8 de maio de 2021

REsp 1.845.536-SC: DOS PRINCÍPIOS DA SUCUMBÊNCIA E DA CAUSALIDADE NA FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

 1. A condenação ao pagamento de honorários advocatícios é uma consequência necessária do processo, pois, segundo CAHALI, citando a lição de Chiovenda, “o direito [...] deve ser reconhecido como se fosse no momento da ação ou da lesão: tudo o que foi necessário ao seu reconhecimento e concorreu para diminuí-lo deve ser recomposto para o titular do direito” (Honorários advocatícios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 17, sem destaque no original). 

2. De fato, a condenação em verbas de sucumbência visa a reparar ou ao menos mitigar esse dano imposto pela necessidade de recurso ao processo para o reconhecimento do direito subjetivo objeto da pretensão resistida. 

3. Assim, como bem sintetizado pelo e. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, “o sistema do Código de Processo Civil se fixa em uma orientação de caráter objetivo: havendo sucumbência, em linha de princípio são devidos os honorários, em quantum a ser arbitrado na decisão”, mas “por outro lado, sem embargo dessa orientação, há de atentar-se para outro princípio, o da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo ou ao incidente processual, dever arcar com as despesas daí decorrentes” (REsp 264.930/PR, Quarta Turma, DJ 16/10/2000, sem destaque no original). 1.1. Da sucumbência em relação à causalidade 

4. Realmente, o princípio da sucumbência é, na maior parte das vezes, fundamento suficiente para a condenação ao pagamento da verba honorária, pois, “de ordinário, o sucumbente é considerado responsável pela instauração do processo e, assim, condenado nas despesas processuais” (REsp 1835174/MS, Terceira Turma, DJe 11/11/2019, sem destaque no original). Em sentido equivalente: AgInt no AREsp 1379197/RS, Quarta Turma, DJe 18/11/2019. 

5. O sucumbente é aquele vencido na lide, e, em regra, deve pagar honorários pelo fato objetivo da derrota que sua pretensão teve no processo, seguindo-se, assim, a máxima de CHIOVENDA de que “a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte a cujo favor se efetiva” (Instituições de direito processual civil. Trad. Guimarães Menegale; introdução A. Buzaid; notas E. T. Liebman. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1965. v. 3, p. 207). 

6. Mas a sucumbência não resolve satisfatoriamente todas os questionamentos sobre a responsabilidade pelo pagamento das despesas processuais, pois, por exemplo, “há situações, não raras, em que, mesmo não sucumbindo no plano do direito material, a parte vitoriosa é considerada como geradora das causas que produziram o processo e todos os dispêndios a ele inerentes” (REsp 1835174/MS, Terceira Turma, DJe 11/11/2019, sem destaque no original), sendo necessário, nessas hipóteses, recorrer-se ao princípio da causalidade. 

7. De fato, há muito está consolidado o entendimento desta e. Terceira Turma de que “o princípio da causalidade não se contrapõe ao princípio da sucumbência”, porquanto “antes, é este um dos elementos norteadores daquele” (REsp 303.597/SP, Terceira Turma, DJ 25/06/2001, sem destaque no original). 

8. Assim, de acordo com a jurisprudência desta Terceira Turma, o princípio da sucumbência deve ser tomado “apenas como um primeiro parâmetro para a distribuição das despesas do processo, sendo necessária a sua articulação com o princípio da causalidade” (REsp 684.169/RS, Terceira Turma, DJe 14/04/2009, sem destaque no original). 

9. De fato, conforme anota a doutrina, a atribuição dos honorários segundo o princípio da causalidade atende a uma razão de justiça distributiva, segundo a qual “é justo que quem tornou necessário o processo suporte-lhe o encargo econômico” (TALAMINI, Eduardo. Os fundamentos constitucionais dos honorários de sucumbência. A&C: Revista de Direito Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, v. 15, n. 62, p. 73-97, out./dez. 2015, sem destaque no original). 

10. Dessa forma, “segundo Liebman, nos casos em que a aplicação pura e simples do princípio da sucumbência fere o princípio da equidade, a obrigação de pagar as despesas judiciais desaparece sempre quando a parte, embora vencida, demonstre, com seu comportamento, di non aver causato Ia lite” (REsp 303.597/SP, Terceira Turma, DJ 25/06/2001, sem destaque no original). 1.2. Da jurisprudência do STJ sobre a articulação da causalidade sobre a sucumbência 

11. No julgamento do citado REsp 303.597/SP, esta e. Terceira Turma examinava a atribuição da responsabilidade pelos honorários em embargos de terceiro opostos contra penhora de imóvel com promessa de compra e venda não registrada em favor do embargante, cujos pedidos foram julgados procedentes. 

12. Na ocasião, prevaleceu o entendimento de que “se o credor indicou à penhora imóvel objeto de contrato de compra e venda não registrado, é iniludível que a necessidade do ajuizamento dos embargos de terceiro pelo adquirente é resultado da desídia deste em não promover o registro, providência que a par da publicidade do ato poderia evitar a indesejada constrição patrimonial, haja vista a eficácia erga omnes dos atos submetidos a registro” (REsp 303.597/SP, Terceira Turma, DJ 25/06/2001, sem destaque no original). 

13. Assim, nessa oportunidade, o princípio da causalidade foi aplicado em sobreposição à mera sucumbência, pois a aplicação deste último princípio poderia implicar a injustiça de “impor ao credor as consequências onerosas do ato imprevidente do terceiro” (REsp 303.597/SP, Terceira Turma, DJ 25/06/2001), que, por desídia, não providenciou o registro da alienação na matrícula do imóvel. 

14. Essa e. Terceira Turma também já ponderou a sucumbência em razão da causalidade nos autos do REsp 1.835.174/MS, no qual se discutia a possibilidade de atribuição dos honorários ao exequente cujo processo foi declarado extinto em razão da prescrição intercorrente, já que não encontrados bens penhoráveis dentro no prazo legal. 

15. Em referida conjuntura, adotou-se a orientação de que “o fato de o exequente não localizar bens do devedor não pode significar mais uma penalidade em desfavor daquele que, embora tenha decisão meritória favorável, não vem a obter êxito prático com o processo”, pois “do contrário, o devedor que não apresentou bens suficientes ao cumprimento da obrigação ainda sairia vitorioso da lide, fazendo jus à verba honorária em prol de sua defesa, o que se revelaria teratológico, absurdo, aberrante” (REsp 1835174/MS, Terceira Turma, DJe 11/11/2019, sem destaque no original). 

16. A jurisprudência da Segunda Seção foi, posteriormente, consolidada no sentido de que “a decretação da prescrição intercorrente por ausência de localização de bens penhoráveis não afasta o princípio da causalidade em desfavor do devedor, nem atrai a sucumbência para a parte exequente” (AgInt nos EDcl nos EAREsp 957.460/PR, Segunda Seção, DJe 20/02/2020, sem destaque no original). 

17. Assim, segundo a jurisprudência desta Corte, como forma de privilegiar a justiça na distribuição dos encargos processuais, o princípio da sucumbência deve ser articulado com o princípio da causalidade, do que se extrai a necessidade de se questionar quem é que, apesar de aparentemente vencedor em uma demanda, deu causa à instauração do processo ou incidente.

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