8 de janeiro de 2022

Ação de controle concentrado de constitucionalidade não pode ser utilizada como sucedâneo das vias processuais ordinárias

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/12/info-1034-stf.pdf


CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE Ação de controle concentrado de constitucionalidade não pode ser utilizada como sucedâneo das vias processuais ordinárias 

Caso concreto: partido político ajuizou ADPF alegando que determinados discursos, pronunciamentos e comportamentos do Presidente da República, de Ministros de Estado e de outros integrantes do alto escalão do Poder Executivo federal representariam violação de preceitos fundamentais do Estado Democrático de Direito e do direito à saúde. O autor pediu “que o Presidente da República, bem como todos os seus Ministros e auxiliares imediatos pautem doravante seus atos, práticas, discursos e pronunciamentos em conformidade com os princípios constitucionais suprareferidos.” O STF não conheceu da ADPF. Na ação, o partido pede, em síntese, que o STF profira comando judicial para que o Presidente da República e seus auxiliares cumpram a Constituição. Ocorre que isso já é óbvio. À luz do constitucionalismo contemporâneo, não há qualquer dúvida de que a supremacia constitucional é o postulado sobre o qual se assenta a validade de todos os atos estatais. Mostra-se inócua e desprovida de qualquer utilidade provocar o Poder Judiciário objetivando, única e exclusivamente, declarar que as autoridades públicas estão sujeitas à ordem constitucional. Em um Estado Democrático de Direito, como o Brasil, nenhum ato jurídico pode ser praticado validamente à margem da Constituição. Transgressões aos princípios e regras constitucionais praticadas por autoridades públicas ou particulares, quando ocorrem, exigem a intervenção judicial, em caráter preventivo ou repressivo, diante de situações concretas e específicas, e não por meio de uma ação de controle concentrado de constitucionalidade. STF. Plenário. ADPF 686/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 18/10/2021 (Info 1034). 

A situação concreta foi a seguinte: 

O PSOL ajuizou ADPF alegando que determinados discursos, pronunciamentos e comportamentos do Presidente da República, de Ministros de Estado e de outros integrantes do alto escalão do Poder Executivo federal representariam violação de preceitos fundamentais do Estado Democrático de Direito e do direito à saúde. O partido argumentou que as autoridades reclamadas teriam feito declarações ou participado de manifestações de caráter antidemocrático contra o Congresso Nacional e o STF e que o Presidente da República estaria descumprindo o papel reservado à União na articulação e formulação das políticas públicas de enfrentamento da pandemia da COVID-19. O autor alegou, portanto, que as condutas praticadas traduzem atos do poder público lesivos aos preceitos fundamentais relativos ao Estado Democrático de Direito e à proteção da saúde humana enquanto direito de todos e dever do Estado, assegurados nos arts. 1º, caput, 196 e 197 da CF/88. Ao final, o partido pediu “que o Presidente da República, bem como todos os seus Ministros e auxiliares imediatos pautem doravante seus atos, práticas, discursos e pronunciamentos em conformidade com os princípios constitucionais suprareferidos.” 

O que o STF decidiu? O mérito da ADPF foi apreciado? NÃO. 

Inépcia da inicial 

O STF entendeu que a petição inicial não preencheu os elementos mínimos necessários à veiculação de uma pretensão de natureza judicial. Na ação, o partido pede, em síntese, que o STF profira comando judicial para que o Presidente da República e seus auxiliares cumpram a Constituição Federal. Ocorre que isso já é óbvio. À luz do constitucionalismo contemporâneo, não há qualquer dúvida de que a supremacia constitucional é o postulado sobre o qual se assenta a validade de todos os atos estatais. A Constituição brasileira prevê expressamente que o Brasil é um “Estado Democrático de Direito” (art. 1º, caput). Desse modo, mostra-se inócua e desprovida de qualquer utilidade provocar o Poder Judiciário objetivando, única e exclusivamente, declarar que as autoridades públicas estão sujeitas à ordem constitucional. Em um Estado Democrático de Direito, como o Brasil, nenhum ato jurídico pode ser praticado validamente à margem da Constituição, pois, no âmbito do seu espaço territorial, ninguém está imune à observância da ordem constitucional brasileira. Transgressões aos princípios e regras constitucionais praticadas por autoridades públicas ou particulares, quando ocorrem, exigem a intervenção judicial, em caráter preventivo ou repressivo, diante de situações concretas e específicas, e não por meio de uma ação de controle concentrado de constitucionalidade. 

Controle abstrato 

As ações de controle normativo abstrato, como é o caso da ADPF, instauram processo de fiscalização objetiva de constitucionalidade de leis e atos normativos. A natureza jurídica dos processos de índole objetiva não se mostra compatível com a análise aprofundada de fatos envolvendo supostas práticas ilícitas, atos de improbidade administrativa ou infrações criminais imputadas a particulares, servidores públicos ou autoridades políticas. A jurisdição constitucional prestada por meio do processo de controle concentrado de constitucionalidade tem por objeto verificar apenas a validade formal ou material de leis e atos administrativos dotados dos atributos da generalidade, impessoalidade e abstração, por isso o seu caráter objetivo. Desse modo, mostra-se inviável, no âmbito da ADPF, a apuração de supostos ilícitos penais ou violações funcionais praticados pelo Presidente, Ministros ou outros auxiliares. Nessa linha de entendimento, o processo de fiscalização normativa abstrata não pode ser utilizado como indevido sucedâneo alternativo às vias processuais ordinárias. 

Em suma: Ação de controle concentrado de constitucionalidade não pode ser utilizada como sucedâneo das vias processuais ordinárias. STF. Plenário. ADPF 686/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 18/10/2021 (Info 1034). 

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, não conheceu de arguição de descumprimento de preceito fundamental ajuizada em face de discursos, pronunciamentos e comportamentos, ativos e omissivos, atribuídos ao Presidente da República, a ministros de Estado e a integrantes do alto escalão do Poder Executivo federal. Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Edson Fachin.

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