EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 227.767 - RS (2012/0188082-8)
RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
PROCESSUAL CIVIL. INTERPOSIÇÃO DE
RECURSO DE APELAÇÃO COM EXPOSIÇÃO DE MAIS DE
UM FUNDAMENTO. PROVIMENTO DA APELAÇÃO COM
BASE EM APENAS UM FUNDAMENTO, DEIXANDO-SE DE
EXAMINAR OS DEMAIS. REVERSÃO DO ACÓRDÃO DE
SEGUNDA INSTÂNCIA EM DECISÃO MONOCRÁTICA NO
STJ. AGRAVO REGIMENTAL QUE VENTILA
FUNDAMENTOS DESPREZADOS NO JULGAMENTO DA
APELAÇÃO. EXISTÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
DIVERGÊNCIA INTERNA NO STJ. EMBARGOS DE
DIVERGÊNCIA PARCIALMENTE PROVIDOS PARA DAR
POR PREQUESTIONADAS QUESTÕES JURÍDICAS
REITERADAS NAS CONTRARRAZÕES AO RECURSO
ESPECIAL.
I - Cuida-se de embargos de divergência por meio dos
quais pretendem os embargantes a uniformização do posicionamento
do Superior Tribunal de Justiça no tocante à resposta ao seguinte
questionamento: consideram-se prequestionados o(s) fundamento(s)
das razões de apelação desprezados no acórdão que deu integral
provimento ao recurso?
II - À luz do acórdão da C. Primeira Turma deste
Tribunal, o recurso especial não atendeu ao requisito especial do
prequestionamento quanto aos temas de (i) não fluência do prazo
prescricional na ausência de liquidez do título executivo; (ii) não
ocorrência de inércia dos exequentes; e (iii) execução movida por
incapaz, contra o qual não corre a prescrição.
III - Lidando com situação jurídica idêntica à dos
presentes autos, assentou o acórdão paradigma (EREsp n.
1.144.667/RS), julgado por esta C. Corte Especial em 7/3/2018 e da
relatoria do e. Min. Felix Fisher, que “a questão levantada nas
instâncias ordinárias, e não examinada, mas cuja pretensão foi acolhida por outro fundamento, deve ser considerada como
prequestionada quando trazidas em sede de contrarrazões”.
IV - Portanto, existem duas linhas de pensamento em rota
de colisão no Superior Tribunal de Justiça, revelando-se de todo
pertinente o recurso de embargos de divergência, em ordem a
remarcar o entendimento que já havia sido proclamado no julgamento
do paradigma invocado. Com efeito, rendendo vênias à C. Primeira
Turma, o entendimento correto é o que considera toda a matéria
devolvida à segunda instância apreciada quando provido o recurso
por apenas um dos fundamentos expostos pela parte, a qual não
dispõe de interesse recursal para a oposição de embargos
declaratórios.
V - A questão precisa ser analisada sob a perspectiva da
sucumbência e da possibilidade de melhora da situação jurídica do
recorrente, critérios de identificação do interesse recursal. Não se
trata de temática afeta a esta ou aquela legislação processual
(CPC/73 ou CPC/15), mas de questão antecedente, verdadeiro
fundamento teórico da disciplina recursal. Só quem perde, algo ou
tudo, tem interesse em impugnar a decisão, desde que possa obter,
pelo recurso, melhora na sua situação jurídica. Precedente: AgInt no
REsp n. 1.478.792/PR, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
Terceira Turma, julgado em 12/12/2017, DJe 2/2/2018. Doutrina:
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz;
MITIDIERO, Daniel. Curso de processo civil: tutela dos direitos
mediante procedimento comum. V. 2. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2015, p. 516; MEDINA, José Miguel Garcia. Direito
processual civil moderno. 2 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2016, p. 1276.
VI - É bastante fácil perceber que os ora embargantes
não dispunham, após o julgamento da apelação, de nenhum dos dois
requisitos: não eram vencidos (sucumbentes) e não existia perspectiva
de melhora na sua situação jurídica. Logo, agiram segundo a ordem e
a dogmática jurídicas quando se abstiveram de recorrer.
VII - Tenho por bem compor a divergência entre os
acórdãos confrontados adotando o entendimento do acórdão
paradigma, segundo o qual se consideram prequestionados os
fundamentos adotados nas razões de apelação e desprezados no
julgamento do respectivo recurso, desde que, interposto recurso
especial, sejam reiterados nas contrarrazões da parte vencedora.
VIII - Embargos de divergência conhecidos e
parcialmente providos a fim de dar por prequestionada a matéria
relativa à não ocorrência de prescrição em razão da iliquidez do título
executivo, cassando o v. acórdão de fls. 293-294, para que seja realizada nova análise do tema prescrição.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça,
A Corte Especial, por unanimidade, conhecer dos embargos de divergência e
dar-lhes parcial provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.
Ministros Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Humberto Martins, Maria Thereza de Assis
Moura, Herman Benjamin, Jorge Mussi, Og Fernandes, Luis Felipe Salomão, Mauro
Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Felix Fischer votaram com o
Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho.
Brasília (DF), 17 de junho de 2020(Data do Julgamento).
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (Relator):
Trata-se, na origem, de embargos à execução fiscal opostos pela União Federal
em desfavor de Amélia Ester P. Rodrigues e outros, opondo-se a embargante à execução de
título originado da sentença prolatada na ação coletiva ajuizada pelo Sindiserf, com base na
qual os exequentes buscam receber diferenças sobre vencimentos no montante de 28,86%,
devidos em face da aplicação das Leis n. 8.622 e 8.627/93.
Na sentença de fls. 130-133, acolheu-se a alegação de prescrição formulada
pela União, extinguindo-se o processo com resolução de mérito. Os embargados foram
condenados ainda ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios
sucumbenciais, suspendendo-se a exigibilidade de tais verbas em razão dos benefícios da
justiça gratuita a eles deferido.
Interpuseram recurso de apelação (fls. 135-142), ao qual se deu provimento
por maioria.
Opostos embargos de declaração, foram parcialmente providos apenas para
fins de prequestionamento (fls. 190-195).
Ato contínuo, interpôs a União recurso especial (fls. 197-201), sustentando a
negativa de vigência ao art. 1º do Decreto n. 20.910/32, que preconiza o prazo quinquenal.
Transitada em julgado a decisão exequenda em 2000 e ajuizada a execução apenas em 2006,
a pretensão acabou apanhada pela prescrição. Ademais, o fato de a União ter ajuizado ação
rescisória do julgado exequendo não tem o condão de interromper a prescrição.
O recurso especial não foi admitido (fls. 219-221), aplicando-se o óbice do
Enunciado Sumular n. 83/STJ.
Adveio a interposição de agravo em recurso especial (fls. 223-228).
Por decisão monocrática da lavra do e. Min. Arnaldo Esteves Lima, deu-se
provimento ao recurso especial (fls. 247-248), sob o fundamento de que a interposição de
ação rescisória não suspende a execução.
Interposto agravo regimental (fls. 253-259), a Primeira Turma negou-lhe
provimento (fls. 284-294), reiterando que “O mero ajuizamento da ação rescisória, sem o
deferimento de antecipação de tutela, não obsta os efeitos da coisa julgada, ensejando a
propositura da execução e sua tramitação, consoante art. 489 do Código de Processo Civil.
Portanto, não há suspensão do prazo prescricional da pretensão executória”. Além disso,
deixou de reconhecer do recurso, pela falta de prequestionamento, quanto às
seguintes questões: não fluência do prazo prescricional na ausência de liquidez do
título executivo; não ocorrência de inércia dos exequentes; e execução movida por
incapaz, contra o qual não corre a prescrição.
Após a sequencial rejeição dos dois embargos de declaração (fls. 317-327 e
344-354), opuseram os recorrentes embargos de divergência (fls. 361-401).
Sustentam que:
(a) a divergência entre os julgamentos confrontados recai sobre regra de direito
processual;
(b) no acórdão embargado, a Primeira turma “entendeu que as questões
ventiladas no recurso carecem de prequestionamento, uma vez que não foram analisadas pelo
tribunal de origem” (fl. 364);
(c) no entanto, a Corte Especial, no julgamento do EREsp n. 1.144.667/RS, da
relatoria do Min. Felix Fisher, DJe 23/3/2018, deu interpretação divergente à questão,
“assentando que, uma vez superado o argumento acolhido pelo Tribunal de Origem, cabe a
esta Corte Superior, no prosseguimento do julgamento do Recurso Especial, examinar os
demais fundamentos suscitados nas contrarrazões, ainda que não anteriormente apreciados”
(fl. 366);
(d) “... o recurso especial não foi interposto pela parte ora embargante, que,
vencedora nas instâncias de origem, não tinha interesse em recorrer, restando-lhe, em atenção
ao princípio da eventualidade, suscitar as demais matérias de defesa nas contrarrazões ao
recurso especial apresentado pela parte contrária, como o fez” (fl. 372);
(e) faltar-lhe-ia interesse recursal para opor embargos de declaração contra o
acórdão regional para obter o pronunciamento do Tribunal quanto aos demais fundamentos da
apelação, na medida em que o julgamento da apelação lhe foi completamente favorável;
(f) ao contrário do consignado no acórdão embargado, “as teses que os
embargantes pretendem ver apreciadas por esta C. Corte Superior foram devidamente
ventiladas nas contrarrazões do recurso especial...” (fl. 373);
(g) a regra do art. 255, § 5º, do RISTJ atribui ao recurso especial amplo efeito
devolutivo, cabendo à Turma aplicar o direito à espécie no caso de cabimento do recurso;
(h) consequência do acolhimento dos embargos de divergência é o afastamento
da multa aplicada em via de embargos declaratórios, pois inexistiu intuito procrastinatório dos
embargantes.
Por meio da decisão de fls. 405-408, os embargos de divergência foram
admitidos.
Impugnação às fls. 413-421.
Aberta vista dos autos ao Ministério Público Federal, exarou parecer pelo
provimento dos embargos de divergência (fls. 424-427), afirmando que “a questão da
necessidade de liquidez do título executivo para contagem do prazo prescricional, conforme
estabelecido pelo artigo 586, do CPC, foi suscitado pela embargante em contrarrazões do
especial, não podendo ser considerada matéria não impugnada. Esse mesmo fundamento foi
trazido na contraminuta do agravo em recurso especial" (fl. 232).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FRANCISCO FALCÃO (Relator):
Cuida-se de embargos de divergência por meio dos quais pretendem os
embargantes a uniformização do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça no tocante à
resposta ao seguinte questionamento: consideram-se prequestionados o(s) fundamento(s)
das razões de apelação desprezados no acórdão que deu integral provimento ao
recurso?
É nesses termos que se põe a divergência.
À luz do acórdão da Primeira Turma deste Tribunal, o recurso especial não
atendeu ao requisito especial do prequestionamento quanto aos temas (i) não fluência do prazo
prescricional na ausência de liquidez do título executivo; (ii) não ocorrência de inércia dos
exequentes; e (iii) execução movida por incapaz, contra o qual não corre a prescrição.
Examinando a cadeia recursal, observa-se que, no recurso de apelação, (fls.
135-142) haviam os recorrentes ventilado as teses enumeradas no parágrafo anterior, exceto
a referente à falta de curso da prescrição contra o incapaz (item iii).
Quando provido o recurso de apelação e interposto recurso especial pela
União, os recorridos (ora embargantes) suscitaram, nas contrarrazões (fls. 206-217), apenas a
matéria concernente à ausência de liquidez do título executivo (item i), como, aliás, bem
observou o Ministério Público Federal em seu parecer (fls. 424-427).
Dado provimento monocrático ao recurso especial da União (fls. 247-248),
interpuseram os ora embargantes agravo regimental (fls. 253-259), no qual reiteraram a
alegação de ausência de liquidez do título executivo a impedir o curso do prazo prescricional
(item i).
No julgamento do agravo (fls. 284-294), a C. Primeira Turma considerou essa matéria e outras não prequestionadas.
Por outro lado, o v. acórdão paradigma assentou, naquilo que ora importa (fls.
394-395):
Em espécie, como dito, o acórdão embargado entendeu que não estava
presente o necessário prequestionamento, mesmo a parte tendo suscitado a questão
relativa ao protesto interruptivo da prescrição em suas contrarrazões ao recurso de
apelação, cuja pretensão acabou sendo acolhida por outro fundamento igualmente
suscitado, e novamente levantada em sede de contrarrazões ao Recurso Especial.
Enquanto isso, nos autos em que proferidos os acórdãos paradigmas, o
entendimento foi no sentido de que, se a parte foi vencedora na Corte de origem, por
acolhimento de um dos fundamentos autônomos levantados, os quais foram
renovados em sede de contrarrazões ao recurso especial, não haveria interesse
recursal em opor embargos de declaração para provocar o exame dos demais
fundamentos não analisados, eis que já vencedora, cabendo à Corte Especial analisar
tais fundamentos caso recebido o Recurso Especial.
Como se vê, a situação processual aqui tratada é idêntica, contudo a
solução foi diversa. Com o devido respeito, entendo acertada a decisão adotada nos acórdãos
paradigmas, uma vez que a evolução histórica do Processo Civil demonstra o
desprendimento de formalidade exacerbada em prol do julgamento do mérito, para o
alcance efetivo do direito material.
Ademais, é assente nesta Corte que o julgador não está adstrito a responder
a todos os argumentos das partes, desde que fundamente sua decisão. Como
corolário lógico, a questão levantada nas instâncias ordinárias, e não examinada, mas
cuja pretensão foi acolhida por outro fundamento, deve ser considerada como
prequestionada quando trazidas em sede de contrarrazões. E esta conclusão se dá,
principalmente, porque o vencedor não detém interesse em interpor embargos de
declaração para ver apreciada tese levantada e não examinada pela corte de origem,
pois nenhum resultado prático obterá, considerando já ter logrado êxito em seu
pleito, a partir do acolhimento de outro fundamento pela instância ordinária. Nesse
sentido, tal fato não deve repercutir em desfavor do embargante que, de modo
expresso, trouxe os demais fundamentos nas contrarrazões ao recurso especial.
Lidando com situação jurídica idêntica à dos presentes autos, assentou o
acórdão paradigma, julgado por esta C. Corte Especial e de relatoria do e. Min. Felix Fisher,
que “a questão levantada nas instâncias ordinárias, e não examinada, mas cuja pretensão foi
acolhida por outro fundamento, deve ser considerada como prequestionada quando trazidas
em sede de contrarrazões”.
Nesse julgamento, o e. relator aderiu ao entendimento abrigado em outros dois
paradigmas, um da C. Segunda Seção (EREsp n. 595.742/SC, Rel. Min. Massami Uyeda,
Rel. p/ acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 13/4/2012) e outro da C. Segunda Turma (AREsp n. 400.828/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 02/10/2015), que adotavam a
mesma compreensão sobre o tema.
Portanto, existem duas linhas de pensamento em rota de colisão no Superior
Tribunal de Justiça, revelando-se de todo pertinente o recurso de embargos de divergência,
em ordem a remarcar o entendimento que já havia sido proclamado no julgamento do
paradigma invocado.
Com efeito, rendendo vênias à C. Primeira Turma, o entendimento correto é o
que considera toda a matéria devolvida à segunda instância apreciada quando provido o
recurso por apenas um dos fundamentos expostos pela parte, a qual não dispõe de interesse
recursal para a oposição de embargos declaratórios.
A questão precisa ser analisada sob a perspectiva da sucumbência e da
possibilidade de melhora da situação jurídica do recorrente, critérios de identificação do
interesse recursal. Não se trata de temática afeta a esta ou aquela legislação processual
(CPC/73 ou CPC/15), mas de questão antecedente, verdadeiro fundamento teórico da
disciplina recursal. Só quem perde, algo ou tudo, tem interesse em impugnar a decisão, desde
que possa obter, pelo recurso, melhora na sua situação jurídica.
Trata-se de lição consagrada na doutrina moderna. Transcrevo,
exemplificativamente, os seguintes magistérios:
A fim de que possa o interessado socorrer-se do recurso, é fundamental
que possa antever algum interesse na sua utilização, isto é, antever a possibilidade de
o seu provimento levar à melhora de sua esfera jurídica. À semelhança do que
acontece com o interesse de agir, é necessário que o interessado possa vislumbrar
alguma utilidade na interposição do recurso, utilidade essa que somente possa ser
obtida através da via recursal (necessidade). A fim de preencher o requisito
“utilidade”, será necessário que a parte (ou o terceiro), interessada em recorrer,
tenha sofrido algum prejuízo jurídico direto ou indireto em decorrência da decisão
judicial ou ao menos que essa não tenha satisfeito plenamente a sua pretensão (uma
vez que, sendo vencidos autor e réu, ambos terão interesse em recorrer). Em relação
à “necessidade”, essa estará presente se, por outro modo, não for possível resolver a
questão, alterando-se ou suplantando-se o prejuízo verificado. (MARINONI, Luiz
Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de processo
civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. V. 2. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2015, p. 516).
Há interesse de recorrer quando o recorrente puder esperar, em tese, do
julgamento do recurso, situação jurídica e pragmaticamente mais vantajosa que
aquela decorrente da decisão impugnada e quando seja necessário usar as vias
recursais para alcançar esse objetivo. Essa concepção, bastante abrangente, tem a
vantagem de considerar haver interesse recursal não apenas quando o que se pediu
não foi concedido, mas também quando, embora vencedora, a parte tenha, ainda
assim, perspectiva concreta de melhora em sua situação jurídica. Trata-se de se
demonstrar a presença do binômio “utilidade-necessidade”, à semelhança do que
ocorre com o interesse processual, requisito processual de admissibilidade para o
julgamento do mérito da causa (cf. art. 485, VI, do CPC/2015)”. (MEDINA, José
Miguel Garcia. Direito processual civil moderno. 2 ed. rev., atual e ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1276).
Portanto, a configuração do interesse recursal pressupõe a presença do binômio
sucumbência e perspectiva de maior vantagem. Sem ele a parte simplesmente não consegue
superar o juízo de admissibilidade recursal.
Também é nesse sentido a orientação do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL
(CPC/73). AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSTRUÇÃO. PEÇAS
OBRIGATÓRIAS E FACULTATIVAS. AUSÊNCIA. SUPRIMENTO. FALTA DE
INTERESSE RECURSAL. SUCUMBÊNCIA DE FUNDAMENTO. AUSÊNCIA DE
UTILIDADE DA DEMANDA. AUSENTE O PREJUÍZO PARA MODIFICAÇÃO DO
JULGADO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
(AgInt no REsp n. 1.478.792/PR, Rel. Ministro Paulo de Tarso
Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 12/12/2017, DJe 2/2/2018.)
É bastante fácil perceber que os ora embargantes não dispunham, após o
julgamento da apelação, de nenhum dos dois requisitos: não eram vencidos (sucumbentes) e
não existia perspectiva de melhora na sua situação jurídica. Logo, agiram segundo a ordem e a
dogmática jurídicas quando se abstiveram de recorrer.
Se se comportaram corretamente e, mais ainda, se tomaram o cuidado de
averbar nas contrarrazões do especial o fundamento descartado no julgamento da apelação – registre-se, aqui, que tal cautela ocorreu apenas em relação ao fundamento da
iliquidez do título executivo – não há como deles cobrar algo a mais. Fizeram o que se
esperava para manter viva a temática.
Pontue-se, ademais, que a exigência de oposição de embargos declaratórios a
fim de inutilmente prequestionar matéria que sequer se sabe se voltará a ser abordada vai de
encontro à tendência vigente mesmo antes do atual Código de Processo Civil de desestimular
a desnecessária utilização das vias recursais.
Assim, tenho por bem compor a divergência entre os acórdãos confrontados
adotando o entendimento do acórdão paradigma, segundo o qual se consideram
prequestionados os fundamentos adotados nas razões de apelação e desprezados no
julgamento do respectivo recurso, desde que, interposto recurso especial, sejam
reiterados nas contrarrazões da parte vencedora.
Se é assim, os embargos de divergência merecem parcial provimento, na na
medida em que apenas um dos fundamentos tidos por não prequestionados pela C. Primeira
Turma foi efetivamente reiterado nas contrarrazões do recurso especial: o referente à iliquidez
o título executivo.
Por fim, no que concerne à multa pela oposição de embargos protelatórios, a
cassação do acórdão embargado gera, como efeito automático, a desconstituição de todos os
seus comandos.
Em face do exposto, conheço e dou parcial provimento aos embargos de
divergência, a fim de dar por prequestionada a matéria relativa à não ocorrência de
prescrição em razão da iliquidez do título executivo, cassando o v. acórdão de fls. 293-294,
para que seja realizada nova análise do tema prescrição.
É como voto.