8 de janeiro de 2022

A Defensoria Pública pode prestar assistência jurídica às pessoas jurídicas que preencham os requisitos constitucionais

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1036-stf.pdf


DEFENSORIA PÚBLICA A Defensoria Pública pode prestar assistência jurídica às pessoas jurídicas que preencham os requisitos constitucionais 

A Defensoria Pública, por obrigação, deve prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Todavia, suas funções a essas não se restringem ao aspecto econômico. A Defensoria Pública deve zelar pelos direitos e interesses de todos os necessitados, não apenas sob o viés financeiro, mas também sob o prisma da hipossuficiência e vulnerabilidade decorrentes de razões outras (idade, gênero, etnia, condição física ou mental etc.). Conclui-se que a Defensoria Pública, agente de transformação social, tem por tarefa assistir aqueles que, de alguma forma, encontram barreiras para exercitar seus direitos. Naturalmente. sua atribuição precípua é o resguardo dos interesses dos carentes vistos sob o prisma financeiro. Todavia não é a única. Isso porque, como sabemos, as desigualdades responsáveis pela intensa instabilidade social não são apenas de ordem econômica. Não há, em princípio, impedimento insuperável a que pessoas jurídicas venham, também, a ser consideradas titulares de direitos fundamentais, não obstante estes, originalmente, terem por referência a pessoa física. As expressões “insuficiência de recursos” e “necessitados” podem aplicar-se tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas. Portanto, há a possibilidade de que pessoas jurídicas sejam, de fato, hipossuficientes e, portanto, sejam assistidas pela Defensoria Pública. STF. Plenário. ADI 4636/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/11/2021 (Info 1036). 

ADI 

A LC nº 80/94, com redação dada pela LC 132/2009, prevê o seguinte: 

Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras: (…) 

V – exercer, mediante o recebimento dos autos com vista, a ampla defesa e o contraditório em favor de pessoas naturais e jurídicas, em processos administrativos e judiciais, perante todos os órgãos e em todas as instâncias, ordinárias ou extraordinárias, utilizando todas as medidas capazes de propiciar a adequada e efetiva defesa de seus interesses; (...) 

§ 6º A capacidade postulatória do Defensor Público decorre exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público. 

O Conselho Federal da OAB ajuizou ação: • contra a expressão “e jurídicas” prevista no inciso V; e • contra a íntegra do § 6º; 

A OAB alegou que a expressão “e jurídicas” violaria o art. 5º, LXXIV, e o art. 134 da Constituição Federal. Isso porque, na visão da OAB, a atuação da Defensoria Pública deveria ficar restrita às pessoas naturais que fossem economicamente necessitadas, não podendo a Instituição fazer a assistência jurídica de pessoas jurídicas: 

Art. 5º (...) LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos; 

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal. 

O § 6º do art. 4º, por sua vez, seria inconstitucional por violar o art. 133 da Constituição, uma vez que o Defensor não deixa de ser um advogado, considerando que exerce atividade de advocacia. Sustentou que a competência da OAB para fiscalização ético-disciplinar difere da fiscalização funcional exercida pela Defensoria, razão pela qual é indispensável a inscrição do defensor em seus quadros. 

O STF acolheu os argumentos da OAB? NÃO. 

Primeira conclusão: 

A Defensoria Pública pode sim prestar assistência jurídica às pessoas jurídicas, desde que preencham os requisitos constitucionais. STF. Plenário. ADI 4636/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/11/2021 (Info 1036). 

Defensoria Pública faz a assistência jurídica não apenas dos necessitados sob o ponto de vista econômico 

A Defensoria Pública, por obrigação, deve prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Todavia, suas funções a essas não se restringem ao aspecto econômico. A Defensoria Pública deve zelar pelos direitos e interesses de todos os necessitados, não apenas sob o viés financeiro, mas também sob o prisma da hipossuficiência e vulnerabilidade decorrentes de razões outras (idade, gênero, etnia, condição física ou mental etc.). Conclui-se que a Defensoria Pública, agente de transformação social, tem por tarefa assistir aqueles que, de alguma forma, encontram barreiras para exercitar seus direitos. Naturalmente.sua atribuição precípua é o resguardo dos interesses dos carentes vistos sob o prisma financeiro. Todavia não é a única. Isso porque, como sabemos, as desigualdades responsáveis pela intensa instabilidade social não são apenas de ordem econômica. 

Constituição Federal não restringe a atuação da Defensoria Pública à defesa das pessoas físicas 

Não há, em princípio, impedimento insuperável a que pessoas jurídicas venham, também, a ser consideradas titulares de direitos fundamentais, não obstante estes, originalmente, terem por referência a pessoa física. As pessoas jurídicas são titulares do direito à inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV) e dos direitos do tipo procedimental, como o direito a ser ouvido em juízo e o direito ao juiz predeterminado por lei, o direito à igualdade de armas e o direito à ampla defesa. A jurisprudência pátria é firme no sentido de admitir, por exemplo, a obtenção da gratuidade de justiça por parte das pessoas jurídicas, desde que a insuficiência de recursos seja devidamente comprovada. As expressões “insuficiência de recursos” e “necessitados” podem aplicar-se tanto às pessoas físicas quanto às pessoas jurídicas. Portanto, há a possibilidade de que pessoas jurídicas sejam, de fato, hipossuficientes e, portanto, sejam assistidas pela Defensoria Pública. Conforme muito bem explicou o Min. Gilmar Mendes: “Como não enxergar, por exemplo, as microempresas, as empresas de pequeno porte, as individuais? Quando se fala em pessoa jurídica, aqui, devemos ir além dos bancos, grandes lojas, redes de supermercado. Trata-se se, sim, do padeiro que abriu seu estabelecimento comercial com recursos da adesão ao Programa de Demissão Voluntária, da costureira que organizou oficina na garagem de sua casa, do sapateiro que atende em uma pequena banca de bairro. Enfim, as possibilidades são infindáveis. E mais: não podemos esquecer que as entidades civis sem fins lucrativos e associações beneficentes também são pessoas jurídicas. Ora, poderemos rejeitar a possibilidade de serem hipossuficientes? Me parece que não.” 

Segunda conclusão: 

Os Defensores Públicos não precisam estar inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para desempenhar suas funções institucionais. STF. Plenário. ADI 4636/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/11/2021 (Info 1036). 

A diferença entre a atuação de um advogado particular e a de um defensor público é perceptível inclusive antes do advento da EC 80/2014. O primeiro, em ministério privado, tem por incumbência primordial a defesa dos interesses pessoais do cliente. O segundo, detentor de cargo público, tem por escopo principal assegurar garantia do amplo acesso à justiça ao assistido, não sendo legitimado por qualquer interesse privado. Tais características não afastam, obviamente, a prestação de serviço público e exercício de função social pelo advogado, tampouco dispensa o defensor do interesse pessoal do assistido. A função dos membros da Defensoria Pública é, evidentemente, marcada pela impessoalidade, porquanto o assistido não escolhe seu defensor, tampouco o remunera diretamente, estando vinculados pelas normas de Direito Público. Ao contrário do cliente, que gratifica o trabalho feito com honorários, tendo poder de escolha sobre o profissional de sua preferência, trazendo à função do advogado feição personalíssima. Além disso, advogados podem escolher suas causas e seus clientes ao passo que Defensores Públicos estão adstritos às funções institucionais, não podendo, de forma alguma, atuar fora delas ou receber honorários. Sendo assim, com direitos, deveres e prerrogativas tão diversos, não se pode submeter os defensores públicos a dois regimes administrativos diferentes. A capacidade postulatória do Defensor Público decorre de nomeação e posse no cargo. Os Defensores Públicos não são advogados públicos, pois possuem regime disciplinar próprio e têm sua capacidade postulatória decorrente diretamente da Constituição em seção à parte no texto constitucional. A LC 80/94, atualizada pela LC 132/2009, em nenhum momento determina que os Defensores Públicos se inscrevam ou permaneçam filiados aos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. Sendo lei especial e posterior à Lei nº 8.906/94, nada impede que ela dispense os Defensores Públicos da inscrição na OAB para o exercício de suas funções. 

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