14 de agosto de 2021

É incompatível com a Constituição Federal ato normativo estadual que amplie as atribuições de fiscalização do Legislativo local e o rol de autoridades submetidas à solicitação de informações

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-1020-stf.pdf


COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS - É incompatível com a Constituição Federal ato normativo estadual que amplie as atribuições de fiscalização do Legislativo local e o rol de autoridades submetidas à solicitação de informações

O art. 50, caput e § 2º, da CF/88 traduz norma de observância obrigatória pelos Estadosmembros que, por imposição do princípio da simetria (art. 25 da CF/88), não podem ampliar o rol de autoridades sujeitas à fiscalização direta pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade. STF. Plenário. ADI 5289/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 7/6/2021 (Info 1020). 

A situação concreta foi a seguinte: 

A Constituição do Estado de São Paulo previu que a Assembleia Legislativa poderia requisitar informações de diversas autoridades estaduais e que se tais autoridades não cumprissem a determinação ou apresentassem informações falsas, isso significaria a prática de crime de responsabilidade. Veja a redação do dispositivo: 

Artigo 20. Compete, exclusivamente, à Assembleia Legislativa: (...) XVI – requisitar informações dos Secretários de Estado, dirigentes, diretores e superintendentes de órgãos da administração pública indireta e fundacional, do Procurador-Geral de Justiça, dos Reitores das universidades públicas estaduais e dos diretores de Agência Reguladora sobre assunto relacionado com sua pasta ou instituição, importando crime de responsabilidade não só a recusa ou o não atendimento, no prazo de trinta dias, bem como o fornecimento de informações falsas; 

ADI 

O PGR ajuizou ADI contra essa previsão. O autor argumentou que a fiscalização dos atos do Poder Executivo pelas assembleias legislativas deve seguir o mesmo modelo que é previsto na Constituição Federal para o Congresso Nacional. Assim, com base no princípio da simetria, deve-se analisar o modelo federal e aplicá-lo, por simetria, em nível estadual. Ocorre que o constituinte estadual ampliou o rol de autoridades que deverão prestar informações, sob pena de crime de responsabilidade. Com isso, o constituinte estadual extrapolou o modelo federal e, por isso, incidiu em inconstitucionalidade. Além disso, o constituinte estadual acabou legislando sobre crime de responsabilidade, o que é de competência privativa da União (art. 22, I, da CF/88). 

Os argumentos do PGR foram acolhidos pelo STF? SIM. 

É incompatível com a Constituição Federal ato normativo estadual que amplie as atribuições de fiscalização do Legislativo local e o rol de autoridades submetidas à solicitação de informações. STF. Plenário. ADI 5289/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 7/6/2021 (Info 1020). 

Princípio da simetria 

O Poder Legislativo possui o poder de convocar determinadas autoridades, mas autoridades integrantes do Poder Executivo, e não do Poder Judiciário ou do Ministério Público. Esse poder convocatório está previsto no art. 50 da CF/88: 

Art. 50. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada. (...) § 2º As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal poderão encaminhar pedidos escritos de informações a Ministros de Estado ou a qualquer das pessoas referidas no caput deste artigo, importando em crime de responsabilidade a recusa, ou o não - atendimento, no prazo de trinta dias, bem como a prestação de informações falsas. 

 (Juiz TJ/ES 2012 CESPE) Como auxiliares diretos do presidente da República, os ministros de Estado podem ser convocados para prestar, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado perante o plenário do Senado Federal e o da Câmara dos Deputados; contudo, no que diz respeito às comissões, o comparecimento deles só pode ocorrer por sua própria iniciativa e mediante entendimento com a Mesa respectiva. (errado) 

As Constituições estaduais devem respeitar esse modelo imposto, conforme exige o art. 25 da CF/88: 

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. 

Assim, o art. 50, caput e § 2º, da CF/88 traduz norma de observância obrigatória pelos Estados-membros que, por imposição do princípio da simetria (art. 25 da CF/88), não podem ampliar o rol de autoridades sujeitas à fiscalização direta pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade. A Constituição do Estado de São Paulo ampliou o rol de autoridades que estariam sujeitas à prestação de informações, sob pena de crime de responsabilidade. Aplicando o princípio da simetria, é constitucional a previsão da CE/SP que exige a prestação de informações por parte dos Secretários de Estado. Isso porque o art. 50 da CF/88 fala em Ministros de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República. Por outro lado, a CE/SP rompeu o modelo federal ao exigir informações de outras autoridades que não são titulares de órgãos diretamente subordinados ao Governador do Estado. É o caso do Procurador-Geral de Justiça, dos Reitores das universidades públicas estaduais, dos diretores de Agência Reguladora e dos titulares de autarquias e fundações. 

Crime de responsabilidade 

Crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas praticadas por pessoas que ocupam determinados cargos públicos. Caso o agente seja condenado por crime de responsabilidade, ele não receberá sanções penais (prisão ou multa), mas sim sanções político-administrativas (perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública). Os crimes de responsabilidade estão previstos: 

• Quanto ao Presidente da República: no art. 85 da CF/88 e Lei nº 1.079/50. 

• Quanto aos Governadores de Estado: na Lei nº 1.079/50. 

• Quanto aos Prefeitos: no DL 201/67. 

Muitas Constituições estaduais tratam sobre o procedimento a ser aplicado quando o Governador do Estado pratica um crime de responsabilidade. As Cartas estaduais podem dispor sobre isso? 

NÃO. O STF entende que o Estado-membro não pode dispor sobre crime de responsabilidade, ainda que seja na Constituição estadual. Isso porque a competência para legislar sobre crime de responsabilidade é privativa da União. 

Por que é privativa da União? 

Porque o STF entende que definir o que seja crime de responsabilidade e prever as regras de processo e julgamento dessas infrações significa legislar sobre Direito Penal e Processual Penal, matérias que são de competência privativa da União, nos termos do art. 22, I, e art. 85, parágrafo único, da CF/88: 

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; (...) 

Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: (...) Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. 

Repare que a doutrina conceitua os crimes de responsabilidade como sendo “infrações políticoadministrativas”. No entanto, o STF entende que, para fins de competência legislativa, isso é matéria que se insere no direito penal e processual, de forma que a competência é da União. Daí o Supremo ter editado um enunciado destacando essa conclusão: 

Súmula vinculante 46-STF: São da competência legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento. 

 (Juiz TJDFT 2016 CESPE) A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são da competência legislativa concorrente da União e das unidades da Federação. (errado) 

Dessa forma, a Constituição Estadual deve seguir rigorosamente os termos da legislação federal sobre crimes de responsabilidade. 

Em outras oportunidades, o STF decidiu: 

É inconstitucional norma da Constituição Estadual que preveja a possibilidade de a Assembleia Legislativa convocar o Presidente do Tribunal de Justiça ou o Procurador-Geral de Justiça para prestar informações na Casa, afirmando que a sua ausência configura crime de responsabilidade. O art. 50 da CF/88, norma de reprodução obrigatória, somente autoriza que o Poder Legislativo convoque autoridades do Poder Executivo, e não do Poder Judiciário ou do Ministério Público. Não podem os Estados-membros ampliar o rol de autoridades sujeitas à convocação pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade, por violação ao princípio da simetria e à competência privativa da União para legislar sobre o tema. STF. Plenário. ADI 5416, Rel. Gilmar Mendes, julgado em 03/04/2020 (Info 977). 

O art. 50, caput e § 2º, da Constituição Federal traduz norma de observância obrigatória pelos Estadosmembros, que, por imposição do princípio da simetria (art. 25, CF), não podem ampliar o rol de autoridades sujeitas à fiscalização direta pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade. STF. Plenário. ADI 5300, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 28/6/2018. 

Outro julgado no mesmo sentido: 

É inconstitucional norma da Constituição Estadual que preveja a possibilidade de a Assembleia Legislativa convocar o Presidente do Tribunal de Justiça ou o Procurador-Geral de Justiça para prestar informações na Casa, afirmando que a sua ausência configura crime de responsabilidade. O art. 50 da CF/88, norma de reprodução obrigatória, somente autoriza que o Poder Legislativo convoque autoridades do Poder Executivo, e não do Poder Judiciário ou do Ministério Público. Não podem os Estados-membros ampliar o rol de autoridades sujeitas à convocação pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade, por violação ao princípio da simetria e à competência privativa da União para legislar sobre o tema. STF. Plenário. ADI 2911, Rel. Carlos Britto, julgado em 10/08/2006. STF. Plenário. ADI 5416, Rel. Gilmar Mendes, julgado em 03/04/2020 (Info 977). 

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