17 de novembro de 2021

Não havendo na sentença condenatória transitada em julgado determinação expressa de reparação do dano ou de devolução do produto do ilícito, não pode o juízo das execuções inserir referida condição para fins de progressão de regime

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-709-stj.pdf


EXECUÇÃO PENAL (PROGRESSÃO DE REGIME) Não havendo na sentença condenatória transitada em julgado determinação expressa de reparação do dano ou de devolução do produto do ilícito, não pode o juízo das execuções inserir referida condição para fins de progressão de regime

Para que a reparação do dano ou a devolução do produto do ilícito faça parte da própria execução penal, condicionando a progressão de regime, é necessário que essa determinação de reparação ou ressarcimento conste expressamente da sentença condenatória, de forma individualizada e em observância aos princípios da ampla defesa e do contraditório, observando-se, assim, o devido processo legal. STJ. 5ª Turma. HC 686.334-PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 14/09/2021 (Info 709). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João foi condenado pelo juízo da 2ª Vara Criminal a uma pena de 4 anos e 2 meses de reclusão pela prática do crime de peculato, em regime inicial semiaberto. A sentença transitou em julgado e iniciou-se o cumprimento da pena. Passados alguns meses, João requereu ao juízo da vara de execução penal a progressão ao regime aberto. O magistrado indeferiu o pedido sob o argumento de que não houve ainda o ressarcimento integral do dano ao erário. O juiz fundamentou sua decisão no art. 33, § 4º do Código Penal: 

Art. 33 (...) § 4º O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. 

O juiz ainda relembrou, em sua decisão, que o STF já reconheceu a constitucionalidade desse dispositivo: O § 4º do art. 33 do CP é constitucional. STF. Plenário. EP 22 ProgReg-AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/12/2014 (Info 772). 

João não se conformou e interpôs agravo em execução dirigido ao Tribunal de Justiça alegando que na sentença condenatória não constou nenhuma determinação para que ele fizesse o ressarcimento integral do dano ao erário. Logo, essa foi uma exigência feita unicamente pelo juízo da execução penal. O Tribunal de Justiça manteve a decisão, tendo a defesa impetrado habeas corpus ao STJ. 

Para o STJ, o juiz agiu corretamente? 

NÃO. Realmente, não se discute que o STF reconhece a constitucionalidade do art. 33, § 4º, do Código Penal, o qual condiciona a progressão de regime, no caso de crime contra a administração pública, à reparação do dano ou à devolução do produto do ilícito. A questão aqui, contudo, não é discutir a constitucionalidade do dispositivo. O que se está debatendo é se o juízo da execução penal pode fazer uma exigência que não consta da sentença condenatória. Para o STJ, não é possível. A execução penal precisa guardar relação com o título condenatório formado no juízo de conhecimento, motivo pelo qual não é possível agregar, como condição para a progressão de regime, capítulo condenatório expressamente decotado. Nessa linha de intelecção, não havendo na sentença condenatória transitada em julgado determinação expressa de reparação do dano ou de devolução do produto do ilícito, não pode o juízo das execuções inserir essa condição para fins de progressão, sob pena de se ter verdadeira revisão criminal contra o réu. O art. 91, I, do Código Penal, que torna certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, deve ser lido em conjunto com os arts. 63 e 64 do Código de Processo Penal, uma vez que, de fato, a sentença condenatória é título executivo judicial, nos termos do art. 515, VI, do Código de Processo Civil. Desse modo, deve referido título ser liquidado e executado na seara cível: 

Art. 91. São efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime; (...) 

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido. 

Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra o responsável civil. Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela. 

Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: (...) VI - a sentença penal condenatória transitada em julgado; 

O art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal, afirma que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Para que a reparação do dano ou a devolução do produto do ilícito faça parte da própria execução penal, condicionando a progressão de regime, mister se faz que conste expressamente da sentença  condenatória, de forma individualizada e em observância aos princípios da ampla defesa e do contraditório, observando-se, assim, o devido processo legal

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