14 de dezembro de 2015

A objeção de pré-executividade é meio processual adequado para deduzir a prescrição do título em execução (aplicável ao artigo 802 do novo CPC)

A objeção de pré-executividade, por se tratar de criação jurisprudencial destinada a impedir a prática de atos tipicamente executivos, em face da existência de vícios ou matérias conhecíveis de ofício e identificáveis de plano pela autoridade judicial, é meio processual adequado para deduzir a prescrição do título em execução.

Íntegra do acórdão:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.522.093 - MS (2014⁄0248089-8)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : KARLOS CESAR FERNANDES
ADVOGADO : ROBERTO SOLIGO E OUTRO(S)
RECORRIDO : DEVANIR ANTONIA CORBANI DOS SANTOS PEREIRA
ADVOGADOS : ANTÔNIO FRANCO DA ROCHA E OUTRO(S)
PAULO AFONSO MAGALHÃES NOLASCO E OUTRO(S)
ANTÔNIO FRANCO DA ROCHA JUNIOR
INTERES. : BANCO DO BRASIL S⁄A
INTERES. : ALDAIR DOS SANTOS PEREIRA
INTERES. : BANCO BRADESCO S⁄A
INTERES. : BUNGE ALIMENTOS S⁄A
EMENTA
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. 1. CÔNJUGE. PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA. LEGITIMIDADE RECONHECIDA. INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 1.046, § 3.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 2. DEMANDA PROPOSTA PELO DEVEDOR. DEFESA JUDICIAL DO CRÉDITO. INÉRCIA DO CREDOR. AFASTADA. CITAÇÃO. PRAZO PRESCRICIONAL. INTERRUPÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. Na esteira dos precedentes do STJ, a intimação do cônjuge enseja-lhe a utilização tanto da via dos embargos à execução, por meio dos quais se admite a discussão da própria causa debendi e a defesa do patrimônio como um todo, como da via dos embargos de terceiro, para defesa de sua meação.
2. Entre os dois instrumentos processuais, desde que respeitado o prazo próprio para oposição, aplica-se a fungibilidade, garantindo a instrumentalização do procedimento na concretização do direito material resguardado.
3. A objeção de pré-executividade, por se tratar de criação jurisprudencial destinada a impedir a prática de atos tipicamente executivos, em face da existência de vícios ou matérias conhecíveis de ofício e identificáveis de plano pela autoridade judicial, é meio processual adequado para deduzir a prescrição do título em execução.
4. Assim, reconhecida a legitimidade ampla do cônjuge para defesa do patrimônio do casal pela via dos embargos à execução, deve-se ser estendida a ele, igualmente, a utilização da exceção ou objeção de pré-executividade.
5. A prescrição é instituto jurídico destinado a sancionar a inércia do detentor de um direito, reconhecendo o desinteresse no exercício de sua posição jurídica e tornando definitivo o estado das coisas.
6. Nos termos do art. 202 do CC, o decurso do prazo prescricional interrompe-se, uma única vez, quando presente qualquer das hipóteses definidas no art. 202 do CC.
7. A propositura de demanda em que se debate o próprio crédito – seja ela anulatória, revisional ou cautelar de sustação de protesto – denota o conhecimento do devedor do interesse do credor em exigir seu crédito. Ademais, a atuação judicial do credor em defesa de seu crédito implica o inevitável afastamento da inércia.
8. Desse modo, aplica-se a interrupção do prazo prescricional, nos termos do art. 202, I, do CC, ainda que a judicialização da relação jurídica tenha sido provocada pelo devedor.
9. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Impedido o Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
Brasília, 17 de novembro de 2015 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 1.522.093 - MS (2014⁄0248089-8)
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:
Trata-se de recurso especial interposto por Karlos Cesar Fernandes com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional.
Depreende-se dos autos que Devanir Antonia Corbani dos Santos Pereira opôs, na origem, exceção de pré-executividade arguindo prescrição de cheques, objeto de execução proposta pelo recorrente contra seu cônjuge.
Em sentença, rejeitou-se liminarmente a referida exceção, ao fundamento de que a matéria encontrava-se alcançada pela preclusão consumativa, porquanto o executado teria arguido a mesma tese anteriormente.
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul deu provimento ao agravo de instrumento, a fim de reconhecer a ocorrência da prescrição, em acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 179):
EMENTA – AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO QUE REJEITOU LIMINARMENTE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE PELO RECONHECIMENTO DA PRECLUSÃO CONSUMATIVA – INTERESSE DO TERCEIRO INTERESSADO QUE NÃO É ALCANÇADO PELA DECISÃO – OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO – PROVIDO.
O terceiro interessado possui legitimidade para discutir a ocorrência de prescrição, pois, além de estar imune ao efeito da coisa julgada, já que não integrava a lide, a questão é de ordem púbica, sendo admitido o seu conhecimento até mesmo de ofício, em qualquer fase ou instância, não justificando os efeitos da preclusão temporal.
O fato de os títulos terem ficado sob a "guarda" do tabelionato aonde foi apresentado para protesto, não é causa interruptiva da prescrição nem impossibilitava que o credor exercitasse o direito de ação para recuperar o seu crédito, aparelhando o feito executivo com as respectivas fotocópias autenticadas dentro do prazo estabelecido pelo artigo 59 da Lei n. 7.357⁄85.
Embargos de declaração, opostos por duas vezes pelo recorrente, foram rejeitados (e-STJ, fls. 207-213 e 259-267).
O recorrente, então, interpôs recurso especial, o qual foi, incialmente, inadmitido em juízo prévio de admissibilidade, dando azo à interposição do AREsp n. 386.194-MS, provido para determinar sua reautuação em recurso especial.
Autuado sob o n. 1.424.411-MS, o recurso especial teve seu mérito apreciado, monocraticamente, pela então relatora Min. Nancy Andrighi, que, reconhecendo a existência de omissão qualificada, anulou o julgamento dos embargos de declaração na origem e determinou o retorno dos autos para novo julgamento (e-STJ, fls. 391-393).
O novo julgamento, a despeito de sanar a omissão, manteve a conclusão anterior no sentido de rejeitar os aclaratórios, nos termos da seguinte ementa (e-STJ, fls. 415-419):
EMENTA – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RETORNO STJ PARA MANIFESTAÇÃO EXPRESSA. ILEGITIMIDADE E INTERESSE. VIA INADEQUADA.
Ausente reflexos na manifestação expressa relativa às questões devolvidas para a respectiva instância, impõe-se a rejeição dos embargos de declaração desconstituído pelo Superior Tribunal de Justiça.
Nas razões do presente recurso especial, sustenta a parte recorrente, em suma, violação dos arts. 3º, 6º, 41, 267 e 1.046 do CPC e 162 e 202 do CC⁄02, bem como a existência de dissídio jurisprudencial.
Sustenta a ilegitimidade do cônjuge meeiro para defender a totalidade de bens pertencentes ao executado, quando sua meação não é alcançada. Isso porque, na hipótese dos autos, a penhora recai apenas sobre 40% (quarenta por cento) do bem do executado.
Partindo desse mesmo fundamento de fato, assevera o recorrente que a prescrição somente pode ser alegada por aquele a quem aproveita, o que não seria o caso diante da preservação da meação.
Sustenta ainda que o prazo prescricional teria sido indevidamente considerado interrompido na data da apresentação do título a protesto. Isso porque, a despeito de sua apresentação, em razão de ordem judicial em ação cautelar de sustação de protesto, este somente se concluiu em 28.5.2008. Outrossim, ainda que se aplique a interrupção da prescrição pelo despacho judicial naquela ação cautelar de sustação de protesto, a prescrição somente retomaria seu curso em 20.5.2008 – data do último ato processual.
Contrarrazões apresentadas (e-STJ, fls. 441-451).
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.522.093 - MS (2014⁄0248089-8)
VOTO
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR):
Cinge-se a controvérsia a definir se há interesse de agir e legitimidade para atuação de cônjuge meeiro na defesa de bem, ainda quando não atingida sua meação, bem como o marco interruptivo do prazo prescricional, nas hipóteses em que o título fica retido em cartório por decisão judicial em ação cautelar de sustação de protesto.
1. Legitimidade do cônjuge.
Com efeito, a jurisprudência desta Corte Superior encontra-se pacificada no sentido de que o cônjuge do executado é parte legítima para defender patrimônio do casal. Assim, regularmente intimado da penhora, o cônjuge disporá "da via dos embargos à execução, nos quais poderá discutir a própria causa debendi e defender o patrimônio como um todo, na qualidade de litisconsorte passivo do(a) executado(a) e a via dos embargos de terceiro, com vista à defesa da meação a que entende fazer jus" (REsp n. 252.854⁄RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ 11⁄9⁄2000, p. 258).
Esse entendimento foi reiterado pela Corte Especial, em julgamento de embargos de divergência, nos termos da seguinte ementa:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSO CIVIL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.046, § 3.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. CÔNJUGE. EMBARGOS DO DEVEDOR. EMBARGOS DE TERCEIRO. MEAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. EMBARGOS CONHECIDOS, MAS REJEITADOS.
1. "A intimação do cônjuge enseja-lhe a via dos embargos à execução, nos quais poderá discutir a própria causa debendi e defender o patrimônio como um todo, na qualidade de litisconsorte passivo do(a) executado(a) e a via dos embargos de terceiro, com vista à defesa da meação a que entende fazer jus" (REsp 252854⁄RJ, QUARTA TURMA, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 11⁄09⁄2000).
2. Não obstante, o cônjuge só será parte legítima para opor embargos de terceiro quando não tiver assumido juntamente com seu consorte a dívida executada, caso em que, figurando no polo passivo do processo de execução como corresponsável pelo débito, não se lhe é legítimo pretender eximir seu patrimônio como "terceiro".
3. Embargos de divergência conhecidos, mas rejeitados.
(EREsp n. 306.465⁄ES, Rel. Min. Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 4⁄6⁄2013)
A leitura desses precedentes evidencia uma distinção quanto à extensão do objeto desses dois institutos, fato que encontra justificativa na doutrina e no próprio sistema processual. Isso porque, o nosso sistema de comunhão somente distingue-se do sistema de condomínio no âmbito do regime de comunhão total de bens. É o que se depreende da seguinte lição de Arnoldo Wald (apud FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais. 9ª ed. Salvador: Jus Podivum, 2013, p. 687):
o direito brasileiro admitiu a concepção romana de condomínio, baseada no conceito de cota ideal, embora houvesse em nosso direito de família um resquício de condomínio germânico, que é a comunhão universal de bens existente entre os cônjuges. Efetivamente, nesta, todos os bens do casal pertencem simultaneamente a marido e mulher, sem que, na vigência da sociedade conjugal, se possa concretizar ou individualizar a cota ideal. Somente com a dissolução da sociedade conjugal é que recorremos à meação para, no inventário, calcular o que cabe a cada um dos interessados. A meação que, até então, era fluida e essencialmente variável, de acordo com as mutações do patrimônio do casal, cristaliza-se no momento em que se dissolve a sociedade conjugal. [grifou-se]
Esse raciocínio harmoniza-se com o dispositivo legal (art. 655-B do CPC, incluído pela Lei n. 11.382, de 2006) que, incorporando antigo entendimento jurisprudencial ao Código de Processo Civil, resguarda a meação do cônjuge por meio da reserva incidente sobre o produto da alienação do bem penhorado.
Nesse diapasão, ressalta o prof. Araken de Assis que a opção pelo meio processual de impugnação da execução de título executivo extrajudicial não fica ao talante do cônjuge, mas deve ser identificada de acordo com a hipótese concreta sub judice. Assim, caberia a oposição de embargos à execução sempre que os bens pessoais do cônjuge, inclusive sua meação, fossem expostos à execução, ou seja, naquelas hipóteses legais em que os bens do cônjuge respondem efetivamente pela dívida, diante da solidariedade por dívidas contraídas a bem da família (arts. 1.643 e 1.644 do CC⁄02). Trata-se das típicas hipóteses de responsabilidade secundária do cônjuge (art. 592, IV, do CPC). Noutro viés, não sendo hipótese de responsabilidade secundária, resguardaria-se ao cônjuge a defesa de sua meação, acaso não observada, pela via dos embargos de terceiros. (ASSIS, Araken de. Manual da execução. 17ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 487).
A despeito dessa distinção essencial, a jurisprudência desta Corte Superior há tempos se inclinou no sentido de aplicar a fungibilidade entre os embargos à execução e os embargos de terceiros, desde que respeitado o prazo para oposição dos primeiros.
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL REDIRECIONADA AO SÓCIO-GERENTE DE EMPRESA DISSOLVIDA. EMBARGOS DE TERCEIRO. INTERPOSIÇÃO PELO SÓCIO-GERENTE. INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. CABIMENTO DE EMBARGOS DO DEVEDOR (ART. 1.046 CPC). PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. INAPLICABILIDADE, PELO DECURSO DE PRAZO SUPERIOR AO PREVISTO NO ART. 16 DA LEF.
1. Os embargos a serem manejados pelo sócio-gerente contra quem se redirecionou ação executiva, regularmente citado e, portanto, integrante do pólo passivo da demanda, são os de devedor.
2. Admite-se, presentes certas circunstâncias - especialmente a da tempestividade (não atendida no presente caso) - o recebimento de embargos de terceiro como embargos do devedor. Todavia, essa questão - que não foi posta no acórdão embargado - não se presta à solução por via de embargos de divergência.
3. Embargos de divergência a que se nega provimento.
(EREsp n. 98.484⁄ES, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, DJ 17⁄12⁄2004, p. 394)
PROCESSUAL - EXECUÇÃO FISCAL - SOCIEDADE LIMITADA - EXECUÇÃO CONTRA SÓCIO SEM PODER DE GERÊNCIA - EMBARGOS DE TERCEIRO.
- Admite-se que o sócio não gerente, citado em execução fiscal - como litisconsorte passivo da sociedade limitada - ofereça embargos de terceiros, para desconstituir penhora incidente sobre seus bens particulares. Precedentes do STJ.
(REsp n. 139.199⁄MG, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, DJ 03⁄11⁄1998, p. 22)
Daí se extrai a ampla legitimidade e interesse reconhecido ao cônjuge de, no prazo dos embargos do devedor, defender-se da execução resguardando a integralidade do patrimônio do casal, e não se restringindo à sua meação. Por via de consequência, impõe-se igualmente reconhecer ao cônjuge a legitimidade para oposição de objeção de pré-executividade.
De fato, a objeção ou exceção de pré-executividade constitui criação jurisprudencial, por meio da qual se obsta a prática de atos judiciais típicos do processo executivo, em razão de suposta existência de vícios ou matérias conhecíveis de ofício e identificáveis de plano pela autoridade judicial. Nesse diapasão, servem para amparar a prestação jurisdicional quando desnecessária a dilação probatória, a fim de se reconhecer a não-executividade do título.
É o que se depreende da seguinte ementa:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - CABIMENTO - REQUISITOS - DISCUSSÃO DE QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA E DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA - CONHECIMENTO EM QUALQUER TEMPO E GRAU DE JURISDIÇÃO - ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA CONHECIDOS E PROVIDOS.
1. Hipótese. Ação de execução de título extrajudicial ajuizada pela casa bancária julgada extinta pelo Tribunal de origem que, no bojo de exceção de pré-executividade, entendeu nulo o título executivo porque ausente assinatura de 2 (duas) testemunhas. Decisão reformada pela eg. Terceira Turma, sob entendimento da ocorrência de preclusão porquanto a exceção de pré-executividade foi ajuizada após a penhora de bem imóvel.
2. Mérito. A orientação assente da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça caminha no sentido de que a exceção de pré-executividade é cabível em qualquer tempo e grau de jurisdição, quando a matéria nela invocada seja suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz e a decisão possa ser tomada sem necessidade de dilação probatória.
3. Embargos de Divergência conhecidos e providos.
(EREsp n. 905.416⁄PR, Rel. Min. Marco Buzzi, Segunda Seção, DJe 20⁄11⁄2013)
Conquanto a legitimidade para oposição não se estenda a qualquer estranho à relação processual, ainda que sob o argumento de contribuir com a administração da justiça, reconhece-se a legitimidade a todos os terceiros "que ostentem interesse jurídico", ou seja, "os titulares de relação jurídica derivada ou incompatível com o objeto da execução" (ASSIS, Araken de. Op. cit. p. 1.250-1.251).
Esse tem sido também o entendimento albergado pelo STJ, como se pode verificar do seguinte precedente:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISSÍDIO NÃO COMPROVADO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE OPOSTA POR TERCEIRA INTERESSADA. EMENDA OU SUBSTITUIÇÃO DA CDA POSSIBILIDADE. ATÉ A PROLAÇÃO DA SENTENÇA NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO.
1. Emerge dos autos que, em exceção de pré-executividade oposta pela recorrente, o juiz singular acolheu em parte as razões da autora tão somente para determinar que a exequente adequasse a alíquota do IPTU posta na execução fiscal, bem como que excluísse a cobrança da Taxa de Limpeza e Conservação de Vias e Logradouros Públicos (TLCVLP), possibilitando a substituição da CDA.
................................................................................................
(AgRg no REsp n. 1.190.997⁄RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 10⁄3⁄2011) [grifado]
Nota-se que sua admissão não tem sido, em regra, questionada, uma vez que, no âmbito do STJ, se reconhece a ampla legitimidade para integral defesa do patrimônio pela via dos embargos do devedor ou de sua meação pela via dos embargos de terceiros. Nesse cenário, parece irrefutável o interesse da recorrida em provocar a análise da prescrição por meio da exceção de pré-executividade e, portanto, a sua legitimidade no presente incidente.
2. Da prescrição.
No que tange ao mérito, o Tribunal de origem acolheu a exceção interposta pela recorrida, reconhecendo a prescrição da pretensão do recorrente sob o fundamento de que a propositura de ação cautelar para sustação de protesto não seria óbice à propositura da demanda executiva pelo credor, nos termos do art. 585, § 1º, do CPC. Logo, ainda que o título tivesse ficado retido, não se justificaria a não contagem do prazo prescricional, diante da expressa garantia legal a assegurar o imediato exercício do direito de ação.
Desse modo, concluiu por operada a interrupção da prescrição com a apresentação do título a protesto, reiniciando-se naquele mesmo momento a contagem do prazo, o qual teria transcorrido in totum quando da propositura da execução em que oposta a presente objeção.
Por sua vez, o recorrente sustenta que o prazo não se interrompeu com a apresentação do título a protesto, porquanto o protesto em si não se perfectibilizou diante da concessão de liminar para sustá-lo. Outrossim, assevera que a propositura da demanda pelo devedor deve ser tida como marco interruptivo do prazo prescricional, de forma que, somente após a prática do último ato processual, teria voltado a ter curso a prescrição.
No ponto, com razão o recorrente. A despeito de a retenção do título não ser suficiente para obstar ao credor o exercício de seu direito fundamental de ação, podendo mesmo instruir excepcionalmente o procedimento executivo com mera cópia do título, a propositura da ação cautelar deve ser considerada, in casu, como o ato interruptivo do prazo prescricional.
Essa tem sido a interpretação que melhor harmoniza o art. 585, §1º, do CPC e a teleologia do art. 202 do CC⁄02.
Com efeito, o instituto da prescrição tem o importantíssimo escopo de pacificação social, agregando segurança jurídica e previsibilidade diante da inércia da parte quanto ao exercício de seu direito. Tutela-se, assim, a legítima expectativa gerada na parte ex adversa diante da inação por lapso temporal considerável e regulamentado legalmente.
Todavia, nas hipóteses em que não há inércia, mas uma conduta igualmente leal por parte do credor, que aguarda o acertamento judicial acerca de sua posição credora, a contagem do prazo prescricional vai de encontro ao próprio escopo do instituto jurídico. Ao assim se entender, ao invés de a prescrição consolidar a pacificação social, imbui-se no espírito dos jurisdicionados um sentimento de injusta surpresa, oposta àquele mote de previsibilidade almejado, fazendo do processo quase que uma armadilha para as partes.
Diante dessas linhas gerais é possível se reconhecer que o art. 202, I, do CC⁄02, ao prever a interrupção do prazo prescricional por meio da citação, é aplicável tanto às hipóteses em que o credor propõe ação objetivando a satisfação de seu direito, quanto às ações intentadas pelo devedor. Isso porque, ainda que pela via da ação, o devedor demonstra seu claro intento de obstar o exercício do direito de crédito, ou seja, de defender-se de atos positivos do credor – mesmo que não judicializados.
Por outra via, é notório que o credor recorrente não se manteve inerte, nem perdeu seu interesse ao longo do desenrolar das ações propostas pelo devedor, tanto que se manteve ativo na defesa de seu crédito ao longo do processo, cujo resultado inclusive lhe foi favorável. E tão logo se concluiu a demanda anulatória, o recorrente deu prosseguimento ao protesto e à execução judicial dos títulos, conforme reconhecido pela própria recorrida em sua petição de agravo de instrumento, interposto na origem (e-STJ, fl. 19):
A ação proposta pelo executado contra o agravado, objetivando a declaração de nulidade dos cheques, cujo feito tramitava perante a 8ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande foi julgada improcedente e, de pronto, o MM. Juiz titular daquela Vara fez expedir o ofício de f. 94 autorizando o protesto dos cheques, o que se deu em 28.05.08, quando a execução se tornara inviável, em decorrência da prescrição.
Vejamos, através do cronograma abaixo, se realmente os cheques foram, ou não, alcançados pela prescrição, tornando-se imprestáveis para alicerçar execução.
- data de apresentação fixada para 05.05.05 (anotações nos cheques);
- prazo para apresentação – 60 dias, por se tratar de praça diversa – o que estendeu esse prazo para 05.07.05
- apresentação em cartório no dia 16.05.08 e liminar da sustação em 19.05.05 (f. 16),
- propositura da execução em 28.05.08 (petição inicial).
[grifos originais]
Assim, tem-se evidente a inexistência de inércia por parte do credor, bem como o manifesto conhecimento por parte do devedor acerca do interesse do primeiro em receber aquilo que lhe era devido. Logo, não há qualquer inércia ou desídia do credor que justifique a extinção de sua pretensão pelo transcurso de prazo prescricional. Ao contrário, o aguardo de uma decisão definitiva quanto à higidez do crédito demonstra ato de boa-fé e lealdade processuais.
Esse entendimento, inclusive, já foi albergado por esta Corte Superior, embora por vezes partindo de fundamentação diversa. Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CHEQUE. SUSTAÇÃO DE PROTESTO. AÇÃO DECLARATÓRIA. PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO DO PRAZO. ADMISSIBILIDADE.
1. Inviável o reconhecimento de violação ao art. 535 do CPC quando não verificada no acórdão recorrido omissão, contradição ou obscuridade apontadas pela recorrente.
2. A ausência de decisão sobre os dispositivos legais supostamente violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. Incidência da Súmula 211⁄STJ.
3. A propositura de demanda judicial pelo devedor, seja anulatória, seja de sustação de protesto, que importe em impugnação do débito contratual ou de cártula representativa do direito do credor, é causa interruptiva da prescrição.
4. A manifestação do credor, de forma defensiva, nas ações impugnativas promovidas pelo devedor, afasta a sua inércia no recebimento do crédito, a qual implicaria a prescrição da pretensão executiva; além de evidenciar que o devedor tinha inequívoca ciência do interesse do credor em receber aquilo que lhe é devido.
5. O art. 585, §1º, do CPC deve ser interpretado em consonância com o art. 202, VI, do Código Civil. Logo, se admitida a interrupção da prescrição, em razão das ações promovidas pelo devedor, mesmo que se entenda que o credor não estava impedido de ajuizar a execução do título, ele não precisava fazê-lo antes do trânsito em julgado dessas ações, quando voltaria a correr o prazo prescricional.
6. Negado provimento ao recurso especial.
(REsp n. 1.321.610⁄SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 27⁄02⁄2013)
EMBARGOS À EXECUÇÃO. DUPLICATA SEM ACEITE. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. LIMINAR QUE IMPEDIU O PROTESTO DO TÍTULO. SUSTAÇÃO DE PROTESTO. TÍTULO RETIDO EM JUÍZO. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.
1. A duplicata sem aceite só se constitui em título executivo após seu devido protesto, quando se torna exigível e possibilita ao credor manejar as ações cambiárias. Assim, antes da formação do título, não há que se falar em prescrição da pretensão executiva.
2. A sustação de protesto, deferida em medida proposta pelo devedor, por ocasionar a custódia judicial do título de crédito, impede que o credor promova a execução da dívida e, por conseguinte, interrompe a fluência do prazo prescricional.
3. Recurso especial não conhecido.
(REsp n. 257.595⁄SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 30⁄03⁄2009)
Civil. Causa. interruptiva de prescrição. Demanda judicial proposta pelo devedor para discussão do débito e da cártula de crédito. Reinício da contagem com o trânsito em julgado. Da ação anulatória de débito ou cautelar de sustação de protesto
- A propositura de demanda judicial pelo devedor, seja anulatória, seja de sustação de protesto, que importe em impugnação do débito contratual ou de cártula representativa do direito do credor, é causa interruptiva da prescrição, nos termos do art. 172, V do CC.
- Quando a interrupção de prescrição se der em virtude de demanda judicial, o novo prazo só correrá da data do último ato do processo, que é aquele pelo qual o processo se finda.
-Recurso especial não conhecido
(REsp n. 216.382⁄PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 13⁄12⁄2004, p. 352)
Destarte, diante da ausência de inércia e da judicialização da pretensão ao exercício do crédito, ainda que sob o enfoque da defesa do devedor, a interrupção da prescrição se aperfeiçoará nos termos dos arts. 202 do CC e 219 do CPC, com a citação do réu na demanda. E somente retomará seu curso normal após praticado o último ato processual.
À vista desses fundamentos, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para rejeitar a objeção e afastar o reconhecimento da prescrição, devendo a execução prosseguir seu trâmite regular.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2014⁄0248089-8
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.522.093 ⁄ MS
Números Origem: 20120078550 201402480898 25436342012812000050 589267 60747920088120002
PAUTA: 17⁄11⁄2015 JULGADO: 17⁄11⁄2015
Relator
Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE
Ministro Impedido
Exmo. Sr. Ministro : RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MÁRIO PIMENTEL ALBUQUERQUE
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : KARLOS CESAR FERNANDES
ADVOGADO : ROBERTO SOLIGO E OUTRO(S)
RECORRIDO : DEVANIR ANTONIA CORBANI DOS SANTOS PEREIRA
ADVOGADOS : ANTÔNIO FRANCO DA ROCHA E OUTRO(S)
PAULO AFONSO MAGALHÃES NOLASCO E OUTRO(S)
ANTÔNIO FRANCO DA ROCHA JUNIOR
INTERES. : BANCO DO BRASIL S⁄A
INTERES. : ALDAIR DOS SANTOS PEREIRA
INTERES. : BANCO BRADESCO S⁄A
INTERES. : BUNGE ALIMENTOS S⁄A
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Títulos de Crédito - Cheque
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a). ROBERTO SOLIGO, pela parte RECORRENTE: KARLOS CESAR FERNANDES
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. Impedido o Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.

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