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16 de janeiro de 2022

A eleição do regime de bens da união estável por contrato escrito é dotada de efetividade ex nunc, sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos patrimoniais do pacto sem expressa autorização judicial

 UNIÃO ESTÁVEL

STJ. 4ª Turma. AREsp 1.631.112-MT, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 26/10/2021 (Info 715).

A eleição do regime de bens da união estável por contrato escrito é dotada de efetividade ex nunc, sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos patrimoniais do pacto sem expressa autorização judicial

União Estável

união estável é uma entidade familiar, caracterizada pela união entre duas pessoas, do mesmo sexo ou de sexos diferentes, que possuem convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família

Art. 226, § 3º, CF: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”

Art. 1.723, CC: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.

ADI 4277, Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 05/05/2011: Apesar da CF/88 e do Código Civil falarem em união de homem e mulher, o STF entende que é possível a existência de uniões estáveis homoafetivas, ou seja, entre pessoas do mesmo sexo

Requisitos

Pública: não pode ser oculta, clandestina

Duradoura / estável: apesar de não se exigir um tempo mínimo

Contínua: sem que haja interrupções constantes

Objetivo de constituir uma família

As duas pessoas não podem ter impedimentos para casar

Exclusiva: é impossível

existência de uniões estáveis concomitantes e

existência união estável se um dos componentes é casado e não separado de fato

coabitação NÃO é um requisito da união estável       

Código Civil não exige que os companheiros residam sob o mesmo teto

STF, 382: A vida em comum sob o mesmo teto “more uxório”, não é indispensável à caracterização do concubinato

Regime de bens

na união estável, as relações patrimoniais entre o casal obedecem às regras do regime da comunhão parcial de bens (art. 1.725)

como se as pessoas estivessem casadas sob o regime da comunhão parcial de bens

Mas é possível que os companheiros celebrem um contrato escrito entre si estipulando regras patrimoniais específicas que irão vigorar naquela união estável

“contratos de convivência” prevendo que na união estável irá vigorar o regime separação bens

No casamento, se os nubentes desejarem fazer um pacto antenupcial, o Código Civil exige que isso seja formalizado por meio de escritura pública (art. 1.640, §ú)

Diferentemente do casamento, no caso da regulação de bens envolvendo a união estável, o Código Civil exigiu apenas que isso fosse feito por contrato escrito, não obrigando a lavratura de escritura pública ou qualquer outra providência notarial ou registral.

“Considerando que a união estável é uma realidade fática, desprovida de formalidades legais, o contrato de convivência, por conseguinte, é um negócio jurídico informal, não reclamando solenidades previstas em lei. Apenas e tão somente exige-se a sua celebração por escrito, afastando-se a forma verbal. Assim, pode ser celebrado por escritura pública ou particular, não submetido ao registro público.” (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Vol. 6. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 502).

REsp 1459597/SC (3ª T), Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 01/12/2016: contrato de união estável precisa apenas ser escrito e observar os requisitos de validade do negócio jurídico (art. 104, CC)

Contrato de união estável

Regra

Em regra, NÃO produz efeitos retroativos

O regime de bens entre os companheiros começa a vigorar na data da assinatura do contrato, assim como o regime de bens entre os cônjuges começa a produzir efeitos na data do casamento (§ 1º do art. 1.639 do CC).

A eleição (escolha) do regime de bens da união estável por contrato escrito produz efeitos ex nunc (para frente), sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos.

Exceção

é possível cláusula retroativa sobre o regime de bens, em contrato celebrado entre os conviventes, desde que haja expressa autorização judicial, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC.

Art. 1.639, § 2º, CC: “É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”.

15 de novembro de 2021

A eleição do regime de bens da união estável por contrato escrito é dotada de efetividade ex nunc, sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos patrimoniais do pacto sem expressa autorização judicial, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002

Processo

AREsp 1.631.112-MT, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por maioria, julgado em 26/10/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

União estável. Regime de bens. Retroatividade. Efeitos ex nunc. Expressa autorização judicial. Excepcionalidade. Art. 1.639, § 2º, do Código Civil.

 


DESTAQUE

A eleição do regime de bens da união estável por contrato escrito é dotada de efetividade ex nunc, sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos patrimoniais do pacto sem expressa autorização judicial, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, o magistrado de piso julgou improcedente a pretensão de invalidade de cláusula retroativa do regime de bens da união estável consignando que "tendo os litigantes optado por adotar o regime da 'separação total de bens' quando da realização do contrato de convivência, inclusive com efeitos retroativos ao início da união estável, e não tendo restado demonstrado que a autora foi forçada ou ludibriada a fazê-lo, se concluiu ter ela o feito espontaneamente, devendo o pacto continuar a vigorar".

Por sua vez, o Tribunal de origem manteve a sentença, por entender possível a retroatividade de todo o contrato de convivência no caso de previsão expressa em cláusula contratual.

Dessa forma, a Corte a quo decidiu a questão em desconformidade com a jurisprudência do STJ, segundo a qual a eleição do regime de bens da união estável por contrato escrito é dotada de efetividade ex nunc, sendo inválidas cláusulas que estabeleçam a retroatividade dos efeitos.

Por fim, consigna-se que a possibilidade de cláusula retroativa sobre o regime de bens, em contrato celebrado entre os conviventes, depende de expressa autorização judicial, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.

5 de outubro de 2021

É inconstitucional o reconhecimento de direitos previdenciários nas relações que se amoldam ao instituto do concubinato, mesmo que a união tenha sido mantida durante longo período e com aparência familiar

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/09/info-1024-stf.pdf

 

DIREITO PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE: É inconstitucional o reconhecimento de direitos previdenciários nas relações que se amoldam ao instituto do concubinato, mesmo que a união tenha sido mantida durante longo período e com aparência familiar 

É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável. STF. Plenário. RE 883168/SC, Rel. Dias Toffoli, julgado em 2/8/2021 (Repercussão Geral – Tema 526) (Info 1024). 

Em que consiste a união estável? 

A união estável é uma entidade familiar, caracterizada pela união entre duas pessoas, do mesmo sexo ou de sexos diferentes, que possuem convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família. 

Previsão 

O instituto da união estável é previsto no art. 226, § 3º da Constituição Federal e no art. 1.723 e seguintes do Código Civil: 

Art. 226 (...) § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. 

Apesar da CF/88 e do CC/2002 falarem em união de homem e mulher, o STF, ao julgar a ADI 4.277-DF em conjunto com a ADPF 132-RJ, entendeu que é possível a existência de uniões estáveis homoafetivas, ou seja, entre pessoas do mesmo sexo (ADI 4277, Rel. Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 05/05/2011). 

Requisitos para a caracterização da união estável 

a) a união deve ser pública (não pode ser oculta, clandestina); 

b) a união deve ser duradoura, ou seja, estável, apesar de não se exigir um tempo mínimo; 

c) a união deve ser contínua (sem que haja interrupções constantes); 

d) a união deve ser estabelecida com o objetivo de constituir uma família; 

e) as duas pessoas não podem ter impedimentos para casar; 

f) a união entre essas duas pessoas deve ser exclusiva (é impossível a existência de uniões estáveis concomitantes e a existência de união estável se um dos componentes é casado e não separado de fato). 

A coabitação é um requisito da união estável? NÃO. 

O CC-2002 não exige que os companheiros residam sob o mesmo teto, de sorte que continua em vigor, com as devidas adaptações, a antiga Súmula 382-STF: A vida em comum sob o mesmo teto, “more uxório”, não é indispensável à caracterização do concubinato. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João é casado com Francisca, com quem tem dois filhos. Ocorre que João, em virtude de sua profissão, passa 15 dias por mês em outro Município trabalhando. Em uma dessas viagens, ele conheceu Regina, por quem se apaixonou. Diante disso, ele passou a também viver com Regina. 15 dias com a sua esposa e nos outros 15 dias com a outra mulher. Em um Município, ele é conhecido publicamente como marido de Francisca e, no outro, como “companheiro” de Regina. Vale ressaltar que uma não sabe da existência da outra. Essa situação perdurou por 5 anos, até que João faleceu. Ambas buscaram pensão por morte do INSS alegando que eram dependentes de João. Francisca, como cônjuge, e Regina, como companheira de união estável. 

É possível reconhecer a existência de união estável, neste caso? Regina terá direito à pensão por morte? NÃO. 

Como o indivíduo já era casado, a segunda relação firmada não pode ser reconhecida juridicamente como união estável. João mantinha com Regina algo que é denominado de “concubinato”, nos termos do art. 1.727 do Código Civil: 

Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. 

“Etimologicamente, concubinato é comunhão de leito. Vem do latim cum (com); cubrare (dormir): concubinatos. Seria a união ilegítima do homem e da mulher. E, segundo o sentido de concubinatus, o estado de mancebia, ou seja, a companhia de cama sem provação legal.” (ROSA, Conrado Paulina da. Direito de Família Contemporâneo. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 125). Em virtude da tradição do direito brasileiro de proteger a monogamia em detrimento da autonomia privada, a jurisprudência não admite a existência concomitante de casamento e união estável. Também não se admite a existência concomitante de duas uniões estáveis. 

Tal vedação encontra-se expressamente prevista na legislação? 

SIM. Encontra-se na primeira parte do § 1º do art. 1.723 do Código Civil: 

Art. 1.723 (...) § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; (...) 

Art. 1.521. Não podem casar: (...) VI - as pessoas casadas; 

Assim, a regra é a seguinte: 

· pessoa casada com “A” não pode simultaneamente ter união estável com “B”; 

· pessoa que já vive em união estável com “A” não pode simultaneamente ter união estável com “B”. 

Nas palavras do Min. Dias Toffoli: “Ora, se uma pessoa casada não pode casar, por força do art. 1.521, VI do Código Civil; se uma pessoa casada não pode ter reconhecida uma união estável concomitante, por força do art. 1.723, § 1º, c/c o art. 1.521, VI, do Código Civil; seguindo essa linha de argumentação, uma pessoa que esteja convivendo em uma união estável não pode ter reconhecida, simultaneamente, uma outra união estável.” 

Exceção 

O Código Civil prevê uma exceção a essa regra e diz que, se o indivíduo casado estiver separado de fato, ele poderá ter união estável com outra pessoa. É a segunda parte do § 1º do art. 1.723: 

Art. 1723 (...) § 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. 

Assim, em nosso exemplo, se João estivesse separado de fato de Francisca, aí sim a sua relação com Regina poderia ser considerada como união estável. 

Tese fixada pelo STF 

O STF já possuía alguns julgados afirmando as conclusões acima expostas e, no fim de 2020, reafirmou sua jurisprudência sob a sistemática da repercussão geral, tendo fixado a seguinte tese: 

A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1.723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro. STF. Plenário. RE 1045273, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 529) (Info 1003). 

O STF afirmou que, em que pese o fato de o art. 226, § 3º, da Constituição Federal ter afastado o preconceito e a discriminação à união estável, que não mais faziam sentido frente à evolução da mentalidade social, constata-se que, em determinadas situações, a união não pode ser considerada estável, mas, sim, concubinato, quando houver causas impeditivas ao casamento, previstas no art. 1.521 do Código Civil. O Direito brasileiro, à semelhança de outros sistemas jurídicos ocidentais, adota o princípio da monogamia, segundo o qual uma mesma pessoa não pode contrair e manter simultaneamente dois ou mais vínculos matrimoniais, sob pena de se configurar a bigamia, tipificada, inclusive, como crime previsto no art. 235 do Código Penal: 

Art. 235. Contrair alguém, sendo casado, novo casamento: Pena - reclusão, de dois a seis anos. 

Por esse motivo, a existência de casamento ou de união estável é, por si só, óbice ao reconhecimento de uma outra união paralelamente estabelecida por um dos companheiros durante o mesmo período, independentemente de se tratar de relacionamentos hétero ou homoafetivos. 

Posição do STJ 

Importante esclarecer que o STJ já possuía o mesmo entendimento: 

A relação concubinária mantida simultaneamente ao matrimônio não pode ser reconhecida como união estável quando ausente separação de fato ou de direito do cônjuge. Nas hipóteses em que o concubinato impuro repercute no patrimônio da sociedade de fato aplica-se o Direito das obrigações. A partilha decorrente de sociedade de fato entre pessoas impõe a prova do esforço comum na construção patrimonial (Súmula nº 380/STF). STJ. 3ª Turma. REsp 1628701/BA, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 07/11/2017. 

A jurisprudência do STJ e do STF é sólida em não reconhecer como união estável a relação concubinária não eventual, simultânea ao casamento, quando não estiver provada a separação de fato ou de direito do parceiro casado. STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 999.189/MS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 16/05/2017. 

Tema 529 

Ao julgar o RE 883168/SC (Tema 529), o STF reafirmou seu entendimento: 

É incompatível com a Constituição Federal o reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada, porquanto o concubinato não se equipara, para fins de proteção estatal, às uniões afetivas resultantes do casamento e da união estável. STF. Plenário. RE 883168/SC, Rel. Dias Toffoli, julgado em 2/8/2021 (Repercussão Geral – Tema 526) (Info 1024). 

É inconstitucional o reconhecimento de direitos previdenciários nas relações que se amoldam ao instituto do concubinato, mesmo que a união tenha sido mantida durante longo período e com aparência familiar. O microssistema jurídico que rege a família como base da sociedade (CF, art. 226, caput) orienta-se pelos princípios da monogamia, da exclusividade e da boa-fé, bem como pelos deveres de lealdade e fidelidade que visam a conferir maior estabilidade e segurança às relações familiares. No Código Civil, a relação duradoura estabelecida entre pessoas impedidas de casar é nomeada concubinato para distingui-la da união estável, precisamente sob o aspecto do impedimento ao casamento, e afastar seu reconhecimento como entidade familiar (CC, art. 1.566, I). Para efeito de diferenciação entre a união estável e o concubinato, o art. 1.727 do CC deve ser lido em conjunto com o art. 1.723, § 1º, do CC. Ademais, o Tribunal, ao debater questões similares, concluiu não ser possível o reconhecimento de uma segunda união estável e o consequente rateio de pensão por morte. 

Qual a diferença entre o caso analisado (Tema 526) e aquele decidido pelo STF no Tema 529? 

Na verdade, o Relator entendeu que há similitude entre as questões constitucionais debatidas em cada um dos temas: 

Tema 526: ‘Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 201, V, e 226, § 3º, da Constituição Federal, a possibilidade, ou não, de reconhecimento de direitos previdenciários (pensão por morte) à pessoa que manteve, durante longo período e com aparência familiar, união com outra casada’. 

Tema 529: ‘Recurso extraordinário com agravo em que se discute, à luz dos artigos 1º, III; 3º, IV; 5º, I, da Constituição Federal, a possibilidade, ou não, de reconhecimento jurídico de união estável e de relação homoafetiva concomitantes, com o consequente rateio de pensão por morte’.

Assim, a única diferença é que, no Tema 529, o caso concreto envolvia relação homoafetiva, o que não interfere em nada. Desse modo, os dois temas poderiam até mesmo ter sido julgados em conjunto.

19 de agosto de 2021

A inexistência jurídica da sentença pode ser declarada em ação autônoma (querela nullitatis insanabilis) e também no próprio processo em que proferida, na fase de cumprimento de sentença ou até antes dela, se possível, especialmente na hipótese em que a matéria foi previamente submetida ao crivo do contraditório e não havia a necessidade de dilação probatória

RECURSO ESPECIAL Nº 1.904.374 - DF (2020/0143768-8) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. OMISSÕES. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES DECIDIDAS PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. QUESTÃO CONSTITUCIONAL QUE DEVE SER EXAMINADA EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. EFEITO EX TUNC COMO REGRA. MODULAÇÃO TEMPORAL DE EFEITOS E EFICÁCIA EX NUNC COMO EXCEÇÃO. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA MODULAÇÃO DE EFEITOS. NECESSIDADE. TEMA 809/STF. APLICABILIDADE AOS PROCESSOS EM QUE NÃO TENHA HAVIDO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA DE PARTILHA. TUTELA DA CONFIANÇA E PREVISIBILIDADE DAS RELAÇÕES PROCESSUAIS FINALIZADAS SOB A ÉGIDA DO ART. 1.790 DO CC/2002. PRÉ-EXISTÊNCIA DE DECISÃO EXCLUINDO HERDEIRO DA SUCESSÃO À LUZ DO DISPOSITIVO POSTERIORMENTE DECLARADO INCONSTITUCIONAL. IRRELEVÂNCIA. AÇÃO DE INVENTÁRIO SEM SENTENÇA DE PARTILHA E SEM TRÂNSITO EM JULGADO. EQUIPARAÇÃO COM DECISÃO PROFERIDA NO CURSO DO INVENTÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE. POSSIBILIDADE DE ARGUIÇÃO EM IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE IMPLICA NA POSSIBILIDADE DE SEU EXAME NA FASE DE CONHECIMENTO. 

1- Ação proposta em 03/02/2004. Recurso especial interposto em 25/11/2019 e atribuído à Relatora em 07/10/2020. 

2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o acórdão recorrido possui omissões relevantes; (ii) se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do tema 809, segundo a qual “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”, deve ser aplicada ao inventário em que a exclusão da concorrência entre herdeiros ocorreu em decisão anterior à tese. 

3- Inexiste omissão quando o acórdão recorrido enfrenta amplamente a questão controvertida, ainda que contrariamente aos interesses da parte recorrente, bem como inexiste omissão quando a questão que se alega deveria ter sido enfrentada possui natureza constitucional e não houve a interposição de recurso extraordinário pela parte. 

4- Considerando que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade, a declaração de sua inconstitucionalidade, de regra, produz efeito ex tunc, ressalvadas as hipóteses em que, no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, houver a modulação temporal dos efeitos, que é excepcional. 

5- Da excepcionalidade da modulação decorre a necessidade de que o intérprete seja restritivo, a fim de evitar inadequado acréscimo de conteúdo sobre aquilo que o intérprete autêntico pretendeu proteger e salvaguardar. 

6- Ao declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002 (tema 809), o Supremo Tribunal Federal modulou temporalmente a aplicação da tese para apenas “os processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha”, de modo a tutelar a confiança e a conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas (ou seja, às ações de inventário concluídas nas quais foi aplicado o art. 1.790 do CC/2002). 

7- Aplica-se a tese fixada no tema 809/STF às ações de inventário em que ainda não foi proferida a sentença de partilha, ainda que tenha havido, no curso do processo, a prolação de decisão que, aplicando o art. 1.790 do CC/2002, excluiu herdeiro da sucessão e que a ela deverá retornar após a declaração de inconstitucionalidade e a consequente aplicação do art. 1.829 do CC/2002. 

8- Não são equiparáveis, para os fins da aplicação do tema 809/STF, as sentenças de partilha transitadas em julgado e as decisões que, incidentalmente, versam sobre bens pertencentes ao espólio, uma vez que a inconstitucionalidade de lei, enquanto questão de ordem pública, é matéria suscetível de arguição em impugnação ao cumprimento de sentença e que, com muito mais razão, pode ser examinada na fase de conhecimento. 

9- Recurso especial conhecido e desprovido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso especial nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Dr. GUSTAVO HENRIQUE CAPUTO BASTOS, pela parte RECORRENTE: TIAGO BASTOS DE MIRANDA RIBEIRO e Outro 

Brasília (DF), 13 de abril de 2021(Data do Julgamento) 

MINISTRA NANCY ANDRIGHI Relatora 


RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): 

Cuida-se de recurso especial interposto por VITOR BASTOS DE MIRANDA RIBEIRO e TIAGO BASTOS DE MIRANDA, com base no art. 105, III, alínea “a” do permissivo constitucional, contra o acórdão do TJ/DFT que, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento por eles interposto. 

Recurso especial interposto e m: 25/11/2019. 

Atribuído ao gabinete e m: 07/10/2020. 

Ação: de inventário e partilha de bens de SADY CARNOT ASSIS DE MIRANDA RIBEIRO. 

Decisão interlocutória: diante da declaração de inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002 pelo Supremo Tribunal Federal (tema 809/STF), que equiparou o regime sucessório entre cônjuges e companheiros, determinou fosse aplicado ao inventário e partilha de bens de SADY a regra do art. 1.829 do CC/2002, razão pela qual a recorrida ROSANE DE AZAMBUJA VILLANOVA, companheira de SADY, passou a concorrer com os descendentes em relação aos bens particulares deixados pelo falecido (fls. 843/844 e fl. 849, e-STJ). 

Acórdão do TJ/DFT: por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelos recorrentes, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DISTINÇÃO DE REGIME SUCESSÓRIO ENTRE CÔNJUGES E COMPANHEIROS. INCONSTITUCIONALIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 1829 DO CÓDIGO CIVIL. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS Nº 646.721/RS E Nº 878.694/MG. DECISÃO MANTIDA. 1. A hipótese consiste em verificar se determinado bem imóvel deve, ou não, ser incluído na herança da ex-companheira do falecido. 2. Ressalta-se que por ocasião do julgamento realizado no dia 10 de maio de 2017, ao apreciar os Recursos Extraordinários nº 646.721/RS e nº 878694/MG, o Excelso Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil e fixou a seguinte tese: “É inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”. 3. No caso, o processo principal ainda não foi sentenciado, razão pela qual os efeitos da mencionada declaração de inconstitucionalidade certamente atingiram a decisão que aplicou o art. 1790 do Código Civil e excluiu a ex-companheira da partilha referente ao bem imóvel questionado, tendo em vista que ela foi fundamentada essencialmente na aplicação de disposição que deixou de ser válida perante o sistema normativo pátrio. 4. Frise-se que a consequência prática dessa afirmação é a aplicação do art. art. 1829, e seguintes, do Código Civil e não o art. 1790 anteriormente mencionado. Isso porque o companheiro passou a ser tratado de forma isonômica, atraindo para si o mesmo regime jurídico aplicável ao cônjuge. 5. Recurso conhecido e desprovido (fls. 875/881, e-STJ). 

Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram rejeitados, por unanimidade (fls. 883/888, e-STJ). 

Recurso especial: alega-se, em síntese: (i) violação ao art. 1.022, I e parágrafo único, II, e ao art. 489, §1º, IV e V, ambos do CPC/15, ao fundamento de que o acórdão recorrido possuiria omissões relevantes acerca da existência de coisa julgada formal e de impossibilidade de a decisão do STF produzir efeitos vinculantes; (ii) violação aos arts. 203, §2º, 503, §1º, 505, 507 e 927, todos do CPC/15, ao fundamento de que, em decisão interlocutória acobertada pela preclusão, a recorrida ROSANE foi excluída da concorrência com os herdeiros em relação a um determinado bem imóvel, razão pela qual a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no tema 809 não se aplicaria à hipótese e não poderia ela ser considerada, posteriormente, herdeira do referido bem (fls. 401/431, e-STJ). 

Parecer do Ministério Público Federal: opinou pelo não conhecimento do recurso especial (fls. 908/924, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator): 

Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se o acórdão recorrido possui omissões relevantes; (ii) se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do tema 809, segundo a qual “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”, deve ser aplicada ao inventário em que a exclusão da concorrência entre herdeiros ocorreu em decisão anterior à tese. 

EXISTÊNCIA DE OMISSÕES RELEVANTES. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.022, I E PARÁGRAFO ÚNICO, II, E ART. 489, §1º, IV E V, AMBOS DO CPC. 

01) De início, anote-se que os recorrentes alegaram a violação aos arts. 1.022, I, parágrafo único, II, e 489, §1º, IV e V, ambos do CPC/15, especialmente ao fundamento de que existiriam duas omissões relevantes no acórdão recorrido, que não teria examinado: (i) a existência de coisa julgada formal decorrente de decisão versando sobre a concorrência hereditária proferida antes da fixação da tese pelo Supremo Tribunal Federal e acobertada pela preclusão temporal; (ii) a inexistência de efeito vinculante na decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal em controle difuso de constitucionalidade por ocasião do julgamento do tema 809. 

02) Em relação ao primeiro ponto, não há omissão, na medida em que a questão controvertida – existência de coisa julgada formal ou de preclusão que impediria novo exame da matéria – foi amplamente enfrentada pelo acórdão recorrido, que, interpretando a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema 809, concluiu ser ela aplicável em virtude de ainda não existir, na hipótese, sentença de partilha transitada em julgado. 

03) No que se refere ao segundo aspecto, sublinhe-se que que a eficácia vinculante da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal em controle difuso de constitucionalidade, a despeito de positivada nos arts. 525, §12, e 535, §5º, ambos do CPC/15, é matéria de índole constitucional – os próprios recorrentes afirmam que o acórdão recorrido deveria ter se pronunciado sobre os arts. 52, X, e 102, III e §2º, ambos da Constituição Federal – razão pela qual eventual omissão sobre a questão constitucional deveria ter sido objeto de oportuna impugnação em recurso extraordinário não interposto pelas partes. 

04) Diante desse cenário, não há que se falar em existência de omissões relevantes no acórdão recorrido. 

DA APLICABILIDADE DA TESE FIXADA NO JULGAMENTO DO TEMA 809/STF À HIPÓTESE. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 203, §2º, 503, §1º, 505, 507 E 927, TODOS DO CPC/15. 

05) Para melhor contextualizar a controvérsia, sublinhe-se que o juízo do inventário de SADY CARNOT ASSIS DE MIRANDA RIBEIRO, diante de sentença que reconheceu a existência de união estável entre o falecido e a recorrida ROSANE no período entre 1997 e janeiro de 2004, proferiu em 09/10/2014 a decisão de fl. 517 (e-STJ) que, aplicando expressamente o art. 1.790 do CC/2002, reconheceu que ROSANE apenas teria direito aos bens adquiridos onerosamente durante a união estável com o falecido, a serem identificados pelo inventariante e pelos demais herdeiros. 

06) Sobrevieram, então, petições do inventariante e das partes em cumprimento das referidas determinações judiciais e, após o contraditório, o juízo do inventário proferiu em 22/05/2015 a decisão de fls. 534/535 (e-STJ), vazada nos seguintes termos: 

Em relação ao imóvel de fl. 167, está evidenciada a data de sua aquisição conforme certidão de matrícula em referência, não participando a Sra. Rosane da sua aquisição visto que o registro de compra e venda data o ano de 1995, anterior ao início de sua relação com o inventariado. Consequentemente os valores decorrentes da locação do imóvel também serão devidos somente aos filhos. 

07) Por ocasião do julgamento do RE 878.694/MG com repercussão geral reconhecida (tema 809), cujo acórdão foi publicado no DJe de 06/02/2018, o Pleno do Supremo Tribunal Federal fixou a tese de que “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”. 

08) Naquela assentada, o Supremo Tribunal Federal, levando em “consideração o fato de que as partilhas judiciais e extrajudiciais que versam sobre as referidas sucessões encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento (muitas já finalizadas sob as regras antigas)”, entendeu por bem modular temporalmente os efeitos da aplicação da tese acima enunciada, de modo que a referida solução deve “ser aplicada apenas aos processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública”. 

09) Em face dessa nova realidade, o juízo do inventário proferiu a decisão de fls. 843/844 (e-STJ) em que determinou a inclusão, no rol de bens partilháveis entre a recorrida e os recorrentes, do bem imóvel que havia sido outrora excluído da partilha mediante a aplicação do art. 1.790 do CC/2002. Ao julgar os embargos de declaração opostos pelos recorrentes (fl. 849, e-STJ), o juízo do inventário consignou expressamente a aplicação do precedente do Supremo Tribunal Federal: 

O Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no julgamento dos Recursos Extraordinários nos 646721 e 878694, ambos com repercussão geral reconhecida, declarou inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no artigo 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do artigo 1.829 do CC/2002. Assim, a companheira concorre com os descendentes em relação aos bens particulares deixados pelo falecido, nos termos do inciso I do artigo 1.829 do Código Civil de 2002. 

10) O acórdão recorrido, mantendo a decisão acima reproduzida, assim se pronunciou quanto ao ponto: 

A decisão de fl. 12 (Id. 7177331), proferida em 9 de outubro de 2014, aplicou o art. 1790 do Código Civil e excluiu a ex-companheira da partilha referente ao bem imóvel questionado, pois o referido bem foi adquirido pelo falecido antes da constância da união estável. Dessa forma, sob o fundamento da aludida regra, a ex-companheira não poderia ter sido incluída na partilha do mencionado bem imóvel, seja na posição de meeira ou de herdeira. Ocorre que por ocasião do julgamento realizado no dia 10 de maio de 2017, ao apreciar os Recursos Extraordinários nº 646.721/RS e nº 878694/MG, o Excelso Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil... (...) Na ocasião, excepcionou-se a regra geral da invalidade da norma inconstitucional (efeitos ex tunc) com a modulação dos efeitos do acórdão, em respeito ao princípio da segurança jurídica. Assim, a afirmada inconstitucionalidade do art. 1790 do Código Civil produz efeitos apenas em relação aos inventários não acobertados pela eficácia do trânsito em julgado da sentença. O processo principal ainda não foi sentenciado, como os próprios agravantes ressaltaram nas razões do agravo. Portanto, os efeitos da supracitada declaração de inconstitucionalidade certamente atingiram a decisão de fl. 12 (Id. 7177331), tendo em vista que esse provimento jurisdicional foi fundamentado essencialmente na aplicação do dispositivo que não mais se afigura válido em nosso sistema normativo. A consequência prática dessa conclusão é a aplicação do art. 1829, e seguintes, do Código Civil ao presente caso e não o art. 1790 acima referido. Isso porque o companheiro passou a ser tratado de forma isonômica, atraindo para si o mesmo regime jurídico aplicável ao cônjuge. Por isso, a recorrida deve ser admitida como herdeira para concorrer com os descendentes na sucessão do falecido, inclusive em relação ao bem imóvel situado no (...), de acordo com o art. 1829, inc. I, do Código Civil. 

11) A tese dos recorrentes é de que as decisões que, aplicando o art. 1.790 do CC/2002, excluíram o bem imóvel da concorrência hereditária entre a recorrida e os recorrentes estariam acobertadas pelo manto da imutabilidade decorrente da preclusão e da coisa julgada formal, motivo pelo qual não poderiam ser alcançadas pela superveniente declaração de inconstitucionalidade da regra legal pelo Supremo Tribunal Federal. 

12) A esse respeito, registre-se que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade e que a consequência disso é que, como regra, a declaração de inconstitucionalidade de lei produz efeito ex tunc. Quanto ao ponto, leciona Luís Roberto Barroso: 

A lógica do raciocínio é irrefutável. Se a Constituição é a lei suprema, admitir a aplicação de uma lei com ela incompatível é violar sua supremacia. Se uma lei inconstitucional puder reger dada situação e produzir efeitos regulares e válidos, isso representaria a negativa de vigência da Constituição naquele mesmo período, em relação àquela matéria. A teoria constitucional não poderia conviver com essa contradição sem sacrificar o postulado sobre o qual se assenta. Daí por que a inconstitucionalidade deve ser tida como uma forma de nulidade, conceito que denuncia o vício de origem e a impossibilidade de convalidação do ato. Corolário natural da teoria da nulidade é que a decisão que reconhece a inconstitucionalidade tem caráter declaratório – e não constitutivo – limitando-se a reconhecer uma situação preexistente. Como consequência, seus efeitos se produzem retroativamente, colhendo a lei desde o momento de sua entrada no mundo jurídico. Disso resulta que, como regra, não serão admitidos efeitos válidos à lei inconstitucional, devendo todas as relações jurídicas constituídas com base nela voltar ao status quo ante. (BARROSO, Luís Roberto. Controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 16). 

13) Todavia, é conhecida a lição e o entendimento que conferem eficácia prospectiva (efeito ex nunc) às decisões que declaram a inconstitucionalidade de lei, fundando-se em razões de diversas ordens – proteção à boa-fé, tutela da confiança, previsibilidade, pragmatismo e consequencialismo jurídico são algumas delas. A partir desses ideais é que se concebeu a denominada modulação temporal dos efeitos da decisão que declara a inconstitucionalidade. 

14) Não se pode perder de vista, entretanto, que a retroatividade é a regra e que a modulação de efeitos é a exceção. Nesse sentido, leciona Teresa Arruda Alvim: 

Importante consignar, todavia, que a utilização indevida da modulação, transformando-a em regra, quando, na verdade, é exceção, pode ensejar mais insegurança jurídica e estimular a edição de leis inconstitucionais. A excepcionalidade desse instituto exige fundamentação qualificada. Trata-se de instituto que deve ser excepcionalmente usado, tanto no ambiente do controle concentrado, quanto no da alteração de precedentes/jurisprudência firme, sendo este último o objeto principal deste estudo. À época de sua concepção, foi visto como algo tão excepcional que o quórum para modular era (é) maior do que o exigido para a própria declaração de inconstitucionalidade. (ALVIM, Teresa Arruda. Modulação: na alteração da jurisprudência firme ou de precedentes vinculantes. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. p. 27). 

15) Diante desse cenário, é correto afirmar que as interpretações subsequentes da modulação de efeitos devem ser restritivas, a fim de que não haja inadequado acréscimo de conteúdo exatamente aquilo que o intérprete autêntico pretendeu, em caráter excepcional, proteger e salvaguardar. 

16) Estabelecidas essas premissas, é preciso examinar o acórdão do Supremo Tribunal que deu origem à tese fixada no tema 809, especificamente no que tange à modulação de efeitos: 

Por fim, não se pode esquecer que o tema possui enorme repercussão na sociedade, em virtude da multiplicidade de sucessões de companheiros ocorridas desde o advento do CC/2002. Levando-se em consideração o fato de que as partilhas judiciais e extrajudiciais que versam sobre as referidas sucessões encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento (muitas já finalizadas sob as regras antigas), entendo ser recomendável modular os efeitos da aplicação do entendimento ora afirmado. Assim, com o intuito de reduzir a insegurança jurídica, a solução ora alcançada deve ser aplicada apenas aos processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública. 

17) Como se percebe, a preocupação do Supremo Tribunal Federal é tutelar a confiança e conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas (isto é, nas ações de inventário concluídas nas quais foi aplicado o art. 1.790 do CC/2002), razão pela qual se fixou a tese de que a declaração de inconstitucionalidade somente deverá alcançar os processos judiciais em que não houve trânsito em julgado da sentença de partilha. 

18) É incontroverso que, na hipótese, ainda não houve trânsito em julgado da sentença de partilha, mas, ao revés, somente a prolação de decisões que versaram sobre a concorrência hereditária sobre um bem específico. 

19) Considerando ser incontroverso que a inconstitucionalidade é uma questão de ordem pública, conclui-se que era lícito ao juízo do inventário, que havia deliberado, em anteriores decisões, pela exclusão da recorrida da sucessão hereditária em virtude da regra do art. 1.790 do CC/2002, rever seu posicionamento, incluindo-a na sucessão, antes da prolação da sentença de partilha, em virtude do reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo legal pelo Supremo Tribunal Federal. 

20) Isso porque, desde a reforma promovida pela Lei 11.232/2005, a declaração superveniente de inconstitucionalidade de lei pelo Supremo Tribunal Federal torna inexigível o título que nela se funda, tratando-se de matéria suscetível de arguição em impugnação ao cumprimento de sentença – ou seja, após o trânsito em julgado da sentença (art. 475, II e §1º, do CPC/73) –, motivo pelo qual, com muito mais razão, deverá o juiz deixar de aplicar a lei inconstitucional antes da sentença de partilha, marco temporal eleito pelo Supremo Tribunal Federal para modular os efeitos da tese fixada no julgamento do tema 809. 

21) Assim, aplica-se à hipótese, por analogia, o recente entendimento desta Corte, que, também interpretando o tema 809/STF, concluiu que “a inexistência jurídica da sentença pode ser declarada em ação autônoma (querela nullitatis insanabilis) e também no próprio processo em que proferida, na fase de cumprimento de sentença ou até antes dela, se possível, especialmente na hipótese em que a matéria foi previamente submetida ao crivo do contraditório e não havia a necessidade de dilação probatória”. (REsp 1.857.852/SP, 3ª Turma, DJe 22/03/2021). 

CONCLUSÃO. 

22) Forte nessas razões, CONHEÇO e NEGO PROVIMENTO ao recurso especial. 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Terceira Turma, por unanimidade, conheceu e negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente), Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

17 de agosto de 2021

Inconstitucionalidade da distinção de regimes sucessórios alcança decisão anterior que prejudicou companheira

 Ao analisar a modulação dos efeitos do Tema 809 da repercussão geral, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que a tese fixada pelo Supremo Tr​ibunal Federal (STF) se aplica às ações de inventário em que ainda não foi proferida a sentença de partilha, mesmo que tenha havido, no curso do processo, decisão que excluiu companheiro da sucessão.

No precedente do STF, foi declarada a inconstitucionalidade da distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, prevista no artigo 1.790 do Código Civil de 2002. Entretanto, o STF modulou os efeitos da decisão para aplicá-la "aos processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública".

Herdeiros questionaram no STJ a decisão do juízo do inventário que incluiu a companheira de seu falecido pai na partilha de um imóvel comprado por ele antes da união estável, pois ela já havia sido excluída da divisão desse bem, com base no artigo 1.790 do CC/2002, em decisão anterior ao julgamento do STF.

A decisão do juízo do inventário foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, segundo o qual, com a declaração de inconstitucionalidade do artigo 1.790 pelo STF, deveria ser aplicado ao caso o artigo 1.829, inciso I, do Código Civil, admitindo-se a companheira como herdeira concorrente na sucessão, inclusive em relação ao imóvel submetido à partilha.

Para os herdeiros, as decisões que, antes do precedente do STF, aplicaram o artigo 1.790 do CC/2002 e excluíram o imóvel da concorrência hereditária, estariam acobertadas pela imutabilidade decorrente da preclusão e da coisa julgada formal, motivo pelo qual não poderiam ser alcançadas pela superveniente declaração de inconstitucionalidade.

Modulação de efeitos tem interpretação restritiva

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade e, como regra, a declaração da sua inconstitucionalidade produz efeitos ex tunc (retroativos). Contudo, ela lembrou que, excepcionalmente – por razões como a proteção à boa-fé, tutela da confiança e previsibilidade –, pode ser conferida eficácia prospectiva (efeito ex nunc) às decisões que declaram a inconstitucionalidade de lei.

"As interpretações subsequentes da modulação de efeitos devem ser restritivas, a fim de que não haja inadequado acréscimo de conteúdo exatamente sobre aquilo que o intérprete autêntico pretendeu, em caráter excepcional, proteger e salvaguardar", ressaltou.

Segundo Nancy Andrighi, a preocupação do STF, ao modular os efeitos de sua decisão no Tema 809, foi a de tutelar a confiança e conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas – isto é, nas ações de inventário concluídas em que foi aplicado o artigo 1.790 do CC/2002.

Sentença baseada em lei inconstitucional é inexigível

No caso em análise, a ministra verificou que não houve trânsito em julgado da sentença de partilha, mas somente a prolação de decisões sobre a concorrência hereditária de um bem específico.

Para a magistrada, foi lícito ao juízo do inventário rever a decisão que havia excluído a companheira do falecido da sucessão hereditária com base no artigo 1.790 do CC/2002, incluindo-a na sucessão antes da prolação da sentença de partilha, em virtude do reconhecimento da inconstitucionalidade do dispositivo legal pelo STF.

A relatora lembrou que, desde a reforma promovida pela Lei 11.232/2005, a declaração superveniente de inconstitucionalidade de uma lei pelo STF torna inexigível a sentença baseada nela – matéria suscetível de ser arguida na impugnação ao cumprimento de sentença, ou seja, após o trânsito em julgado. Por esse motivo, o juízo deve deixar de aplicar a lei inconstitucional antes da sentença de partilha, marco temporal eleito pelo STF para modular os efeitos da tese fixada no julgamento do Tema 809.

Leia o acórdão no REsp 1.904.374.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1904374

14 de abril de 2021

Quem vive em união estável pode receber pensão por morte?

 Atualmente é normal encontrarmos cada vez menos pessoas se casando e registrando a união, no entanto, acabamos vendo um grande número de pessoas morando umas com as outras. Quando um casal tende a se unir, este mesmo pode se configurar como união estável, afins de conhecimento a união estável se trata por uma entidade familiar formada por duas ou mais pessoas que convivem de for pública, contínua e duradoura e com o objetivo de constituição de uma família.

Não há na lei a exigência de um tempo mínimo para configuração da união estável, desde que se verifiquem todos os requisitos acima. Possui proteção do Estado, assim como o casamento, conforme especificado no artigo 226, § 3º.

Deve haver ainda os elementos constantes no casamento, no que se refere à relação entre os conviventes:

  • Honorabilidade;
  • Fidelidade;
  • Lealdade.
  • Distingue-se a união estável da mera união carnal, transitória, moralmente reprovável, como o adultério ou incesto (concubinato).

No entanto, quando o casal tem a união estável sem a formalização como é o casamento, grande parte dos cidadãos ficam na dúvida quanto ao direito de benefícios de seu par, como é o caso da pensão por morte. Através desse texto, buscamos, geralmente definir preceitos e responder questionamentos, de modo a auxiliar os companheiros na compreensão do direito ao recebimento do benefício.

Pensão por Morte para quem vive em União estável

A pensão por morte trata-se de um benefício previdenciário que no Regime Geral da Previdência Social (RGPS) é pago pelo INSS aos dependentes do segurado que veio a óbito, ou teve sua morte declarada pela justiça.

Para quem vive em união estável é sim, possível o recebimento da pensão por morte. Essa possibilidade é prevista na Lei n.º 8213/91, que dispõe que a companheira ou companheiro que vivam em união estável possuem direito à pensão por morte deixada pelo (a) falecido (a).

Ainda, o companheiro sobrevivente tem preferência no recebimento do benefício previdenciário em relação aos pais e irmãos do falecido. Essa preferência significa que a existência de companheiro ou companheira de segurado falecido exclui os parentes citados acima.

Já no que se refere aos filhos, estes possuem igual direito à pensão, sendo assim, quando há companheiro e filhos, cada um receberá sua porcentagem devida.

Como comprovar união estável para receber a pensão por morte?

A união estável pode ser comprovada através de prova testemunhal e documentação como, por exemplo?

  • Certidão de nascimento de filho comum
  • Certidão de casamento religiosos
  • Fotos
  • Conta bancária conjunta
  • Comprovante de endereço com mesmo domicílio
  • Cartões de crédito
  • Plano de saúde
  • Comprovante de pagamento de contas mensais pelo segurado

Dentre várias outras comprovações que podem ser utilizada, em vias de regra, não se admite prova exclusivamente testemunhal, exigindo-se início de prova material produzida em 24 meses anteriores à data de falecimento do segurado.

Qual prazo para solicitar a pensão por morte?

De acordo com a legislação vigente, não existe um prazo específico para que seja solicitada o benefício. Desde que preenchidos os requisitos pelo dependente, o direito não é perdido, no entanto, no momento de solicitar o mesmo é necessário fixar a data a partir do qual o dependente começará a receber o benefício.

Por quanto tempo posso receber a pensão?

A duração do benefício é de quatro meses se o óbito ocorrer sem que o falecido tenha realizado 18 contribuições, ou ainda se a união estável tiver se iniciado a menos de dois anos.

Caso o segurado tenha falecido após cumprir às 18 contribuições e também os dois anos de início da união estável, a duração do benefício dependerá da idade do companheiro na data do falecimento, confira:

⁣Idade do dependente x Duração do benefício com regra valida até 31 de dezembro de 2020

Idade do dependente x Duração do benefício com regra valida após 1º de janeiro de 2021

Por fim, vale lembrar que são exigidos três requisitos básicos para você ter acesso ao benefício de Pensão por Morte, sendo eles:

  1. Comprovar o óbito ou morte presumida do segurado;
  2. Demonstrar a qualidade de segurado do falecido na hora de seu falecimento;
  3. Ter qualidade de dependente do segurado falecido.

Por Jornal Contábil
Fonte: www.jornalcontabil.com.br

Publicado in direitonews.com.br

13 de abril de 2021

TJ-TO reconhece que união estável foi apenas namoro qualificado

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins – TJTO reconheceu que o período de união estável concedido em juízo de primeiro grau, correspondera, na verdade, a um namoro. Decisão confirmou a tese do recorrente: a existência de namoro qualificado.

O Tribunal reformou a sentença para adequar a partilha de bens quanto ao período de duração da união estável, que teria se estendido de janeiro de 2014 a novembro de 2015. No período compreendido entre 2008 e 2013, a relação entre as partes seria apenas de um namoro.

Em análise dos autos, o relator determinou que a prova produzida é incapaz de comprovar  o marco inicial da união estável como em 2008. “A documentação juntada ao feito, analisada em cotejo com a prova oral produzida, não se revela coesa e segura a comprovar que o relacionamento amoroso, com contornos típicos da união estável, tenha se iniciado no ano do nascimento da filha menor do ex- casal.”

Conforme o voto do magistrado, para fins de comprovação de união estável deve ser observada a efetiva definição do casal pela comunhão de vida como se casados fossem.  Sendo assim “o fato de o réu, sobretudo após o encerramento da obra na cidade, voltar à localidade, seja com o intuito de se encontrar amorosamente com a primeira apelante, seja para visitar a filha, não indica contornos de continuidade, duração e reconhecimento público de constituição de família (artigo 1.723, Código Civil de 2002).”

“É indispensável ressaltar, inclusive, que a própria autora, em audiência de Instrução e Julgamento, afirma, de forma clara, que o namoro teria iniciado em maio de 2007. Registro, ademais, que a magistrada chega a frisar a expressão ‘a namorar’, como se extrai do áudio juntado ao feito de origem”, pontuou.

O relator concluiu que a decisão de formação de família somente se deu em meados de fevereiro de 2013, quando, em comunhão de vontades, as partes optaram por coabitar, a fim de criarem juntos a filha em outro país. Deste modo, votou por conhecer e dar parcial provimento ao apelo, para estabelecer o período da união estável havida entre as partes e determinar a partilha dos bens e dívidas amealhadas neste lapso.

Progressismo

Para a advogada Alessandra Muniz, presidente do IBDFAM-TO, a decisão progressista coloca o Tribunal no patamar de um início de decisões “que não pregam somente o direito positivado, mas também a evolução da sociedade que não consegue acompanhar as leis, tendo os magistrados que se debruçarem em seus votos com um olhar mais acurado e humanista.”

“A união estável e seus requisitos estão positivados no artigo 1.723 do Código Civil de 2002. Ter uma convivência pública, contínua e duradoura, com o ânimo de constituir família é união estável. O namoro qualificado não está contemplado em lei, porém, jurisprudencialmente, vem tendo seu reconhecimento”, explica a especialista.

Segundo ela, é muito “sui generis” a diferença entre ambos: “o namoro, atualmente, contempla os mesmos requisitos do artigo citado, e a diferenciação se dá no animus de constituição familiar. Enquanto na união estável esse ânimo é imediato, no namoro qualificado é mediato. Mas vejamos que é muito sutil e subjetivo o ânimo de constituir uma família. Daí, um olhar mais acurado dos magistrados para decretarem um ou outro, analisando sempre cada caso concreto.”

A advogada frisa que, sendo namoro, não há que se falar em partilha de bens, pois não gera efeitos patrimoniais. Ao contrário da união estável, modalidade na qual, quando não estabelecido o regime de bens, vigora o da comunhão parcial, estabelecendo, portanto, efeitos para partilha no percentual de 50% para cada ex-convivente.

Contrato de namoro

A presidente do IBDFAM-TO destaca que, com a pandemia, muitos casais de namorados resolveram morar na mesma casa e partilharem despesas. Neste cenário, ela adverte: “caso não queira o casal constituir família imediatamente e que essa união não gere efeitos patrimoniais, o mais correto seria procurar um advogado e terem um contrato de namoro assinado. Mas, cuidado! Ter contrato de namoro que não se renova, pode sim virar união estável.”

De acordo com ela, o animus de constituir família é uma linha tênue. Deste modo, é preciso analisar cada caso concreto e as provas inseridas nos autos para chegar a um denominador comum.

Alessandra finaliza com uma homenagem ao jurista Zeno Veloso, diretor nacional e cofundador do IBDFAM, que morreu em 18 de março, vítima da Covid-19:

“E por último, e mais importante, a voz do Mestre Zeno Veloso ressoa nos vários tribunais do Brasil. É com ele que termino essa breve explanação sobre namoro qualificado. Ao Mestre com carinho:

Nem sempre é fácil distinguir essa situação – a união estável – de outra, o namoro, que também se apresenta informalmente no meio social. Numa feição moderna, aberta, liberal, especialmente se entre pessoas adultas, maduras, que já vêm de relacionamentos anteriores (alguns bem-sucedidos, outros nem tanto), eventualmente com filhos dessas uniões pretéritas, o namoro implica, igualmente, convivência íntima – inclusive, sexual –, os namorados coabitam, frequentam as respectivas casas, comparecem a eventos sociais, viajam juntos, demonstram para os de seu meio social ou profissional que entre os dois há uma afetividade, um relacionamento amoroso. E quanto a esses aspectos, ou elementos externos, objetivos, a situação pode se assemelhar – e muito – a uma união estável. Parece, mas não é! Pois falta um elemento imprescindível da entidade familiar, o elemento interior, anímico, subjetivo: ainda que o relacionamento seja prolongado, consolidado, e por isso tem sido chamado de ‘namoro qualificado’, os namorados, por mais profundo que seja o envolvimento deles, não desejam e não querem – ou ainda não querem – constituir uma família, estabelecer uma entidade familiar, conviver numa comunhão de vida, no nível do que os antigos chamavam de “affectio maritalis”. Ao contrário da união estável, tratando-se de namoro – mesmo do tal namoro qualificado –, não há direitos e deveres jurídicos, mormente de ordem patrimonial entre os namorados. Não há, então, que falar-se de regime de bens, alimentos, pensão, partilhas, direitos sucessórios, por exemplo (VELOSO, Zeno. Direito Civil: temas. Belém: ANOREGPA, 2018. p. 313)

Com informações da assessoria do IBDFam.