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6 de janeiro de 2022

Não é abusiva a recusa, por operadora ou seguradora de plano de saúde, de custeio de aparelho auditivo de amplificação sonora individual - AASI cuja cobertura não possui previsão contratual

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-713-stj.pdf


PLANOS DE SAÚDE Não é abusiva a recusa, por operadora ou seguradora de plano de saúde, de custeio de aparelho auditivo de amplificação sonora individual - AASI cuja cobertura não possui previsão contratual 

O art. 10, VII, da Lei nº 9.656/98 estabelece que as operadoras de planos de saúde e seguradoras não têm a obrigação de arcar com próteses e órteses e seus acessórios não ligados a ato cirúrgico. Assim, o plano de saúde só é obrigado a fornecer a prótese ou a órtese se esse dispositivo está vinculado a um ato cirúrgico, ou seja, se esse dispositivo for necessário para que o ato cirúrgico atinja a sua finalidade. No caso concreto, o aparelho auditivo de amplificação sonora individual (aparelho auditivo) não é necessário para qualquer ato cirúrgico, razão pela qual a negativa de seu fornecimento não é abusiva, já que não prevista na cobertura contratual. STJ. 4ª Turma. REsp 1.915.528-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 28/09/2021 (Info 713).

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Eduardo foi diagnosticado como pessoa com deficiência auditiva. O médico, então, prescreveu o uso de aparelho externo de amplificação sonora, conhecido na linguagem popular como “aparelho auditivo”. Como Eduardo é cliente do plano de saúde, Eduardo solicitou o fornecimento do aparelho prescrito por seu médico. A operadora do plano de saúde negou o fornecimento, sob o argumento de que o aparelho solicitado não está incluído na cobertura contratual: 

“Cumpre informar que o aparelho auditivo solicitado não tem cobertura contratual, tendo em vista que não consta no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, atualizado pela Resolução Normativa - RN n° 428/2017 editada pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e por se trata de um material não implantável cirurgicamente, ou seja, não ligado a qualquer procedimento cirúrgico. Por essa razão, o pedido não poderá ser atendido.” 

A recusa do plano de saúde foi legitima? 

SIM. O consumidor, quando contrata um plano de saúde ou seguro de saúde, imagina que todos os materiais básicos relacionados com procedimentos médicos, como material de sutura, marcapasso, próteses para cirurgia reparadora de mama, pinos para cirurgias ortopédicas e stents estejam cobertos. Isso, contudo, não é inteiramente verdade. O art. 10, VII, da Lei nº 9.656/98 estabelece que as operadoras de planos de saúde e seguradoras não têm a obrigação de arcar com próteses e órteses e seus acessórios não ligados a ato cirúrgico. Confira: 

Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médicoambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: (...) VII - fornecimento de próteses, órteses e seus acessórios não ligados ao ato cirúrgico; 

A doutrina e a jurisprudência, ao interpretarem essa regra, afirmam que o plano de saúde só é obrigado a fornecer a prótese ou a órtese se esse dispositivo está vinculado a um ato cirúrgico, ou seja, se esse dispositivo for necessário para que o ato cirúrgico atinja a sua finalidade: 

“Desse modo, não se garante cobertura contratual para fornecimento de órteses, próteses e seus acessórios em face de patologia cuja terapêutica não depende de procedimento cirúrgico, mas, apenas, quando o procedimento cirúrgico para atingir o resultado desejado necessite de tais insumos médicos.” (ESMERALDI, Renata Maria Gil da Silva Lopes; LOPES, José Fernando da Silva. Planos de saúde no Brasil: doutrina e jurisprudência. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 104-105) 

O que é prótese? E órtese? São dispositivos diferentes? 

SIM. São diferentes. Veja os conceitos fornecidos pelo art. 4º da Resolução Normativa 465/2021, da ANS: 

a) prótese: material permanente ou transitório que substitua total ou parcialmente um membro, órgão ou tecido; 

b) órtese: material permanente ou transitório que auxilie as funções de um membro, órgão ou tecido. 

O caso envolvendo AASI 

É importante esclarecer que o caso concreto não envolve prótese para Implante Coclear (IC), que se constitui em um dispositivo eletrônico que substitui parcialmente as funções da cóclea (órgão da audição), implantado mediante procedimento cirúrgico que visa proporcionar aos seus usuários sensação auditiva próxima ao fisiológico. No caso concreto, a parte pede o fornecimento de um Aparelho de Amplificação Sonora (AASI). Este dispositivo (AASI) não tem correlação com qualquer procedimento cirúrgico e poderia ser comparado, por exemplo, com os óculos para pacientes com deficiência visual. 

Assistência à saúde privada é complementar 

A universalização da cobertura, apesar de garantida pelo art. 198 da Constituição Federal e considerada um dos princípios basilares das ações e serviços públicos de saúde (art. 7º da Lei nº 8.080/90) não pode ser imposta de modo completo e sem limites ao setor privado, porque “a assistência à saúde de iniciativa privada é exercida em caráter complementar” (arts. 199 da Constituição e 4º da Lei nº 8.080/90). 

Equilíbrio atuarial 

Vale ressaltar, ainda, que a contraprestação paga pelo usuário do plano de saúde (ou do seguro saúde) é atrelada aos riscos assumidos pela prestadora. Isso obedece à lógica atuarial desta espécie contratual, pois, quanto mais riscos forem cobertos, mais elevado será o prêmio pago pela parte aderente. Esses prêmios, ademais, são calculados de maneira a permitir que, em uma complexa equação atuarial, sejam suficientes para pagar as indenizações aos contratantes e para cobrir os custos de administração, além de, naturalmente, gerar os justos lucros às fornecedoras. Nesse contexto, eventual modificação, a posteriori, das obrigações contratuais implica inegável desequilíbrio contratual e enriquecimento sem causa para os segurados. 

Em suma: Não é abusiva a recusa, por operadora ou seguradora de plano de saúde, de custeio de aparelho auditivo de amplificação sonora individual - AASI cuja cobertura não possui previsão contratual. STJ. 4ª Turma. REsp 1.915.528-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 28/09/2021 (Info 713). 

DOD PLUS 

Esclareço, mais uma vez, que, se a prótese ou órtese for essencial para o ato cirúrgico, ela deverá ser fornecida pelo plano 

A cláusula que exclui da cobertura do plano de saúde órteses, próteses e materiais diretamente ligados ao procedimento cirúrgico a que se submete o consumidor é abusiva, razão pela qual a recusa indevida pela operadora do plano de saúde em autorizar a cobertura financeira de tratamento médico faz nascer o dever de reparar os danos morais produzidos pelo agravamento da situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do beneficiário, que se configura como dano moral in re ipsa (independente de prova). STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 1398455/PA, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 15/04/2019. 

Mas como saber se aquela prótese ou órtese está ligada ao ato cirúrgico? 

Para saber se uma prótese ou órtese está ligada ao ato cirúrgico e, portanto, coberta pelo plano de saúde, deve-se indagar se ela possui as seguintes características, inerentes aos dispositivos médicos implantáveis: a) ser introduzida (total ou parcialmente) no corpo humano; b) ser necessário procedimento cirúrgico para essa introdução e c) permanecer no local onde foi introduzida, após o procedimento cirúrgico. STJ. 3ª Turma. REsp 1673822/RJ, Rel. p/ Acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 15/03/2018.