15 de outubro de 2021

A operadora não pode ser obrigada a oferecer plano individual a idoso usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal modalidade contratual

Fonte: Dizer o Direito

Referência:  https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-703-stj-1.pdf


CONTRATO DE SEGURO - A operadora não pode ser obrigada a oferecer plano individual a idoso usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal modalidade contratual 

Assunto já apreciado no Info 693-STJ 

A operadora que resiliu unilateralmente plano de saúde coletivo empresarial não possui a obrigação de fornecer ao usuário idoso, em substituição, plano na modalidade individual, nas mesmas condições de valor do plano extinto. STJ. 3ª Turma. REsp 1.924.526-PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/06/2021 (Info 703). 

Modalidades de planos de saúde 

O art. 16, VII, da Lei nº 9.656/98 prevê que existem três modalidades de planos de saúde: 

a) individual ou familiar; 

b) coletivo empresarial e 

c) coletivo por adesão. 

Plano de saúde individual 

O plano de saúde individual é aquele em que a pessoa física contrata diretamente com a operadora ou por intermédio de um corretor autorizado. A vinculação de beneficiários é livre, não havendo restrições relacionadas ao emprego ou à profissão do usuário em potencial (art. 3º da RN n. 195/2009 da ANS). 

Planos de saúde coletivo 

O plano de saúde coletivo é aquele contratado por uma empresa, conselho, sindicato ou associação junto à operadora de planos de saúde para oferecer assistência médica e/ou odontológica às pessoas vinculadas às mencionadas entidades, bem como a seus dependentes. São dois os regimes de contratação de planos de saúde coletivos: 

a) o coletivo empresarial, o qual garante a assistência à saúde dos funcionários da empresa contratante em razão do vínculo empregatício ou estatutário (art. 5º da RN nº 195/2009 da ANS); e 

b) o coletivo por adesão, contratado por pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, como conselhos, sindicatos, cooperativas e associações profissionais (art. 9º da RN nº 195/2009 da ANS). 

Nos contratos de plano de saúde coletivo, portanto, a relação jurídica de direito material envolve uma operadora e uma pessoa jurídica que atua em favor de uma classe (coletivo por adesão) ou em favor de seus respectivos empregados (coletivo empresarial). 

Rescisão em caso de plano de saúde individual 

No caso de plano de saúde individual, a própria Lei nº 9.656/98 reservou um tratamento mais restritivo para eventual rescisão. O art. 13, parágrafo único, II, da Lei previu o seguinte: 

Art. 13. Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1º desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação. Parágrafo único. Os produtos de que trata o caput, contratados individualmente, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: (...) 

II - a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência; e 

Rescisão em caso de plano de saúde coletivo 

Em se tratando de plano de saúde coletivo, a operadora pode fazer a rescisão unilateral e imotivada do contrato coletivo se cumpridos três requisitos: 

a) o contrato contenha cláusula expressa prevendo a possibilidade de rescisão unilateral; 

b) o contrato esteja em vigência por período de pelo menos 12 meses; 

c) haja a prévia notificação da rescisão com antecedência mínima de 60 dias. 

Nesse sentido: É possível a resilição unilateral do contrato coletivo de saúde, uma vez que a norma inserta no art. 13, II, b, parágrafo único, da Lei 9.656/98 aplica-se exclusivamente a contratos individuais ou familiares. STJ. 4ª Turma. AgInt nos Edcl no ARESP 1.197.972/SP, Rel. Min. Raul Araújo, DJ 20/3/2019. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

João mantinha, há alguns anos, contrato de plano de saúde coletivo empresarial com a operadora Bradesco Saúde S.A. Determinado dia, a operadora do plano de saúde notificou João dizendo que não tinha mais interesse em manter o contrato, fazendo a resilição unilateral do pacto. 

O que é resilição? 

A resilição ocorre quando o contrato é rescindido por vontade das partes. A resilição pode ser unilateral (quando só uma das partes quis a resolução) ou bilateral (quando ambas as partes optaram por essa solução). O art. 473 do Código Civil trata sobre a resilição unilateral: 

Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte. 

Voltando ao caso concreto 

João ajuizou ação contra o Bradesco Saúde pedindo para que a operadora fosse obrigada a fornecer um plano de saúde individual para ele. A operadora respondeu afirmando que é inviável para ela oferecer, em substituição, plano individual, porque somente comercializa planos coletivos. 

O pedido de João foi acolhido? 

NÃO. Na hipótese de cancelamento do plano privado coletivo de assistência à saúde, deve ser permitido que os empregados ou ex-empregados migrem para planos individuais ou familiares, sem o cumprimento de carência, desde que a operadora comercialize esses planos. Veja os dispositivos da Resolução nº 19/1999, do CONSU: 

Art. 1º As operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou ex-empregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência. (...) 

Art. 3º Aplicam-se as disposições desta Resolução somente às operadoras que mantenham também plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar. 

A operadora de plano de saúde não pode ser obrigada a oferecer plano individual a usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal tipo de plano. Vale ressaltar que não é ilegal a recusa de operadoras de planos de saúde de comercializarem planos individuais por atuarem apenas no segmento de planos coletivos. Com efeito, não há norma alguma que as obrigue a atuar em determinado ramo de plano de saúde. 

Em suma: A operadora não pode ser obrigada a oferecer plano individual a usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal modalidade contratual. STJ. 3ª Turma. REsp 1.846.502/DF, Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/04/2021 (Info 693). 

Mesmo se o usuário for idoso? 

Mesmo assim, não haverá essa obrigação do plano de saúde. Se houve a resilição do plano de saúde para todos os usuários, não se pode dizer que esse ato tenha sido discriminatório, ou seja, não se pode dizer que a resilição ocorreu pelo fato de o autor ser idoso ou em virtude de suas características pessoais. Assim, se o plano foi extinto para todos os beneficiários, de todas as idades, não há que se falar em arbitrariedade, abusividade ou má-fé. Não se revela adequado ao Judiciário obrigar a operadora de plano de saúde que, em seu modelo de negócio, apenas comercializa planos coletivos, a oferecer também planos individuais, tão somente para idosos e com valores de mensalidade defasados, de efeito multiplicador, e sem a constituição adequada de mutualidade: esses planos não sobreviveriam. A operadora também não pode ser compelida a criar um produto único e exclusivo para apenas uma pessoa. A função social do contrato não pode ser usada para esvaziar por completo o conteúdo da função econômica do contrato. Um cenário de insolvência de operadoras de planos de saúde e de colapso do setor da Saúde Suplementar é que não seria capaz de densificar o princípio da dignidade da pessoa humana. 

A operadora que resiliu unilateralmente plano de saúde coletivo empresarial não possui a obrigação de fornecer ao usuário idoso, em substituição, plano na modalidade individual, nas mesmas condições de valor do plano extinto. STJ. 3ª Turma. REsp 1.924.526-PE, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/06/2021 (Info 703). 

Mas o usuário ficará completamente desprotegido? 

NÃO. Neste caso, pode-se utilizar o instituto da portabilidade de carências (RN-ANS nº 438/2018), o que se mostra razoável e adequado para assistir à população idosa, sem onerar em demasia os demais atores do campo da saúde suplementar. 

Os beneficiários de plano de saúde coletivo, após a resilição unilateral do contrato pela operadora, têm direito à portabilidade de carências ao contratar novo plano observado o prazo de permanência no anterior, sem o cumprimento de novos períodos de carência ou de cobertura parcial temporária e sem custo adicional pelo exercício do direito. STJ. 3ª Turma. REsp 1.732.511-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04/08/2020 (Info 677). 

A portabilidade de carências nos planos de saúde poderá ser exercida, entre outras hipóteses, em decorrência da extinção do vínculo de beneficiário - como nas rescisões de contrato coletivo (empresarial ou por adesão) -, devendo haver comunicação desse direito, que poderá ser exercido sem cobrança de tarifas e sem o preenchimento de formulário de Declaração de Saúde (DS), afastando-se objeções quanto a Doenças ou Lesões Preexistentes (DLP). Incidência dos arts. 8º, IV e § 1º, 11 e 21 da RN nº 438/2018 da ANS. A portabilidade de carências, por ser um instrumento regulatório, destina-se a incentivar tanto a concorrência no setor de saúde suplementar quanto a maior mobilidade do beneficiário no mercado, fomentando suas possibilidades de escolha, já que o isenta da necessidade de cumprimento de novo período de carência. STJ. 3ª Turma. REsp 1.846.502/DF, Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 20/04/2021 (Info 693).


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