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7 de julho de 2021

Regime geral de previdência social - RGPS. Art. 112 da Lei n. 8.213/1991. Âmbito de aplicação. Ação revisional de aposentadoria de segurado falecido e de pensão por morte. Ausência de iniciativa do segurado em vida. Legitimidade ativa de pensionistas e sucessores. Ordem de preferência. Diferenças devidas e não pagas

Processo

REsp 1.856.967-ES, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 23/06/2021, DJe 28/06/2021. (Tema 1057)

Ramo do Direito

DIREITO PREVIDENCIÁRIO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Regime geral de previdência social - RGPS. Art. 112 da Lei n. 8.213/1991. Âmbito de aplicação. Ação revisional de aposentadoria de segurado falecido e de pensão por morte. Ausência de iniciativa do segurado em vida. Legitimidade ativa de pensionistas e sucessores. Ordem de preferência. Diferenças devidas e não pagas. Tema 1057.

 

Destaque

(I) O disposto no art. 112 da Lei n. 8.213/1991, segundo o qual "o valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento", é aplicável aos âmbitos judicial e administrativo;

(II) Os pensionistas detêm legitimidade ativa para pleitear, por direito próprio, a revisão do benefício derivado (pensão por morte) - caso não alcançada pela decadência -, fazendo jus a diferenças pecuniárias pretéritas não prescritas, decorrentes da pensão recalculada;

(III) Caso não decaído o direito de revisar a renda mensal inicial do benefício originário do segurado instituidor, os pensionistas poderão postular a revisão da aposentadoria, a fim de auferirem eventuais parcelas não prescritas resultantes da readequação do benefício original, bem como os reflexos na graduação econômica da pensão por morte; e

(IV) À falta de dependentes legais habilitados à pensão por morte, os sucessores (herdeiros) do segurado instituidor, definidos na lei civil, são partes legítimas para pleitear, por ação e em nome próprios, a revisão do benefício original - salvo se decaído o direito ao instituidor - e, por conseguinte, de haverem eventuais diferenças pecuniárias não prescritas, oriundas do recálculo da aposentadoria do de cujus.

Informações do Inteiro Teor

A legislação processual civil desautoriza, como regra, a postulação de pretensão vinculada a direito alheio, ressalvada previsão no ordenamento jurídico.

Na seara do direito da seguridade social, a concessão e a renúncia a benefício previdenciário, é cediço, constituem direitos intuito personae, cuja disposição se atribui, unicamente, ao segurado titular.

É personalíssima, ainda, a renúncia promovida pelo beneficiário titular com o objetivo de obter benefício mais vantajoso, no Regime Geral da Previdência Social - RGPS ou em regime próprio de Previdência, segundo compreensão sedimentada em precedente dotado de eficácia vinculante (Primeira Seção, REsp 1.334.488/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 27/03/2019, DJe 29/05/2019).

Outrossim, consolidou-se, igualmente em sede de recurso especial submetido à sistemática repetitiva, a intransmissibilidade de benefícios assistenciais, uma vez que, "pela ausência de contribuição prévia, são personalíssimos e, portanto, intransferíveis aos dependentes" (Primeira Seção, REsp 1.648.305/RS, Rel. p/ acórdão Min. Regina Helena Costa, j. 22/08/2018, DJe 26/09/2018).

Isso considerado, verifica-se que o objeto da ação revisional , limitada a formular pedido de readequação de benefícios previdenciários já concedidos - no caso, aposentadoria e/ou pensão por morte -, distancia-se, largamente, de tais hipóteses impeditivas, porquanto nela não se articula pretensão vinculada a direito privativo, cujo exercício demandaria a manifestação de vontade do então titular da prestação previdenciária originária.

Noutras palavras, a revisão judicial de benefício é vocacionada a provocar apenas a implementação de ajustes nos valores da prestação previdenciária, incapaz, ipso facto, de afetar o direito primário, de índole personalíssima.

A rigor, incorporado o benefício ao patrimônio jurídico do segurado titular por regular ato de concessão, eventuais alterações dos parâmetros da outorga, indutores de reflexos financeiros, descolam-se da esfera da titularidade exclusiva do segurado, assumindo natureza puramente econômica, e, por conseguinte, passíveis de transferência a terceiros legitimados.

Daí porque, partindo-se dessa decisiva distinção ontológica, afirma-se que "os sucessores não têm legitimidade para pleitear direito personalíssimo, não exercido pelo instituidor da pensão (renúncia e concessão de outro benefício), o que difere da possibilidade de os herdeiros pleitearem diferenças pecuniárias de benefício já concedido em vida ao instituidor da pensão (art. 112 da Lei n. 8.213/1991)" (Segunda Turma, AgRg no AREsp 492.849/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães, j. 09/06/2016, DJe 21/06/2016).

Com efeito, o art. 112 da Lei n. 8.213/1991, a par de dispensar pensionistas e sucessores de se submeterem a arrolamento ou inventário, investe-lhes de legitimidade processual para intentar ação revisional da aposentadoria do falecido segurado e da pensão por morte dela resultante, permitindo-lhes, como corolário, auferirem eventuais diferenças pecuniárias devidas e não prescritas, porém não pagas ao de cujus, sem subordinar o exercício do direito de ação a nenhuma iniciativa, judicial ou administrativa, do segurado em vida.

De fato, além da ausência de imposição expressa de outras condicionantes no texto legal enfocado, é inegável que embaraçar ou dificultar o direito de os legitimados buscarem valores devidos ao instituidor do benefício abre espaço para eventual - e indesejável - enriquecimento sem causa da Administração.

Por isso, consoante orientação jurisprudencial deste Superior Tribunal, ao perseguir a revisão da renda mensal da aposentadoria para que repercuta no cálculo da pensão por morte, o "pensionista que busca em juízo diferenças no benefício já em manutenção, ao qual tem direito, pleiteia em nome próprio direito próprio, não havendo que se cogitar de ofensa ao art. 6º do CPC (atual art. 18)" (Segunda Turma, AgRg no REsp n. 1.576.207/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 10/03/2016, DJe 16/03/2016).

Anote-se, por oportuno, que a legitimidade ativa de pensionistas para ajuizar ação revisional previdenciária foi adotada como premissa à conclusão alcançada pela Primeira Seção acerca da forma de contagem do prazo decadencial de revisão da aposentadoria e da pensão por morte. (EREsp 1.605.554/PR, Relatora p/ acórdão Ministra Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 27/02/2019, DJe 02/08/2019)

Nesse contexto, os dependentes habilitados à pensão por morte, e, na falta deles, os sucessores civilmente definidos, detêm legitimidade para figurarem no polo ativo de ação previdenciária revisional, ajuizada com o escopo de revisar, conforme o caso, a aposentadoria do de cujus (benefício originário) e/ou a pensão por morte dela decorrente (benefício derivado), bem como de perceberem as diferenças pecuniárias resultantes da readequação de ambos os benefícios, independentemente de iniciativa do titular em vida, e observada eventual ocorrência de decadência e de prescrição.




24 de junho de 2021

A matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais.

Processo

AREsp 1.273.046-RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 08/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Compensação ou restituição de indébitos. Relação jurídico-tributária de filial. Matriz. Legitimidade ativa.

 

Destaque

A matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais.

Informações do Inteiro Teor

Na origem, trata-se de mandado de segurança, objetivando que a autoridade impetrada se abstivesse de cobrar a Contribuição para o Seguro Acidente de Trabalho (SAT) com base em alíquota apurada de acordo com a atividade preponderante da empresa como um todo e permitisse o recolhimento dessa contribuição com base em alíquotas aferidas de acordo com a atividade preponderante em cada estabelecimento.

No caso, o Tribunal a quo estabeleceu que a matriz e cada filial deveriam, individualmente, buscar o Poder Judiciário, com vistas a obter declaração do direito de se enquadrar em alíquota diversa da que vinha lhe sendo atribuída.

A sucursal, a filial e a agência não têm um registro próprio, autônomo, pois a pessoa jurídica como um todo é que possui personalidade, sendo ela sujeito de direitos e obrigações, assumindo com todo o seu patrimônio a correspondente responsabilidade

As filiais são estabelecimentos secundários da mesma pessoa jurídica, desprovidas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, apesar de poderem possuir domicílios em lugares diferentes (art. 75, § 1º, do CC) e inscrições distintas no CNPJ.

O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas somente autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, não abarcando a autonomia jurídica, já que existe a relação de dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz.

Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais.


7 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Legitimidade - Antonio do Passo Cabral

Como pertine ao exercício de um poder jurídico, o ordenamento remete a legitimidade à específica situação concreta onde tal poder será exercido. Se a legitimidade é um atributo transitivo, verificado em relação a um determinado estado de fato, pensamos que, a partir do conceito de situação legitimante, enquadrado no pano de fundo da relação processual dinâmica, é possível reduzir a análise da legitimidade a certos momentos processuais específicos, vale dizer, não mais um juízo de pertinência subjetiva da demanda (a legitimatio ad causam), mas referente ao ato processual específico (a legitimatio ad actum). Em razão do dinamismo da relação processual, é só na sua verificação casuística que a legitimidade encontra sua completa e mais pura finalidade. Se a função desse limite subjetivo ao exercício de funções processuais é analisar a correspondência entre o modelo legal e a situação de fato, a legitimidade só pode ser precisa em cada caso concreto e para cada ato processual. Como afirma Fazzalari, a par das discussões sobre a abstração ou concretude da ação, devemos reputar que a situação material pretérita deve ser abstraída quando da análise dos atos processuais, e estes não pressupõem necessariamente a relação material. A situação substancial é relevante como pressuposto de alguns atos processuais, mas não todos, e a ela se juntam outros requisitos processuais definidores de situações legitimantes não necessariamente vinculadas a um direito subjetivo ou a uma relação jurídica material. Na verdade, a colocação dos atos em seqüência faz com que, com exclusão do primeiro ato da série, cada ato processual dependa, para ser praticado, de requisitos e pressupostos que somente poderão ser corretamente compreendidos a partir da análise da cadeia formativa dos atos anteriores e da múltipla e difusa implicação entre eles. Além disso, as situações legitimantes são todas cambiantes ao longo do processo, e o controle da legitimidade não pode se dar senão na dinâmica do contraditório. 


CABRAL, Antonio do Passo. Legitimidade e despolarização da demanda in Revista da AJUFE, São Paulo, v. 25, n. 92, jan./jun. 2012., p. 288/289. 

6 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Legitimidade - Athos Gusmão Carneiro

 “consiste a legitimação para a causa na coincidência entre a pessoa do autor a quem, em tese, a lei atribui a titularidade da pretensão deduzida em juízo, e a coincidência entre a pessoa do réu e a pessoa contra quem, em tese, pode ser oposta tal pretensão”. 

Dito de outra maneira: 

Assim, no exame da legitimação da causa, cumpre partir de uma hipótese: se verdadeiros os fatos jurígenos afirmados na inicial, é o autor o titular da pretensão? E figura como ré a pessoa sujeita à mesma pretensão? Se a resposta a ambas as indagações for positiva, a demanda corre entre partes legítimas para a causa. 


CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 25/26. 

5 de maio de 2021

SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO REPARATÓRIA CONTRA EX-ADMINISTRADORES. AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLÉIA GERAL. ART. 159 DA LEI 6.404/76. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO AFASTADA. POSSIBILIDADE DE SANAÇÃO DA "LEGITIMATIO AD PROCESSUM". ART. 13 DO CPC/73. PRECEDENTE ESPECÍFICO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.778.629 - RS (2017/0114145-2) 

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO REPARATÓRIA CONTRA EX-ADMINISTRADORES. AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLÉIA GERAL. ART. 159 DA LEI 6.404/76. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO AFASTADA. POSSIBILIDADE DE SANAÇÃO DA "LEGITIMATIO AD PROCESSUM". ART. 13 DO CPC/73. PRECEDENTE ESPECÍFICO. 

1. A nulificação do acórdão recorrido por afronta ao art. 398 do CPC/73 depende da destacada influência do documento tardiamente acostado para a fundamentação da decisão que se pretende desconstituir. 

2. Plena a ciência da parte em relação ao teor do referido documento, pois a ata de assembleia fora por ela própria assinada. 

3. A ação social reparatória (ut universi) ajuizada pela sociedade empresária contra ex-administradores, na forma do art. 159 da Lei 6.404/76, depende de autorização da assembléia geral ordinária ou extraordinária, atendidos os requisitos legais. Precedente específico. 

4. Em se tratando de capacidade para estar em juízo (legitimatio ad processum), eventual irregularidade pode vir a ser sanada após o ajuizamento da ação, impondo-se que se oportunize a regularização na forma do art. 13 do CPC/73. 

5. Caso concreto em que a ata da assembleia, dando conta da autorização, foi acostada aos autos, demonstrando-se a capacidade para estar em juízo e, assim, permitindo-se o prosseguimento da ação reparatória. 

6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, dando provimento ao recurso especial, por maioria, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 06 de agosto de 2019(data do julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por EUNICE ROTTA BERGESCH, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do inciso III do art. 105 da CF, contra o acórdão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, cuja ementa está assim redigida: 

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA CONTRA EX- ADMINISTRADORA. Tratando-se de demanda ajuizada contra ex-administradora desnecessária a deliberação da assembleia, por ausência de previsão legal. Inaplicação do art. 159 da lei 6404/76. Caso de desconstituição da decisão prolatada para o retorno dos autos à origem e regular prosseguimento do feito. Apelo provido; sentença desconstituída. Prejudicado apelo da ré. 

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados. 

Em suas razões recursais, sustentou, além do dissídio, a afronta aos arts. 159 da LSA, 398 do CPC/73 (437, §1º, do CPC/15) e ao art. 5º, LV, da CF. Disse nulo o acórdão pois prolatado com base em documento novo juntado pela parte contrária sem que oportunidade de prévia manifestação fosse dada à recorrente no que lhe pertine. 

Referiu que a juntada do documento sem seus anexos (voto dissidente e parecer do Conselheiro Fiscal) e acaso cumprido o art. 398 do CPC/73 teria possibilitado à recorrente demonstrar à Câmara que houve protesto com relação à abusiva deliberação. Disse que o fato de ser secundária a relevância do documento não altera ter sido ele considerado e que, assim, fora violada a legislação disciplinante. 

Por outro lado, aduziu que para o ajuizamento da ação social uti singuli é necessária a deliberação assemblear, impondo-se manter a decisão do magistrado de primeiro grau que extinguiu a ação, já que inexistente referida deliberação. Destacou que a interpretação literal e simplista do art. 159 da lei 6.404/76 levada a efeito pelo acórdão recorrido não é corroborada pela doutrina ou jurisprudência, sendo irrelevante serem, os réus são, ex-administradores. Inexiste, assim, interesse processual, seja pelo que dispõe o art. 159, seja porque se desobedeceu decisão assemblear no sentido da oitiva dos ex-administradores antes que fosse tomada qualquer medida, estando os atuais administradores a abusar da personalidade jurídica da sociedade. Pediu o provimento do recurso. 

Houve contrarrazões, sustentando-se não ter sido imprescindível para o deslinde da controvérsia o documento acostado pelo ora recorrido, não havendo falar em nulidade a ser declarada e, por outro lado, afirmou que a ação de responsabilidade civil de uma companhia contra ex-administrador não exige delibração assemblear, mas, ainda assim, providenciou que o tema fosse deliberado em Assembleia Geral, tendo restado aprovado por ampla maioria, inclusive com a presença da ora Recorrente. Ademais, disse que deveria ser oportunizada, eventualmente, a regularização dessa situação, com fulcro no art. 13 do CPC (art. 76 do CPC/15). Pediu o desprovimento.

 O recurso especial não foi admitido na origem. 

Interposto agravo em recurso especial, a presidência desta Corte dele não conheceu. 

Opostos aclaratórios, foram rejeitados. 

Manejado agravo interno a mim distribuído, dele conheci para, em juízo de retratação, tornar sem efeito a decisão e dar provimento ao agravo, determinando a sua conversão. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (Relator): Eminentes Colegas. Duas são as questões devolvidas ao conhecimento desta Corte Superior no presente recurso especial: 

a) a existência de nulidade do acórdão recorrido tendo em vista a juntada de documento em sede recursal do qual não teria sido oportunizada vista ao ora recorrente; 

b) a necessidade ou não de autorização assemblear para o ajuizamento de ação de responsabilidade civil em nome da pessoa jurídica contra seus ex-administradores. 

Antes de tudo, a alegação de afronta a dispositivo constitucional (art. 5º da CF) é de todo imprópria em sede de recurso especial e, assim, não será conhecida, já que não se insere na competência atribuída a esta Corte pelo art. 105, inciso III, da CF. 

1. Alegação de nulidade do acórdão recorrido: 

Inicio com a alegada afronta ao disposto no art. 398 do CPC/73, a qual, entendo, deve ser superada. 

Para a declaração de nulidade da decisão judicial tendo em conta pretensa ausência de oportunidade de manifestação acerca de documento juntado por uma das partes em sede recursal, é de suma importância a relevância do referido dentro da fundamentação da decisão que se pretende ver anulada e, ainda, em conformidade com específico precedente desta Terceira Turma, é mister a inciência da parte que teria visto seu direito de manifestação cerceado acerca do conteúdo do documento tardiamente acostado. 

O documento aqui referido é a ata de assembleia geral em que se teria autorizado a sociedade empresária demandante a ajuizar a ação de responsabilização de ex-administrador, documento este que, pela sua falta, fundamentara a extinção da ação pelo juízo sentenciante, isso em 03/10/2013. 

Apesar de, em tese, consubstanciar documento de suma relevância tendo em conta a sentença prolatada, o que comanda a possibilidade de desconstituição do acórdão recorrido é, como já referido, a importância do documento na fundamentação desta decisão. 

A relevância, todavia, perde espaço, pois na interpretação da lei levada a efeito pelo órgão julgador, a ausência do documento desde o início da ação seria irrelevante, pois desnecessária a autorização assemblear para o ajuizamento de ação de responsabilização de ex-administradores no sentir dos julgadores do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (fl. 701 e-STJ). 

Desimportara, pois, para a Câmara julgadora a existência do documento, razão porque efetivamente não há falar em nulidade no aresto recorrido. 

Por outro lado, colhe-se precedente específico desta Terceira Turma, sob a relatoria da e. Min. Nancy Andrighi, que, resumindo o tratamento jurisprudencial e doutrinário dado à questão, estabelecera: 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. OFENSAS DE MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO (PROMOTOR DE JUSTIÇA) DIRIGIDAS À MEMBRO DO PODER JUDICIÁRIO (DESEMBARGADOR). ATO DOLOSO. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE PASSIVA. OCORRÊNCIA DE ATO ILÍCITO. DANO MORAL. ARTIGOS ANALISADOS: 20, § 3º, 85 e 398 DO CPC e 186 e 944 DO CC/02. (...) 5. No intuito de evitar declarações de nulidade sem a ocorrência de prejuízo efetivo, a construção pretoriana tem também delineado que, para se exigir o contraditório, i) o documento deve ser desconhecido da parte contrária; ii) precisa guardar relevância e pertinência com o deslinde da controvérsia, influindo de forma direta e determinante em sua solução; e iii) seu conteúdo não deve se limitar a mero reforço de argumentação (v.g., decisões ou acórdãos que julgaram situações semelhantes). Hipótese em que o documento juntado aos autos, não obstante a falta de contraditório imediato, era conhecido do recorrente e, ademais, não foi determinante para solução da controvérsia. (...) 10. Recurso especial provido em parte. (REsp 1435582/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 11/09/2014) 

Bem se vê que a ciência da ora recorrente acerca do teor do referido documento também é fundamento para o afastamento da alegação de afronta ao art. 398 do CPC/73. Aliás, referida ciência fora reconhecida no próprio acórdão recorrido, pontuando a Colenda Câmara julgadora que "foi juntada ao processo a ata de Assembléia geral ordinária e extraordinária de nº 104, realizada em 12.05.2014, também subscrita pela ré ratificando o ato da nova diretoria em promover esta ação e outras tantas que ainda estão em andamento igualmente propostas pela empresa (fls. 436/445)." 

Não há, assim, em face dos fatos destacados, falar em nulidade do processo/aresto por pretenso descumprimento ao art. 398 do CPC/73. 

2. Autorização assemblear e regularização da capacidade para estar em juízo: 

Remanesce, então, a alegação de afronta ao disposto no art. 159 da Lei 6.404/76. 

A parte recorrente sustenta que a interpretação do referido dispositivo permite concluir pela necessidade de autorização assemblear para o ajuizamento de ação indenizatória pela sociedade empresária em relação a administradores e ex-administradores. 

Esta Corte Superior já tivera a oportunidade de reconhecer que, apesar de a ação necessitar de autorização assemblear também em relação a ex-administradores, é plenamente possível a sanação da irregularidade na forma do art. 13 do CPC/73: 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO DA COMPANHIA CONTRA EX-ADMINISTRADORES E EX-GERENTES. NECESSIDADE DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DA ASSEMBLÉIA GERAL. ART. 159 DA LEI 6.404/76. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO AFASTADA. ART. 13 DO CPC. MULTA APLICADA AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO AFASTADA. ENUNCIADO N. 98 DA SÚMULA DO STJ. A sociedade anônima tem legitimidade para o ajuizamento da ação de responsabilidade contra seus ex-administradores e ex-gerentes pelos eventuais desmandos por eles praticados. Todavia, para tanto, exige o art. 159 da Lei das S/A que a assembléia geral delibere acerca da propositura da ação. A extinção do processo sem julgamento do mérito, sem prévia oportunidade de regularização da capacidade processual, importa violação do art. 13 do CPC. Nos termos do enunciado n. 98 da Súmula do STJ, os "embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório". Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. (REsp 157.579/RS, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 12/09/2006, DJ 19/03/2007, p. 353) 

A orientação fora traçada nos idos de 2006, razão porque estou a trazer a questão novamente a este Colegiado de modo a reafirmar-se o entendimento de outrora, até mesmo no que toca à sanabilidade da referida irregularidade (ausência de capacidade para estar em juízo). 

O art. 159 da Lei 6.404/76 estabelece requisito de procedibilidade para o ajuizamento de ação indenizatória pela sociedade empresária em face dos administradores, consistente na específica autorização assemblear. 

Este o inteiro teor da norma: 

Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembléia-geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio. § 1º A deliberação poderá ser tomada em assembléia-geral ordinária e, se prevista na ordem do dia, ou for conseqüência direta de assunto nela incluído, em assembléia-geral extraordinária. § 2º O administrador ou administradores contra os quais deva ser proposta ação ficarão impedidos e deverão ser substituídos na mesma assembléia. § 3º Qualquer acionista poderá promover a ação, se não for proposta no prazo de 3 (três) meses da deliberação da assembléia-geral. § 4º Se a assembléia deliberar não promover a ação, poderá ela ser proposta por acionistas que representem 5% (cinco por cento), pelo menos, do capital social. § 5° Os resultados da ação promovida por acionista deferem-se à companhia, mas esta deverá indenizá-lo, até o limite daqueles resultados, de todas as despesas em que tiver incorrido, inclusive correção monetária e juros dos dispêndios realizados. § 6° O juiz poderá reconhecer a exclusão da responsabilidade do administrador, se convencido de que este agiu de boa-fé e visando ao interesse da companhia. § 7º A ação prevista neste artigo não exclui a que couber ao acionista ou terceiro diretamente prejudicado por ato de administrador. 

Tem-se no referido dispositivo, pois, duas modalidades de ações de reparação: 

a) a ação social exercida pela pessoa jurídica (ut universi) ou, excepcionalmente, pelos acionistas (ut singuli); 

b) a ação individual (§7º), que é exclusiva dos acionistas diretamente prejudicados. 

As ações sociais variam, ainda, de acordo com a legitimidade extraordinária atribuída aos sócios para atuar em nome da pessoa jurídica, sendo ação social ut singuli derivada, quando autorizado o ajuizamento pela assembleia e inerte a pessoa jurídica pelo prazo de 3 meses; e ação social ut singuli originária quando não autorizado o ajuizamento pela aseembleia, mas os acionistas que reúnem 5% do capital social resolvem ajuizá-la. 

ALFREDO LAMY FILHO e JOSÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA lecionam acerca da presente questão (in A Lei das S.A., vol. II, Renovar, 1996, p. 408/409): 

"A redação do art. 159 da lei de sociedades por ações deixa evidente que o acionista da companhia não tem ação contra os administradores para obter reparação dos chamados 'prejuízos indiretos'. Se o patrimônio da companhia sofre prejuízo por efeito de ato ilícito de administrador ou de terceiro, a ação para haver indenização compete à companhia, como pessoa jurídica titular do patrimônio que sofreu o dano e deve receber a reparação. Somente negando a existência da personalidade distinta da companhia seria possível atribuir a cada acionista ação para haver, do administrador ou de terceiro, a sua quota-parte ideal no prejuízo causado ao patrimônio da companhia: a reparação do patrimônio social seria substituída pela reparação dos patrimônios dos acionistas que promovessem ações de indenização. No regime da lei somente existem, portanto, dois tipos de ação: a) a ação social, cujo fundamento é o prejuízo causado ao patrimônio da sociedade e que pode ser proposta pela companhia ou (observados os requisitos da lei) pelo acionista, como substituto processual da companhia; e b) a ação individual, cujo fundamento é o prejuízo causado diretamente ao patrimônio do acionista. 

Trata-se, no presente caso, de ação social (ut universi) de reparação de danos, ajuizada, pois, pela sociedade empresária contra ex-administradora, Sra. Eunice Rota Bergesch, visando ao ressarcimento de valor de R$ 350.576,17 em face do pagamento de serviço de vigilância da residência da ré pela sociedade empresária. 

Porque ajuizada em nome do ente coletivo para o ressarcimento dos seus prejuízos, a sociedade empresária depende de prévia autorização da assembleia geral (ou, excepcionalmente, assembleia extraordinária uma vez satisfeitos os requisitos do §1º do art. 159), para que possa demandar em juízo os seus administradores. 

Relembro antigo precedente desta Corte Superior a tratar da responsabilidade de ex-administradores de sociedade anômina em que se reconheceu aplicar, sem ressalvas, o art. 159 da Lei 6.404/76: 

PROCESSO CIVIL E COMERCIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO SOCIAL ORIGINÁRIA. ART. 159, LEI 6.404/76. RESPONSABILIDADE DOS EX-DIRETORES. DOUTRINA. APURAÇÃO FUNDADA NO CONJUNTO PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE NA VIA DO RECURSO ESPECIAL. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA. ATOS ILÍCITOS. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. ENUNCIADO Nº 54 DA SÚMULA/STJ. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. CONDENAÇÃO DE TRÊS DOS RÉUS. APLICAÇÃO DO ART. 20, § 3º, CPC. PEDIDO IMPROCEDENTE EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO. APRECIAÇÃO EQÜITATIVA. ART. 20, § 4º, CPC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) II - A "ação social originária", segundo a boa doutrina, é ajuizada pela companhia contra seus (ex-)administradores, com o fim de obter o ressarcimento de prejuízo causado ao patrimônio social, seja por terem agido com culpa ou dolo, seja por terem violado a lei ou o estatuto. Em se tratando de responsabilidade extracontratual, portanto, como no caso, é de ser aplicado o enunciado sumular nº 54/STJ, para que os juros fluam desde a data dos atos ilícitos atribuídos a cada um dos diretores. (...) (REsp 279.019/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 13/03/2001, DJ 28/05/2001, p. 202) 

O relator, Min. Sálvio de Figueiredo, àquela assentada asseverou: "A "ação social originária", na expressão de Osmar Brina Corrêa Lima (Sociedade Anônima, v. 2, Belo Horizonte: Del Rey, 1994, cap. 10, nº 15, p. 135), é ajuizada pela companhia contra seus ex-administradores, com o fim de obter o ressarcimento de prejuízo causado ao patrimônio social, seja por terem agido com culpa ou dolo, seja por terem violado a lei ou o estatuto." 

Esta Terceira Turma, sob a relatoria da Min. Nancy Adrighi, no REsp 736.189/RS, julgado em 06/12/2007, analisou a razão de ser da referida autorização, impondo-se, pela precisão das conclusões, transcrever os fundamentos do voto da relatora: 

Luiz Gastão Paes de Barros Leães, tratando sobre o tema sob a ótica das sociedades anônimas, afirma que “a ação de responsabilidade civil contra o administrador de sociedade anônima compete à companhia. É natural; à sociedade, como pessoa jurídica com aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, é que cabe prioritariamente defender a integridade do seu próprio patrimônio (Lei n. 6.404, de 1976, art. 159). A ação pertence à sociedade e, por isso, qualifica-se com propriedade, de ação social” (A prévia deliberação assemblear como condição de legitimatio ad causam na ação social. In Pareceres. São Paulo: Ed. Singular, v.I, p. 462). A exigência de tal formalidade é justificada nos seguintes termos pela doutrina: “Tratando-se de procedimento da sociedade contra membros da própria administração (que normalmente seria o órgão encarregado da representação processual da sociedade), a lei reserva à assembléia geral – órgão que expressa a vontade social – a competência para decidir sobre a propositura ou não da ação em questão” (Barros Leães, idem, p. 462-463). A formalidade é mais que razoável quando se trata de sociedade anônima, pois ordinariamente há ali uma razoável separação entre a administração da empresa e a titularidade de ações, cisão essa que só é mitigada no nível do conselho de administração. Submetendo-se os administradores exclusivamente ao crivo dos acionistas, confere-se estabilidade à gestão empresarial e resguarda-se o interesse social, de forma a assegurar que a ação de responsabilidade não será meio para a consecução de interesses individuais (no mesmo sentido, vide Nelson Eizirik. Temas de Direito Societário. São Paulo: Renovar, 2005, p. 117). 

Exigir-se também para o ajuizamento da ação contra ex-administradores da companhia a autorização assemblear estaria a resguardar, pois, o interesse social, evitando-se, ainda, a sua utilização como meio para a consecução de interesses individuais. 

No precedente inicialmente citado, da lavrado Min. Asfor Rocha, concluiu a Colenda 4ª Turma que "é a própria companhia que tem legitimidade para o ajuizamento da ação de responsabilidade contra seus ex-administradores e ex-gerentes pelos eventuais desmandos por eles praticados. Todavia, para tanto, exige o art. 159 da Lei das S/A que a assembléia geral delibere acerca da propositura da ação. Assim dispõe a mencionada norma: (...)" 

Arremata, ainda, o Min. Asfor Rocha: Assim, como se vê, é a empresa autora que tem legitimidade para figurar no polo ativo da ação de responsabilidade civil contra os administradores e gerentes. Porém, sua capacidade de postular em juízo está condicionada à autorização da assembléia geral. Também comungo do entendimento do nobre Relator no que tange à necessidade de o egrégio Tribunal de origem dar oportunidade à autora de comprovar a autorização da assembléia geral para o ajuizamento da demanda, antes do decreto de extinção do processo sem julgamento do mérito, conforme determina o art. 13 do CPC, que dispõe: 

O disposto no §2º do art. 159 poderia, é verdade, levar à conclusão diversa, ou seja, poderia fazer concluir que a norma está exclusivamente voltada a administradores e não ex-administradores, pois estabelece como efeito da autorização assemblear o impedimento e substituição dos administradores na mesma assembleia, o que não se poderia aplicar a ex-gestores. 

A propósito: "§2º. O administrador ou administradores contra os quais deva ser proposta ação ficarão impedidos e deverão ser substituídos na mesma assembléia." No entanto, tenho que o dispositivo apenas quis deixar claro que, com a perda da confiança em relação ao administrador demandado, deverá ele ser substituído da administração da companhia, caso esteja na gestão da companhia. 

O parágrafo não diz com a razão de ser da formalidade estipulada no caput, senão erige efeito que "deverá" decorrer do voto de desconfiança em relação ao atual administrador demandado. 

A razão de ser da autorização assemblear, com efeito, é a necessidade de os acionistas reconhecerem, na causa de pedir e no pedido formulados na ação reparatória, interesse coletivo e, assim, coadjuvarem a pretensão de acionamento de administradores atuais ou antigos em nome da sociedade empresária. 

Esta Corte Superior, mais recentemente, aplicou analogicamente o art. 159 da LSA às ações de responsabilidade contra sócios controladores, deixando ver que os seus termos podem vir a alcançar hipóteses que desbordem da literalidade da norma. A propósito: 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA (CPC, ART. 130). NÃO OCORRÊNCIA. SOCIEDADE ANÔNIMA. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRA ADMINISTRADOR (LEI 6.404/76, ART. 159) OU ACIONISTAS CONTROLADORES (APLICAÇÃO ANALÓGICA): AÇÃO SOCIAL UT UNIVERSI E AÇÃO SOCIAL UT SINGULI (LEI 6.404/76, ART. 159, § 4º). DANOS CAUSADOS DIRETAMENTE À SOCIEDADE. AÇÃO INDIVIDUAL (LEI 6.404/76, ART. 159, § 7º). ILEGITIMIDADE ATIVA DE ACIONISTA. RECURSO PROVIDO. 1. O art. 130 do CPC trata de faculdade atribuída ao juiz da causa de poder determinar as provas necessárias à instrução do processo. O julgamento antecipado da lide, no entanto, por entender o magistrado encontrar-se maduro o processo, não configura cerceamento de defesa. 2. Não viola os arts. 459 e 460 do CPC a decisão que condena o réu ao pagamento de valor determinado, não obstante constar do pedido inicial a apuração do valor da condenação na execução da sentença. 3. Aplica-se, por analogia, a norma do art. 159 da Lei n. 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) à ação de responsabilidade civil contra os acionistas controladores da companhia por danos decorrentes de abuso de poder. 4. Sendo os danos causados diretamente à companhia, são cabíveis as ações sociais ut universi e ut singuli, esta obedecidos os requisitos exigidos pelos §§ 3º e 4º do mencionado dispositivo legal da Lei das S/A. 5. Por sua vez, a ação individual, prevista no § 7º do art. 159 da Lei 6.404/76, tem como finalidade reparar o dano experimentado não pela companhia, mas pelo próprio acionista ou terceiro prejudicado, isto é, o dano direto causado ao titular de ações societárias ou a terceiro por ato do administrador ou dos controladores. Não depende a ação individual de deliberação da assembleia geral para ser proposta. 6. É parte ilegítima para ajuizar a ação individual o acionista que sofre prejuízos apenas indiretos por atos praticados pelo administrador ou pelos acionistas controladores da sociedade anônima. 7. Recurso especial provido. (REsp 1214497/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 06/11/2014) 

Outrossim, não fosse o fato de que os atos da sociedade empresária deverem espelhar a vontade dos acionistas e, assim, ser mesmo natural exigir que o instrumento de manifestação desta vontade, a assembleia geral, fosse consultado acerca do ajuizamento da ação reparatória contra ex-administradores, não se deve desprezar o fato de que tenha havido a aprovação das contas dos antigos administradores com o fim de sua gestão. 

Torna-se, também por isso, relevante que a própria assembleia delibere acerca da possibilidade de ajuizar-se ação reparatória em face do administrador que teve as contas por ela aprovadas. 

Finalmente, tenho que não se pode desprezar a análise pragmática e econômica que possa advir do ajuizamento de ação de reparação civil contra administradores e ex-administradores da companhia. 

É que as sociedades anônimas em regra, tem as ações negociadas em bolsa, podendo sofrer algum decaimento na confiança que possuem no mercado em face do ajuizamento de ações reparatórias sociais contra sua administração, atual ou anterior, hipótese que poderia refletir diretamente no valor da companhia, já que a enunciar ao mercado que a sua administração fora falha a ponto de ter causado danos ao ente coletivo. 

Sobre esta possibilidade, Eduardo Secchi Munhoz, ao tratar dos percalços da ação social ut singuli originária ou derivada, destaca: 

A evidência empírica indica que o ajuizamento de ação judicial, em geral, resulta em queda do valor das ações da Companhia e, mais, que o eventual julgamento de sua procedência não resulta em proporcional valorização (Ferris, Prichtard, 2001). A percepção do mercado de que o controlador (ou administrador) age de forma abusiva pode gerar a perda de confiança dos investidores, com efeito negativo sobre a cotação das ações superior ao valor do dano concretamente causado ao seu patrimônio pelo ato lesivo por ele praticado." (in Lei das S.A. em seus 40 anos, Organização Alberto Venâncio Filho et alii, Ed. Forense, Rio de janeiro: 2016, p. 141) 

Convém lembrar, finalmente, lição de Norma Jonssen Parente que, concluindo pelo alcance do art. 159 da LSA a ex-administradores, ainda assim, faz interessante contra-ponto com base em parecer jurídico contrário da CVM sobre a questão (in Tratado de Direito Empresarial, V. 6, Ed. RT, 2018, item 3.1.1): 

Cabe ressaltar que a lei prevê ação contra administradores, o que levanta a questão de se é necessário o rito do art. 159 para autorizar a propositura de ação de indenização contra ex-administradores. (...) O próprio jurídico da CVM já se manifestou neste sentido no Parecer PJU/CVM 5/2002: Parecer CVM/PJU 5/2002 “1. Ação de responsabilidade civil prevista no art. 159 da Lei 6.404, de 1976, tem aplicação aos administradores ainda investidos de suas atribuições, sendo desnecessária a deliberação assemblear específica prevista no aludido dispositivo no caso de ação de igual natureza a ser promovida pela companhia em face de administradores já destituídos; 2. A decisão pela propositura de ação de responsabilidade civil em face de ex-administradores prescinde de autorização da assembleia por se tratar de ato de mera gestão; 3. Quando efetivamente configurada a hipótese do art. 159 da Lei Societária, e tratando-se de atos irregulares praticados pelos administradores em benefício do acionista controlador, fica este impedido de votar na assembleia que deliberar pela propositura da ação de responsabilidade civil, tendo em vista o evidente conflito de interesses (Lei 6.404, de 1976, art. 115, § l.º); 4. As hipóteses de exercício abusivo do poder de controle previstas em lei (Lei 6.404, de 1976) e em normas regulamentares (Instruc¸a~o CVM 323, de 2000) não têm relevância para o julgamento de ação de responsabilidade civil proposta exclusivamente em face dos administradores e sem a inclusão do controlador, sendo cabível a apuração administrativa dos fatos pela CVM, com vistas à eventual aplicação das penalidades previstas no art. 11 da Lei 6.385, de 1976, tanto em relação aos administradores quanto ao próprio controlador”. O parecer está correto ao afirmar que a propositura da ação é um ato de gestão da companhia. No entanto, a própria lei alçou tal ato à competência da assembleia. A necessidade da prévia aprovação da assembleia exclui o assunto da gestão dos administradores em sua própria proteção, por um lado, e em proteção dos acionistas e da companhia, por outro. Deixar a competência para deliberar sobre a propositura ou não da ação de responsabilidade com a diretoria seria esperar que esta agisse contra seus próprios membros, ou, pior, contra membros do Conselho de Administração, que elegem e destituem os diretores. Exatamente por envolver os gestores da companhia, o assunto foi tirado da alçada deles. Apesar de o art. 159 da Lei das S.A. mencionar administradores, o termo deve ser entendido no sentido de incluir também ex-administradores, já que se cuidará de reparação de danos por quem certamente não estará mais na companhia. Não só aqueles, cujos atos estão sendo discutidos no momento, que a lei determina que serão substituídos na mesma assembleia, como aqueles que saíram antes. Seria um contrassenso excluir do art. 159 o administrador que, pouco antes da assembleia, renunciou ao cargo e só incluir os que ainda estavam em exercício no momento da realização da assembleia. 

Os fatos que podem vir a ser atribuídos à gestão atual ou anterior da sociedade anônima, por sua gravidade, podem, de algum modo, combalir a própria sociedade, razão da pertinência da aplicação do art. 159 da LSA a administradores atuais ou antigos. 

Não deixo de registrar serem absolutamente razoáveis os argumentos em ambos os sentidos, todavia, tenho que bem se estará a preservar os interesses dos acionistas submetendo-se ao corpo social, mediante assembleia, a decisão acerca do ajuizamento de ação de reparação. 

Com isso e finalmente, não deixo de destacar que a eventual possibilidade de o acionista controlador direcionar a deliberação em assembleia, evitando, assim, o ajuizamento da ação existe seja para os administradores atuais, seja para administradores anteriores. 

A lei, no entanto, para contornar esta hipótese, previu que, mesmo em sendo deliberado pela assembleia contrariamente ao ajuizamento da ação, ainda assim, acionistas minoritários poderão, reunindo 5% do capital social, ajuizar a ação reparatória. 

Nesta perspectiva, não fosse a possibilidade de sanação da irregularidade de representação processual, o acórdão recorrido mereceria reforma. 

Analiso, então, a última questão objeto de controvérsia no recurso especial, ou seja, se a autorização assemblear poderá vir a ser realizada e comprovada após o ajuizamento da ação. 

A questão é de legitimidade processual, que, na teoria geral do processo consubstancia um dos pressupostos processuais, ou seja, a deliberação assemblear habilita a sociedade empresária para estar em juízo e pleitear a indenização pelos danos causados à sociedade por seus administradores, atuais e antigos. 

Arruda Alvim, acerca da legitimatio ad processum, relembra: 

Para a validade da relação jurídica processual, de modo a permitir que o juiz possa validamente entrar no mérito do processo, solucionando o conflito de interesses levado a juízo, exige a lei que sejam, as partes, capazes. Por pressuposto processual entende-se a capacidade de estar em juízo, também denominada comumente, pela doutrina tradicional, de legitimação formal (legitimatio ad processum) ou capacidade processual, conceitos que comportam distinção, todavia. Tem capacidade para estar em juízo toda a pessoa que se acha no exercício dos seus direitos (art. 70 do CPC/2015). Assim, aquele que, pelo Direito Civil, tem capacidade de gozo e de exercício de direitos, tem capacidade para estar em juízo. (...) Comumente, a legitimatio ad causam coincide com a legitimidade processual, que, a seu turno, pressupõe a capacidade de estar em juízo (= processual). A legitimação processual é a legitimidade para que as partes atuem em um processo em concreto. Na hipótese de coincidência da legitimação processual com a legitimação ad causam, ambas dirão respeito ao mesmo sujeito ou ente jurídico (= parte). (Manual de Direito processual, 2ª ed. e-book, Ed. RT, 2017, item 5.3) 

Em estando ligada à capacidade de estar em juízo, a autorização assemblear poderia ser sanada na forma do art. 13 do CPC/73 (art. 76 do CPC/15), cujos termos na memória reavivo: 

Art. 13. Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade da representação das partes, o juiz, suspendendo o processo, marcará prazo razoável para ser sanado o defeito. Não sendo cumprido o despacho dentro do prazo, se a providência couber: I - ao autor, o juiz decretará a nulidade do processo; II - ao réu, reputar-se-á revel; III - ao terceiro, será excluído do processo. 

A doutrina processualista, uma vez mais, mais bem aclara essa possibilidade de sanação: 

Arruda Alvim: Ausente a capacidade de estar em juízo e, consequentemente, a legitimidade processual, o juiz deve ensejar sua regularização. No entanto, o prazo fixado pelo juiz, com fulcro no caput do art. 76, do CPC/2015, para regularização das partes, é preclusivo. Não suprida a falta no prazo marcado, incumbe ao juiz declarar extinto o processo sem resolução de mérito, por falta de pressuposto processual. 

Araken de Assis: A capacidade processual constitui requisito de validade da relação processual e sua ausência impede o julgamento do mérito. Não ocorrendo o suprimento de algum defeito, e respeitando ela ao autor, o juiz extinguirá o processo (art. 485, IV), ressalva feita à possibilidade de prover favoravelmente ao adversário (art. 488). (in Processo Civil Brasileiro, Ed. RT., 2015, item 111, subitem 510) 

Esta Corte, no precedente anteriormente citado da lavra do Min. Asfor Rocha, reconhecera a plena possibilidade de ser sanada irregularidade referente à capacidade processual da sociedade anônima que deixa de acostar, com o ajuizamento, a autorização assemblear. 

Na hipótese dos autos, a autorização restou concedida, mesmo que posteriormente ao ajuizamento da ação, e fora acostada em sede recursal, impondo-se, por isso, manter o acórdão recorrido que determinou dar-se continuidade à ação de reparação. Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso especial. 

É o voto. 

VOTO-VISTA VENCIDO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA: 

Trata-se, na origem, de ação de responsabilidade civil cumulada com pedido de reparação de danos ajuizada por IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS S.A. contra EUNICE ROTTA BERGESCH, pessoa física que, tendo exercido diversos cargos de direção no período de 2003 a 2012, com poderes de administração, teria contratado serviços de vigilância para a sua própria residência e alocado as respectivas despesas nas contas da empresa autora, sem a prévia deliberação do Conselho de Administração. 

A autora pede a condenação da parte ré à reparação dos danos que lhe teriam sido causados, equivalentes à quantia de R$ 350.576,17 (trezentos e cinquenta mil quinhentos e setenta e seis reais e dezessete centavos). 

Ante a falta do requisito de que trata o art. 159 da Lei nº 6.404/1976 – prévia deliberação da assembleia-geral – o magistrado de primeiro grau de jurisdição julgou extinto o processo, sem resolução de mérito (art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973). 

Em grau de apelação, a ora recorrida defendeu que é inaplicável o dispositivo legal mencionado por se tratar de demanda ajuizada contra ex-administrador, e, alternativamente, com fundamento no art. 13 do CPC/1973, que lhe fosse concedida a oportunidade de regularizar a sua capacidade processual. 

Porém, antes do julgamento do recurso, a então apelante procedeu à juntada de cópia da Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária nº 104, realizada em 12/5/2014, na qual se teria deliberado pela ratificação dos atos praticados em nome da sociedade empresária – ajuizamento de ações de responsabilidade civil contra os ex-administradores. 

Na sequência, o Tribunal de origem deu provimento ao recurso de apelação e determinou o retorno dos autos à origem para que prosseguisse no julgamento do feito, ficando o respectivo acórdão assim ementado: 

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA CONTRA EX-ADMINISTRADORA. Tratando-se de demanda ajuizada contra ex-administradora desnecessária a deliberação da assembleia, por ausência de previsão legal. Inaplicação do art. 159 da lei 6404/76. Caso de desconstituição da decisão prolatada para o retorno dos autos à origem e regular prosseguimento do feito. Apelo provido; sentença desconstituída. Prejudicado apelo da ré" (e-STJ fl. 488). 

Nos embargos de declaração opostos na origem, a ora recorrente arguiu nulidade em decorrência de suposta inobservância da norma contida no art. 398 do CPC/1973, porque não lhe teria sido concedida oportunidade para se manifestar a respeito do documento novo apresentado pela parte contrária. 

Em virtude da rejeição dos embargos por fundamentação absolutamente genérica, esta Corte Superior, nos autos do ARESP nº 673.658/RS, determinou o retorno dos autos à origem para novo julgamento dos aclaratórios (e-STJ fls. 689-692). 

Nessa segunda oportunidade, a Corte local, após reconhecer que não se conferiu à parte contrária vista para se manifestar sobre o documento novo trazido pela autora, rejeitou novamente os embargos de declaração sob a seguinte fundamentação: 

"(...) De início, verifica-se que, de fato, não foi oportunizada vista à embargante do documento colacionado às fls. 436/455. Todavia, é preciso ressaltar que isso, por si só, não tem o condão de ensejar a nulidade do referido acórdão por cerceamento de defesa. Isso porque, apesar de ter sido feita expressa referência à Ata de Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária nº 104 no acórdão recorrido, essa circunstância revela-se tão somente secundária ao fundamento principal do julgado, que diz respeito à desnecessidade de autorização da Assembleia Geral para ajuizamento de ação contra ex-administrador por atos anteriores, pois limita-se a lei a exigir permissão em ação afora contra administrador. (...) Nesse contexto, mesmo que não houvesse sido juntada a citada Ata, a solução do conflito seria no sentido de se desconstituir a sentença prolatada à fl. 401, para determinar o regular prosseguimento do feito. Não há falar, portanto, em prejuízo à parte embargante no caso concreto" (e-STJ fls. 700-702). 

Na assentada de 25/6/2019 (14h), o Relator, Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, negou provimento ao recurso especial. 

Para melhor compreensão da controvérsia, pedi vista dos autos. 

Inicialmente, anoto a minha plena concordância com a fundamentação trazida no voto do Relator quanto a não estar configurada a alegada negativa de prestação jurisdicional. Concordo igualmente com a tese de que a ação social reparatória (ut universi) ajuizada pela sociedade empresária contra ex-administrador, na forma do art. 159 da Lei das Sociedades Anônimas, depende de autorização da assembleia geral. 

Entendo, contudo, que assiste razão à recorrente quanto aos demais aspectos suscitados no recurso. Considerando a prejudicialidade da matéria, inicio o exame da irresignação pela alegada violação do art. 159 da Lei nº 6.404/1976, que assim dispõe: 

"Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembléia-geral, a ação de responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio." (grifou-se) 

O texto legal é absolutamente claro quanto à necessidade de deliberação da assembleia geral antes do ajuizamento da ação de responsabilidade civil contra o administrador, valendo conferir, a esse respeito, a lição de Nelson Eizirik: 

"(...) Constitui requisito legal, essencial e imprescindível para a propositura da ação de responsabilidade civil do administrador, a realização de assembleia geral que previamente delibere a respeito." (A lei das S.A. comentada, v. II, São Paulo: Quartier Latin, 2011, pág. 410 - grifou-se) 

Nessa mesma linha de entendimento, segue a opinião de Marcelo Vieira Von Adamek: 

"(...) Para a propositura da ação social, em qualquer uma de suas modalidades, é de regra indispensável a existência de prévia deliberação assemblear, de conteúdo positivo ou negativo. (...) Diante da literalidade da lei acionária vigente, tanto a doutrina como os tribunais têm diuturnamente proclamado ser indispensável a existência dessa prévia deliberação assemblear." (Responsabilidade civil dos administradores de S/A (e as ações correlatas), São Paulo: Saraiva, 2009, págs. 308-309 - grifou-se) 

Fábio Ulhoa Coelho classifica a prévia deliberação assemblear como "(...) condição de procedibilidade da ação de responsabilidade civil contra o administrador" (Curso de direito comercial, volume 2 [livro eletrônico] : direito de empresa, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, 24:5.4 - grifou-se). 

No precedente invocado pelo Relator, muito se debateu acerca da natureza jurídica de tal exigência, especialmente no voto vencido da lavra do eminente Ministro Barros Monteiro, em que se fez a necessária distinção entre legitimatio ad causam e legitimatio ad processum: 

"(...) A despeito de a decisão recorrida haver reputado a autora parte ilegítima para a propositura desta ação, com base em alguns respeitáveis escólios doutrinários, certo é que, na espécie, não se cuida propriamente de ilegitimidade de parte ad causam. Em princípio, a legitimidade para intentar a ação de responsabilidade civil contra os ex-administradores é da própria sociedade anônima. Mas, para que ela ingresse em juízo para tal fim, é de rigor que se muna ela previamente da autorização expedida pela assembléia geral. Considero assim que, antes de uma questão relativa à legitimidade de parte, trata-se aqui de um problema ligado à incapacidade da parte de estar em juízo (incapacidade processual)" (REsp nº 157.579/RS, Rel. p/ acórdão Ministro Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, julgado em 12/9/2006, DJ 19/3/2007 - grifou-se). 

De fato, "(...) é a empresa autora que tem legitimidade para figurar no polo ativo da ação de responsabilidade civil contra os administradores e gerentes. Porém, sua capacidade de postular em juízo está condicionada à autorização da assembléia geral", como bem salientou o Ministro Cesar Asfor Rocha, Relator designado para a lavratura do acórdão. 

Foi por esse motivo, a propósito, que o Órgão Colegiado, naquela oportunidade, considerou aplicável a norma contida no art. 13 do CPC/1973: 

"Art. 13. Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade da representação das partes, o juiz, suspendendo o processo, marcará prazo razoável para ser sanado o defeito." (grifou-se) 

Impõe-se registrar, no entanto, que a controvérsia examinada naquela ocasião dizia respeito à possibilidade da posterior juntada de documento que, segundo a parte interessada, era capaz de comprovar que houve deliberação assemblear antes do ajuizamento da ação, o que fica claro pelo teor do voto proferido pelo eminente Ministro Aldir Passarinho Junior: 

"(...) Sr. Presidente, diante dos esclarecimentos, acompanho o voto de V. Exa. no sentido de que o Tribunal a quo se manifeste especificamente sobre essa ata, já que se admite, efetivamente, que haja a instrução do processo se o documento foi produzido antes do ajuizamento da ação autorizando, em tese, esse ajuizamento. Essa questão deveria ter sido considerada pelo Tribunal, para acolher ou rejeitar, mas, efetivamente, teria que haver uma manifestação concreta a respeito" (grifou-se). 

E pelo saudoso Ministro Hélio Quaglia Barbosa: 

"(...) Sr. Presidente, sinto-me perfeitamente esclarecido, com vista à oportunidade que se deva conferir à parte, para demonstrar a existência da autorização na forma do art. 159 da Lei nº 6.404, Lei das Sociedades Anônimas" (grifou-se). 

A hipótese dos autos é diversa, haja vista a deliberação assemblear ter sido obtida após o ajuizamento da ação, em manifesta afronta à literalidade da lei. 

Embora situando a deliberação assemblear como condição para se alcançar a legitimidade ad causam, Luiz Gastão Paes de Barros Leães também entende que dita providência deve preceder o ajuizamento da ação: 

"(...) De acordo com a lei em vigor, portanto, para propor ação social - uti universi ou uti singuli - é necessário que o autor preencha a condição de legitimidade ativa estabelecida pela lei do anonimato: a prévia deliberação da assembléia geral. Ocorre a legitimidade ordinária da sociedade para propor ação social contra os seus administradores, quando existe 'prévia deliberação assemblear' autorizadora; surge a legitimidade extraordinária dos acionistas, para propor subsidiariamente a mesma ação, ou com a inação da sociedade, uma vez escoado o prazo de três meses da 'prévia deliberação assemblear' autorizadora, ou com a 'prévia deliberação da assembléia geral', negando autorização para o ajuizamento da ação pela companhia (Cf. Modesto Carvalhosa, Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, 5.º vol., Saraiva, S. Paulo, 1982, p. 204 ss.). 2.13 A condição de legitimidade para agir, em todas essas hipóteses, é, portanto, apenas uma: a existência de prévia decisão da assembléia geral deliberando promover – ou não promover – a ação. Inexiste no texto legal qualquer outra condição para que o autor da ação social adquira qualidade para agir." (A prévia deliberação assemblear como condição de 'legitimatio ad causam' na ação social. In: Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro, nova série, v. 34, n. 100, págs. 98-104, out./dez. 1995 - grifou-se). 

A razão para assim interpretar o comando legal vai além da própria literalidade da norma, tendo em vista que o ajuizamento de demandas judiciais contra administradores de sociedades anônimas podem representar prejuízos para a própria companhia e seus acionistas, como bem adverte Fábio Ulhoa Coelho: 

"(...) Convém atentar para o fato de que nem sempre é interessante à companhia promover a responsabilização judicial do administrador afastado, porque o ajuizamento do processo implica, necessariamente, tornar públicos os problemas na administração da empresa (por vezes, importa a divulgação de dados confidenciais, também). Ou seja, a imagem institucional da sociedade anônima pode sofrer, com o ajuizamento da ação de responsabilidade do administrador, danos que superem os provocados por este. Assim, mesmo apurada a responsabilidade, a assembleia geral pode deliberar validamente pelo não ajuizamento da demanda." (ob. cit. - grifou-se) 

Em outro artigo doutrinário, o ilustre professor de Direito Comercial assevera: 

"(...) A lei reservou à competência exclusiva da assembleia geral a decisão sobre processar ou não processar seus ex-administradores, porque nem sempre corresponde ao melhor interesse da sociedade promover a demanda judicial. Pode ocorrer, por exemplo, de a sociedade considerar que o ressarcimento do prejuízo material não compensaria os danos à imagem que a responsabilização do antigo administrador lhe causaria. Também é necessário que a sociedade sopese o quanto poderia prejudicar ver certas informações reservadas de sua administração tornadas acessíveis à imprensa ou à concorrência, graças à publicidade do processo judicial. Em vista da envergadura dessas implicações, a lei considera imprescindível que a assembleia geral aprecie a questão e decida se convém, ou não, ajuizar a ação de responsabilização contra ex-administrador." (Responsabilidade civil por ato de administrador de sociedade anônima (STJ - REsp 1.515.710/RJ). In: Revista brasileira de direito comercial, v. 1, n. 5, págs. 123-133, jun./jul. 2015). 

Nelson Eizirik também acentua que 

"(...) A companhia não é obrigada a mover a ação de responsabilidade contra seus administradores, ainda que haja indícios de que atuaram de forma ilegal. Trata-se de decisão absolutamente soberana da assembléia geral, que deve pesar: (i) a gravidade do eventual ato ilícito; (ii) os danos efetivamente causados ao patrimônio social; (iii) os custos e benefícios da propositura da ação; e (iv) as reais possibilidades de êxito na demanda." (ob. cit., pág. 410 - grifou-se) 

Diante desse panorama, entendo que, para assegurar que a convicção dos presentes ao conclave não seja afetada, positiva ou negativamente, ao tempo da deliberação quanto ao ajuizamento ou não da ação social reparatória, é indispensável que ela já não esteja em curso, sendo essa, a meu juízo, a intenção do legislador ao exigir que a assembleia geral previamente delibere a respeito da propositura da ação de responsabilidade civil contra administrador ou ex-administrador. 

Assim, diante da literalidade da lei especial e da verdadeira intenção do legislador ao exigir que a deliberação assemblear seja prévia, não vejo como aplicar subsidiariamente a disposição contida no art. 13 do CPC/1973, salvo se limitada a diligência à juntada de cópia da respectiva ata, conforme decidido no julgamento do REsp nº 157.579/RS. 

Na hipótese de não ser acolhida tal proposição, entendo que a recorrente teve cerceado o seu direito de defesa, por ofensa ao princípio do contraditório, a teor do disposto no art. 398 do Código de Processo Civil de 1973: 

"Art. 398. Sempre que uma das partes requerer a juntada de documento aos autos, o juiz ouvirá, a seu respeito, a outra, no prazo de 5 (cinco) dias." 

Com referência ao dispositivo legal em comento, o eminente Relator bem salientou que a jurisprudência desta Corte Superior, com o intuito de evitar declarações de nulidade sem a ocorrência de prejuízo efetivo – pas de nullité sans grief –, tem exigido que o documento i) não seja do conhecimento da parte contrária; ii) precisa guardar relevância e pertinência com o deslinde da controvérsia, influindo de forma decisiva para a sua solução, e iii) seu conteúdo não deve se limitar a mero reforço de argumentação. 

Estabelecidas tais premissas, entendeu Sua Excelência que a recorrente tinha plena ciência do teor do referido documento, sobretudo porque também o subscreveu na condição de sócia, não havendo falar, por isso, em nulidade por descumprimento da norma contida no art. 398 do CPC/1973. 

Não me parece, contudo, que a ciência extra autos em relação à existência do documento seja suficiente, no caso ora examinado, para afastar a nulidade aventada, notadamente porque ao tempo em que procedida a sua juntada ao processo a recorrente já possuía em seu favor uma sentença de extinção da demanda, fundada justamente na ausência de requisito indispensável para o ajuizamento da ação – prévia deliberação da assembleia geral. 

Além disso, conquanto fosse o documento desimportante para a solução adotada pela Corte estadual, calcada na inaplicabilidade do art. 159 da Lei nº 6.404/1976 para a propositura de ação de responsabilidade civil contra ex-administradores, passou ele a ter absoluta relevância para o deslinde da controvérsia no âmbito desta Corte Superior, que entende aplicável a exigência prevista na aludida norma, mesmo para as ações propostas contra ex-administradores. 

Nessa medida, se à ora recorrente fosse dada a oportunidade de se manifestar a respeito do documento novo juntado antes do julgamento da apelação, sua própria legitimidade poderia ser questionada com base em argumentos que jamais poderiam ser examinados por este Tribunal Superior, dada a vedação contida na Súmula nº 7/STJ. 

Basta verificar que a ora recorrente, nos primeiros embargos de declaração opostos na origem, sustentou que "(...) o desrespeito ao art. 398 do CPC impediu, por exemplo, que a ora embargante impugnasse o referido documento, eis que não foi juntado na íntegra, faltando os anexos de que trata o § 1º do art. 130 da Lei nº 6.404/76" (e-STJ fl. 500 - grifou-se). 

Mais à frente, ressaltou que 

"(...) a juntada da ata sem seus anexos (voto dissidente e parecer do Conselheiro Fiscal) é evidente ato de má-fé da parte autora, e o cumprimento do art. 398 do CPC teria possibilitado à ré que apresentasse aos autos tais documentos, demonstrando à Câmara que houve protesto com relação à abusiva deliberação. 6. O prejuízo da parte recorrida/ré é evidente, uma vez que não pôde esta, antes da prolação do acórdão, verificar o teor e autenticidade do documento juntado pela outra parte, impossibilitando, por exemplo, eventual contraposição mediante juntada de outro documento, como possibilita, se for o caso, a segunda parte do art. 397 do CPC. Também foi a parte recorrida/ré prejudicada em sua sustentação oral, eis que apenas no momento do julgamento teve ciência da juntada do referido documento" (e-STJ fls. 500-501 - grifou-se). 

Presentes tais circunstâncias, entendo que a ofensa ao princípio do contraditório, na hipótese, está configurada, devendo ser declarada a nulidade dos atos processuais praticados após a juntada de documento novo sem a correspondente abertura de vista à parte contrária. 

Sobreleva notar, ainda, que a jurisprudência desta Corte admite a juntada de documentos novos após a petição inicial e a contestação, inclusive em fase recursal, desde que: i) não se trate de documento indispensável à propositura da ação; ii) não haja má-fé na ocultação do documento, e iii) seja ouvida a parte contrária, conforme decidido nos seguintes julgados: 

"PROCESSO CIVIL. AÇÃO POSSESSÓRIA. JUNTADA EXTEMPORÂNEA DE DOCUMENTOS. DETERMINAÇÃO DE DESENTRANHAMENTO. PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUÍZO. RELATIVIZAÇÃO. NECESSIDADE DE CONTRADITÓRIO. 1. É admitida a juntada de documentos novos após a petição inicial e a contestação desde que: (i) não se trate de documento indispensável à propositura da ação; (ii) não haja má fé na ocultação do documento; (iii) seja ouvida a parte contrária (art. 398 do CPC). Precedentes. 2. Dessarte, a mera declaração de intempestividade não tem, por si só, o condão de provocar o desentranhamento do documento dos autos, impedindo o seu conhecimento pelo Tribunal a quo, mormente tendo em vista a maior amplitude, no processo civil moderno, dos poderes instrutórios do juiz, ao qual cabe determinar, até mesmo de ofício, a produção de provas necessárias à instrução do processo (art. 130 do CPC). 3. De fato, o processo civil contemporâneo encontra-se marcado inexoravelmente pela maior participação do órgão jurisdicional na construção do conjunto probatório, o que, no caso em apreço, autorizaria o Juízo a determinar a produção da prova consubstanciada em documento público, tornando irrelevante o fato de ela ter permanecido acostada aos autos a despeito da ordem para seu desentranhamento. 4. Nada obstante, essa certidão foi objeto de incidente de falsidade, o qual foi extinto pelo Juízo singular, em virtude da perda superveniente do interesse de agir decorrente da determinação de desentranhamento dos documentos impugnados dos autos. Assim, verifica-se que o contraditório não foi devidamente exercido, sendo tal cerceamento contrário à norma insculpida no art. 398 do CPC. 5. Recurso especial parcialmente provido." (REsp 1.072.276/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/2/2013, DJe 12/3/2013 - grifou-se). 

"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. 1. Segundo a jurisprudência deste Tribunal Superior, é admissível a juntada de documentos novos, inclusive na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação, inexista má-fé na sua ocultação e seja observado o princípio do contraditório. Precedentes. 1.1. No caso em tela, o acórdão recorrido verificou ser cabível a juntada de documentos novos, nos termos aduzidos. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Para que se configure o prequestionamento da matéria, há que se extrair do acórdão recorrido pronunciamento de tese jurídica em torno dos dispositivos legais tidos como violados, a fim de que se possa, nesta instância especial, definir se foi correta a interpretação conferida à legislação federal. 3. Agravo interno desprovido." (AgInt nos EDcl no AREsp 1.395.012/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 27/5/2019, DJe 3/6/2019 - grifou-se). 

"RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. PROVA. ART. 435 DO CPC/2015 (ART. 397 DO CPC/1973). DOCUMENTO NOVO. FATO ANTIGO. INDISPENSABILIDADE. EFEITO SURPRESA. APRECIAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. É admissível a juntada de documentos novos, inclusive na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação, inexista má-fé na sua ocultação e seja observado o princípio do contraditório (art. 435 do CPC/2015). 2. O conteúdo da alegada prova nova, tardiamente comunicada ao Poder Judiciário, foi objeto de ampla discussão, qual seja, a condição de bem de família de imóvel penhorado e, por isso, não corresponde a um fato superveniente sobre o qual esteja pendente apreciação judicial. 3. A utilização de prova surpresa é vedada no sistema pátrio (arts. 10 e 933 do Código de Processo Civil de 2015) por permitir burla ou incentivar a fraude processual. 4. Há preclusão consumativa quando à parte é conferida oportunidade para instruir o feito com provas indispensáveis acerca de fatos já conhecidos do autor e ocorridos anteriormente à propositura da ação e esta se queda silente. 5. A penhorabilidade do bem litigioso foi aferida com base no conjunto fático-probatório dos autos, que é insindicável ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 6. Recurso especial não provido." (REsp 1.721.700/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 8/5/2018, DJe 11/5/2018 - grifou-se). 

Ante o exposto, pedindo as mais respeitosas vênias ao Relator, Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, dou provimento ao recurso para restabelecer a sentença de extinção do processo, sem resolução de mérito, inclusive no tocante aos ônus da sucumbência. 

Caso fique vencido nessa proposição, dou parcial provimento ao recurso especial para declarar a nulidade dos atos processuais praticados após a juntada de documento novo sem a correspondente abertura de vista à parte contrária. 

É o voto. 

Filigrana doutrinária: Legitimidade - Arruda Alvim

"Para a validade da relação jurídica processual, de modo a permitir que o juiz possa validamente entrar no mérito do processo, solucionando o conflito de interesses levado a juízo, exige a lei que sejam, as partes, capazes. Por pressuposto processual entende-se a capacidade de estar em juízo, também denominada comumente, pela doutrina tradicional, de legitimação formal (legitimatio ad processum) ou capacidade processual, conceitos que comportam distinção, todavia. Tem capacidade para estar em juízo toda a pessoa que se acha no exercício dos seus direitos (art. 70 do CPC/2015). Assim, aquele que, pelo Direito Civil, tem capacidade de gozo e de exercício de direitos, tem capacidade para estar em juízo. (...) Comumente, a legitimatio ad causam coincide com a legitimidade processual, que, a seu turno, pressupõe a capacidade de estar em juízo (= processual). A legitimação processual é a legitimidade para que as partes atuem em um processo em concreto. Na hipótese de coincidência da legitimação processual com a legitimação ad causam, ambas dirão respeito ao mesmo sujeito ou ente jurídico (= parte)". 


ALVIM, Arruda. Manual de Direito processual, 2ª ed. e-book, Ed. RT, 2017, item 5.3. 

19 de abril de 2021

PROCESSO COLETIVO - O MPF possui legitimidade para propor ação civil pública a fim de debater a cobrança de encargos bancários supostamente abusivos praticados por instituições financeiras privadas

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2020/02/info-662-stj-1.pdf


PROCESSO COLETIVO - O MPF possui legitimidade para propor ação civil pública a fim de debater a cobrança de encargos bancários supostamente abusivos praticados por instituições financeiras privadas 

O Ministério Público Federal possui legitimidade para propor ação civil pública a fim de debater a cobrança de encargos bancários supostamente abusivos praticados por instituições financeiras privadas. Ex: ação civil pública ajuizada pelo MPF contra diversos bancos privados pedindo para que seja declarada abusiva a cobrança da tarifa bancária pela emissão de cheque de baixo valor. As atividades desenvolvidas pelas instituições financeiras, sejam elas públicas ou privadas, estão subordinadas ao conteúdo de normas regulamentares editadas por órgãos federais e de abrangência nacional. Logo, o cumprimento dessas normas por parte dos bancos é um tema de interesse nitidamente federal, suficiente para conferir legitimidade ao Ministério Público Federal para o ajuizamento da ação civil pública. STJ. 3ª Turma. REsp 1.573.723-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/12/2019 (Info 662). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Determinado Procurador da República (membro do Ministério Público Federal) ajuizou ação civil pública, na Justiça Federal, contra a União (Conselho Monetário Nacional – CMN), o Banco Central - BACEN e diversos bancos privados (Itaú, Bradesco, Santander, HSBC, entre outros) alegando que tais instituições financeiras privadas estavam cobrando tarifa bancária pela emissão de cheque de baixo valor, o que seria uma prática abusiva, que violaria o Código de Defesa do Consumidor. A União e o Banco Central figuraram no polo passivo da lide porque, segundo o MPF, a Lei nº 4.595/64 atribuiu ao CMN (órgão da União) e ao BACEN o poder-dever de fiscalizar as instituições financeiras, regulamentando, inclusive, as tarifas bancárias que podem ser cobradas dos clientes. 

Decisão do juiz 

O magistrado de primeiro grau de jurisdição entendeu que o CMN e o BACEN não teriam legitimidade passiva para figurar na lide. Com a exclusão da União (CMN) e do BACEN da lide, não haveria mais legitimidade para que esta ação fosse proposta pelo MPF na Justiça Federal já que não envolveria mais nenhum órgão ou entidade federal. Vejamos alguns interessantes pontos sobre o tema. 

O Ministério Público possui legitimidade para propor ação civil pública discutindo a cobrança de encargos bancários supostamente abusivos? SIM. 

O Ministério Público detém legitimidade para propor ação civil pública a fim de debater a cobrança de tarifas/taxas bancárias supostamente abusivas, por se cuidar de tutela de interesses individuais homogêneos de consumidores/usuários do serviço bancário (art. 81, III, da Lei nº 8.078/90). STJ. 3ª Turma. REsp 1.370.144/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 7/2/2017. 

O Conselho Monetário Nacional e o Banco Central possuem legitimidade passiva para figurar nesta ação? NÃO. O Conselho Monetário Nacional e o Banco Central possuem função fiscalizadora e reguladora das atividades das instituições financeiras. Isso, contudo, por si só, não faz com que o CMN e o BACEN tenham interesse jurídico em relação às ações que são propostas contra os bancos. STJ. 3ª Turma. REsp 1303646/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10/05/2016. 

Em regra, esse tipo de demanda coletiva envolve direito contratual e a pretensão buscada é apenas a de se questionar a validade de cláusula inserida nos contratos firmados pelas instituições financeiras com seus clientes. Não se busca questionar a legalidade ou a constitucionalidade de algum ato normativo que tenha sido expedido pelo CMN ou pelo BACEN. Assim, considerando que a ação civil pública proposta pelo MPF não tinha por objetivo questionar a constitucionalidade ou a legalidade de normas editadas pelo BACEN, normalmente fundadas em deliberações do CMN nem tampouco imputar a eles qualquer conduta omissiva, impõe-se reconhecer a ilegitimidade da União e do BACEN para figurar no polo passivo da ação civil pública. 

O fato de a União e do CMN terem sido excluídos da lide faz com que o processo tenha que ser deslocado para a Justiça Estadual? 

NÃO. A simples presença do Ministério Público Federal no polo ativo da relação processual é suficiente para manter o processamento da demanda perante a Justiça Federal. Nesse sentido: 

A presença do Ministério Público Federal no polo ativo da demanda, por si só, determina a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da CF, tendo em vista que o MPF é um órgão federal. STJ. 1ª Seção. AgInt no CC 163.268/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 20/8/2019. 

As ações propostas pelo MPF deverão ser ajuizadas na Justiça Federal. Isso porque o MPF é órgão da União, o que atrai a competência do art. 109, I, da CF/88. Assim, a competência será determinada, em um primeiro momento, pela parte processual. Num segundo momento, contudo, o Juiz Federal irá averiguar se o MPF é parte legítima. Se o MPF for parte legítima, perpetua-se a competência na Justiça Federal. Por outro lado, se for parte ilegítima, deverá determinar o deslocamento da competência para a Justiça Estadual. Desse modo, a circunstância de o Ministério Público Federal figurar como parte na lide não é suficiente para determinar a perpetuação da competência da Justiça Federal para o julgamento da ação. STF. Plenário. RE 669952 AgR-ED, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 09/11/2016. 

Como bem advertiu o Ministro Herman Benjamin, “(...) a questão de uma ação ter sido ajuizada pelo MPF não garante que ela terá sentença de mérito na Justiça Federal, pois é possível que se conclua pela ilegitimidade ativa do Parquet Federal, diante de eventual falta de atribuição para atuar no feito” (STJ. 2ª Turma. REsp 1.804.943/PB, julgado em 25/6/2019). 

O MPF possui legitimidade ativa para propor ACP contra instituições financeiras privadas? 

SIM. O Ministério Público Federal terá legitimidade para o ajuizamento de ações civis públicas sempre que ficar evidenciado o envolvimento de interesses nitidamente federais, assim considerados em virtude dos bens e valores a que se visa tutelar. Segundo o art. 21, VIII, da CF/88: 

Art. 21. Compete à União: (...) VIII - administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as operações de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada; 

Os art. 4º, VIII e 9º, da Lei nº 4.595/64 preveem: 

Art. 4º Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República: (...) 

VIII - Regular a constituição, funcionamento e fiscalização dos que exercerem atividades subordinadas a esta lei, bem como a aplicação das penalidades previstas; 

Art. 9º Compete ao Banco Central da República do Brasil cumprir e fazer cumprir as disposições que lhe são atribuídas pela legislação em vigor e as normas expedidas pelo Conselho Monetário Nacional. 

Desse modo, verifica-se que as atividades desenvolvidas pelas instituições financeiras, sejam elas públicas ou privadas, estão subordinadas ao conteúdo de normas regulamentares editadas por órgãos federais e de abrangência nacional. Logo, o cumprimento dessas normas por parte dos bancos é um tema de interesse nitidamente federal, suficiente para conferir legitimidade ao Ministério Público Federal para o ajuizamento da ação civil pública. 

Em suma: O Ministério Público Federal possui legitimidade para propor ação civil pública a fim de debater a cobrança de encargos bancários supostamente abusivos praticados por instituições financeiras privadas. STJ. 3ª Turma. REsp 1.573.723-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/12/2019 (Info 662). 

Tema correlato: 

Município tem legitimidade ad causam para ajuizar ação civil pública em defesa de direitos consumeristas questionando a cobrança de tarifas bancárias. STJ. 3ª Turma. REsp 1.509.586-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/05/2018 (Info 626). 

(Juiz TJ/BA 2019 CEBRASPE) O município não possui legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em defesa de servidores a ele vinculados, questionando a cobrança de tarifas bancárias de renovação de cadastro, uma vez que a proteção de direitos individuais homogêneos não está incluída em sua função constitucional. (errado)

18 de abril de 2021

O administrador do fundo de investimento é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em que se pretende a reparação de supostos danos resultantes de inadequada liquidação.

 REsp 1.834.003-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 17/09/2019, DJe 20/09/2019

Fundo de Investimento. Ação de reparação de danos. Legitimidade passiva do administrador. Possibilidade. Teoria da Asserção.


Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as condições da ação, aí incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial. Na hipótese, o administrador foi demandado pelo fato de ter realizado a liquidação do fundo de investimento, mediante distribuição do patrimônio líquido entre os cotistas, sem o prévio pagamento de um suposto passivo. No entanto, a Instrução CVM n. 391/2003, que primeiro tratou especificamente dos Fundos de Investimento em Participações (FIPs), já incluía entre as obrigações do administrador o dever de "cumprir e fazer cumprir todas as disposições do regulamento do fundo" (art. 14, XV). Desse modo, a satisfação integral do passivo antes da partilha do patrimônio líquido entre os cotistas está, em regra, inserida entre as atribuições do administrador, sendo dele a responsabilidade, em tese, por eventuais prejuízos que guardem nexo de causalidade com a sua inobservância.

A ação rescisória de sentença proferida em ação de investigação de paternidade cujo genitor é pré-morto deve ser ajuizada em face dos herdeiros, e não do espólio.

 REsp 1.667.576-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 10/09/2019, DJe 13/09/2019

Sentença proferida em ação investigatória de paternidade. Falecimento do pretenso genitor. Ação rescisória. Ação de estado e de natureza pessoal. Legitimidade passiva. Herdeiros do falecido e não do espólio.

Regitre-se, de início, que a jurisprudência desta Corte fixou-se no sentido de que a ação de investigação de paternidade deve ser ajuizada em face dos herdeiros e não do espólio do falecido. Nesse contexto, o fato de a sentença que se pretende rescindir ter sido proferida em ação investigatória de paternidade, em que somente o de cujus figurou como parte, não modifica esse entendimento. Embora o CPC/1973 não trate da legitimidade passiva para a ação rescisória (o CPC/2015 também não examina esse tema), é correto afirmar que a regra do art. 487, I, do CPC revogado (idêntico ao art. 967, I, do novo CPC), que disciplina a legitimidade ativa e que informa que poderá propor a referida ação "quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular" deve se aplicar, por lógica, coerência e simetria, também à adequada configuração da legitimação passiva da ação rescisória. Por essa razão, o falecimento da parte após o trânsito em julgado da sentença a ser rescindida implica sucessão processual não apenas no polo ativo, mas também no polo passivo. Como se sabe, a legitimidade passiva decorre de uma relação lógica e abstrata entre quem pede, o que se pede e contra quem se pede, devendo figurar no polo passivo a pessoa indicada pelo autor que possa ser compelida e reúna condições de satisfazer o pedido inicial. Tendo em mira essa premissa, conclui-se que, evidentemente, o espólio não é parte legítima para responder à ação rescisória em que se pleiteie a rescisão de sentença e o rejulgamento de ação investigatória de paternidade post mortem, seja como legitimado exclusivo, seja como litisconsorte passivo necessário, na medida em que, nessa ação, nada será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente despersonalizado apto a titularizar a universalidade jurídica denominada herança até que se efetive a partilha dos bens. Sublinhe-se que as eventuais repercussões econômicas ou patrimoniais derivadas do reconhecimento, ou não, da filiação que se pretende alcançar por intermédio da ação investigatória de paternidade é que poderão, hipoteticamente, ser objeto de pretensões autônomas que serão deduzidas contra o espólio, como já se consignou em precedentes desta Corte em relação à petição de herança (AgRg no Ag 580.197/SP, Quarta Turma, DJe 04/05/2009) e à execução de dívidas do de cujus (REsp 1.559.791/PB, Terceira Turma, DJe 31/08/2018).