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12 de abril de 2021

POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL; TRANSAÇÃO PENAL; REJEIÇÃO DA HOMOLOGAÇÃO; DECISÃO CASSADA; RETORNO DOS AUTOS AO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL

PRIMEIRA TURMA RECURSAL CRIMINAL PROCESSO Nº 0030968-62.2020.8.19.0210 RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO RECORRIDO: GLEISON RIBEIRO DOS SANTOS APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE DE DROGA PARA CONSUMO PRÓPRIO.REJEIÇÃO DA HOMOLOGAÇÃO DE TRANSAÇÃO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO . CONHECIMENTO E PROVIMENTO RELATÓRIO Trata-se de recurso interposto pelo Ministério Público da decisão da juíza a quo , que entendeu atípica a conduta do art. 28 da lei nº 11.343/06 e deixou de homologar a transação penal consistente em medida de advertência , com fundamento no Enunciado nº 73 do FONAJE. Alega o Ministério Público que o juízo a quo incorreu em error in procedendo, a ensejar a nulidade do feito, na medida em que sequer foi designada audiência preliminar ou ofertada formalmente ao Autor do fato a transação penal, consistente na aplicação de medida de advertência sobre os malefícios do uso de drogas. Que apenas se cogita da homologação (ou não) da transação penal depois de aceita pelo Autor do fato, o que não ocorreu no caso em tela , eis que sequer foi designada audiência preliminar tendo, portanto, o decisum incorrido em error e tumulto processual. Que a decisão impugnada importa em verdadeiro HC de ofício por parte da magistrada, obstaculizando o regular exercício da Ação Penal, ainda de forma anômala. Que a conduta é típica e a transação penal versa tão somente em torno da admoestação verbal prevista no preceito secundário do art. 28 da Lei de Drogas. Acrescenta o Ministério Público em suas razões que a magistrada avançou artificiosamente em verdadeiro controle abstrato, analisando a lei em tese, que é vedado ao juízo comum no exercício do controle difuso da constitucionalidade. Que a saúde pública, bem jurídico tutelado pela norma, traduz o interesse do Estado em manter o bem-estar físico, sanitário e mental da população em níveis satisfatórios, ameaçados pela difusão/disseminação de entorpecentes na sociedade. Nesse diapasão, procurou o legislador coibir a posse de material entorpecente para evitar o risco da sua possível oferta a terceiros. Apresenta ainda em suas razões, para fins de PREQUESTIONAMENTO do presente recurso, que sejam as presentes alegações expressamente apreciadas pela Turma Recursal à luz da CF , no que concerne à contrariedade do decisum em relação a Princípios Constitucionais como a da Segurança Jurídica, da Presunção de Constitucionalidade das Leis ( art. 5º § 1º da CF ) e da Separação dos Poderes ( art. 2º da CF) , monopólio do STF para controle abstrato de constitucionalidade ( art. 102, inc. I da CF ). O Apelado apresentou contrarrazões às fls. 62/73, argumentando que o art. 28 da lei nº 11.343/43 é norma penal em branco, cujo complemento se encontra na Portaria da Agência Nacional da Vigilância Sanitária. E, que a citada portaria não obedeceu ao processo legislativo exigido para a criação de uma lei, mas somente as normas procedimentais para a criação de uma Portaria, o que fere o princípio da legalidade. Sustenta de igual forma a aplicação dos princípios da intervenção mínima do Direito Penal e da ofensividade (art. 5º XV e 98, inc. I da CF. Acrescenta a Defensoria Pública que uma pequena quantidade de substância tida como droga não tem potencial lesivo contra saúde pública, citando a decisão no HC 110.475. Requer por derradeiro, a manutenção da r. decisão impugnada, requerendo a expressa discussão e decisão deste colegiado acerca do disposto no art. 5º, inc. X da CF, e demais temas constitucionais posto na presente, para fins de prequestionamento. O Defensor Público em exercício junto a Turma Recursal manifestou às fls. 83, ratificando a tese de inconstitucionalidade do tipo penal por ofensa ao direito de intimidade e vida privada (art. 5º, X da CF). O Promotor de Justiça em atuação junto a esta Turma, manifestou-se às fls. 85, ratificando as contrarrazões apresentadas. VOTO Trata-se de Apelação interposta pelo Ministério Público onde objetiva a modificação da r. sentença que deixou de homologar a transação com advertência e declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 28 da lei nº 11.343/06. Conheço do presente recurso, eis que presentes os requisitos de admissibilidade. No mérito, assiste razão ao Ministério Público. A tese de que o usuário de drogas só prejudica a Ele mesmo não deve prevalecer, eis que lamentavelmente, as drogas têm efeito nocivo à saúde do indivíduo, o que reverbera inclusive no sistema único de saúde, sendo certo ainda que a proporção tomada pela atividade criminosa, afeta diretamente a segurança pública. Significa dizer, portanto, que o bem jurídico tutelado pela lei de drogas não é a vida privada ou a intimidade, de modo que sua aplicação não pode ser afastada. Quanto a inconstitucionalidade alegada na r. sentença, importante colocar a excelente argumentação do colega de Turma Recursal, Dr. Marcelo Oliveira da Silva, em caso semelhante. "Não se desconhece a possibilidade de se realizar o controle de constitucionalidade pelo meio difuso em qualquer grau de jurisdição, seja por órgão colegiado ou mesmo em julgamento monocrático e singular, porém, há grande discussão quanto a sua aplicabilidade, notadamente no fenômeno da "judicialização da política" em que o parlamento deixa de legislar certos temas controvertidos e desinteressantes politicamente, relegando ao judiciário operar as mudanças legais ante os anseios da sociedade. Esse ativismo judicial deve ser visto com bastante cautela, tendo em vista que pode gerar uma verdadeira invasão do Poder Judiciário nas competências constitucionais do Poder Legislativo, levando o magistrado a agir como "legislador positivo" e não apenas na função de "legislador negativo" - situação aceita doutrinariamente quando o órgão julgador suprime a vigência da norma do sistema ou afasta possíveis interpretações a fim de conformá-la às normas constitucionais. A matéria encontra-se em análise perante o Supremo Tribunal Federal, ainda, sem prolação definitiva acerca da (in)constitucionalidade do presente tipo penal, assim, o mandamento penal proibitivo possui plena vigência, não sendo possível afastar a sua aplicação, por não ter se operado a "abolitio criminis" no que se refere a conduta imputado à recorrente. Destaca-se que a controvérsia está sendo debatida por intermédio de controle concreto de constitucionalidade nos autos do Recurso Especial nº 635359, fato que traz mais um problema sistêmico, visto que, em caso de declaração de inconstitucionalidade da norma, haveria a necessidade de o Senado suspender a execução da mesma por intermédio de ato normativo conforme disposto no art. 52, inciso X, da Constituição Federal, a semelhança do que foi realizado no art. 33, § 4° da Lei de Drogas, no tocante à vedação de conversão das penas corporais em restritivas de direitos, operada pela Resolução n° 5, de 2012, quando da declaração de inconstitucionalidade por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal nos autos do Habeas Corpus nº 97.256/RS. Ademais, ao se adentrar na análise da tipificação do delito, o crime perpetrado não se exaure apenas na esfera particular da agente, na medida em que o objeto jurídico protegido é a saúde pública, atingindo toda a coletividade, por possuir potencialidade ofensiva no seio social. Não há, portanto, ofensa aos princípios da Inviolabilidade à Vida Privada e à intimidade com o seu reconhecimento, notadamente porque a apelante trazia consigo - maconha, substância capaz de causar dependência psíquica, sendo cediço que o direito à intimidade não pode ser oponível ao interesse coletivo em proteger a saúde pública, que é o bem jurídico tutelado pela norma em questão. Além disso, o delito é de perigo abstrato ou presumido, sendo desnecessária a efetiva lesão à acusada para sua caracterização. A conduta em si do agente com a aquisição do entorpecente, ao portá-lo para uso próprio, encerra a presunção de perigo, pois, realimenta o comércio ilícito de drogas, restando caracterizada a periculosidade do suposto autor do fato, ora apelantes. Da mesma forma, não se aplica o princípio da insignificância para os crimes de porte ilegal para uso pessoal de entorpecentes, vez que referendar tal conduta seria extremamente danoso para toda a sociedade, já que a prática desse tipo de crime deixa notórias sequelas antissociais, posto que o usuário de drogas fomenta a prática de outros crimes de maior gravidade tais como: tráfico de entorpecentes, roubos, latrocínios, corrupção, disputas entre quadrilhas e assassinatos. Desta feita, as alegações defensivas narradas em contrarrazões acerca da aplicação do princípio da Insignificância neste tipo de delito deve ser refutada, vez que a jurisprudência majoritária do STF já se posicionou contrariamente à aplicação deste princípio em crimes relacionados à Lei de Drogas, ante sua lesividade e afronta aos objetivos visados, quais sejam: prevenção do uso indevido de drogas e reinserção social dos apenados, conforme os diversos arestos colacionados pela douta promotoria às fls. 65/69, entre os quais convém transcrever: HC102940 /ES - ESPÍRITO SANTO HABEAS CORPUS Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI Julgamento: 15/02/2011 Órgão Julgador: Primeira Turma EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 28 DA LEI 11.343/2006. PORTE ILEGAL DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. ÍNFIMA QUANTIDADE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PERICULOSIDADE SOCIAL DA AÇÃO. EXISTÊNCIA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO OU PRESUMIDO. PRECEDENTES. WRIT PREJUDICADO. I - Com o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal, não mais subsiste o alegado constrangimento ilegal suportado pelo paciente. II - A aplicação do princípio da insignificância de modo a tornar a conduta atípica exige sejam preenchidos, de forma concomitante, os seguintes requisitos: (i) mínima ofensividade da conduta do agente; (ii) nenhuma periculosidade social da ação; (iii) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e (iv) relativa inexpressividade da lesão jurídica. III - No caso sob exame, não há falar em ausência de periculosidade social da ação, uma vez que o delito de porte de entorpecente é crime de perigo presumido. IV - É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não se aplica o princípio da insignificância aos delitos relacionados a entorpecentes. V - A Lei 11.343/2006, no que se refere ao usuário, optou por abrandar as penas e impor medidas de caráter educativo, tendo em vista os objetivos visados, quais sejam: a prevenção do uso indevido de drogas, a atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas. VI - Nesse contexto, mesmo que se trate de porte de quantidade ínfima de droga, convém que se reconheça a tipicidade material do delito para o fim de reeducar o usuário e evitar o incremento do uso indevido de substância entorpecente. VII - Habeas corpus prejudicado. Por tudo dito, deve-se reconhecer que o fato atribuído à recorrente é típico, ilícito e culpável não se admitindo o argumento de que a fato seria atípico alicerçado no princípio da insignificância. " Por derradeiro, como acima fundamentado não há qualquer violação do art. 28 da lei de drogas aos artigos artigos 1º e 5º , X, LIV, XLVI e § 2º da Constituição Federal. Ante o exposto, considerando as razões tecidas, VOTO pelo conhecimento do recurso, dado o preenchimento de seus requisitos de admissibilidade, e PROVIMENTO para cassar a decisão de rejeição da denúncia e determinar que os autos sejam restituídos ao Juízo de origem para o seu regular prosseguimento. MARIA DO CARMO ALVIM PADILHA GERK JUÍZA RELATORA



0030968-62.2020.8.19.0210 - APELAÇÃO CRIMINAL

CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CRIMINAIS

Juiz(a) MARIA DO CARMO ALVIM PADILHA GERK - Julg: 02/02/2021 - Data de Publicação: 11/02/2021