7 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Legitimidade - Antonio do Passo Cabral

Como pertine ao exercício de um poder jurídico, o ordenamento remete a legitimidade à específica situação concreta onde tal poder será exercido. Se a legitimidade é um atributo transitivo, verificado em relação a um determinado estado de fato, pensamos que, a partir do conceito de situação legitimante, enquadrado no pano de fundo da relação processual dinâmica, é possível reduzir a análise da legitimidade a certos momentos processuais específicos, vale dizer, não mais um juízo de pertinência subjetiva da demanda (a legitimatio ad causam), mas referente ao ato processual específico (a legitimatio ad actum). Em razão do dinamismo da relação processual, é só na sua verificação casuística que a legitimidade encontra sua completa e mais pura finalidade. Se a função desse limite subjetivo ao exercício de funções processuais é analisar a correspondência entre o modelo legal e a situação de fato, a legitimidade só pode ser precisa em cada caso concreto e para cada ato processual. Como afirma Fazzalari, a par das discussões sobre a abstração ou concretude da ação, devemos reputar que a situação material pretérita deve ser abstraída quando da análise dos atos processuais, e estes não pressupõem necessariamente a relação material. A situação substancial é relevante como pressuposto de alguns atos processuais, mas não todos, e a ela se juntam outros requisitos processuais definidores de situações legitimantes não necessariamente vinculadas a um direito subjetivo ou a uma relação jurídica material. Na verdade, a colocação dos atos em seqüência faz com que, com exclusão do primeiro ato da série, cada ato processual dependa, para ser praticado, de requisitos e pressupostos que somente poderão ser corretamente compreendidos a partir da análise da cadeia formativa dos atos anteriores e da múltipla e difusa implicação entre eles. Além disso, as situações legitimantes são todas cambiantes ao longo do processo, e o controle da legitimidade não pode se dar senão na dinâmica do contraditório. 


CABRAL, Antonio do Passo. Legitimidade e despolarização da demanda in Revista da AJUFE, São Paulo, v. 25, n. 92, jan./jun. 2012., p. 288/289. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário