16 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Legitimidade ativa no controle concentrado de constitucionalidade / processo objetivo

"É interessante notar que antes e durante os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) a maioria dos Ministros do STF da época revelou preferir um acesso restrito ao controle abstrato, concentrado e por via direta. Em 1986, o Supremo Tribunal Federal enviou mensagem pública, formal e oficial à Comissão Afonso Arinos, que havia acabado de ser convocada pelo Presidente José Sarney para elaborar um projeto de constituição. Entre as inúmeras recomendações constantes daquela mensagem, afirmaram os Ministros: ‘Quanto à pretendida outorga de legitimidade para representação por inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual a certos órgãos do Poder Público (Executivo, Legislativo e Judiciário) ou, mesmo, a entidades e direito público ou privado, entendeu a Corte que ela deve continuar a cargo, exclusivamente, da Procuradoria-Geral da República. Se se entende que seu titular fica excessivamente vinculado ao Poder Executivo, diante da demissibilidade ad nutum, então será caso de pô-la em discussão, com eventual outorga de garantias maiores para o exercício do cargo. Isso, porém, deve ser considerado, com maior segurança, pelo próprio Poder Constituinte, abstendo-se a Corte de outras considerações por envolverem temas ligados aos Poderes Executivo e Legislativo’. O tom da mensagem é cauteloso, mas sugestivo das preferências da maioria dos membros do tribunal antes da convocação da ANC, em fevereiro de 1987. Para o Supremo da transição, ampliar o rol de legitimados a iniciar essa espécie de controle de constitucionalidade não era uma boa ideia. Em julho de 1987, já durante trabalhos da ANC, o Ministro José Carlos Moreira Alves – uma inegável liderança intelectual no STF até sua aposentadoria em 2003 – se manifestou inequivocamente contra a expansão da legitimação para iniciar o controle abstrato e por via direta. Em palestra proferida em um congresso nacional de direito constitucional, Moreira Alves afirmou que o projeto de constituição que então tramitava na ANC ‘abre demais o acesso sobre quem pode representar a inconstitucionalidade de uma lei, prevê que onze órgãos políticos, incluindo todos os governadores de Estado, podem provocar inconstitucionalidade’. ‘É demais’, concluiu o Ministro. Apesar de não ter sido bem-sucedido em obter da ANC o seu arranjo ideal em termos das regras para acesso ao controle abstrato e concentrado, o STF conseguiu, pela via da jurisprudência, aproximar de suas preferências derrotadas o desenho institucional. Limitou-se o grau de abertura do controle de constitucionalidade à sociedade e, com ele, a própria pauta do STF. Mantendo constantes outras variáveis, se menos atores podem ajuizar ADIs, menos questões políticas tendem a chegar ao STF pela via direta” 

ARGUELHES, Diego Werneck. Poder não é querer: preferências restritivas e redesenho institucional do Supremo Tribunal Federal pós-democratização. Universitas JUS, [s.l.], v. 25, n. 1, 2014. p. 31-32.

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