que tenha violado (988, CPC):

i. a competência de um tribunal (de 2º grau ou Superior);

ii. a autoridade de uma decisão do tribunal (de 2º grau ou Superior);

iii. súmula vinculante;

iv. decisão do STF em controle concentrado de constitucionalidade;

v. acórdão proferido em julgamento de IRDR ou de IAC

vi. tese fixada em RE/RG ou Recursos Repetitivos (§5º)

Exigência de que, antes de a parte apresentar a reclamação, ela deve ter esgotado todos os recursos cabíveis nas "instâncias ordinárias"

natureza jurídica de ação

STF. 1ª T. Rcl 49352 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, j. 04/11/2021: A reclamação constitucional é ação vocacionada para a tutela específica da competência e autoridade das decisões proferidas por este Supremo Tribunal Federal, não consubstanciando sucedâneo recursal

 

juízo de retratação

previsto no art. 1.030, II, do CPC, tem aplicação quando “o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos.”

Não é o que ocorre na situação na qual o reclamante alega descumprimento da decisão proferida pelo STJ em um caso concreto (e não em um acórdão proferido sob o regime dos recursos repetitivos).

Logo, não haveria oportunidade para que o Tribunal local se retratasse.

Nem mesmo eventuais embargos de declaração teriam aptidão para reformar o acórdão reclamado, já que o Tribunal a quo, não se omitiu sobre a decisão desta Corte Superior

A reforma do novo acórdão do Tribunal de Justiça só seria viável com o julgamento de mais um Recurso Especial, razão pela qual está esgotada a instância ordinária

o desrespeito à autoridade da decisão do STJ ocorreu com a prolação do acórdão pelo Tribunal local e independe da intimação das partes por meio da imprensa oficial.

6 de janeiro de 2022

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC.

Processo

Rcl 41.894-SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 24/11/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Reclamação constitucional. Decisão do STJ em caso concreto. Descumprimento. Conhecimento. Publicação da decisão. Juízo de retratação do art. 1.030, II, do CPC. Desnecessidade.

 

DESTAQUE

A Reclamação com base na alegação de descumprimento de decisão proferida pelo STJ em caso concreto independe, para sua admissibilidade, da publicação do acórdão impugnado ou do juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a analisar a alegação de inadmissibilidade de conhecimento de reclamação constitucional ao argumento de que, no caso concreto, o acórdão teria sido publicado e que as reclamantes deveriam ter interposto, antes, Recurso Especial. Somente após o juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC, a Reclamação seria admissível, conforme preveria, a contrario sensu, o § 5º, inciso II, do art. 988 do CPC.

No entanto, o juízo de retratação previsto no art. 1.030, II, do CPC, tem aplicação quando "o acórdão recorrido divergir do entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça exarado, conforme o caso, nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos." Não é o que ocorre na espécie, onde o reclamante alega descumprimento da decisão proferida pelo STJ no caso concreto, não de acórdão proferido sob o regime dos recursos repetitivos. Não haveria oportunidade para que o Tribunal local se retratasse.

Nem mesmo eventuais Embargos de Declaração teriam aptidão para reformar o acórdão reclamado, já que o Tribunal a quo, não se omitiu sobre a decisão desta Corte Superior. A reforma do novo acórdão do Tribunal de Justiça só seria viável com o julgamento de mais um Recurso Especial, razão pela qual está esgotada a instância ordinária.

Outrossim, o desrespeito à autoridade da decisão do STJ ocorreu com a prolação do acórdão pelo Tribunal local e independe da intimação das partes por meio da imprensa oficial.


19 de novembro de 2021

Não cabe reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de ter sido admitido pelo STJ pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-710-stj-2.pdf 


JUIZADO ESPECIAL Não cabe reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de ter sido admitido pelo STJ pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo 

É incabível o ajuizamento de reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo. STJ. 1ª Seção. Rcl 31.193-SC, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 16/09/2021 (Info 710). 

Pedido de uniformização de jurisprudência 

O pedido de uniformização de jurisprudência é um instrumento processual manejado quando houver divergência entre decisões proferidas por Turmas Recursais sobre questões de direito material. A legislação prevê a existência de dois pedidos de uniformização de jurisprudência: um no âmbito dos Juizados Especiais Federais e outro no Juizado Especial da Fazenda Pública. A Lei nº 9.099/95 não previu pedido de uniformização de jurisprudência para o caso do Juizado Especial Cível. 

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA 

Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal 

Previsto no art. 14 Lei nº 10.259/2001. 

Quem julga esse pedido: 

• a Justiça Federal é dividida em seis regiões. Se a divergência for entre Turmas Recursais da mesma Região (ex: entre a Turma Recursal do AM e a Turma Recursal da BA): o pedido de uniformização será julgado pela Turma Regional de Uniformização, sob a presidência de um Desembargador Federal. 

• se a divergência for entre Turmas de regiões diferentes (ex: TR do AM e TR do RS): será julgado pela Turma Nacional de Uniformização (TNU), composto por juízes federais representantes de cada região, sendo presidida por um Ministro do STJ. 

• se a orientação acolhida pela Turma de Uniformização, em questões de direito material, contrariar súmula ou jurisprudência dominante no STJ, a parte interessada poderá provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência. 


Juizados Especiais da Fazenda Pública 

Previsto no art. 18 da Lei nº 12.153/2009. 

Quem julga esse pedido: 

• se a divergência for entre Turmas do mesmo Estado: o pedido de uniformização será julgado em reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência de Desembargador indicado pelo Tribunal de Justiça. Se a parte prejudicada entender que a orientação acolhida contraria súmula do STJ, ela poderá provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência. 

• quando as Turmas de diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a decisão proferida estiver em contrariedade com súmula do STJ, o pedido será por este julgado. 

Obs: quando o Ministro do STJ admite o processamento de um pedido de uniformização naquele Tribunal, ele poderá, ou não, determinar o sobrestamento de todos os processos que tratam sobre aquela matéria. 

Lei nº 10.259/2001 Art. 14 (...) § 5º No caso do § 4º, presente a plausibilidade do direito invocado e havendo fundado receio de dano de difícil reparação, poderá o relator conceder, de ofício ou a requerimento do interessado, medida liminar determinando a suspensão dos processos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. 

Lei nº 12.153/2009 Art. 19 (...) § 2º Nos casos do caput deste artigo e do § 3º do art. 18, presente a plausibilidade do direito invocado e havendo fundado receio de dano de difícil reparação, poderá o relator conceder, de ofício ou a requerimento do interessado, medida liminar determinando a suspensão dos processos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

A TNU decidiu que João, segurado do INSS, não tinha direito à aposentadoria especial mesmo exercendo o trabalho “X”. Contra essa decisão da TNU, João ingressou com pedido de uniformização de jurisprudência perante o STJ, invocando o § 4º do art. 14 da Lei nº 10.259/2001: 

Art. 14 (...) § 4º Quando a orientação acolhida pela Turma de Uniformização, em questões de direito material, contrariar súmula ou jurisprudência dominante no Superior Tribunal de Justiça -STJ, a parte interessada poderá provocar a manifestação deste, que dirimirá a divergência. 

No STJ, foi sorteado um Ministro Relator que aceitou o processamento do pedido, ou seja, disse que esse pedido preenchia os requisitos de admissibilidade e que ele deveria ser julgado. Vale ressaltar, contudo, que o Ministro Relator não determinou o sobrestamento dos processos que tratam sobre essa mesma matéria e que ainda estejam tramitando nos Juizados Especiais. Ele poderia fazer, mas entendeu que não era o caso. 

Processo de Pedro 

Pedro também é segurado do RGPS e exercia o trabalho “X”. Ele também formulou pedido de aposentadoria especial, que foi negado. O processo de Pedro está na Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, onde aguarda julgamento. Pedro sabe que existe um risco grande de a TRU da 4ª Região decidir da mesma maneira que a TNU. Então, o advogado de Pedro pediu à TRU da 4ª Região o sobrestamento do processo enquanto o STJ não julga o incidente de uniformização de jurisprudência. A TRU da 4ª Região, contudo, indeferiu o pedido de sobrestamento e jugou o processo, decidindo que Pedro não tem direito à aposentadoria especial. Em outras palavras, decidiu o mesmo que a TNU. Diante desse cenário, Pedro ingressou com reclamação dirigida ao STJ afirmando que a autoridade do Tribunal foi desrespeitada considerando que, “uma vez instaurado o incidente de uniformização de jurisprudência, no âmbito dessa Corte Superior, sobre matéria idêntica a dos autos originários, cabia ao Juiz Presidente da Turma Regional de Uniformização da Quarta Região Federal sobrestar o processo originário até a solução final do referido Incidente de Uniformização.” 

O pedido de Pedro será acolhido pelo STJ? 

NÃO. Não cabe reclamação, neste caso. A Reclamação é prevista no art. 105, I, “f”, da Constituição Federal e no art. 988 do CPC: 

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: (...) f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; 

Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal; II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; 

A reclamação é um incidente processual cabível apenas nas hipóteses dos incisos do art. 988 do CPC. Logo, se a situação não se amolda em nenhum desses incisos, não cabe reclamação, que é um meio de impugnação de manejo limitado, não podendo serem ampliadas as hipóteses de conhecimento, sob pena de se tornar um sucedâneo recursal. O pedido de sobrestamento do processo originário, formulado por Pedro, não se enquadra nas hipóteses de cabimento da reclamação. Isso porque a TRU da 4ª Região não usurpou a competência ou desrespeitou a autoridade do STJ. 

Mesmo raciocínio em caso de recurso especial repetitivo 

Vale ressaltar que o mesmo raciocínio se aplicaria caso o STJ, em vez de pedido de uniformização, tivesse recebido um recurso especial repetitivo. Nesse sentido:

 (...) I - O presente feito decorre de reclamação apresentada por Mitsuko Tereza Suzuki Mori contra decisão proferida pelo Juízo Federal que determinou o sobrestamento do feito até o trânsito em julgado da decisão proferida pelo STJ sobre o Tema n. 1.007. II - Nas razões apresentadas em sua reclamação, o reclamante defende a desnecessidade do trânsito em julgado de demandas repetitivas. Nesta Corte, a reclamação não foi conhecida. III - A reclamação é procedimento previsto, originariamente, na Constituição Federal de 1988 no art. 105, I, f. IV - Ela é cabível, em tese, contra decisão de qualquer Tribunal, de forma que ele possa preservar sua competência e a autoridade das suas decisões. V - O procedimento está disciplinado, atualmente, no art. 988 e seguintes do CPC/2015. VI - A reclamação, na sua origem, constitui instrumento de tutela da decisão do caso concreto, sendo assim ela não deve ser vista como meio de tutela do precedente ou da jurisprudência vinculante. Entretanto, o art. 988 do CPC/15 trouxe a previsão, nos seus incisos III e IV, da garantia de observância, pelas cortes inferiores, de enunciados de súmula vinculante, precedente em controle concentrado de constitucionalidade e incidente de resolução de demandas repetitivas e assunção de competência. VII - Vê-se, pois, que, no caso em tela, a reclamação é totalmente inadmissível. Isso porque entre as hipóteses possíveis de reclamação, não vinculadas ao caso concreto, não está a decisão que determina ou não o sobrestamento do feito. Assim, por ausência de previsão legal, a presente reclamação é inadmissível. (...) STJ. 1ª Seção. AgInt na Rcl 39.878/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 29/09/2020. 

Em suma: É incabível o ajuizamento de reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo. STJ. 1ª Seção. Rcl 31.193-SC, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 16/09/2021 (Info 710).

9 de outubro de 2021

É incabível o ajuizamento de reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo

Processo

Rcl 31.193-SC, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 16/09/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo. Decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito. Reclamação. Não cabimento.

 

DESTAQUE

É incabível o ajuizamento de reclamação contra decisão que defere ou indefere o sobrestamento do feito em razão de processamento de pedido de uniformização ou recurso especial repetitivo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A Reclamação, prevista no art. 105, I, f, da Constituição da República, bem como no art. 988 do Código de Processo Civil de 2015 (redação da Lei n. 13.256/2016), constitui incidente processual destinado à preservação da competência deste Superior Tribunal de Justiça (inciso I), a garantir a autoridade de suas decisões (inciso II) e à observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência (inciso IV e § 4º). Sendo portanto meio de impugnação de manejo limitado, não podendo serem ampliadas as hipótese de conhecimento, sob pena de se tornar um sucedâneo recursal.

O pedido de sobrestamento do processo originário não se enquadra nas hipóteses de cabimento da reclamação prevista na Constituição Federal, porquanto não restou configurada a alegada usurpação de competência ou desrespeito à autoridade do Superior Tribunal de Justiça.

Ressalte-se, ademais, que a Reclamação, a teor do art. 105, I, f da Constituição da República, destina-se a garantir a autoridade das decisões desta Corte, no próprio caso concreto, em que o Reclamante tenha figurado como parte, ou à preservação de sua competência, não servindo como sucedâneo recursal.

7 de maio de 2021

INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. RECLAMAÇÃO. ACÓRDÃO DO STJ QUE DETERMINOU INVESTIGAÇÃO EXAURIENTE SOBRE FRAUDE EM EXAME DE DNA. RECUSA TÁCITA AO FORNECIMENTO DE MATERIAL GENÉTICO PELO HERDEIRO E POR TERCEIROS. ADOÇÃO DE MEDIDAS INDUTIVAS, COERCITIVAS E MANDAMENTAIS AO HERDEIRO QUE SE NEGA A FORNECER MATERIAL BIOLÓGICO. POSSIBILIDADE

RECLAMAÇÃO Nº 37.521 - SP (2019/0061080-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSO CIVIL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. RECLAMAÇÃO. ACÓRDÃO DO STJ QUE DETERMINOU INVESTIGAÇÃO EXAURIENTE SOBRE FRAUDE EM EXAME DE DNA. SENTENÇA QUE, COM BASE NO MESMO DOCUMENTO JÁ EXAMINADO PELA CORTE, CONCLUIU PELA PREVALÊNCIA DE COISA JULGADA ANTERIORMENTE FORMADA E QUE HAVIA SIDO AFASTADA PELO STJ. OFENSA À DECISÃO PROFERIDA PELA CORTE. RECUSA TÁCITA AO FORNECIMENTO DE MATERIAL GENÉTICO PELO HERDEIRO E POR TERCEIROS. SENTENÇA QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DA SÚMULA 301/STJ. ERRO DE JULGAMENTO. INAPLICABILIDADE DO ENTENDIMENTO SUMULAR QUE DEPENDE, DE IGUAL MODO, DO EXAURIMENTO DA ATIVIDADE INSTRUTÓRIA. ADOÇÃO DE MEDIDAS INDUTIVAS, COERCITIVAS E MANDAMENTAIS AO HERDEIRO QUE SE NEGA A FORNECER MATERIAL BIOLÓGICO. POSSIBILIDADE, QUANDO INAPLICÁVEL DESDE LOGO O ENTENDIMENTO DA SÚMULA 301/STF OU QUANDO VERIFICADA POSTURA ANTICOOPERATIVA QUE RESULTE EM PREJUÍZO AO PRETENSO FILHO. ADOÇÃO DAS MEDIDAS INDUTIVAS, COERCITIVAS E MANDAMENTAIS A TERCEIROS QUE IGUALMENTE SE RECUSAM A FORNECER MATERIAL BIOLÓGICO. POSSIBILIDADE. LEGITIMAÇÃO PROCESSUAL AD ACTUM. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E, POR ANALOGIA, DO PROCEDIMENTO APLICÁVEL À EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO OU COISA EM PODER DE TERCEIRO. 

1- O propósito da presente reclamação é definir se a sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito ao fundamento de que deveria ser respeitada a coisa julgada formada em anterior ação investigatória de paternidade afrontou a autoridade de decisão proferida por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, por meio da qual se determinou a apuração de eventual fraude no exame de DNA realizado na primeira ação investigatória e a realização de novo exame de DNA para a apuração de eventual existência de vínculo biológico entre as partes. 

2- Tendo o acórdão desta Corte concluído que o documento apresentado pela parte configurava prova indiciária da alegada fraude ocorrida em anterior exame de DNA e, em razão disso, determinado a reabertura da fase instrutória, não pode a sentença, valendo-se apenas daquele documento, extrair conclusão diversa, no sentido de não ser ele suficiente para a comprovação da fraude, sob pena de afronta à autoridade da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça. 

3- Determinado, pelo acórdão desta Corte, que fosse realizado novo exame de DNA para apuração da existência de vínculo biológico entre as partes, não pode a sentença, somente com base na ausência das pessoas que deveriam fornecer o material biológico, concluir pelo restabelecimento da coisa julgada que se formou na primeira ação investigatória (e que foi afastada por esta Corte), nem tampouco concluir pela inaplicabilidade da presunção contida na Súmula 301/STJ, sem que sejam empreendidos todas as providências necessárias para a adequada e exauriente elucidação da matéria fática. Aliás, é preciso enfatizar que maior do que o direito de ter um pai é o direito de saber quem é o pai. 

4- A impossibilidade de condução do investigado “debaixo de vara” para a coleta de material genético necessário ao exame de DNA não implica na impossibilidade de adoção das medidas indutivas, coercitivas e mandamentais autorizadas pelo art. 139, IV, do novo CPC, com o propósito de dobrar a sua renitência, que deverão ser adotadas, sobretudo, nas hipóteses em que não se possa desde logo aplicar a presunção contida na Súmula 301/STJ ou quando se observar a existência de postura anticooperativa de que resulte o non liquet instrutório em desfavor de quem adota postura cooperativa, pois, maior do que o direito de um filho de ter um pai, é o direito de um filho de saber quem é o seu pai. 

5- Aplicam-se aos terceiros que possam fornecer material genético para a realização do novo exame de DNA as mesmas diretrizes anteriormente formuladas, pois, a despeito de não serem legitimados passivos para responder à ação investigatória (legitimação ad processum), são eles legitimados para a prática de determinados e específicos atos processuais (legitimação ad actum), observando-se, por analogia, o procedimento em contraditório delineado nos art. 401 a 404, do novo CPC, que, inclusive, preveem a possibilidade de adoção de medidas indutivas, coercitivas, sub-rogatórias ou mandamentais ao terceiro que se encontra na posse de documento ou coisa que deva ser exibida. 

6- Reclamação julgada procedente. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, julgar procedente a reclamação, para que seja cassada a sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, determinando-se a reabertura e exaurimento da fase instrutória para apuração da alegada fraude ocorrida no primeiro exame de DNA e para que se esgotem as possibilidades de realização de novo exame de DNA, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Houve ressalva parcial de fundamentação do Sr. Ministro Raul Araújo. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti. 

Brasília (DF), 13 de maio de 2020(Data do Julgamento). 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de reclamação proposta por F D G contra ato praticado pelo Juízo da 7ª Vara de Família e Sucessões do Foro Central da Comarca da Capital do Estado de São Paulo que acolheu preliminar de coisa julgada em alegado desrespeito ao acórdão proferido pela 3ª Turma desta Corte. 

Ação: investigatória de paternidade ajuizada pelo reclamante em face de R M, em que pretende ser reconhecido como filho de F T M, pré-morto. 

Acórdão do TJ/SP: extinguiu o processo sem resolução de mérito, ao fundamento de que não se trataria de hipótese excepcional em que se poderia admitir a relativização da coisa julgada formada em anterior ação investigatória de paternidade. 

Recurso especial: a 3ª Turma do STJ, no REsp 1.632.750/SP, por maioria, deu provimento ao recurso especial, afastando o óbice da coisa julgada na hipótese, a fim de que fossem apurados os indícios de fraude no primeiro exame de DNA e de que fosse investigada novamente a paternidade mediante a realização de novo exame de DNA. 

Decisão reclamada: o Juízo da 7ª Vara de Família e Sucessões do Foro Central da Comarca da Capital do Estado de São Paulo, diante do não comparecimento dos familiares do suposto genitor pré-morto à perícia técnica designada e tendo como base apenas a declaração indiciária da fraude existente no exame anterior, entendeu não ser aplicável a presunção de paternidade decorrente da Súmula 301/STJ e, novamente, extinguiu o processo sem resolução de mérito em virtude da coisa julgada formada na ação investigatória de paternidade anterior (fls. 547/551, e-STJ). 

Reclamação: sustenta que a sentença que novamente extinguiu o processo sem resolução de mérito em razão da coisa julgada que se formou em anterior ação investigatória desrespeitou o acórdão proferido por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP (fls. 3/9). 

Informações: oficiado, o Juízo reclamado prestou informações às fls. 581/586 (e-STJ). 

Contestação: citado, o requerido R M deixou transcorrer in albis o prazo para constestar (fls. 607/608, e-STJ). 

Ministério Público Federal: opina pela procedência da reclamação (fls. 593/598, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito da presente reclamação é definir se a sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito ao fundamento de que deveria ser respeitada a coisa julgada formada em anterior ação investigatória de paternidade afrontou a autoridade de decisão proferida por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, por meio da qual se determinou a apuração de eventual fraude no exame de DNA realizado na primeira ação investigatória e a realização de novo exame de DNA para a apuração de eventual existência de vínculo biológico entre as partes. 

ALEGADO DESRESPEITO AO ACÓRDÃO QUANTO À DETERMINAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DA SUPOSTA FRAUDE EM EXAME DE DNA REALIZADO NA PRIMEIRA AÇÃO INVESTIGATÓRIA. 

01) A sentença reclamada está assim fundamentada no que tange à fraude no exame de DNA realizado na primeira ação investigatória: 

No mais, a declaração de fl. 47 não constitui prova de fraude no exame realizado com o falecido, tratando-se de declaração de pessoa que sequer participou da colheita e análise do material genético daquele. Ou seja, cuide-se de simples alegação de fraude, desacompanhada de prova, porquanto exarada por pessoa estranha ao procedimento objeto da alegação. 

02) Trata-se, como desde logo se vê, de uma mera reprodução de trecho do acórdão proferido pelo TJ/SP e que foi reformado por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, o que sugere que o D. Juízo de 1º grau não empreendeu nenhum esforço na apuração da alegada fraude, como havia sido expressamente determinado por esta Corte. 

03) Com efeito, a declaração de terceira pessoa em que se baseou a sentença reclamada para afirmar não ter havido a alegada fraude é exatamente a mesma em que esta Corte se baseou, no julgamento do recurso especial apontado como violado, para concluir que se tratava, na verdade, de prova indiciária suficiente para provocar a reabertura da fase instrutória e a efetiva apuração da veracidade da declaração contida no referido documento. 

04) Acrescente-se, ademais, que esta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, adotou fundamentação analítica de modo a explicitar, pormenorizadamente, quais providências deveriam ser adotadas para a exauriente apuração da suposta fraude. Confira-se: 

Verifica-se que o recorrente, para provar a sua alegação de fraude no primeiro exame de DNA, noticia ter sido procurado por uma pessoa – Angelo Tadao Kawazoi – que afirma saber e ter efetivamente participado da suposta fraude ocorrida no exame de DNA por ocasião da 1ª ação investigatória – concordando com a declaração destes fatos em escritura pública. Ocorre que a referida pessoa sequer foi ouvida em juízo para melhor esclarecer sobre o que efetivamente sabe sobre este assunto, a despeito de requerimento expresso do recorrente nesse sentido (fls. 247, e-STJ). Além disso, se a fraude, segundo se alega, teria ocorrido com a participação de pessoas com nome e sobrenome – Silvio Fernando Tiritilli e Sérgio Danilo Pena – é evidente que a oitiva dessas pessoas seria igualmente imprescindível, devendo o julgador determinar a colheita da prova testemunhal inclusive de ofício e com base em seus poderes instrutórios. Nesse contexto – de insuficiência probatória causada pela incorreta e prematura extinção do feito – não se poderia exigir do recorrente, desde logo, uma “prova clara e convincente”, para usar a feliz expressão referida por Michele Taruffo. O standard probatório aplicável, até mesmo diante da nítida dificuldade de comprovar uma fraude ocorrida há quase 25 (vinte e cinco) anos no âmbito de uma empresa privada que monopolizava os exames de DNA no Brasil naquele momento, é o da “preponderância da prova”, sendo crível e razoável, em princípio, a versão apresentada pelo recorrente, salvo se o contrário for apurado em regular e exauriente instrução. Isso porque exigir da parte a prova cabal da fraude para viabilizar o afastamento da coisa julgada e, ao mesmo tempo, não permitir que haja a exauriente instrução probatória configuraria uma situação verdadeiramente kafkiana, em que se impõe à parte o ônus de provar sem que lhe seja facultado o meio e o poder de dele se desvencilhar. Anote-se que a profunda investigação acerca da existência ou não de fraude no exame de DNA realizado anteriormente é de grande relevância, seja por se tratar da única causa de pedir deduzida pelo recorrente para afastar a coisa julgada material formada na 1ª ação e, então, viabilizar um novo exame de DNA, seja em razão dos reflexos de natureza cível, administrativa e penal que da eventual comprovação da fraude surgirão, seja ainda, e até mesmo, porque também é direito do recorrente saber se o possível genitor F T M teve participação neste hipotético ato ilícito. Por isso mesmo, observa-se não ter sido completamente adequada a decisão, posteriormente reformada pelo acordão recorrido, de determinar desde logo a realização de novo exame de DNA, antes mesmo de apurar com mais detalhes a existência da alegada fraude, na medida em que a prova pericial não esclarecerá a causa, mas tão somente atingirá um determinado resultado, que coincide com o bem da vida pretendido pelo recorrente – reconhecimento da paternidade. Significa dizer que a realização pura e simples de um novo exame de DNA, como determinado em 1º grau de jurisdição, e o eventual resultado positivo, no sentido de que o recorrente possui vinculo biológico com F T M, não constituirá prova convincente acerca da existência ou não de fraude, elemento causal que demanda investigação própria. Nesse contexto, a eventual comprovação de vínculo genético entre o recorrente e F T M trará, evidentemente, mais um indício de que houve o uso de expediente espúrio para burlar o reconhecimento da relação paterno-filial, mas, nessa hipótese, não se descobrirá se o resultado negativo de 1993 foi causado, por exemplo, por um erro na interpretação dos resultados, por uma falha técnica ou, até mesmo, pela reclamada fraude. Verifica-se que o recorrente, para provar a sua alegação de fraude no primeiro exame de DNA, noticia ter sido procurado por uma pessoa – Angelo Tadao Kawazoi – que afirma saber e ter efetivamente participado da suposta fraude ocorrida no exame de DNA por ocasião da 1ª ação investigatória – concordando com a declaração destes fatos em escritura pública. Ocorre que a referida pessoa sequer foi ouvida em juízo para melhor esclarecer sobre o que efetivamente sabe sobre este assunto, a despeito de requerimento expresso do recorrente nesse sentido (fls. 247, e-STJ). Além disso, se a fraude, segundo se alega, teria ocorrido com a participação de pessoas com nome e sobrenome – Silvio Fernando Tiritilli e Sérgio Danilo Pena – é evidente que a oitiva dessas pessoas seria igualmente imprescindível, devendo o julgador determinar a colheita da prova testemunhal inclusive de ofício e com base em seus poderes instrutórios. Nesse contexto – de insuficiência probatória causada pela incorreta e prematura extinção do feito – não se poderia exigir do recorrente, desde logo, uma “prova clara e convincente”, para usar a feliz expressão referida por Michele Taruffo. O standard probatório aplicável, até mesmo diante da nítida dificuldade de comprovar uma fraude ocorrida há quase 25 (vinte e cinco) anos no âmbito de uma empresa privada que monopolizava os exames de DNA no Brasil naquele momento, é o da “preponderância da prova”, sendo crível e razoável, em princípio, a versão apresentada pelo recorrente, salvo se o contrário for apurado em regular e exauriente instrução. Isso porque exigir da parte a prova cabal da fraude para viabilizar o afastamento da coisa julgada e, ao mesmo tempo, não permitir que haja a exauriente instrução probatória configuraria uma situação verdadeiramente kafkiana, em que se impõe à parte o ônus de provar sem que lhe seja facultado o meio e o poder de dele se desvencilhar. Anote-se que a profunda investigação acerca da existência ou não de fraude no exame de DNA realizado anteriormente é de grande relevância, seja por se tratar da única causa de pedir deduzida pelo recorrente para afastar a coisa julgada material formada na 1ª ação e, então, viabilizar um novo exame de DNA, seja em razão dos reflexos de natureza cível, administrativa e penal que da eventual comprovação da fraude surgirão, seja ainda, e até mesmo, porque também é direito do recorrente saber se o possível genitor F T M teve participação neste hipotético ato ilícito. Por isso mesmo, observa-se não ter sido completamente adequada a decisão, posteriormente reformada pelo acordão recorrido, de determinar desde logo a realização de novo exame de DNA, antes mesmo de apurar com mais detalhes a existência da alegada fraude, na medida em que a prova pericial não esclarecerá a causa, mas tão somente atingirá um determinado resultado, que coincide com o bem da vida pretendido pelo recorrente – reconhecimento da paternidade. Significa dizer que a realização pura e simples de um novo exame de DNA, como determinado em 1º grau de jurisdição, e o eventual resultado positivo, no sentido de que o recorrente possui vinculo biológico com F T M, não constituirá prova convincente acerca da existência ou não de fraude, elemento causal que demanda investigação própria. Nesse contexto, a eventual comprovação de vínculo genético entre o recorrente e F T M trará, evidentemente, mais um indício de que houve o uso de expediente espúrio para burlar o reconhecimento da relação paterno-filial, mas, nessa hipótese, não se descobrirá se o resultado negativo de 1993 foi causado, por exemplo, por um erro na interpretação dos resultados, por uma falha técnica ou, até mesmo, pela reclamada fraude. 

05) O acórdão desta Corte, pois, é didático, na medida em que indica ao 1º grau de jurisdição o motivo pelo qual a apuração da fraude era imprescindível (por se tratar de causa de pedir autônoma, com inúmeros reflexos para as partes, para terceiros e para o Poder Público) e, inclusive, indica também o meio de prova a ser adotado (testemunhal) e as pessoas que deverão ser inquiridas (o declarante e os médicos supostamente envolvidos), sem prejuízo, por óbvio, de outras providências a serem adotadas pelo juízo para, repise-se uma vez mais, exaurir a atividade instrutória relacionada ao mencionado fato. 

06) Considerando que nenhuma das medidas determinadas no acórdão desta Corte foi adotada pelo 1º grau de jurisdição, é preciso concluir que houve absoluta afronta à autoridade desta Corte e manifesto desrespeito ao comando contido no acórdão do REsp 1.632.750/SP, devendo a decisão reclamada ser cassada para que seja realizada a exauriente instrução do processo para apuração da alegada fraude e, somente após, seja proferida outra decisão de mérito. 

ALEGADO DESRESPEITO AO ACÓRDÃO QUANTO À DETERMINAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME DE DNA.ALEGADO DESRESPEITO AO ACÓRDÃO QUANTO À DETERMINAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME DE DNA. 

07) No que se refere à determinação de realização de novo exame de DNA para investigação da existência de vínculo biológico entre o reclamante e o suposto genitor F T M, faz-se necessária a realização de uma breve contextualização fática. 

08) A ação investigatória de paternidade foi ajuizada pelo reclamante em face do interessado R M, eis que o suposto genitor biológico, F T M, faleceu em janeiro de 2002. Anote-se que R M é filho de F T M e, até o momento, é o único herdeiro necessário de F T M de que se tem notícia. 

09) Após a propositura da ação, foram localizados dois irmãos vivos do suposto genitor e, a requerimento da reclamante, foi deferida a intimação de todos os envolvidos (os irmãos e o herdeiro necessário) para fornecerem material genético para a realização do novo exame de DNA. 

10) Ocorre que, na data designada para a colheita do material genético, somente o reclamante compareceu ao IMESC – Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo – e, se não bastasse, os irmãos vivos do genitor e o seu herdeiro necessário sequer justificaram a ausência. 

11) Diante desse cenário, a sentença reclamada extinguiu sem resolução de mérito a ação investigatória em razão da coisa julgada que se formou na primeira investigatória, adotando as seguintes razões de decidir: (i) não seria viável a integração do polo passivo pelos irmãos do falecido, eis que não são eles herdeiros necessários; (ii) que a recusa dos envolvidos em fornecer material genético não pode induzir à presunção de paternidade estampada na Súmula 301/STJ, especialmente na hipótese em que há coisa julgada formada em ação investigatória anterior, que teria sido afastada por esta Corte apenas para a realização de novo exame de DNA, mas não para que se possa inferir a paternidade a partir de outros elementos probatórios, inclusive inexistentes na hipótese. 

12) Em primeiro lugar, anote-se que, somente se houvesse sido exaurida a atividade instrutória acerca da existência ou não de fraude no exame de DNA realizado na primeira ação investigatória, como expressamente determinado por esta Corte por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, é que se poderia cogitar de aplicação ou não da presunção de paternidade pela negativa de fornecimento de material biológico pelos demais familiares próximos, especialmente na hipótese em que há coisa julgada formada em anterior ação investigatória. 

13) Com efeito, conquanto a jurisprudência desta Corte tenha se firmado no sentido de que “a recusa imotivada da parte investigada em se submeter ao exame de DNA, no caso, os sucessores do autor da herança, gera a presunção iuris tantum de paternidade à luz da literalidade da Súmula nº 301/STJ” (REsp 1.531.093/RS, 3ª Turma, DJe 10/08/2015), a hipótese em exame envolve, como destacado, relativização de coisa julgada formada em ação anterior, motivo pelo qual, com muito mais razão, devem ser empreendidas todas as providências necessárias para a adequada e exauriente elucidação da matéria fática. 

14) Em segundo lugar, ressalte-se que existem precedentes do Supremo Tribunal Federal no sentido de ser impossível a condução do investigado (ou de quem lhe faça as vezes) “debaixo de vara” para a coleta do material genético necessário ao exame de DNA (HC 71.373/RS, Pleno, DJ 22/11/1996 e RHC 95.183/BA, 1ª Turma, DJe 17/10/2013), por se tratar de medida sub-rogatória que viola a liberdade de locomoção do suposto genitor. 

15) Isso não significa, todavia, que possa a parte ou o terceiro colocar o magistrado de mãos atadas, desrespeitando injustificadamente a ordem judicial de comparecimento ao local da perícia sem que haja nenhuma espécie de instrumento eficaz para dobrar a renitência de quem adota postura anticooperativa e anticolaborativa, sobretudo quando a inércia se revela apta a gerar o non liquet instrutório justamente em desfavor de quem coopera e de quem colabora para o descobrimento da verdade. 

16) Sobre a conduta que se espera das partes no processo civil contemporâneo, anote-se a lição de Marcelo Mazzola: 

Sob o prisma das partes, diferentemente do que se possa pensar, a colaboração não representa um abraço fraterno de inimigos, mas sim uma aproximação leal e distanciada, com foco convergente. Há uma confluência de interações, não de interesses. Como pontua Júlio Muller, “a adversariedade quanto aos interesses de mérito não deve se confundir quanto à cooperação em termos de processo”. Da mesma forma, não se espera que uma parte forneça munição à outra, reconheça a providência do direito alheio ou cometa o chamado sincericídio. Isso, obviamente, não faria muito sentido. Se fosse assim, o réu, “vislumbrando a fragilidade de sua posição, cogitaria ficar revel ao invés de contestação a ação”. Na verdade, o espírito do NCPC é alçar a ética, a honestidade e lealdade das partes como standards de conduta, facilitando a gestão do processo pelo juiz e permitindo que se chegue à solução de mérito mais justa e efetiva. Em outras palavras, o que se preconiza é uma atuação proba e correta dos indivíduos na exposição dos fatos, na defesa dos seus direitos e na identificação das questões que reclamam a intervenção judicial, colaborando com o juiz para que o mérito seja resolvido em tempo razoável. A individualidade e os objetivos de cada litigante devem ser respeitados, mas o percurso até a vitória não pode ser uma disputa meramente individual e egoísta, sem qualquer preocupação com o resultado da prestação jurisdicional. Ou seja, as partes não podem se portar como “antagonistas que aguardam uma decisão, mas como protagonistas que constroem a decisão”. Embora interesses conflitantes traduzam posições divergentes, jamais podem constituir barreiras para a ética e a lealdade, impedindo o fair play processual. (MAZZOLA, Marcelo. Tutela jurisdicional colaborativa: a cooperação como fundamento autônomo de impugnação. Curitiba: CRV, 2017. p. 53/54). 

17) Nessas hipóteses, não apenas pode, como deve o juiz, de modo criativo e inovador, adotar todas as medidas indutivas, mandamentais e coercitivas, como autoriza o art. 139, IV, do novo CPC, com vistas a refrear a renitência de quem deva fornecer o material, especialmente quando a Súmula 301/STJ se revelar claramente insuficiente para bem resolver a controvérsia, como na hipótese em exame. 

18) Em outras palavras, o entendimento materializado na Súmula 301/STJ não pode ser considerado como absoluto e insuscetível de relativização, pois, maior do que o direito de um filho de ter um pai, é o direito de um filho de saber quem é o seu pai. 

19) Sublinhe-se que o acórdão desta Corte que fora desrespeitado pela sentença reclamada anota a necessidade de valoração da conduta das partes na atividade instrutória. Confira-se: 

Nesse sentido, a par de todas as questões de índole patrimonial e hereditária que do reconhecimento da filiação do recorrente eventualmente possam surgir, fato é que o exame dos autos revela ter o recorrido adotado uma postura inerte, quase descompromissada e indiferente, no tocante ao esclarecimento dos fatos que diretamente lhe dizem respeito. Ocorre que, como bem destaca a doutrina, na ação de investigação de paternidade “o ônus da prova curiosamente é bipartido: o autor pretende provar e demonstrar que o réu é seu pai; este, por sua vez, tentará demonstrar o contrário” (KNIJNIK, Danilo. A prova nos juízos cível, penal e tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 191). Significa dizer, portanto, que a conduta da parte que, escorando-se no ônus da prova supostamente atribuído com exclusividade ao autor, exime-se do “dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade” (art. 379 do CPC/15) e adota postura nitidamente anticooperativa que não mais se admite no sistema processual brasileiro (art. 6º do CPC/15), deve ser valorada e, inclusive, deve ser levada em consideração na escolha do standard da “preponderância da prova” e na valoração das provas até aqui produzidas – afinal, a versão de quem coopera e adota postura ativa na atividade instrutória, municiando o juízo com tudo que estiver ao seu alcance para o descobrimento da verdade, tende normalmente a ser mais verossímil do que a versão de quem não coopera e adota postura inerte e renitente na ativa instrutória, dificultando sobremaneira o descobrimento desta mesma verdade. Daí porque a cooperação no âmbito processual, espontânea ou estimulada, desenvolve-se também mediante a adoção de técnicas coercitivas e, em certos ordenamentos ou situações, até mesmo de técnicas sub-rogatórias, pois o que se deve buscar no litígio – por ambas as partes – é a mais completa elucidação dos fatos que conduza a uma decisão de mérito justa e efetiva. (...) Em síntese, revela-se mais verossímil neste momento a versão de quem, na medida de suas possibilidades, contribuiu ativamente para o descobrimento da verdade e para a elucidação das questões de fato até aqui ocultas, apresentando os elementos de prova de que dispunha (cheques emitidos pelo falecido, declaração em forma de escritura pública, fotografias que comprovariam a semelhanças – e que, aliás, deveriam ser submetidas a um exame prosopográfico, pleiteando a oitiva de testemunhas e dispondo-se a realização de novo exame de DNA), criando, sim, um cenário de dúvida razoável sobre o que de fato ocorreu no fatídico exame de DNA realizado em 1993. 

20) Como se vê, esta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.632.750/SP, já havia identificado a inércia e a postura anticooperativa do herdeiro necessário do suposto genitor, agravada, agora, com a informação de que não apenas ele, mas também os irmãos do falecido, negam-se, de modo sistemático e injustificado, a fornecer o material biológico para a realização do novo exame de DNA determinado naquele julgamento, buscando impor ao Poder Judiciário que decida de acordo com os ônus e as presunções que convenientemente lhes favorecem. 

21) Assim, como forma de dobrar a renitência das únicas pessoas aptas a elucidar adequadamente a questão fática controvertida, bem como conferir efetividade e autoridade à decisão proferida por esta Corte no REsp 1.632.750/SP, impõe-se a cassação da sentença reclamada para determinar, uma vez mais, que seja também exaurida a atividade instrutória quanto à filiação biológica do reclamante, devendo o julgador de 1º grau, se necessário, adotar as medidas indutivas, mandamentais e coercitivas autorizadas pelo art. 139, IV, do novo CPC, para, somente então, se impossível a elucidação da questão, decidir com base em ônus e presunções. 

22) Finalmente, sublinhe-se, por oportuno, que tais medidas devem ser adotadas em relação ao herdeiro necessário (que é interessado nessa reclamação) e, também, em relação aos irmãos do falecido cuja existência foi descoberta no curso da ação. 

23) De fato, conquanto os irmãos do falecido não sejam legitimados passivos para responder à ação investigatória de paternidade ajuizada pelo reclamante, eis que não são herdeiros do suposto genitor biológico, não se pode olvidar que a doutrina tem demonstrado a necessidade de ressignificação do conceito de legitimidade processual, que não mais deverá se referir apenas à clássica hipótese de legitimidade para a demanda (ad causam), mas também à legitimidade para específicos e determinados atos processuais (ad actum). 

24) A esse respeito, leciona Antonio do Passo Cabral: 

Como pertine ao exercício de um poder jurídico, o ordenamento remete a legitimidade à específica situação concreta onde tal poder será exercido. Se a legitimidade é um atributo transitivo, verificado em relação a um determinado estado de fato, pensamos que, a partir do conceito de situação legitimante, enquadrado no pano de fundo da relação processual dinâmica, é possível reduzir a análise da legitimidade a certos momentos processuais específicos, vale dizer, não mais um juízo de pertinência subjetiva da demanda (a legitimatio ad causam), mas referente ao ato processual específico (a legitimatio ad actum). Em razão do dinamismo da relação processual, é só na sua verificação casuística que a legitimidade encontra sua completa e mais pura finalidade. Se a função desse limite subjetivo ao exercício de funções processuais é analisar a correspondência entre o modelo legal e a situação de fato, a legitimidade só pode ser precisa em cada caso concreto e para cada ato processual. Como afirma Fazzalari, a par das discussões sobre a abstração ou concretude da ação, devemos reputar que a situação material pretérita deve ser abstraída quando da análise dos atos processuais, e estes não pressupõem necessariamente a relação material. A situação substancial é relevante como pressuposto de alguns atos processuais, mas não todos, e a ela se juntam outros requisitos processuais definidores de situações legitimantes não necessariamente vinculadas a um direito subjetivo ou a uma relação jurídica material. Na verdade, a colocação dos atos em seqüência faz com que, com exclusão do primeiro ato da série, cada ato processual dependa, para ser praticado, de requisitos e pressupostos que somente poderão ser corretamente compreendidos a partir da análise da cadeia formativa dos atos anteriores e da múltipla e difusa implicação entre eles. Além disso, as situações legitimantes são todas cambiantes ao longo do processo, e o controle da legitimidade não pode se dar senão na dinâmica do contraditório. (CABRAL, Antonio do Passo. Legitimidade e despolarização da demanda in Revista da AJUFE, São Paulo, v. 25, n. 92, jan./jun. 2012., p. 288/289). 

25) Assim, é correto afirmar que um terceiro, independentemente da existência de circunstância que o legitime a ser parte ou interveniente, poderá ser instado a participar apenas de determinados atos processuais, inclusive na seara instrutória, o que, na verdade, não é sequer uma grande novidade, na medida em que terceiros, observado o contraditório, poderão ser obrigados a exibir documento ou coisa que se encontre em seu poder, sob pena de busca e apreensão em que se admitirá a adoção de medidas indutivas, coercitivas, sub-rogatórias ou mandamentais (art. 401 a 404, do novo CPC), procedimento que igualmente deve ser aplicado à hipótese. 

CONCLUSÃO. 

26) Forte nessas razões, JULGO PROCEDENTE a presente reclamação, para o fim de que seja cassada a sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, determinando-se a reabertura e exaurimento da fase instrutória para apuração da alegada fraude ocorrida no primeiro exame de DNA e para que se esgotem as possibilidades de realização de novo exame de DNA, nos termos da fundamentação acima. 

27) Condeno o interessado ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais). 

VOTO-VOGAL 

O SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Sra. Presidente, cumprimento V. Exa. e os eminentes Pares, em especial a eminente Relatora, Ministra Nancy Andrighi, pela qualidade do voto que nos traz. 

Penso que a solução apresentada, de julgar procedente a reclamação, está correta. Porém, divirjo quanto à possibilidade de adoção de medidas coercitivas contra aqueles que não participam da lide, no caso, os possíveis tios, tanto do réu como do promovente da ação (conforme o resultado da demanda). Isso não é, a meu ver, possível no nosso ordenamento jurídico. 

Diante da relativização da coisa julgada, promovida no julgamento da Terceira Turma, e da recusa do réu, supostamente irmão do promovente, em se submeter ao exame de DNA, comportamento desafiador e desrespeitoso para com o prestígio do Judiciário, penso que, nessa hipótese, se solucionaria com facilidade a pendência com a aplicação da presunção referida na Súmula n. 301/STJ (Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade), por analogia. Neste caso, o réu, pretenso irmão, seria instado a se submeter ao exame de DNA sob pena de se entender realmente fraudulenta a realização do exame anterior, ficando, assim, comprovada a alegada irmandade e, via de consequencia, a paternidade daquele suposto pai, conforme o objeto da investigação. 

Isso, a meu ver, solucionaria a questão sem necessidade de envolvimento de terceiros que não integram a lide e que não podem sofrer condução coercitiva para doação obrigatória de material para exame de DNA. Essa providência invasiva não me parece possível, nem proporcional, nem necessária. Contraria frontalmente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, baseado no princípio da dignidade da pessoa humana, não permite que alguém seja forçado a produzir prova contra seus interesses. 

No caso em análise, essa garantia está presente e, por isso, foi originalmente concebida pelo STJ a Súmula n. 301. Quando um suposto pai, demandado, se recusava a se submeter ao exame de DNA, não era obrigado a fazê-lo, mas, em contrapartida, vinha a presunção de que agia assim por ser o pai realmente. 

Aqui, também, se esse pretenso irmão resiste à realização do exame de DNA é porque, provavelmente, sabe que a demanda é movida por um meio-irmão. 

Nesse caso, excepcionalmente, por analogia, aplicaríamos a presunção referida na Súmula n. 301/STJ ao irmão unilateral, porque é ele que está sendo demandado, é o réu, e, como tal, é a pessoa que imediatamente deveria fornecer o material genético. Além disso, é quem terá o interesse patrimonial eventualmente contrariado, com a perda de parte da herança do pai falecido, no caso de reconhecimento da paternidade buscada pelo promovente. 

Então, se autorizarmos a aplicação da presunção tratada na Súmula n. 301, aqui por analogia, para considerar meio-irmãos os litigantes, a querela seria resolvida, pois o promovido, devida e previamente advertido das consequências de sua opção, se veria suficientemente estimulado a se submeter ao exame de DNA. 

Desse modo, a incidência da presunção constante da Súmula n. 301, neste caso, afetando somente o réu, pessoa diretamente envolvida na lide, melhor solucionaria a questão do que cogitar-se da adoção de medida invasiva contra terceiros, em contrariedade à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 

Entendo inviável, inconstitucional, forçar terceiros a fornecer material para exame de DNA, máxime num processo de natureza cível e de interesse não só existencial mas também, no final das contas, de índole patrimonial. Não podemos autorizar ou sugerir ao julgador da instância ordinária a adoção de medidas coercitivas contra os tios do réu, terceiros que não participam da lide, o que me parece uma demasia. Não podemos chegar a tanto e não precisamos disso. Basta ensejar a aplicação, por analogia, da presunção da Súmula n. 301 na hipótese. Isso já resolveria bem a questão, porque a resistência do promovido, a meu ver, é muito mais para não ter afetado o patrimônio recebido na herança do pai. 

E, por fim, lembro que não temos coisa julgada que obrigue os tios do réu, pois não participaram do processo e não há formação de coisa julgada contra quem não participa da lide. 

A reclamação, assim, é procedente, estou acompanhando a eminente Relatora, mas com a ressalva de que não podemos afirmar, no voto condutor, algo que contraria frontalmente a jurisprudência da Corte Constitucional e que, portanto, violaria claramente a Constituição, o devido processo legal, the due process of law, em sua dimensão substantiva. 

Então, registrando a ressalva quanto ao item 25 do voto, no mais muito bem produzido, muito bem elaborado, da eminente Ministra Nancy Andrighi, estou acompanhando pela procedência da reclamação. 

Filigrana doutrinária: Reclamação e Ação Rescisória - Jaldemiro Rodrigues de Ataíde Jr.

O enunciado do § 5º do art. 966 do CPC/2015 diz menos do que deveria, pois apresenta como nova hipótese de cabimento da ação rescisória apenas a aplicação de precedente sem a realização do devido distinguishing - ou melhor, a aplicação do precedente a caso que versa sobre fatos materiais distintos daqueles constantes no caso que gerou o precedente - , olvidando que também se viola a ratio decidendi do precedente quando não se a considera em caso que versa sobre fatos materiais semelhantes. É óbvio que o intérprete pode (e deve), a partir do § 5º do art. 966 do CPC/2015, construir norma jurídica cuja hipótese de incidência contenha também a não aplicação do precedente a caso que verse sobre fatos materiais semelhantes ao do caso que gerou o precedente; mas, e se tal disposição legal for interpretada restritivamente? O legislador pátrio não contou com esse risco. 


ATAÍDE Jr, Jaldemiro Rodrigues de. Comentários ao Código de Processo Civil, Coord. Angélica Arruda Alvim, Araken de Assis, Eduardo Arruda Alvim e George Salomão Leite. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 1.131.

Filigrana doutrinária: Reclamação por descumprimento de precedente

[...] de nada adianta formatar um sistema de precedentes com pretensão de serem obrigatórios, sem haver meios adequados para impor-lhes aos órgãos judiciais. A vinculação efetiva demanda meios para garantir a observância dos precedentes. Os meios comuns são os recursos, que podem veicular erro na aplicação e inobservância dos precedentes obrigatórios. São os recursos os mecanismos habituais de controle dos precedentes, assegurando-lhes vinculação. No entanto, o CPC/2015 – por opção – também elegeu a reclamação como remédio hábil a controlar a observância e o erro na aplicação de certos precedentes ditos obrigatórios. Além dos recursos, a reclamação destina-se a garantir a observância dos precedentes. A reclamação consiste, portanto, num dos elementos do sistema de precedentes obrigatórios.


AZEVEDO, Gustavo. Novo Código de Processo Civil Comentado: Tomo III – arts. 771 a 1072. Coord. Sérgio Luiz de Almeida Ribeiro, Roberto P. Campos Gouveia Filho, Izabel Cristina Pinheiro Cardoso Pantaleão, Lúcio Grassi de Gouveia, São Paulo: Lualri Editora, 2017, p. 332/333.


Essa necessidade de esgotamento das instâncias ordinárias remete ao art. 1.030 do CPC/2015, que concebe o regime de admissibilidade prévio dos recursos [...], na presidência ou vice-presidência do tribunal local. É nesse regramento que, usualmente, se exaurem as vias ordinárias. Na verdade, o art. 1.030 vai além do simples juízo de admissibilidade e concede competência ao tribunal local de julgar o mérito dos recursos excepcionais, cuja questão recorrida tenha sido objeto de julgamento de caso repetitivo no STJ ou no STF. 


AZEVEDO, Gustavo. Novo Código de Processo Civil Comentado: Tomo III – arts. 771 a 1072. Coord. Sérgio Luiz de Almeida Ribeiro, Roberto P. Campos Gouveia Filho, Izabel Cristina Pinheiro Cardoso Pantaleão, Lúcio Grassi de Gouveia, São Paulo: Lualri Editora, 2017, p. 335.

Filigrana doutrinária: Reclamação por desrespeito a precedente - Teresa Arruda Alvim

A lei cria estímulos para ações posteriormente movidas em que se pretenda discutir tema a respeito do qual já tenha havido decisão em repetitivo. Havendo decisão de recurso repetitivo, em todos os recursos e ações cujos procedimentos foram sobrestados, fica o juiz ou tribunal vinculado, em sentido forte, a decidir à luz do precedente firmado. Se o autor desistir da ação, dispensando o juiz de proferir sentença de mérito: sendo a desistência da ação anterior à contestação, o autor ficará isento de custas e honorários de sucumbência. Se, todavia, ocorrer depois de apresentada a contestação, por força de determinação legal, dispensa-se a anuência do réu. No entanto, não fica o autor dispensado de arcar com custas e honorários (art. 1.040, §§ 1º, 2º e 3º). Além de estímulos, o CPC estabelece o desrespeito à decisão proferida em recurso repetitivo, como hipótese de cabimento de reclamação (art. 988, § 5º, II – incluído pela Lei 13.256/2016). A hipótese de desrespeito aos repetitivos como ensejadora do manejo da reclamação era prevista, na versão original do CPC (art. 988, IV). A nova Lei 13.256/2016 retirou dos incisos do art. 988 esta hipótese, mas surpreendentemente, a recolocou no § 5º, II, só para dizer que, quando for o caso de se usar a reclamação para impugnar decisão que desrespeita precedente proferido no julgamento dos repetitivos (recurso especial ou recurso extraordinário) – e assim restabelecendo a hipótese de cabimento retirada dos incisos – dever-se-á, antes de usar a reclamação, esgotar as instâncias ordinárias. Assim, o precedente proferido em julgamento de recursos repetitivos continua tendo obrigatoriedade forte, já que cabe reclamação contra decisão que o desrespeita. Todavia, a força dissuasiva desta reclamação está bastante atenuada, com esta exigência. 


ALVIM, Teresa Arruda. CPC em foco: temas essenciais e sua receptividade - Dois anos de vigência do novo CPC. Coord. Teresa Arruda Alvim, 2. ed., rev., atual. e ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2019, p. 811/812.