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2 de maio de 2021

AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO PROCEDIMENTO COMUM. POSSIBILIDADE. PRETENSÃO QUE SE EXAURE NA APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS APONTADOS. INTERESSE E ADEQUAÇÃO PROCESSUAIS. VERIFICAÇÃO. AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO PROCEDIMENTO COMUM E PRODUÇÃO DE PROVA ANTECIPADA. COEXISTÊNCIA

RECURSO ESPECIAL Nº 1.803.251 - SC (2018/0235823-3) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO PROCEDIMENTO COMUM. POSSIBILIDADE. PRETENSÃO QUE SE EXAURE NA APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS APONTADOS. INTERESSE E ADEQUAÇÃO PROCESSUAIS. VERIFICAÇÃO. AÇÃO AUTÔNOMA DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS PELO PROCEDIMENTO COMUM E PRODUÇÃO DE PROVA ANTECIPADA. COEXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 

1. A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em saber se, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, é possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum (arts. 318 e seguintes), ou, como compreenderam as instâncias ordinárias, a referida ação deve se sujeitar, necessariamente, para efeito de adequação e interesse processual, ao disposto em relação ao "procedimento" da "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes). 

2. A partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, que não reproduziu, em seu teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no diploma processual de 1973, adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário, seguido da prolação de decisões díspares nas instâncias ordinárias, quanto à subsistência da ação autônoma de exibição de documentos, de natureza satisfativa (e eventualmente preparatória), sobretudo diante dos novos institutos processuais que instrumentalizam o direito material à prova, entre eles, no que importa à discussão em análise, a "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e a "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes). 

3. O Código de Processo Civil de 2015 buscou reproduzir, em seus termos, compreensão há muito difundida entre os processualistas de que a prova, na verdade, tem como destinatário imediato não apenas o juiz, mas também, diretamente, as partes envolvidas no litígio. Nesse contexto, reconhecida a existência de um direito material à prova, autônomo em si — que não se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar, tampouco com as consequências jurídicas daí advindas a subsidiar (ou não) outra pretensão —, a lei adjetiva civil estabelece instrumentos processuais para o seu exercício, o qual pode se dar incidentalmente, no bojo de um processo já instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação probatória lato sensu). 

4. Para além das situações que revelem urgência e risco à prova, a pretensão posta na ação probatória autônoma pode, eventualmente, se exaurir na produção antecipada de determinada prova (meio de produção de prova) ou na apresentação/exibição de determinado documento ou coisa (meio de prova ou meio de obtenção de prova — caráter híbrido), a permitir que a parte demandante, diante da prova produzida ou do documento ou coisa apresentada, avalie sobre a existência de um direito passível de tutela e, segundo um juízo de conveniência, promova ou não a correlata ação. 

4.1 Com vistas ao exercício do direito material à prova, consistente na produção antecipada de determinada prova, o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu a possibilidade de se promover ação probatória autônoma, com as finalidades devidamente especificadas no art. 381. 

4.2 Revela-se possível, ainda, que o direito material à prova consista não propriamente na produção antecipada de provas, mas no direito de exigir, em razão de lei ou de contrato, a exibição de documento ou coisa — já existente/já produzida — que se encontre na posse Documento: 1849154 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 08/11/2019 Página 1 de 6 Superior Tribunal de Justiça de outrem. 

4.2.1 Para essa situação, afigura-se absolutamente viável — e tecnicamente mais adequado — o manejo de ação probatória autônoma de exibição de documento ou coisa, que, na falta de regramento específico, há de observar o procedimento comum, nos termos do art. 318 do novo Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente. 

4.2.2 Também aqui não se exige o requisito da urgência, tampouco o caráter preparatório a uma ação dita principal, possuindo caráter exclusivamente satisfativo, tal como a jurisprudência e a doutrina nacional há muito reconheciam na postulação de tal ação sob a égide do CPC/1973. A pretensão, como assinalado, exaure-se na apresentação do documento ou coisa, sem nenhuma vinculação, ao menos imediata, com um dito pedido principal, não havendo se falar, por isso, em presunção de veracidade na hipótese de não exibição, preservada, contudo, a possibilidade de adoção de medidas coercitivas pelo juiz. 

5. Reconhece-se, assim, que a ação de exibição de documentos subjacente, promovida pelo rito comum, denota, por parte do demandante, a existência de interesse de agir, inclusive sob a vertente adequação e utilidade da via eleita. 

6. Registre-se que o cabimento da ação de exibição de documentos não impede o ajuizamento de ação de produção de antecipação de provas. 

7. Recurso especial provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencidos os Srs. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Boas Cueva. Votaram com o Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze os Srs. Ministros Moura Ribeiro e Nancy Andrighi. 

Brasília, 22 de outubro de 2019 (data do julgamento)


RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: 

Lucas Lima dos Santos interpõe recurso especial, fundado na alínea a do permissivo constitucional, em contrariedade ao aresto prolatado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. 

Subjaz ao presente recurso especial ação de exibição de documentos promovida, em outubro de 2016, por Lucas Lima dos Santos contra Banco do Brasil S.A., tendo por finalidade condenar o banco requerido a exibir o contrato de abertura de conta n. 7.594-9 (Agência n. 5390-2), bem como extrato de movimentação dos últimos 5 (cinco) anos da referida conta, além de outros documentos relacionados à relação jurídica em pauta, que estejam em seu poder (e-STJ, fls. 1-9). 

A esse propósito, afirmou a parte autora que a exibição destina-se a "averiguar se houve ou não cobranças indevidas ou excessiva" (e-STJ, fl. 2), tendo, anteriormente, envidado notificação extrajudicial à instituição financeira para a apresentação da aludida documentação, sem, todavia, obter êxito, não lhe restando outra saída senão socorrer-se do Judiciário. 

Especificamente sobre o cabimento da presente ação, o demandante consignou que "no caso em apreço é cabível a ação de exibição de documento de forma autônoma, uma vez que o objetivo único e exclusivo da mesma é a obtenção de documento que está em poder da requerida, ou seja, a causa de pedir da ação de exibição limita-se tão somente ao acesso do documento postulado, tendo a mesma caráter plenamento satisfativo" (e-STJ, fl. 2). 

Sustentou, outrossim, que "a presente demanda encontra respaldo legal no art. 396 [e seguintes], do novo Código de Processo Civil o qual dispõe que o 'o juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder'" (e-STJ, fl. 4). 

O juízo a quo reputou necessária a emenda da inicial (e-STJ, fls. 18-24), sob o fundamento de que os arts. 396 e seguintes do CPC/2015, os quais fundamentam a presente ação, referem-se à exibição incidental de documentos, sem aplicação, portanto, à ação que tem como única pretensão a exibição de documento ou coisa. Compreendeu, assim, que, "na legislação processual em vigor — Lei n. 13.105/2015 —, a antiga ação cautelar de exibição vem disciplinada nos artigos 381 e seguintes como a ação autônoma de produção antecipada de provas" (e-STJ, fl. 19), razão pela qual o "requerente deve fazer as adequações que entender pertinentes ao prosseguimento da ação de produção antecipada de provas" (e-STJ, fl. 22). 

Ato contínuo, o demandante requereu a reconsideração do despacho que determinou a emenda da inicial para adequação e seguimento como ação de produção antecipada de provas, a fim de que a presente ação siga, tal como postulada, como ação autônoma de exibição de documentos (arts. 396 a 404 do CPC/2015), sob o procedimento comum (art. 318 do CPC/2015), na esfera da obrigação de fazer (e-STJ, fls. 27-39). 

Para tanto, argumentou não se afigurar viável, para o caso em apreço, transmutar a pretensão de exibição de documento em ação de produção antecipada de provas, uma vez que não se trata aqui de produção/elaboração de prova perecível, mas sim a simples apresentação de um documento já existente em posse da instituição financeira, em que se objetiva apenas a sua exibição. Sustentou, ainda, que, nos termos do § 2º do art. 382 do CPC/2015, no procedimento de produção antecipada de provas, "o juiz não poderá se manifestar sobre a inocorrência do fato, nem sobre respectivas consequências jurídicas", a ensejar a descabida conclusão de que, "no caso de inércia da parte requerida na apresentação da documentação quando solicitada, nada poderá ser feito para forçar a exibição" (e-STJ, fl. 29). 

O Juízo de primeira instância entendeu por bem indeferir a petição inicial (art. 321, CPC/2015) e, por consequência, extinguir o processo sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, I, do CPC/2015. 

Irresignado, o demandante interpôs recurso de apelação, ao qual o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina conferiu parcial provimento, apenas para deferir o benefício da gratuidade de justiça, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 124): 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. SENTENÇA QUE INDEFERIU A INICIAL. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. MÉRITO. AÇÃO AJUIZADA SOB A ÉGIDE DO CPC/15 PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE EXTRATOS E CONTRATO BANCÁRIO. ALEGAÇÃO DE CABIMENTO DO PROCESSAMENTO PELOS ART.396 E SEGUINTES DO CPC. IMPOSSIBILIDADE. VIA PROCESSUAL INADEQUADA. ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E VÍCIO. DESPACHO DE EMENDA À INICIAL, DETERMINANDO A ADEQUAÇÃO AO MEIO PROCESSUAL (PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS). INDEFERIMENTO QUE SE IMPUNHA. ART. 321 DO CPC. JUSTIÇA GRATUITA. CONJUNTO PROBATÓRIO APTO. RENDIMENTOS MENSAIS QUE JUSTIFICAM A CONDIÇÃO HIPOSSUFICIENTE. DEFERIMENTO. ART. 98 DO CPC. Recurso conhecido e parcialmente provido. 

Opostos embargos de declaração (e-STJ, fls. 132-144), estes foram rejeitados (e-STJ, fls. 164-168). 

Nas razões do presente recurso especial, Lucas Lima dos Santos sustenta, em suma, que o acórdão recorrido incorreu em violação dos arts. 318 e 497 do CPC/2015. 

Anota que, ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, a ação de exibição destinada à apresentação de contratos e extratos bancários já assumia nítido caráter de ação de obrigação de fazer, em que a tutela requerida limitava-se a mera obtenção do documento de maneira satisfativa, a despeito de a lei processual inseri-la em capítulo afeto a procedimento preparatório. 

Argumenta que o Código de Processo Civil de 2015, em que pese tenha extinguido o processo cautelar do ordenamento, não impede a utilização de ação autônoma de exibição de documentos, tendo por propósito a apresentação de contratos e extratos bancários (obrigação de fazer), cuja pretensão se exaure em si mesma (natureza satisfativa). 

Defende, no caso, a inaplicabilidade do art. 381, III, do CPC/2015, que trata do procedimento de produção antecipada de prova, pois não se pugna pela "produção" de nenhuma prova, até porque ela já está produzida; "o direito a ser tutelado, deste modo, é o de mera obtenção do documento e não o de produção dele" (e-STJ, fl. 177). 

Sustenta, assim, não ser correta a assertiva de que o CPC/2015 teria substituído a ação de exibição de documento (satisfativa em si e, portanto, autônoma) pela "produção antecipada de prova". 

Pondera que, se a antiga cautelar de exibição de documentos nada tinha de cautelar, porque como antes exposto lhe faltava a urgência (perigo de dano ao direito ou ao próprio processo), não há óbice, então, que, na vigência do CPC/2015, a pretensão de exibição dos documentos bancários possa ser realizada pela via da ação autônoma (procedimento comum art. 318) na esfera de obrigação de fazer (obrigação de fazer art. 497), sendo prescindível a via do rito especial da produção antecipada de prova (e-STJ, fls. 178-179). 

A parte adversa apresentou contrarrazões às fls. 222-229 (e-STJ). 

É o relatório.


VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR): A controvérsia posta no presente recurso especial centra-se em saber se, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, é possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum (arts. 318 e seguintes), ou, como compreenderam as instâncias ordinárias, a referida ação deve se sujeitar, necessariamente, para efeito de adequação e interesse processual, ao disposto em relação ao "procedimento" da "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes). 

Impende registrar, de início, que esta questão, recentemente, foi objeto de enfrentamento pela Quarta Turma do STJ, por ocasião do julgamento do REsp 1.774.987/SP (da relatoria do Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 8/11/2018, DJe 13/11/2018), inexistindo, até o presente momento, deliberação da Terceira Turma sobre a matéria, razão pela qual se reputou oportuno submetê-la a este Colegiado. 

A propósito, consigna-se que a Quarta Turma do STJ, ao enfrentar o tema, compreendeu afigurar-se possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos pelo procedimento comum, nos termos da seguinte ementa: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. AÇÃO AUTÔNOMA. PROCEDIMENTO COMUM. AÇÃO DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA. INTERESSE E ADEQUAÇÃO. 1. Admite-se o ajuizamento de ação autônoma para a exibição de documento, com base nos arts. 381 e 396 e seguintes do CPC, ou até mesmo pelo procedimento comum, previsto nos arts. 318 e seguintes do CPC. Entendimento apoiado nos enunciados n. 119 e 129 da II Jornada de Direito Processual Civil. 2. Recurso especial provido. (REsp 1774987/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 08/11/2018, DJe 13/11/2018) 

A tal conclusão adere esta relatoria integralmente, com o acréscimo de fundamentação a seguir expendida. 

Segundo o entendimento adotado pelo Tribunal de origem — que manteve a extinção do feito, sem julgamento de mérito, ante a inadequação da via eleita (e, por conseguinte, ante a ausência de interesse processual da parte demandante) —, o Código de Processo Civil de 2015 teria substituído a antiga ação cautelar de exibição de documentos, de caráter satisfativo, pela "ação de produção antecipada de provas", regida pelos arts. 381 e seguintes. Assim, a partir da nova sistemática processual, a pretensão de exibir documentos somente poderia ser veiculada, autonomamente, por meio da ação de produção antecipada de provas, ou, incidentalmente, nos termos dos arts. 496 e seguintes. 

Destaca-se, a esse propósito, os fundamentos constantes no acórdão recorrido (e-STJ, fls. 126-128): 

O requerente pediu a exibição de extratos e do contrato bancário, a fim de verificar se havia irregularidades de cobrança de encargos ilegais. [...] Nesse viés, discute-se qual o procedimento adequado para este requerimento, uma vez que há procedimentos com finalidades diferentes. Do novo Código de Processo, se extrai a possibilidade da exibição de documentos por via de Ação de Antecipação de Provas (arts. 381 e ss) ou, ainda, a Exibição de Documento (arts. 396 e ss). Acontece que cada ação apresenta efeitos jurídicos diversos, sendo sua utilização condicionada a um determinado fato jurídico. Por isso, necessário analisar cada ação a fim de verificar qual seria mais apropriada para a presente demanda. O pedido de Tutela Cautelar antecedente se utiliza naqueles casos em que há perigo ao resultado útil da ação, mas não existe o acervo probatório necessário para embasar o pedido principal, que deverá ser interposto no prazo de 30 dias após efetivada a tutela cautelar. Sendo, assim, de caráter dependente, não merece maiores explicações neste momento, visto não condizer com o interesse do autor nesta demanda. Na vigência do Código passado, a Ação Cautelar de Exibição de Documento de ocupava de trazer aos autos o documento almejado, sendo regulada no capítulo de procedimentos especiais. Contudo, com a modificação trazida pela legislação atual, a previsão do procedimento especial se extinguiu, tendo como mesmo destino a interpretação sobre o assunto. Atualmente, a Ação de Antecipação de Provas, a priori, é a que melhor coaduna para substituir a antiga Ação de Exibição de Documentos, por se tratar de ação autônoma e cujo objeto é colher provas antecipadamente, isto é, beneficiar as partes acerca de qualquer meio de prova, justificada pela urgência da colheita de provas; para ensejar a autocomposição; ou tão somente para reconhecimento prévio dos fatos (art. 381, incisos I a III do CPC). Já a Exibição de Documentos possui sua existência pautada na determinação de obrigar a parte adversa a juntar aos autos determinado documento, observando os requisitos do art. 397 do CPC. Assim, sua natureza cautelar foi extinta e posta como meio incidental, retirando a característica autônoma que possuía. [...] Nota-se que a disposição da exibição de documento na legislação anterior tinha duas acepções: era disciplinada como procedimento especial - preparatória - e como incidente no Capítulo das Provas. Enquanto, atualmente, é disciplinado somente como incidente nos arts. 396 e ss., da Seção VI, Capítulo VI - Das Provas. Pela interpretação histórico-sistemática, percebe-se que o legislador optou por retirar da Ação de Exibição de Documentos o caráter preparatório e amplificar as hipóteses de cabimento da ação de produção antecipada de provas, restando à parte a opção de ajuizar esta última somente com o intuito de analisar os documentos almejados. Para o referido caso, o mais adequado, portanto, seria a ação de produção antecipada de provas (com fundamento nos incisos II ou III do art. 381 do CPC), em razão da exibição de documentos se tratar agora de pedido incidental, deixando de apresentar o caráter autônomo que possuía na legislação anterior (sem grifos no original). 

Conforme já adiantado, conquanto a compreensão adotada na origem encontre respaldo em respeitável corrente doutrinária (citada, inclusive, no acórdão recorrido: Teresa Arruda Alvim Wambier, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil artigo por artigo, 2ª edição. Revista dos Tribunais, 2015, p. 756), filio-me à vertente doutrinária, de igual quilate, que reconhece, atenta às particularidades de cada qual, a coexistência harmônica entre a ação autônoma de exibição de documentos pelo rito comum e os "novos" institutos processuais afetos à "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e à "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes). 

Efetivamente, a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, que não reproduziu, em seu teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no diploma processual de 1973, adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário, seguido da prolação de decisões díspares nas instâncias ordinárias, quanto à subsistência da ação autônoma de exibição de documentos, de natureza satisfativa (e eventualmente preparatória), sobretudo diante dos novos institutos processuais que instrumentalizam o direito material à prova, entre eles, no que importa à discussão em análise, a "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e a "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes). 

Relevante, no ponto, consignar que o Código de Processo Civil de 2015 buscou reproduzir, em seus termos, compreensão há muito difundida entre os processualistas de que a prova, na verdade, tem como destinatário imediato não apenas o juiz, mas também, diretamente, as partes envolvidas no litígio. 

Reconhece-se, assim, à parte o direito material à prova, cuja tutela pode se referir tanto ao modo de produção de determinada prova (produção antecipada de prova, prova emprestada e a prova 'fora da terra'), como ao meio de prova propriamente concebido (ata notarial, depoimento pessoal, confissão, exibição de documentos ou coisa, documentos, testemunhas, perícia e inspeção judicial). 

Nesse contexto, reconhecida a existência de um direito material à prova, autônomo em si — que não se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar (objeto da prova), tampouco com as consequências jurídicas daí advindas, podendo (ou não) subsidiar outra pretensão —, a lei adjetiva civil estabelece instrumentos processuais para o seu exercício, que pode se dar incidentalmente, no bojo de um processo já instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação probatória lato sensu). 

Nesse último caso, para além das situações que revelem urgência e risco à prova, a pretensão posta na ação probatória autônoma pode, eventualmente, se exaurir na produção antecipada de determinada prova (meio de produção de prova) ou na apresentação/exibição de determinado documento ou coisa (meio de prova ou meio de obtenção de prova — caráter híbrido), a permitir que a parte demandante, diante da prova produzida ou do documento ou coisa apresentada, avalie sobre a existência de um direito passível de tutela e, segundo um juízo de conveniência, promova ou não a correlata ação. 

Com vistas ao exercício do direito material à prova, consistente na produção antecipada de determinada prova, o Código de Processo Civil de 2015 estabeleceu a possibilidade de se promover ação probatória autônoma, com as finalidades devidamente especificadas no art. 381, in verbis: 

Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que: I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação; II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito; III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação. 

Como anotado, esta ação probatória autônoma não exige, necessariamente, que a produção da prova se apresente em situação de risco, podendo ser utilizada, inclusive, para evitar o ajuizamento de uma futura ação, seja pela constatação, a partir da prova produzida, da ausência de direito passível de tutela, seja para viabilizar a composição entre as partes. 

Afigura-se possível, ainda, que o direito material à prova consista não propriamente na produção antecipada de provas, mas no direito de exigir, em razão de lei ou de contrato, a exibição de documento ou coisa — já existente/já produzida — que se encontre na posse de outrem. 

Para essa situação, afigura-se absolutamente viável — e tecnicamente mais adequado — o manejo de ação probatória autônoma de exibição de documento ou coisa, que, na falta de regramento específico, há de observar o procedimento comum, nos termos do art. 318 do novo Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente. 

Também aqui não se exige o requisito da urgência, tampouco o caráter preparatório a uma ação dita principal, possuindo caráter exclusivamente satisfativo, tal como a jurisprudência e a doutrina nacional há muito reconheciam na postulação de tal ação sob a égide do CPC/1973. A pretensão, como assinalado, exaure-se na apresentação do documento ou coisa, sem nenhuma vinculação, ao menos imediata, com um dito pedido principal, não havendo se falar, por isso, em presunção de veracidade na hipótese de não exibição, preservada, contudo, a possibilidade de adoção de medidas coercitivas pelo juiz. 

Ao ensejo, cabe transcrever os dispositivos legais do CPC/2015 que regem a subjacente ação autônoma de exibição de documentos 

Art. 318. Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei. Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução. [...] Da Exibição de Documento ou Coisa Art. 396. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder. Art. 397. O pedido formulado pela parte conterá: I - a individuação, tão completa quanto possível, do documento ou da coisa; II - a finalidade da prova, indicando os fatos que se relacionam com o documento ou com a coisa; III - as circunstâncias em que se funda o requerente para afirmar que o documento ou a coisa existe e se acha em poder da parte contrária. Art. 398. [não aplicação] Art. 399. O juiz não admitirá a recusa se: I - o requerido tiver obrigação legal de exibir; II - o requerido tiver aludido ao documento ou à coisa, no processo, com o intuito de constituir prova; III - o documento, por seu conteúdo, for comum às partes. Art. 400. [não aplicação] Art. 401. Quando o documento ou a coisa estiver em poder de terceiro, o juiz ordenará sua citação para responder no prazo de 15 (quinze) dias. Art. 402. Se o terceiro negar a obrigação de exibir ou a posse do documento ou da coisa, o juiz designará audiência especial, tomando-lhe o depoimento, bem como o das partes e, se necessário, o de testemunhas, e em seguida proferirá decisão. Art. 403. Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a exibição, o juiz ordenar-lhe-á que proceda ao respectivo depósito em cartório ou em outro lugar designado, no prazo de 5 (cinco) dias, impondo ao requerente que o ressarça pelas despesas que tiver. Parágrafo único. Se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência, pagamento de multa e outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a efetivação da decisão. Art. 404. A parte e o terceiro se escusam de exibir, em juízo, o documento ou a coisa se: I - concernente a negócios da própria vida da família; II - sua apresentação puder violar dever de honra; III - sua publicidade redundar em desonra à parte ou ao terceiro, bem como a seus parentes consanguíneos ou afins até o terceiro grau, ou lhes representar perigo de ação penal; IV - sua exibição acarretar a divulgação de fatos a cujo respeito, por estado ou profissão, devam guardar segredo; V - subsistirem outros motivos graves que, segundo o prudente arbítrio do juiz, justifiquem a recusa da exibição; VI - houver disposição legal que justifique a recusa da exibição. Parágrafo único. Se os motivos de que tratam os incisos I a VI do caput disserem respeito a apenas uma parcela do documento, a parte ou o terceiro exibirá a outra em cartório, para dela ser extraída cópia reprográfica, de tudo sendo lavrado auto circunstanciado. 

Com essa compreensão, de grande relevância citar o escólio de Cássio Scarpinella Bueno, que, após bem tecer um traço distintivo entre as pretensões relacionadas ao direito à prova (meio de prova e meio de obtenção de prova), reconhece a possibilidade de ajuizamento de ação autônoma de exibição de documento ou coisa, inclusive como o instrumento mais técnico para tal propósito: 

Na normalidade dos casos, a própria parte apresenta, em juízo, os documentos ou quaisquer outros suportes materiais de prova que tenha em seu poder. Pode ocorrer, contudo, que, por qualquer razão, tais substratos materiais estejam em poder da parte contrária e, até mesmo de terceiros, isto é, com pessoas estranhas ao processo. É para disciplinar esses casos que se voltam os arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil, sob a denominação de exibição de documentou ou coisa. Didática a propósito a regra do art. 396: "O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder". A exibição de documento ou coisa, tal qual disciplinada pelo Código de Processo Civil, é, ao mesmo tempo, meio de (produção de) prova [...] e meio de obtenção de prova. Com relação a esta última observação, o Código de Processo Civil parece ter dado ouvido aos reclamos de parcela da doutrina de que era fundamental compreender o instituto de viés híbrido. Isso porque se mostra inócuo querer presumir, em todo e qualquer caso, indistintamente, verdadeiro o fato resultante da não exibição do documento ou coisa pela singela razão de que, sem o documento ou coisa, pode ocorrer de não haver condições mínimas para se saber sequer a informação essencial para o exercício de uma pretensão. Tratava-se, outrossim, de forma de dar máximo aproveitamento para o que, para o Código de Processo Civil de 1973, era (mais um) procedimento cautelar específico, previsto nos seus arts. 844 e 845, não por acaso intitulado "exibição". [...] Sobre a abolição — sempre compreendida no sentido de desformalização — da dicotomia constante do CPC de 1973, entre a exibição como meio de prova e a exibição como "cautelar preparatória (arts. 844 e 845 do CPC de 1973), surge uma questão importante. O que fazer nos casos em que a exibição de documentos ou coisa precisar anteceder o início do processo? Há três respostas possíveis. A primeira se inclina à utilização dos procedimentos da tutela provisória antecedente constantes dos arts. 303 e 304 ou 305 a 310, cuja escolha deverá levara em conta o maior ou o menor viés satisfativo do pedido a ser apresentado pelo autor, respectivamente. A segunda é no sentido de o interessado lançar mão do procedimento relativo à "produção antecipada de prova", [...] justificando sua necessidade, inclusive com base em urgência, nos muito bem desenhados incisos do art. 381. A terceira entende que a parte deve se valer do procedimento reservado pelos arts. 397 a 400 ou 401 e 402 para a exibição pretendida contra a parte e em face do terceiro, respectivamente, sendo indiferente que se trate de pedido que anteceda o processo. Dentre as alternativas, a terceira é preferível pela especificidade da hipótese. Afinal, são aqueles artigos — e não os relativos à tutela provisória e à produção antecipada de provas — que conseguirão atender ao desiderato do interessado. A única adaptação que se faz necessária reside no caput do art. 398. Mais do que a intimação lá prevista, a parte contrária deverá ser citada, a exemplo, aliás, do que, para o terceiro, exige (e pertinentemente) o art. 401, tanto quanto os arts. 303, § 1º, II, e 306, quando trata da tutela provisória antecedente, sendo indiferente para os fins da exposição que seu viés seja (predominantemente) satisfativo ou acautelatório. Para os casos em que ficar demonstrado, concretamente, que o tempo necessário ao prévio contraditório (citação) tem o condão de macular a pretensão relativa à exibição, o arsenal da "tutela provisória" será suficientemente amplo para os devidos fins, inclusive com relação à necessária postergação do contraditório. (Bueno, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: Vol. 2. Procedimento Comum, Processos nos Tribunais e Recursos. 8ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2019. p. 248-249) - sem grifo no original. 

Assim, nas situações em que a parte postulante possuir o direito material de obter a exibição de documento ou coisa, em razão de lei ou de contrato, cuja prestação da parte adversa consiste em obrigação de fazer, afigura-se possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, nos termos do art. 318 novo do Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 401 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente (em poder de terceiro). 

Em comentário ao art. 396 do CPC/2015 — que trata da exibição incidental de documento ou coisa —, José Miguel Garcia Medina também reafirma a possibilidade de ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, com ênfase na pretensão fundada em direito material à exibição da parte, exercitada contra quem possui o dever, legal ou contratual, de apresentar o documento ou a coisa (obrigação de fazer), nos seguintes termos: 

I. Exibição forçada do documento. A prova documental, como regra, é produzida espontaneamente pela parte [...]. Pode suceder, no entanto, que seja necessário obter documento que se encontra com a outra parte ou com terceiro. Neste caso, pode a parte se valor do procedimento referido nos arts. 396 ss. do CPC/2015. II. Exibição incidental ou em ação autônoma. A exibição será incidental quando tiver por fim propiciar a produção de provas em processo já em curso. No caso, a exibição pode ser pedido por uma das partes do processo contra a outra, bem como contra terceiros. Poderá, também, ser determinada ex officio, nos termos do art. 370 do CPC/2015. [...] Mas a exibição de documentos ou coisa também pode ser pedida em ação autônoma (ação exibitória) voltada exclusivamente à exibição de documento ou da coisa, ajuizada por uma parte contra a outra, muitas vezes antes da ação em que se discutirá o fato objeto de prova, mas, também, com o intuito de apenas ver a coisa ou o documento exibidos, com o intuito de satisfazer direito material à exibição, constante de lei ou de contrato (aplica-se ao caso o disposto nos arts. 497 do CPC/2015, já que exibir é fazer) (Medina, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. 4ª Edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2016. p. 691-692) 

Na mesma linha de entendimento, reproduz-se a compreensão de Arruda Alvim: 

Embora não haja previsão expressa, no CPC/2015, de ação autônoma de exibição de documento ou coisa, nada obsta a que referida exibição seja requerida autonomamente, por meio de tutela provisória antecipada que, quando já pendente o processo principal, dizendo-se, então, que é incidente, ou antes do processo principal. Por igual, é possível que seja requerida em sede de produção antecipada de provas. A exibição antecedente ao processo principal não deve ser considerada necessariamente como preventiva e, ainda, num sentido rigoroso, sequer preparatória. É perfeitamente possível que a exibição satisfaça plenamente o requerente e que até mesmo desaconselhe qualquer providência ulterior. Se a finalidade da exibição está relacionada com a possível finalidade da prova, ou com o relacionamento do documento ou da coisa com os fatos probandos (v., nesse sentido, o art. 397, II, aplicável, por analogia, à ação autônoma), segue-se que esta medida se pode exaurir em si mesma. Ademais, havemos de ter presente que, nos casos de produção antecipada de prova sem o requisito da urgência, sequer é necessária a indicação da demanda que se pretende ajuizar (v. art. 381, incs. II e III, do CPC/2015, bem como o que foi dito sobre a produção antecipada de provas). Isso, porque a razão de ser da medida antecipada é, dentre outras, viabilizar uma possível conciliação (art. 381, II) ou mesmo evitar o ajuizamento da ação (381, III). Conquanto a ratio essendi da exibição seja indiscutivelmente de ordem pública, há, também, que se compatibilizar o direito à exibição com o direito exercitado contra quem se exiba o documento, de não ser este último, em todos os casos, inexoravelmente constrangido a produzir prova contra si (v. 25.4.18, infra, sobre os limites da ação de exibição de documento ou coisa) (Alvim, Arruda. Manual de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo, Processo de Conhecimento, Recursos, Precedentes. 18ª Edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil. 2019. p. 979-980) 

Na hipótese dos autos, a exordial é suficientemente clara quanto à pretensão posta, satisfativa em si, para que a instituição financeira, com quem o demandante estabeleceu contrato de abertura de conta-corrente, exiba o contrato e o extrato dos últimos 5 (cinco) anos referente à aludida conta, a fim de avaliar se houve ou não a cobrança de encargos indevidos, e, num juízo de conveniência, promover ou não futura ação ressarcitória, ressaltando que não obteve êxito na apresentação da referida documentação pela via administrativa. 

Como anotado, a jurisprudência desta Corte de Justiça, sob a égide do CPC/1973, reconhecia, em tal situação, a existência de interesse de agir do correntista, afigurando-se a ação de exibição de documentos, de natureza unicamente satisfativa (em que pese sob a rubrica de medida cautelar), a via processual adequada para esse fim, conforme dão conta os seguintes precedentes: 

RECURSO ESPECIAL. MEDIDA CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE EXTRATOS DE CADERNETA DE POUPANÇA. NATUREZA SATISFATIVA. "FUMUS BONI IURIS" E "PERICULUM IN MORA". DEMONSTRAÇÃO. DESNECESSIDADE. 1. Natureza satisfativa da medida cautelar de exibição de documentos. 2. Desnecessidade de demonstração do "fumus boni iuris" e do "periculum in mora", bastando a afirmação pela parte requerente do direito de obter a exibição, o que, no caso, decorre do caráter comum dos documentos, nos termos do art. 844, II, do CPC. 3. Doutrina e jurisprudência do STJ em casos similares. 4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (REsp 1197056/ES, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 28/06/2013) 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EXIBIÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS. INTERESSE DE AGIR. PEDIDO PRÉVIO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E PAGAMENTO DO CUSTO DO SERVIÇO. NECESSIDADE. REQUERIMENTO VÁLIDO. AUSÊNCIA. REEXAME. SÚMULA N. 7/STJ. NÃO PROVIMENTO. 1. "A propositura de ação cautelar de exibição de documentos bancários (cópias e segunda via de documentos) é cabível como medida preparatória a fim de instruir a ação principal, bastando a demonstração da existência de relação jurídica entre as partes, a comprovação de prévio pedido à instituição financeira não atendido em prazo razoável, e o pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária." (REsp 1.349.453/MS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 10/12/2014, DJe 2/2/2015) 2. Concluindo o Tribunal de origem que o requerimento apresentado não estava acompanhado de procuração do titular do interesse, de modo que não houve pedido administrativo válido, a questão é imune ao crivo do recurso especial, haja vista as disposições do enunciado n. 7 da Súmula desta Corte. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1020471/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 27/10/2017) 

De acordo com a fundamentação acima exposta, o advento do Código de Processo Civil de 2015 não altera a compreensão de se afigurar possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito comum, nos termos do art. 318 do CPC/2015, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente. 

Esse entendimento, como assinalado, reconhece a coexistência harmônica entre a ação autônoma de exibição de documentos pelo rito comum e os "novos" institutos processuais afetos à "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e à "exibição incidental de documentos e coisa" (arts 496 e seguintes), consideradas as particularidades de cada qual. 

É de se reconhecer, assim, que a ação de exibição de documentos subjacente, promovida pelo rito comum, denota, por parte do demandante, a existência de interesse de agir, inclusive sob a vertente adequação e utilidade da via eleita. 

Registre-se, por fim, que o cabimento da ação de exibição de documentos não impede, em si, o ajuizamento de ação de produção de antecipação de provas. 

Em arremate, a partir dos fundamentos acima delineados, dou provimento ao recurso especial para reconhecer a adequação da via eleita pela parte demandante, determinando-se, pois, o retorno dos autos à origem, para o prosseguimento do feito, na esteira do devido processo legal. É o voto.


VOTO-VISTA 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO: Eminentes colegas. Pedi vista dos autos na sessão de 13/08/2019 para apreciar com mais cuidado a controvérsia acerca do cabimento de ação autônoma de exibição na vigência do CPC/2015, pois essa delicada questão processual também foi suscitada, como preliminar, num dos representativos do Tema 1000/STJ, de minha relatoria, relativo ao cabimento de astreintes na exibição de documentos. 

Relembre-se que o caso subjacente ao presente recurso diz respeito a um pedido de exibição do contrato de abertura da Conta Corrente n. 7.594-9, Ag. 5390-2, do banco ora recorrido, bem como dos extratos bancários dos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. 

O juízo e o Tribunal de origem entenderam que seria descabido o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos na vigência do CPC/2015, e, ante a inércia do autor da demanda em emendar a petição inicial para formular pedido de produção antecipada de provas, julgaram extinto o processo sem resolução do mérito, dando ensejo ao presente recurso especial. 

Na sessão de 13/08/2019, o relator, Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, proferiu voto no sentido de dar provimento ao recurso especial para determinar o prosseguimento do feito como ação autônoma na origem. 

Feito esse breve relato dos autos, peço as mais respeitosas vênias ao eminente relator para abrir divergência, negando provimento ao recurso especial, pelos fundamentos que passo a declinar. 

No CPC/2015, o procedimento da exibição de documentos encontra-se disciplinado nos arts. 396 a 404 do CPC/2015, quando requerida de modo incidental, sendo pertinente a transcrição do enunciado normativo dos arts. 400 e 403, abaixo transcritos, litteris: 

Art. 400. Ao decidir o pedido, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou da coisa, a parte pretendia provar se: I - o requerido não efetuar a exibição nem fizer nenhuma declaração no prazo do art. 398 ; II - a recusa for havida por ilegítima. Parágrafo único. Sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido. ........................................................ Art. 403. Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a efetuar a exibição, o juiz ordenar-lhe-á que proceda ao respectivo depósito em cartório ou em outro lugar designado, no prazo de 5 (cinco) dias, impondo ao requerente que o ressarça pelas despesas que tiver. Parágrafo único. Se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência, pagamento de multa e outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a efetivação da decisão. (sem grifos no original) 

A exibição também pode ser requerida como produção antecipada de provas, segundo o procedimento descrito nos arts. 381 e 382 do CPC/2015, abaixo transcritos: 

Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que: I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação; II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito; III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação. § 1º O arrolamento de bens observará o disposto nesta Seção quando tiver por finalidade apenas a realização de documentação e não a prática de atos de apreensão. § 2º A produção antecipada da prova é da competência do juízo do foro onde esta deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu. § 3º A produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para a ação que venha a ser proposta. § 4º O juízo estadual tem competência para produção antecipada de prova requerida em face da União, de entidade autárquica ou de empresa pública federal se, na localidade, não houver vara federal. § 5º Aplica-se o disposto nesta Seção àquele que pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica para simples documento e sem caráter contencioso, que exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção. Art. 382. Na petição, o requerente apresentará as razões que justificam a necessidade de antecipação da prova e mencionará com precisão os fatos sobre os quais a prova há de recair. § 1º O juiz determinará, de ofício ou a requerimento da parte, a citação de interessados na produção da prova ou no fato a ser provado, salvo se inexistente caráter contencioso. § 2º O juiz não se pronunciará sobre a ocorrência ou a inocorrência do fato, nem sobre as respectivas consequências jurídicas. § 3º Os interessados poderão requerer a produção de qualquer prova no mesmo procedimento, desde que relacionada ao mesmo fato, salvo se a sua produção conjunta acarretar excessiva demora. § 4º Neste procedimento, não se admitirá defesa ou recurso, salvo contra decisão que indeferir totalmente a produção da prova pleiteada pelo requerente originário. 

A exibição como ação autônoma, fundada no direito material à exibição, por sua vez, não foi prevista no CPC/2015, estando revogada a ação cautelar de exibição de documentos regulada CPC/1973 (art. 844). 

Esse silêncio eloquente do CPC/2015 acerca da ação autônoma de exibição tem suscitado controvérsia na doutrina. 

O eminente relator, na linha do entendimento de CASSIO SCARPINELLA BUENO e JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA, votou no sentido de se admitir a ação autônoma de exibição "nas situações em que a parte postulante possuir o direito material de obter a exibição de documento ou coisa, em razão de lei ou de contrato". 

Embora seja bastante pertinente essa distinção entre o direito à exibição como direito material e como direito probatório autônomo, entendo não ser suficiente para justificar a possibilidade de ajuizamento de uma ação autônoma de exibição pelo procedimento comum, fundada no direito material à exibição, pois tal pretensão pode ser alcançada pelo procedimento da ação probatória autônoma do art. 381. 

Nesse sentido, manifestou-se o Tribunal de origem, com base em entendimento consignado na obra da autoria coletiva de TERESA A. A. WAMBIER, MARIA L. L. CONCEIÇÃO, LEONARDO F. DA S. RIBEIRO E ROGÉRIO L. T. DE MELLO, como também na obra de CRISTIANO IMHOF. Confira-se, a propósito, a seguinte passagem do acórdão recorrido: 

Na vigência do Código passado, a Ação Cautelar de Exibição de Documento de ocupava de trazer aos autos o documento almejado, sendo regulada no capítulo de procedimentos especiais. Contudo, com a modificação trazida pela legislação atual, a previsão do procedimento especial se extinguiu, tendo como mesmo destino a interpretação sobre o assunto. Atualmente, a Ação de Antecipação de Provas, a priori, é a que melhor coaduna para substituir a antiga Ação de Exibição de Documentos, por se tratar de ação autônoma e cujo objeto é colher provas antecipadamente, isto é, beneficiar as partes acerca de qualquer meio de prova, justificada pela urgência da colheita de provas; para ensejar a autocomposição; ou tão somente para reconhecimento prévio dos fatos (art. 381, incisos I a III do CPC). Já a Exibição de Documentos possui sua existência pautada na determinação de obrigar a parte adversa a juntar aos autos determinado documento, observando os requisitos do art. 397 do CPC. Assim, sua natureza cautelar foi extinta e posta como meio incidental, retirando a característica autônoma que possuía. A respeito da matéria, Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Liscastro Torres de Mello lecionam: "(...) Para a exibição de documento ou coisa que se encontre na posse da parte contrária, o procedimento previsto é o incidente de exibição de documento que coisa regulado nos arts. 396 a 400 do NCPC, que terá lugar se já houver uma ação em andamento. Caso não haja, a parte poderá lançar mão de ação probatória autônoma, com fundamento no art. 381 do NCPC (...)" (Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil artigo por artigo, 2ª ed., ed. Revista dos Tribunais, 2015, p. 756). E, também, Cristiano Imhof: "O objetivo do processo, efetivamente, não é a produção da prova, mas sim a solução do conflito. Todavia, em determinados casos, a prova traduz a meta primordial do processo, vez que o conflito estabelece-se em torno dela mesma, hipótese em que ocorrem as denominadas "ações probatórias". Nessas ações, reconhece-se que as partes têm direito a produzir a prova antecipadamente e sem necessariamente depender de um processo posterior. Mas, em casos de processos que sejam subsequentes à ação probatória, a finalidade da produção antecipada de prova, como o próprio nome já indica, é a de produzir determinada prova antes do momento processual em que ordinariamente seria produzida, em razão de alguma circunstância que leve a crer que não será possível aguardar a sua realização no curso do processo." (Novo código de processo civil comentado. 2ª ed. Ed. São Paulo: BookLaw, 2016. P. 607). Nota-se que a disposição da exibição de documento na legislação anterior tinha duas acepções: era disciplinada como procedimento especial - preparatória - e como incidente no Capítulo das Provas. Enquanto, atualmente, é disciplinado somente como incidente nos arts. 396 e ss., da Seção VI, Capítulo VI - Das Provas. Pela interpretação histórico-sistemática, percebe-se que o legislador optou por retirar da Ação de Exibição de Documentos o caráter preparatório e amplificar as hipóteses de cabimento da ação de produção antecipada de provas, restando à parte a opção de ajuizar esta última somente com o intuito de analisar os documentos almejados Para o referido caso, o mais adequado, portanto, seria a ação de produção antecipada de provas (com fundamento nos incisos II ou III do art. 381 do CPC), em razão da exibição de documentos se tratar agora de pedido incidental, deixando de apresentar o caráter autônomo que possuía na legislação anterior. (fls. 127/9) 

No caso dos autos, a parte demandante foi intimada a emendar a petição inicial a fim de adequar o pedido ao rito da ação probatória autônoma do art. 381 do CPC/2015 (fl. 40), mas preferiu insistir no processamento do pedido exibitório pelo procedimento comum, levando o juízo de origem a indeferir a inicial, em decisão mantida pelo Tribunal a quo, com base nos fundamentos acima transcritos, aos quais este relator manifesta adesão no presente voto. 

Sob outra ótica, relembre-se que a ação cautelar de exibição, regulada no CPC/1973, como demanda de massa, passou a ser usada de forma abusiva, mediante o ajuizamento de lides artificialmente forjadas, com o objetivo único de gerar honorários advocatícios em duplicidade ao advogado da parte demandante, ou seja, honorários na ação de exibição e honorários na demanda principal. 

Talvez seja essa a explicação para o silêncio eloquente do legislador no CPC de 2015 em não regular a exibição de documentos como ação autônoma. 

Veio efetivamente em boa hora, portanto, a mudança implementada pelo novo Código de Processo Civil, estatuindo um procedimento autônomo, não litigioso, de produção probatória (arts. 381/3) 

À luz desses fundamentos, renovando as vênias ao eminente relator, entendo que não merece reforma o acórdão recorrido. 

Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso especial. 

Deixo de majorar os honorários advocatícios por não terem sido arbitrados na origem (fl. 41). 

É o voto.

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO A TERCEIRO PARA APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS EM SEU PODER. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO COM BASE NO ART. 1.015, VI, DO CPC/15. POSSIBILIDADE. IRRELEVÂNCIA DO MEIO UTILIZADO PARA SE BUSCAR A EXIBIÇÃO. PREPONDERÂNCIA DO CONTEÚDO DECISÓRIO. MODALIDADE DE INCIDENTE, AÇÃO INCIDENTAL OU MERO REQUERIMENTO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.939 - SP (2018/0125600-8) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL E CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE PEDIDO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO A TERCEIRO PARA APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS EM SEU PODER. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO COM BASE NO ART. 1.015, VI, DO CPC/15. POSSIBILIDADE. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO QUE TEM POR FINALIDADE PERMITIR QUE A PARTE SE DESINCUMBA DO ÔNUS PROBATÓRIO. INCLUSÃO NO PROCESSO JUDICIAL DE DOCUMENTOS EM PODER DA OUTRA PARTE OU DE TERCEIRO QUE PERMITE O CUMPRIMENTO DO ENCARGO. HIPÓTESE DE CABIMENTO QUE ABRANGE A DECISÃO QUE RESOLVE A EXIBIÇÃO NA MODALIDADE DE INCIDENTE, AÇÃO INCIDENTAL OU MERO REQUERIMENTO NO PRÓPRIO PROCESSO. IRRELEVÂNCIA DO MEIO UTILIZADO PARA SE BUSCAR A EXIBIÇÃO. PREPONDERÂNCIA DO CONTEÚDO DECISÓRIO. 

1- Ação proposta em 12/05/2014. Recurso especial interposto em 26/07/2017 e atribuído à Relatora em 06/06/2018. 

2- O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que indeferiu a expedição de ofício para agente financeiro que é terceiro, a partir do qual se buscava a apresentação de documentos comprobatórios de vínculo entre os autores e o sistema financeiro de habitação e os riscos cobertos pela apólice de seguro, versa sobre exibição de documento e, assim, se é cabível agravo de instrumento com fundamento no art. 1.015, VI, do CPC/15. 

3- O art. 1.015 do CPC/15, que regula o cabimento do recurso de agravo de instrumento em suas hipóteses típicas, é bastante amplo e dotado de diversos conceitos jurídicos indeterminados, de modo que o Superior Tribunal de Justiça ainda será frequentemente instado a se pronunciar sobre cada uma das hipóteses de cabimento listadas no referido dispositivo legal. 

4- A regra do art. 1.015, VI, do CPC/15, tem por finalidade permitir que a parte a quem a lei ou o juiz atribuiu o ônus de provar possa dele se desincumbir integralmente, inclusive mediante a inclusão, no processo judicial, de documentos ou de coisas que sirvam de elementos de convicção sobre o referido fato probandi e que não possam ser voluntariamente por ela apresentados. 

5- Partindo dessa premissa, a referida hipótese de cabimento abrange a decisão que resolve o incidente processual de exibição instaurado em face de parte, a decisão que resolve a ação incidental de exibição instaurada em face de terceiro e, ainda, a decisão interlocutória que versou sobre a exibição ou a posse de documento ou coisa, ainda que fora do modelo procedimental delineado pelos arts. 396 e 404 do CPC/15, ou seja, deferindo ou indeferindo a exibição por simples requerimento de expedição de ofício feito pela parte no próprio processo, sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental. 

6- Hipótese em que o requerimento da seguradora era a expedição de ofício para agente financeiro, que é terceiro, para que ele apresente documentos comprobatórios do vínculo dos autores com o sistema financeiro de habitação e dos riscos cobertos pela apólice que poderiam, em tese, acarretar a exclusão do dever de indenizar ou a atribuição do dever de indenizar a outra seguradora, e que foi liminarmente indeferido pelo magistrado de 1º grau em decisão interlocutória que versou sobre a exibição do documento. 7- Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 12 de novembro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por SUL AMERICA COMPANHIA NACIONAL DE SEGUROS, com base na alínea “a” do permissivo constitucional, em face de acórdão do TJ/SP que, por unanimidade, conheceu em parte do agravo de instrumento interposto pela recorrente e, nessa extensão, negou-lhe provimento. 

Recurso especial interposto e m: 26/07/2017. Atribuído ao gabinete e m: 06/06/2018. 

Ação: de reparação de danos, em que os recorridos pleiteiam indenização securitária em decorrência de danos ocorridos em imóveis ao fundamento de vício de construção. 

Decisão interlocutória: indeferiu requerimento formulado pela recorrente, a fim de que fosse expedido ofício ao agente financeiro Caixa Econômica Federal para que fornecesse documentos comprobatórios da existência de vínculo entre os recorridos e o sistema financeiro da habitação e os riscos cobertos pela apólice (fls. 125/131, e-STJ). 

Acórdão: por unanimidade, conheceu em parte do agravo de instrumento interposto pela recorrente e, nessa extensão, negou-lhe provimento, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO INTERPOSTO CONTRA DOIS TÓPICOS DA DECISÃO – INDEFERIMENTO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À CEF – DECISÃO IRRECORRÍVEL – RECURSO NÃO CONHECIDO NESTA PARTE – INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO, EM FAVOR DOS MUTUÁRIOS DO SFH – ÔNUS PROBATÓRIO CARREADO À SEGURADORA – ADMISSIBILIDADE. A decisão que indefere expedição de ofício à CEF não desafia agravo de instrumento, por não se tratar de incidente de exibição de documento ou coisa – Em ação de indenização securitária, a decisão que inverte o ônus probatório em desfavor da seguradora, com base no CDC e no CPC, não comporta reforma – Precedentes. - Decisão mantida – NÃO CONHECERAM DE PARTE DO RECURSO E NEGARAM PROVIMENTO NA PARTE CONHECIDA. (fls. 269/275, e-STJ). 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados por unanimidade (fls. 316/318, e-STJ). 

Recurso especial: alega-se violação ao art. 1.015, VI, do CPC/15, ao fundamento de que a decisão interlocutória que indeferiu a expedição de ofício ao agente financeiro Caixa Econômica Federal, que não é parte do processo, versa sobre exibição de documento (fls. 278/286, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que indeferiu a expedição de ofício para agente financeiro que é terceiro, a partir do qual se buscava a apresentação de documentos comprobatórios de vínculo entre os autores e o sistema financeiro de habitação e os riscos cobertos pela apólice de seguro, versa sobre exibição de documento e, assim, se é cabível agravo de instrumento com fundamento no art. 1.015, VI, do CPC/15. 

1. DA IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO AGENTE FINANCEIRO QUE É TERCEIRO ESTRANHO À LIDE. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.015, VI, DO CPC/15. 

Em primeiro lugar, anote-se que a hipótese em exame diz respeito a um simples requerimento de expedição de ofício formulado pela recorrente, por meio do qual se pretende que um terceiro, o agente financeiro Caixa Econômica Federal, apresente em juízo determinados documentos que permitiriam comprovar a existência de vínculo entre os recorridos e o sistema financeiro da habitação e os riscos cobertos pela apólice de seguro. 

Na hipótese, não houve a instauração de um incidente processual ou uma ação incidental de exibição ou posse de documento ou coisa, nos moldes delineados nos arts. 396 a 404 do CPC/15, que, como se sabe, exigem rito e procedimento próprios (com intimação da parte ou citação do terceiro, amplo contraditório, exame das escusas de exibir ofertadas pela parte ou terceiro, produção de provas sobre a obrigação de exibir ou sobre a posse do documento ou coisa e decisão final). 

A questão vertida no recurso especial consiste em definir se o art. 1.015, VI, do CPC/15, diria respeito somente às decisões interlocutórias proferidas no incidente processual e na ação incidental a que se referem os arts. 396 e 404 do CPC/15 ou se a hipótese de recorribilidade acima mencionada seria mais ampla, abrangendo quaisquer decisões que digam respeito à exibição ou posse de documento ou coisa.

Para melhor exame da questão, confira-se o conteúdo do dispositivo legal alegadamente violado: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) VI – exibição ou posse de documento ou coisa; 

De início, é preciso relembrar, uma vez mais e a exemplo do que já se destacou em diversas outras oportunidades (como, por exemplo, no julgamento do REsp 1.752.049/PR, 3ª Turma, DJe 15/03/2019 e do REsp 1.729.110/CE, 3ª Turma, DJe 04/04/2019), que o art. 1.015 do CPC/15, que regula o cabimento do recurso de agravo de instrumento, em suas hipóteses típicas, é bastante amplo e dotado de diversos conceitos jurídicos indeterminados, de modo que esta Corte será frequentemente instada a se pronunciar sobre cada uma das hipóteses de cabimento listadas no referido dispositivo legal. 

O debate sobre o sentido que deve ser dado ao art. 1.015, VI, do CPC/15, também se insere nesse contexto, exigindo-se a indispensável conformação entre o texto de lei e o seu respectivo conteúdo normativo, a fim de que se possa dizer, exatamente, o significado de “decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa”. 

Nesse sentido, não há dúvida de que a decisão que resolve o incidente processual de exibição instaurado em face de parte e a decisão que resolve a ação incidental de exibição instaurada em face de terceiro estão abrangidas pela hipótese de cabimento do art. 1.015, VI, do CPC/15. 

Contudo, não se identifica na doutrina quem tenha examinado a hipótese em que a decisão interlocutória versou sobre a exibição ou a posse de documento ou coisa fora do modelo procedimental delineado pelos arts. 396 e 404 do CPC/15, ou seja, deferindo ou indeferindo a exibição por simples requerimento de expedição de ofício feito pela parte no próprio processo, sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental, o que, aliás, ocorre muito frequentemente na praxe forense. 

Com efeito, a pretensão do réu que requer a expedição de ofício para agente financeiro, que é terceiro, para que ele apresente documentos comprobatórios do vínculo dos autores com o sistema financeiro de habitação e dos riscos cobertos pela apólice, reveste-se de típica natureza de exibição de um documento que se encontra em poder de quem não é parte. 

A esse respeito, confira-se a lição de Elaine Harzheim Macedo: 

O direito pátrio sempre reconheceu que a pretensão à exibição possa ser deduzida contra terceiro. Aqui, é preciso fixar um denominador comum: o terceiro aqui referido não é o terceiro juridicamente interessado e que interveio no processo, como é o caso do assistente, do denunciado à lide ou do chamado no processo. O terceiro passível de sofrer uma exibitória é uma pessoa, natural ou jurídica, estranha ao processo em curso, mas que devido a certas circunstâncias é a detentora do documento ou coisa a ser exibido como meio de prova. (MACEDO, Elaine Harzheim. Exibitória de documento ou coisa no novo CPC: arts. 396 a 404 in Coleção Grandes Temas do Novo CPC, vol. 5: direito probatório. Coord.: Fredie Didier Jr. et. al. 3ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2018. p. 921). 

Na hipótese, pleiteou-se que o agente financeiro Caixa Econômica Federal, que não é parte, exibisse determinados documentos que, em sintonia com a tese de defesa deduzida pela recorrente, poderiam, em tese, acarretar a exclusão do dever de indenizar ou a atribuição de eventual dever de reparar danos a outra seguradora. 

Nesse contexto, pouco importa, para fins de cabimento do recurso de agravo de instrumento com base no art. 1.015, VI, do CPC/15, que a decisão que indeferiu o pedido de exibição tenha se dado na resolução de um incidente processual, de uma ação incidental ou de um mero requerimento formulado no próprio processo. 

Com efeito, o veículo processual é irrelevante face ao conteúdo decisório que efetivamente versou sobre a exibição de documento em posse de terceiro, ainda que não tenha sido observado o procedimento previsto no CPC/15 porque o julgador, liminarmente, indeferiu o pedido de cunho exibitório formulado pela recorrente de forma expedita. 

Em sentido semelhante, lecionam Teresa Arruda Alvim, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello: 

7. Exibição ou posse de documento ou coisa – inciso VI. A decisão que determina que certo documento seja entregue, ou seja, exibido, quer em relação à própria parte, quer em relação a terceiro, é agravável de instrumento, bem como a decisão que indefere pedido neste sentido. (ARRUDA ALVIM, Teresa; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1.616). 

Também em sentido análogo, ensina Daniel Amorim Assumpção Neves: 

8. Decisão que versar sobre exibição e posse de documento ou coisa. O inciso VI do art. 1.015 prevê a recorribilidade por agravo de instrumento da decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa. Nesse caso, tanto a decisão de indeferimento, como de deferimento do pedido, bem como a determinação de exibição de ofício, devem ser consideradas. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 4ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2019. p. 1.819). 

Em suma, a regra do art. 1.015, VI, do CPC/15, tem por finalidade permitir que a parte a quem a lei ou o juiz atribuiu o ônus de provar possa dele se desincumbir integralmente, inclusive mediante a inclusão, no processo judicial, de documentos ou de coisas que sirvam de elementos de convicção sobre o referido fato probandi e que não possam ser voluntariamente por ela apresentados. 

Essa finalidade apenas será perfeitamente atingida se se compreender que a decisão interlocutória que versa sobre a exibição do documento possa ocorrer em um incidente processual, em uma ação incidental ou, ainda, em mero requerimento formulado no bojo do próprio processo. 

Conclui-se, pois, que o acórdão recorrido violou o art. 1.015, VI, do CPC/15. 

2. CONCLUSÕES. 

Forte nessas razões, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial, determinando o retorno do processo ao TJ/SP para que, afastado o óbice do cabimento, examine a alegação de plausibilidade do requerimento exibitório formulado. 

Filigrana Doutrinária: Exibição de documentos

 O direito pátrio sempre reconheceu que a pretensão à exibição possa ser deduzida contra terceiro. Aqui, é preciso fixar um denominador comum: o terceiro aqui referido não é o terceiro juridicamente interessado e que interveio no processo, como é o caso do assistente, do denunciado à lide ou do chamado no processo. O terceiro passível de sofrer uma exibitória é uma pessoa, natural ou jurídica, estranha ao processo em curso, mas que devido a certas circunstâncias é a detentora do documento ou coisa a ser exibido como meio de prova. 

MACEDO, Elaine Harzheim. Exibitória de documento ou coisa no novo CPC: arts. 396 a 404 in Coleção Grandes Temas do Novo CPC, vol. 5: direito probatório. Coord.: Fredie Didier Jr. et. al. 3ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2018. p. 921. 

24 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Exibição de documentos - Fredie Didier

 “A exibição de coisa ou documento contra a parte adversária poderá ocorrer por ação autônoma. Seria uma ação probatória autônoma, nos termos em que autorizada pelos arts. 381-383, CPC). 

DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 12ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016. p. 258. 

Filigrana Doutrinária: Ação de Exibição de Documentos

 “Existem situações de fato nas quais o autor necessita ter contato com determinado documento ou coisa que não está em seu poder, para saber qual é o seu exato conteúdo ou estado e, assim, avaliar se é ou não o caso da utilização de uma medida judicial. Para viabilizar esse contato do autor a lei lhe permite a utilização da via processual denominada exibição de documento, que pode seguir o procedimento previsto para a tutela cautelar requerida em caráter antecedente ou o procedimento previsto nos art. 396 e seguintes, do CPC, variando se o pedido é feito em face da própria parte ou em face de terceiro. Há ainda, em tese, a possibilidade do autor pleitear a exibição mediante ação que siga o procedimento comum, embora possa obter a mesma eficácia com a utilização dos outros ritos, que são mais simples e por isso, mais indicados.” 

OLIVEIRA NETO, Olavo de; Curso de direito processual civil. Volume 2: tutela de conhecimento. São Paulo: Editora Verbatim, 2016, p. 262. 

23 de abril de 2021

AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - É possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum, na vigência do CPC/2015. Ainda existe a ação autônoma de exibição de documentos ou coisas no CPC/2015

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2020/06/info-660-stj.pdf


AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - É possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum, na vigência do CPC/2015. Ainda existe a ação autônoma de exibição de documentos ou coisas no CPC/2015 

É admissível o ajuizamento da ação de exibição de documentos, de forma autônoma, na vigência do CPC/2015. Admite-se o ajuizamento de ação autônoma para a exibição de documento, com base nos arts. 381 e 396 e seguintes do CPC, ou até mesmo pelo procedimento comum, previsto nos arts. 318 e seguintes do CPC. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.803.251-SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 22/10/2019 (Info 660). 

STJ. 4ª Turma. REsp 1.774.987-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 08/11/2018 (Info 637). 

Imagine a seguinte situação hipotética: João teve seu nome inscrito no cadastro de inadimplentes por indicação do Banco “X”, que informou ao SERASA que ele estaria devendo determinada quantia à instituição financeira. Quando soube da inscrição, João solicitou do banco, extrajudicialmente, acesso ao contrato que gerou o suposto débito. A instituição financeira, contudo, não apresentou o contrato. Diante disso, João propôs “ação autônoma de exibição de documentos” em face do Banco. Na demanda, o autor pediu a exibição do suposto contrato que originou a dívida. 

Sentença 

A sentença extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, por carência de ação, pela falta de interesseadequação. O juiz entendeu que, com a entrada em vigor do novo CPC, a exibição de documentos ou coisas passou a ser prevista expressamente apenas em caráter incidental, no curso do processo em andamento, nos termos dos arts. 396 a 404 do CPC/2015. 

Agiu corretamente o juiz? O CPC/2015 acabou com a ação autônoma de exibição de documentos ou coisas? Agora a única espécie que existe é a ação incidente de exibição de documentos ou coisas? 

NÃO. O CPC/2015 não acabou com a ação autônoma de exibição de documentos ou coisas. Conforme explica a doutrina: 

“Existem situações de fato nas quais o autor necessita ter contato com determinado documento ou coisa que não está em seu poder, para saber qual é o seu exato conteúdo ou estado e, assim, avaliar se é ou não o caso da utilização de uma medida judicial. Para viabilizar esse contato do autor a lei lhe permite a utilização da via processual denominada exibição de documento, que pode seguir o procedimento previsto para a tutela cautelar requerida em caráter antecedente ou o procedimento previsto nos art. 396 e seguintes, do CPC, variando se o pedido é feito em face da própria parte ou em face de terceiro. Há ainda, em tese, a possibilidade do autor pleitear a exibição mediante ação que siga o procedimento comum, embora possa obter a mesma eficácia com a utilização dos outros ritos, que são mais simples e por isso, mais indicados.” (OLIVEIRA NETO, Olavo de; Curso de direito processual civil. Volume 2: tutela de conhecimento. São Paulo: Editora Verbatim, 2016, p. 262). 

“A exibição de coisa ou documento contra a parte adversária poderá ocorrer por ação autônoma. Seria uma ação probatória autônoma, nos termos em que autorizada pelos arts. 381-383, CPC). (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. 12ª ed., Salvador: JusPodivm, 2016. p. 258). 

Essa foi também a conclusão exposta na II Jornada de Direito Processual Civil do STJ/CJF, ocasião em que foram aprovados os seguintes enunciados: 

Enunciado 119: É admissível o ajuizamento de ação de exibição de documentos, de forma autônoma, inclusive pelo procedimento comum do CPC (art. 318 e seguintes). 

Enunciado 129: É admitida a exibição de documentos como objeto de produção antecipada de prova, nos termos do art. 381 do CPC. 

Voltando ao caso concreto: O autor ingressou com o pedido de exibição por meio de ação autônoma em razão da negativação de seu nome em órgão de proteção ao crédito. Afirma que desconhece a dívida, e necessita do teor do contrato que deu origem ao débito para tomar as providências cabíveis. Tal providência, a teor dos enunciados da II Jornada de Processo Civil e da doutrina autorizada, pode ser buscada por meio de ação autônoma, não havendo de se falar em falta de adequação ou interesse. Apresentado o documento (suposto contrato), o autor definirá se ajuizará ou não ação de conhecimento. Trata-se, portanto, de ação autônoma de exibição, sendo medida adequada para o objetivo buscado. 

Em suma: É possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum, na vigência do CPC/2015. STJ. 3ª Turma. REsp 1.803.251-SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 22/10/2019 (Info 660). 

Admite-se o ajuizamento de ação autônoma para a exibição de documento, com base nos arts. 381 e 396 e seguintes do CPC, ou até mesmo pelo procedimento comum, previsto nos arts. 318 e seguintes do CPC. STJ. 4ª Turma. REsp 1.774.987-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 08/11/2018 (Info 637). 

Veja o teor dos arts. 381 e 396 do CPC/2015: 

Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que: I - haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação; II - a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito; III - o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação. § 1º O arrolamento de bens observará o disposto nesta Seção quando tiver por finalidade apenas a realização de documentação e não a prática de atos de apreensão. § 2º A produção antecipada da prova é da competência do juízo do foro onde esta deva ser produzida ou do foro de domicílio do réu. § 3º A produção antecipada da prova não previne a competência do juízo para a ação que venha a ser proposta. § 4º O juízo estadual tem competência para produção antecipada de prova requerida em face da União, de entidade autárquica ou de empresa pública federal se, na localidade, não houver vara federal. § 5º Aplica-se o disposto nesta Seção àquele que pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica para simples documento e sem caráter contencioso, que exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção. 

Art. 396. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder. Art. 318. Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei.

Filigrana Doutrinária: Agravo de Instrumento da decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa - Daniel Amorim Assumpção Neves

“8. Decisão que versar sobre exibição e posse de documento ou coisa. O inciso VI do art. 1.015 prevê a recorribilidade por agravo de instrumento da decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa. Nesse caso, tanto a decisão de indeferimento, como de deferimento do pedido, bem como a determinação de exibição de ofício, devem ser consideradas.” 

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 4ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2019. p. 1.819.

18 de abril de 2021

É cabível multa cominatória para compelir provedor de acesso à internet ao fornecimento de dados para identificação de usuário

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/09/info-652-stj.pdf


MULTA COMINATÓRIA - É cabível multa cominatória para compelir provedor de acesso à internet ao fornecimento de dados para identificação de usuário 

É cabível multa cominatória para compelir provedor de acesso a internet ao fornecimento de dados para identificação de usuário. STJ. 4ª Turma. REsp 1.560.976-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 30/05/2019 (Info 652). 

Imagine a seguinte situação hipotética ocorrida ainda na vigência do CPC/1973: 

Em um blog na internet, um usuário identificado apenas pelo pseudônimo “Coronel” publicou diversas ofensas contra João. O ofendido conseguiu obter o endereço do IP utilizado pelo usuário e descobriu que ele utilizou os serviços de internet do provedor “Oi”. IP, abreviatura de “Internet Protocol”, é um número que identifica o dispositivo (computador, celular, impressora etc) conectado a uma rede (como a internet). É como se fosse um “RG” ou “CPF” do dispositivo que está conectado. João notificou a “Oi” para que fornecesse a identificação do usuário/ofensor, o que foi, expressamente, recusado. Diante disso, ele ajuizou ação cautelar contra a “Oi”, pedindo que ela fosse condenada a exibir, em juízo, os dados necessários (nome completo, CPF, endereço residencial ou comercial cadastrado e telefones de contato) para a identificação do blogueiro que ofendeu o autor, possibilitando a futura propositura das ações judiciais cabíveis. O juiz deferiu tutela antecipada determinando que a “Oi” (provedora de acesso à internet) forneça os dados para identificação do usuário, sob pena de multa diária de R$ 500,00. A “Oi” recorreu contra a decisão afirmando que o magistrado não poderia ter aplicado a multa cominatória na ação de exibição de documento, conforme entendimento sumulado do STJ: 

Súmula 372-STJ: Na ação de exibição de documentos, não cabe a aplicação de multa cominatória. 

Agiu corretamente o magistrado? É possível a imposição de multa cominatória, no âmbito de ação na qual se pretende o fornecimento de dados para identificação de usuário de provedor de acesso à internet, de modo a permitir eventual ação indenizatória futura? SIM. 

Multa cominatória 

A multa cominatória (também chamada de astreintes, multa coercitiva ou multa diária) é penalidade pecuniária que caracteriza medida executiva de coerção indireta, pois seu único escopo é compelir o devedor a realizar a obrigação de fazer ou a não realizar determinado comportamento. Cuida-se de uma medida atípica de apoio à decisão judicial, de caráter meramente persuasório e instrumental, não caracterizando um fim em si mesmo. A multa cominatória apresenta, portanto, feição meramente coercitiva/indutiva. Isso porque o magistrado, para sua aplicação, é movido por desígnios de ordem dissuasória e intimidatória, no intuito de que as astreintes se mostrem capazes de estimular o devedor a cumprir o comando judicial que lhe é imposto, ciente de que a incidência da multa causar-lhe-á dano maior. Nessa perspectiva, o propósito final do sistema jurídico processual é que a multa nem incida concretamente, priorizando-se o seu escopo de garantia da efetividade das decisões judiciais. 

Pedido do autor não é o mesmo que uma ação de exibição (de que trata a súmula 372) 

No presente caso, o autor pretendia o fornecimento de dados para identificação do indivíduo que estava ofendendo a sua honra. Tratava-se, portanto, de pedido para impor uma obrigação de fazer, consistente no ato de identificação do usuário do serviço de internet. Para o STJ, esse pedido (de obrigar o provedor a fornecer a identidade do usuário) não é o mesmo pedido que é formulado em uma ação de exibição de documento (que era regulada pelo art. 844 do CPC/1973) e que inspirou a Súmula 372 do STJ. Não são a mesma coisa. 

Razão de ser da súmula não se aplica no presente caso 

A razão de ser da súmula 372 do STJ está no fato de que não é cabível a multa porque existem outros instrumentos e sanções processuais que podem ser utilizados para suprir o descumprimento da ordem judicial. O juiz pode, por exemplo, presumir que as informações que estão supostamente presentes no documento são verdadeiras (art. 359 do CPC/1973; art. 400 do CPC/2015). Outra alternativa que o magistrado possui é a determinação de busca e apreensão. 

No entanto, o raciocínio presente na súmula não se aplica ao presente caso. Isso porque não se trata propriamente de uma ação de exibição de documentos. O que se pretende na ação é que se forneça a identificação do usuário, ou seja, uma informação que deverá ser buscada no sistema informatizado da empresa. Assim, a multa é a única forma de compelir a ré a cumprir a decisão, já que não seria viável ordenar uma busca e apreensão na empresa, considerando que esse dado não está escrito em um papel arquivado, estando nos sistemas informatizados do provedor de acesso à internet. Não é igualmente aplicável a determinação contida no art. 359 do CPC (presunção de veracidade dos fatos afirmados pela parte requerente da exibição dos documentos), pois não se busca a prova de fatos contra a demandada, mas a identificação do terceiro responsável pela autoria de atos ilícitos. A causa em tela é muito mais específica e deve ser vista sob outro prisma que não o do já sumulado pelo STJ na súmula 372, pois se trata de matéria eletrônica, onde as demais possibilidades legais, que não a multa cominatória, são inócuas. Assim, as sanções processuais aplicáveis à recusa de exibição de documento - presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor e busca e apreensão, revelam-se evidentemente inócuas na espécie. Logo, as citadas peculiaridades, extraídas do caso concreto, constituem distinguishing apto a afastar a incidência do entendimento plasmado na Súmula 372 do STJ. 

Obrigação dos provedores de acesso de guardar os dados 

Registre-se que, desde 2009, já havia recomendação do Comitê Gestor de Internet no Brasil no sentido de que os provedores de acesso mantivessem, por um prazo mínimo de três anos, os dados de conexão e comunicação realizadas por meio de seus equipamentos. 

Em suma: É cabível multa cominatória para compelir provedor de acesso à internet ao fornecimento de dados para identificação de usuário. STJ. 4ª Turma. REsp 1.560.976-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 30/05/2019 (Info 652). 

A Súmula 372 do STJ ainda permanece válida com o CPC/2015? 

A doutrina majoritária afirma que não. Com a entrada em vigor do CPC/2015, a Súmula 372 do STJ está SUPERADA. Nesse sentido é o enunciado nº 54 do Fórum Permanente de Processualistas Civis. Isso porque o novo CPC permite expressamente a fixação de multa de natureza coercitiva na ação de exibição de documento. Veja: 

Art. 400 (...) Parágrafo único. Sendo necessário, o juiz pode adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias para que o documento seja exibido. 

Art. 403 (...) Parágrafo único. Se o terceiro descumprir a ordem, o juiz expedirá mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial, sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência, pagamento de multa e outras medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar a efetivação da decisão. 

Sobre o tema, importante mencionar a lição de Guilherme Rizzo Amaral: “Na vigência do CPC de 1973, havia pacífico entendimento jurisprudencial pela inaplicabilidade da multa para a coerção do dever de exibição de documentos, entendimento esse consubstanciado na súmula 372 do STJ. Tal súmula resta superada com o CPC de 2015, que prevê em seu art. 400, parágrafo único, que poderá o juiz “adotar medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub- rogatórias' para a exibição do documento, incluindo-se aí, portanto, a multa periódica. É claro que, podendo valer-se da presunção de veracidade dos fatos decorrente da não apresentação do documento (art. 400, caput), deverá o juiz sempre por ela optar, deixando assim de aplicar a multa, que somente se presta àquelas situações em que a coerção se mostre estritamente necessária (como pode ocorrer, por exemplo, quando não se tiver a exata dimensão dos fatos que se pretendem provar com o documento).” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. [livro eletrônico]./Coordenadores Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini e Bruno Dantas. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, Capítulo VI, comentário 2 ao artigo 537) 

O Ministro Luís Felipe Salomão, em obiter dictum, revelou que concorda com o entendimento doutrinário no sentido de que está, de fato, superada. Veja: 

“A título meramente informativo – pois a presente controvérsia se estabeleceu durante a vigência do CPC de 1973 –, revela-se importante destacar que o verbete sumular parece ter sido superado pelo poder geral de efetivação das decisões judiciais conferido ao juiz pelos artigos 139, inciso IV, e 400, parágrafo único, do CPC de 2015.” 

Desse modo, o caso acima exposto, se ocorrido sob a égide do CPC/2015, não geraria polêmica porque, ainda que se considerasse que a demanda proposta por João era uma ação de exibição, mesmo assim seria cabível a imposição da multa cominatória.