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17 de agosto de 2021

O locatário não possui legitimidade para ajuizar ação contra o condomínio no intuito de questionar o descumprimento de regra estatutária, a ausência de prestação de contas e a administração de estabelecimento comercial.

Processo

REsp 1.630.199-RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 05/08/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Descumprimento de regra estatutária, ausência de prestação de contas e administração de estabelecimento comercial. Pretensões vinculadas à relação jurídica entre o proprietário locador e o estabelecimento comercial. Ilegitimidade ativa do locatário.

 

DESTAQUE

O locatário não possui legitimidade para ajuizar ação contra o condomínio no intuito de questionar o descumprimento de regra estatutária, a ausência de prestação de contas e a administração de estabelecimento comercial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A questão jurídica submetida a exame diz respeito à legitimidade ativa de locatário para ajuizar ação contra o condomínio, no intuito de questionar o descumprimento de regra estatutária, a ausência de prestação de contas e a administração de estabelecimento comercial, cujo reconhecimento resultaria na necessidade de adequações de cota condominial e recomposição de prejuízos financeiros.

Nos termos do art. 18 do CPC/2015, correspondente ao art. 6º do CPC/1973, "ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico". Não existe norma que confira ao locatário legitimidade para atuar em Juízo na defesa dos interesses do condômino locador.

Isso porque o vínculo obrigacional estabelecido no contrato de locação se dá entre o inquilino e o locador. Desse modo, a convenção realizada entre os particulares transfere a posse direta do imóvel e, eventualmente, o dever de arcar com obrigações propter rem, de titularidade do proprietário, mas não sub-roga o inquilino em todos os direitos do condômino perante o condomínio.

Vale anotar que os locatários podem pedir contas ao locador, não diretamente ao condomínio, conforme previsto no art. 23, § 2º, da Lei n. 8.245/1991. Desse modo, se a má administração do condomínio tornou onerosa a relação contratual locatícia, cabe ao inquilino buscar providência frente ao proprietário do imóvel.

Conclui-se, em suma, que o locatário não possui legitimidade para ajuizar ação contra o condomínio para questionar a forma pela qual a coisa comum é gerida.

19 de julho de 2021

DIREITOS REAIS (CONDOMÍNIO COMUM) - No exercício do direito de preferência legal, é possível que o condômino contraia um empréstimo para o cumprimento do requisito de depósito do preço do bem

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/07/info-698-stj-1.pdf


DIREITOS REAIS (CONDOMÍNIO COMUM) - No exercício do direito de preferência legal, é possível que o condômino contraia um empréstimo para o cumprimento do requisito de depósito do preço do bem 

O art. 504 do CC enumera taxativamente os requisitos necessários para o exercício do direito de preferência: a) a indivisibilidade da coisa; b) a ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido, acerca da venda realizada a estranho; c) o depósito do preço, que deve ser idêntico àquele que fora pago pelo estranho na aquisição; e d) a observância do prazo decadencial de 180 dias. O fato de o condômino tomar um empréstimo para cumprir o requisito de depósito do preço do bem, por si só, não é suficiente para a configuração de abuso de direito. A origem do dinheiro utilizado para o depósito do preço do bem não tem qualquer relevância para o exercício do direito de preferência. É possível, portanto, que o montante necessário seja obtido pelo condômino através de empréstimo. A declaração de nulidade do negócio jurídico por simulação não pode se fundamentar apenas em deduções ou suspeitas. No empréstimo, a comprovação de renda ou a prestação de garantia são faculdades do mutuário. A não exigência de garantias não é suficiente para a constatação da existência de simulação do negócio jurídico. Assim, tais fundamentos baseados na origem do depósito, no abuso de direito ou na simulação, não são hábeis a tolher o exercício do direito de preferência do condômino. STJ. 3ª Turma. REsp 1.875.223-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021 (Info 698). 

Condomínio comum 

Condomínio consiste na copropriedade exercida sobre um mesmo bem. É o exercício simultâneo do direito de propriedade por duas ou mais pessoas sobre uma mesma coisa. 

Direito de preferência 

Se um dos condôminos de uma coisa indivisível decidir vender a sua parte, ele terá que, antes de efetivada a venda, dar ciência aos demais condôminos, os quais terão preferência na aquisição da quota, desde que assim requeiram, no prazo decadencial de 180 dias, depositando o preço equivalente àquele ofertado ao terceiro. Trata-se do direito de preferência, previsto no art. 504 do CC: 

Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência. 

O direito de preferência é baseado na função social da propriedade, ou seja, o objetivo da norma foi o de estimular que a propriedade permaneça somente com os titulares originários, evitando desentendimentos com a entrada de um estranho no grupo. 

A partir de quando se inicia esse prazo de 180 dias? Inicia-se com a notificação feita pelo alienante ao outro condômino. 

E se não for feita essa notificação? Se não houver a notificação, o prazo decadencial do exercício do direito de preferência inicia-se com o registro da escritura pública de compra e venda da fração ideal da coisa comum indivisa. 

O prazo decadencial de 180 dias para o exercício do direito de preferência do condômino, previsto no art. 504 do CC, inicia-se com o registro da escritura pública de compra e venda da fração ideal da coisa comum indivisa. STJ. 3ª Turma. REsp 1.628.478-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 03/11/2020 (Info 683). 

Requisitos do direito de preferência: 

1) a indivisibilidade da coisa; 2) a ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido, acerca da venda realizada a estranho; 3) o depósito do preço, que deve ser idêntico àquele que fora pago pelo estranho na aquisição; e 4) a observância do prazo decadencial de 180 dias. 

Assim, cumpridos os requisitos exigidos pelo art. 504, CC, inclusive o depósito do preço, cria-se verdadeiro direito potestativo do condômino reivindicar a propriedade das demais frações ideais que haviam sido vendidas. 

Esse direito de preferência é o mesmo previsto nos arts. 513 a 520 do Código Civil? NÃO. O direito de preferência ou preempção, tratado nos arts. 513 a 520 do CC, é o contratual, ou seja, dependerá de um ajuste entre as partes. O direito de preferência objeto deste julgado é o direito de preferência legal, previsto no art. 504 do CC, não dependendo de qualquer contrato ou ajuste entre as partes. 

DIREITO DE PREFERÊNCIA LEGAL (art. 504 do CC) 

É o direito que o condômino tem de adquirir a fração ideal do outro condômino que deseje alienar sua fração ideal a terceiros. 

Recai sobre coisa indivisível em condomínio. 

Não depende de previsão contratual (decorre da lei). 

É um direito real. 

O condômino deve efetuar o pagamento e requerer para si a propriedade, no prazo de 180 dias. 

Caso o condômino não observe o dever de notificação, o condômino preterido deverá propor uma ação anulatória. 

Por ser um direito real, transmite-se aos herdeiros junto com a coisa. 


DIREITO DE PREFERÊNCIA CONTRATUAL (arts. 513 a 520 do CC) 


É uma cláusula contratual que obriga o comprador a oferecer ao vendedor a coisa, caso resolva aliená-la no futuro a terceiro. 

Recai sobre qualquer coisa alienável. 

Depende de previsão contratual (é uma expressão da autonomia privada). 

É um direito contratual. Caso a cláusula esteja registrada, terá oponibilidade erga omnes. 

As partes poderão ajustar os prazos. Todavia, o prazo máximo de vigência da cláusula será de: - 180 dias para móveis - 2 anos para imóveis Já o prazo para responder à notificação (ou seja, para requerer para si a propriedade), não havendo previsão contratual, será de: - 3 dias para móveis - 60 dias para imóveis; 

Caso o comprador venda o bem sem ter dado ciência ao vendedor, este poderá ajuizar ação indenizatória, requerendo o pagamento das perdas e danos. 

Por ser um direito obrigacional personalíssimo, não se pode ceder nem passa aos herdeiros. 


Feita esta necessária revisão sobre o tema, imagine a seguinte situação hipotética: 

João e Regina viviam em união estável há mais de 40 anos. João tinha dois filhos (Joaquim e José), que não eram filhos de Regina. João faleceu e deixou uma fazenda como único bem a ser partilhado. Assim, os três herdeiros (Regina, Joaquim e José) viraram proprietários da fazenda, cada um possuindo 1/3 da fração ideal do bem. Desse modo, no caso concreto, existe um condomínio comum. 

Alienação do imóvel 

Joaquim e José, mesmo sabendo da existência da união estável, alienaram a fazenda por R$ 300 mil, para a empresa ABC Ltda., sem dar ciência a Regina. Regina resolveu exercer seu direito de preferência, dentro do prazo de 180 dias, conforme autoriza o art. 504 do Código Civil. Como Regina não tinha R$ 300 mil, ela tomou emprestado o dinheiro com uma incorporadora imobiliária. Com a quantia na conta, ela fez depósito do preço do bem. Os demais coproprietários alegaram que o contrato de empréstimo firmado entre Regina e a incorporadora imobiliária teria sido uma simulação. Isso porque Regina não possuía patrimônio suficiente e a empresa não exigiu qualquer garantia ou comprovação da renda. Assim, haveria suspeitas da realização do negócio simulado e abuso de direito no exercício do direito de preferência. 

É possível a tomada de empréstimo para o cumprimento do requisito do depósito do preço para o exercício do direito de preferência? 

SIM. O simples fato da coproprietária tomar um empréstimo para o depósito do valor não é apto, por si só, a configurar o abuso de direito. É irrelevante a origem do dinheiro para o depósito exigido no direito de preferência. De acordo com o STJ, não se podem admitir deduções ou suspeitas como ensejadoras de nulidade do negócio jurídico. A exigência de comprovação da renda ou a prestação de garantia é uma faculdade do mutuário. O fato de ser concedido um empréstimo sem comprovação da renda ou sem a prestação de garantia, por si só, não é suficiente para se considerar o negócio jurídico simulado ou a existência de abuso de direito. 

Irrelevância da origem do depósito 

O STJ considerou, ainda, que não tem relevância a discussão a respeito da origem do depósito do preço. O art. 504 do CC exige apenas que o condômino preterido realize o depósito do preço da coisa. Não se faz qualquer menção a respeito da origem do dinheiro. Portanto, é plenamente possível a tomada de empréstimo para o cumprimento do requisito do depósito do preço, não se configurando abuso de direito. 

Boa-fé 

Apesar de os coproprietários terem argumentado que houve abuso de direito por parte de Regina, o STJ entendeu que, na verdade, quem agiu de má-fé foram os herdeiros que alienaram o imóvel. Joaquim e José tinham pleno conhecimento da união estável de Regina com João, tanto pela longa duração da relação, como pela existência da sentença reconhecendo a união estável. Mesmo assim, eles alienaram totalmente o imóvel, sem respeitar o direito de preferência, e sem respeitar a fração ideal de propriedade da condômina. 

Em suma: 

O exercício do direito de preferência, previsto no art. 504 do CC, exige a observância dos seguintes requisitos: 1) a indivisibilidade da coisa; 2) a ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido, acerca da venda realizada a estranho; 3) o depósito do preço, que deve ser idêntico àquele que fora pago pelo estranho na aquisição; e 4) a observância do prazo decadencial de 180 (cento e oitenta) dias. O fato de o condômino tomar um empréstimo para cumprir o requisito de depósito do preço do bem, por si só, não é suficiente para a configuração de abuso de direito. A origem do depósito do preço do bem não tem relevância para o cumprimento do requisito previsto no art. 504 do CC. É possível, portanto, que o montante necessário seja obtido pelo condômino através de empréstimo. Ademais, a declaração de nulidade do negócio jurídico por simulação não pode se fundamentar apenas em deduções ou suspeitas. No empréstimo, a comprovação de renda ou a prestação de garantia são faculdades do mutuário. A não exigência de garantias não é suficiente para a constatação da existência de simulação do negócio jurídico. Assim, tais fundamentos baseados na origem do depósito, no abuso de direito ou na simulação, não são suficientes para tolher o exercício do direito de preferência do condômino. STJ. 3ª Turma. REsp 1.875.223-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021 (Info 698). 

DOD PLUS – INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES 

Caso Joaquim tivesse vendido sua fração ideal para José, e não para um terceiro, Regina, ainda assim, poderia exercer o direito de preferência? NÃO. O direito de preferência previsto no art. 504 do CC aplica-se ao contrato de compra e venda celebrado entre condômino e terceiro, e não àquele ajustado entre condôminos. STJ. 4ª Turma. REsp 1.137.176-PR, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 16/2/2016 (Info 577). 

A literalidade do art. 504 demonstra que o direito de preferência deve ser observado somente nos casos em que o contrato de compra e venda seja celebrado entre o condômino e um estranho. Não se aplica, portanto, às hipóteses de venda entre os consortes (condôminos). O objetivo da norma foi o de estimular que a propriedade permaneça somente com os titulares originários, evitando desentendimentos com a entrada de um estranho no grupo. A alienação da fração ideal de um condômino para o outro não ofende a finalidade intrínseca do direito de preferência do art. 504 do CC, uma vez que não se tratará de hipótese de ingresso de terceiro/estranho à comunhão. Pelo contrário, serão mantidos os consortes, apenas com alterações no percentual da parte ideal daquele que adquiriu a parcela de outrem. 

Este direito de preferência do art. 504 do CC aplica-se também nos casos de condomínio edilício? Ex: em um prédio, se um dos moradores quiser vender seu apartamento, terá que oferecer primeiro aos demais condôminos? NÃO. A regra do art. 504 do CC aplica-se somente ao condomínio tradicional e não ao condomínio edilício. “Assim, um condômino em prédio de apartamentos não precisa dar preferência aos demais proprietários. Mas se a unidade pertencer também a outras pessoas, estas devem ser notificadas para exercer a preferência legal, pois instaurou-se, nesse caso, um condomínio tradicional dentro do horizontal” (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 242).



14 de maio de 2021

Condomínios residenciais podem impedir, por meio da convenção condominial, o uso de imóveis para locação pelo Airbnb

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-693-stj.pdf


CONDOMÍNIO - Condomínios residenciais podem impedir, por meio da convenção condominial, o uso de imóveis para locação pelo Airbnb 

É vedado o uso de unidade condominial com destinação residencial para fins de hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de aposentos existentes nos apartamentos, a diferentes pessoas, por curta temporada. STJ. 4ª Turma. REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 20/04/2021 (Info 693). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Lucas possui um apartamento localizado em um condomínio residencial. Ele não mora no local, tendo comprado o imóvel apenas como forma de investimento. Lucas teve a ideia de anunciar o seu apartamento no Airbnb. 

Abrindo um parêntese 

Para quem não conhece, Airbnb é um serviço online que une pessoas que querem alugar acomodações (casas, apartamentos ou apenas quartos). Assim, existem basicamente duas pessoas que utilizam a plataforma: 

• aquelas que oferecem seu imóvel para ser alugado; 

• as que buscam alugar um imóvel ou apenas um quarto por determinado tempo. 

Desse modo, o indivíduo, em vez de procurar um hotel, motel ou similar, pode acessar o Airbnb e escolher uma das acomodações disponíveis. 

Voltando ao caso concreto: 

Lucas alugou algumas vezes seu apartamento pelo Airbnb. Ocorre que o síndico soube do fato e enviou uma notificação a Lucas afirmando que essa prática é proibida pela convenção do condomínio. Segundo argumentou o síndico, essa forma de aluguel via plataforma configura atividade comercial e de hospedagem, o que que é proibido, pela convenção, de ser realizada em condomínio residencial. 

A questão foi judicializada e chegou até o STJ. O que decidiu o Tribunal? É possível a locação pelo Airbnb neste caso? 

NÃO. A 4ª Turma do STJ, por maioria de votos, decidiu que, se a convenção do condomínio previr a destinação residencial das unidades, os proprietários não poderão alugar seus imóveis por meio de plataformas digitais de intermediação, tais como o Airbnb, Booking, Vrbo e HomeAway. Vale ressaltar, no entanto, que a convenção do condomínio pode autorizar a utilização das unidades para essa modalidade de aluguel. Assim, o ponto principal a ser analisado é a convenção do condomínio. 

Contrato atípico de hospedagem 

O sistema de reserva de imóveis pela plataforma digital é caracterizado como uma espécie de contrato atípico de hospedagem. Trata-se de contrato distinto da locação por temporada e da hospedagem oferecida por empreendimentos hoteleiros, que possuem regulamentações específicas. A Lei de Locações (Lei nº 8.245/91) considera aluguel para temporada aquele destinado à residência temporária do locatário, por prazo não superior a 90 dias:

Art. 48. Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel. 

A Lei nº 8.245/91, contudo, não trata da hipótese de oferta de imóveis com alta rotatividade nem da possibilidade de divisão de uma mesma unidade entre pessoas sem vínculo, como pode ocorrer nas locações realizadas via Airbnb (e outras plataformas). Por outro lado, as atividades realizadas por meio de plataformas como o Airbnb não possuem o modelo de negócio, nem a estrutura ou o profissionalismo suficientes para serem enquadradas na Lei nº 11.771/2008 (Política Nacional de Turismo), embora as características desse tipo de locação lembrem um contrato de hospedagem na modalidade atípica. Desse modo, “trata-se de contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas” (Min. Raúl Araújo). 

Alta rotatividade 

O Min. Relator Raul Araújo apresentou uma distinção entre os conceitos de: 

• residência (morada habitual e estável); 

• domicílio (residência com a intenção de permanência definitiva); e 

• hospedagem (habitação temporária). 

Entre as características da hospedagem estão a alta rotatividade no local e a oferta de serviços. Esse é justamente o caso do aluguel via Airbnb, no qual o imóvel é disponibilizado para diferentes pessoas em curto espaço de tempo, com oferta de serviços adicionais, como lavagem de roupas. Vale ressaltar que não se está dizendo que o proprietário está impedido de fechar contratos de aluguel de longa duração. A proibição recaiu sobre a exploração de hospedagem remunerada, que traz perturbação à rotina do espaço residencial e insegurança aos demais condôminos. 

Direito de propriedade deve ser exercido com respeito à convenção do condomínio 

O Código Civil, ao mesmo tempo em que reconhece ao proprietário o direito de dispor livremente de sua unidade residencial, também lhe impõe o dever de observar a sua destinação e usá-la de maneira não abusiva, com respeito à convenção do condomínio, que possui força normativa. 

Assim, o direito do proprietário condômino de usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos arts. 1.228 e 1.335 do Código Civil e do art. 19 da Lei nº 4.591/64, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício. Vale ressaltar que o contrato atípico de hospedagem realizado por meio de plataformas como o Airbnb não configura atividade ilícita, mas desde que exercida nos limites da legislação. 

Em suma: É vedado o uso de unidade condominial com destinação residencial para fins de hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de aposentos existentes nos apartamentos, a diferentes pessoas, por curta temporada. STJ. 4ª Turma. REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 20/04/2021 (Info 693). 

Voto vencido 

Ficou vencido o Min. Luis Felipe Salomão, que havia votado contra a possibilidade de os condomínios proibirem as locações por meio de plataformas digitais. Para o Min. Salomão, essa modalidade não está inserida no conceito de hospedagem, mas sim no de locação residencial por curta temporada. Além de entender que essa atividade não poderia ser enquadrada como estritamente comercial, o Ministro considerou que, caso fosse permitido que os condomínios vedassem a locação temporária, haveria violação do direito de propriedade. O condomínio poderia adotar mecanismos para garantir a segurança – como o cadastramento de pessoas na portaria –, mas não seria possível impedir a atividade de locação pelos proprietários. 

27 de abril de 2021

É vedado o uso de unidade condominial com destinação residencial para fins de hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de aposentos existentes nos apartamentos, a diferentes pessoas, por curta temporada.

 REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 20/04/2021

Condomínio. Destinação residencial. Contrato atípico de hospedagem. Airbnb. Locação concomitante de partes do imóvel a diferentes pessoas. Inviabilidade.


No caso, tem-se um contrato atípico de hospedagem, que expressa uma nova modalidade, singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas.

Assim, esse contrato atípico de hospedagem configura atividade aparentemente lícita, desde que não contrarie a Lei de regência do contrato de hospedagem típico, regulado pela Lei n. 11.771/2008, como autoriza a norma do art. 425 do Código Civil, ao dizer: "É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código".

No caso específico de unidade condominial, também devem ser observadas as regras dos arts. 1.332 a 1.336 do CC/2002, que, por um lado, reconhecem ao proprietário o direito de usar, fruir e dispor livremente de sua unidade e, de outro, impõem o dever de observar sua destinação e usá-la de maneira não abusiva, com respeito à Convenção Condominial.

Ademais, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no Condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício.

Portanto, existindo na Convenção de Condomínio regra impondo destinação residencial, mostra-se inviável o uso das unidades particulares que, por sua natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade residencial (CC/2002, arts. 1.332, III, e 1.336, IV).

Com isso, fica o condômino obrigado a "dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação" (CC, art. 1.336, IV), ou seja, destinação residencial, carecendo de expressa autorização para dar destinação diversa, inclusive para a relativa à hospedagem remunerada, por via de contrato atípico.

Filigrana Doutrinária: Responsabilidade pelo débito condominial - João Batista Lopes

 “a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais acompanha a pessoa do adquirente, que não pode eximir-se com alegação de que os encargos foram gerados anteriormente à aquisição do imóvel” 

LOPES, João Batista. Condomínio, 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98. 

24 de abril de 2021

PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.683.419 - RJ (2017/0163137-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. PENHORA DO IMÓVEL GERADOR DOS DÉBITOS CONDOMINIAIS NO BOJO DE AÇÃO DE COBRANÇA NA QUAL A PROPRIETÁRIA DO BEM NÃO FIGUROU COMO PARTE. POSSIBILIDADE. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 

1. Embargos de terceiro opostos em 28/04/2014. Recurso especial interposto em 17/05/2016 e concluso ao gabinete em 24/07/2017. Julgamento: CPC/2015. 

2. O propósito recursal consiste em definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que tramitou apenas em face de seu ex-companheiro. 

3. A ausência de decisão do Tribunal de origem acerca da questão suscitada pela recorrente – in casu, a preclusão – impede o conhecimento do recurso especial quanto ao tema, pois não satisfeito o requisito do prequestionamento. Aplicação da Súmula 211/STJ. 

4. Segundo o reiterado entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação “própria da coisa”, ou, ainda, assumida “por causa da coisa”. Por isso, a pessoa do devedor se individualiza exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito. 

5. Em havendo mais de um proprietário do imóvel, como ordinariamente ocorre entre cônjuges ou companheiros, a responsabilidade pelo adimplemento das cotas condominiais é solidária, o que, todavia, não implica a existência de litisconsórcio necessário entre os co-proprietários, podendo o condomínio demandar contra qualquer um deles ou contra todos em conjunto, conforme melhor lhe aprouver. Precedente. 

6. Hipótese dos autos em que, à época da fase de conhecimento, o imóvel encontrava-se registrado em nome dos dois companheiros, mostrando-se válido e eficaz, portanto, o acordo firmado pelo ex-companheiro da recorrente com o condomínio. 

7. Descumprido o acordo e retomada a ação, e em não sendo efetuado o pagamento do débito, é viável a penhora do imóvel gerador das despesas, ainda que, nesse novo momento processual, esteja ele registrado apenas em nome da recorrente, que não participou da fase de conhecimento. 

8. Sob o enfoque do direito material, aplica-se a regra do art. 1.345 do CC/02, segundo o qual “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multa e juros moratórios”. Por outro lado, no plano processual, a penhora do imóvel e a inclusão da proprietária no polo passivo da lide é viável ante o disposto no art. 109, § 3º, do CPC/15, no sentido de que os efeitos da sentença proferida entre as partes originárias se estendem ao adquirente ou cessionário. 

9. Ademais, a solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se o débito condominial possui caráter ambulatório, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença. 

10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido, com majoração de honorários advocatícios. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, com majoração de honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 20 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por MARIA EVELINE LEITE DE OLIVEIRA, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional. 

Ação: embargos de terceiro, opostos pela recorrente em face do CONDOMINIO DO EDIFICIO MERLIN SUL, visando à preservação de sua posse e propriedade sobre imóvel que foi penhorado nos autos da ação de cobrança de cotas condominiais, em fase de cumprimento de sentença, proposta pelo CONDOMINIO em desfavor de Orcínio Cardoso Inácio, ex-companheiro da embargante. 

Na petição inicial, a embargante alegou, em síntese que: (i) 50% do imóvel já lhe pertencia e os outros 50% lhe foram doados por seu ex-companheiro, quando fora lavrada escritura pública de dissolução de sociedade de fato e outros pactos; (ii) o acordo firmado entre Orcínio e o CONDOMÍNIO na fase de conhecimento da ação de cobrança é fraudulento, pois ambos os contratantes tinham conhecimento da partilha amigável realizada em 2005; (iii) não pode ser atingida pela sentença, pois não participou da fase de conhecimento. 

Sentença: rejeitou os embargos de terceiro, determinando o prosseguimento da execução. 

Acórdão: por maioria, deu provimento à apelação interposta pela ora recorrente, para determinar o levantamento da penhora, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 256): 

"APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. COTAS CONDOMINAIS. AÇÃO DE COBRANÇA PROPOSTA EM FACE DE UM DOS COPROPRIETÁRIOS. ACORDO FIRMADO EM SEDE DE AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO DEVIDAMENTE HOMOLOGADO PELO JUÍZO. DESCUMPRIMENTO QUE ENSEJOU O INÍCIO DA FASE EXECUTIVA. CERTIDÃO DO IMÓVEL QUE CONSTOU A TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE DO IMÓVEL PARA O OUTRO COPROPRIETÁRIO, ORA EMBARGANTE, QUE NÃO PARTICIPOU DA FASE COGNITIVA. JUÍZO A QUO QUE DETERMINOU A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO PARA FAZER CONSTAR SOMENTE A EMBARGANTE, SOB A PREMISSA DE QUE A NATUREZA DA DÍVIDA É PROPTER REM. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO ELEMENTO SUBJETIVO DA COISA JULGADA. DISCUSSÃO ACERCA DA NATUREZA DO DÉBITO QUE SE REVELA DESPICIENDA. NÃO SE PODE PRETENDER EXECUTAR IMÓVEL, NO BOJO DE PROCESSO QUE NÃO CONTOU COM A PARTICIPAÇÃO DE SUA PROPRIETÁRIA. NECESSIDADE DE SE OBSERVAR A CORRELAÇÃO ENTRE OS POLOS ATIVO E PASSIVO DA DEMANDA. PRECEDENTES DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO PARA JULGAR PROCEDENTES OS PEDIDOS E DETERMINAR O LEVANTAMENTO DA PENHORA DO IMÓVEL". 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram acolhidos, para a inversão dos ônus da sucumbência. 

Embargos infringentes: opostos pelo condomínio recorrido, foram acolhidos, para fazer prevalecer o voto vencido, que confirmava a sentença e desprovia o recurso de apelação. O acórdão foi assim ementado (e-STJ fls. 321/322): 

"EMBARGOS INFRINGENTES - COBRANÇAS DE COTAS CONDOMINIAIS EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PENHORA DO IMÓVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA EX-COMPANHEIRA E COPROPRIETÁRIA - LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO - INEXISTÊNCIA – PRECEDENTES DO STJ - ESCRITURA DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO E OUTROS PACTOS LAVRADA ANTES DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO, PORÉM NÃO REGISTRADA, NA QUAL COUBE A EMBARGADA A EXCLUSIVA TITULARIDADE DO IMÓVEL - INOPONIBILIDADE A TERCEIROS. 1. Cuida-se de embargos infringentes interpostos em face de v. acórdão que, por maioria de votos, deu provimento ao apelo da ora embargada, para reformando a sentença de 1º grau, julgar procedente o pedido contido nos embargos de terceiros por ela opostos, a fim de determinar o levantamento da constrição judicial de imóvel de sua propriedade. 2. Já decidiu o E. STJ que "os cônjuges, coproprietários de imóvel, respondem solidariamente pelas despesas de condomínio, mas esta responsabilidade não implica litisconsórcio necessário em razão da natureza pessoal da ação de cobrança de cotas condominiais (AgRg no AREsp 213.060/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 06/11/2012). 3. No caso em tela, quando do ajuizamento da ação de cobrança de cotas condominiais, constava da certidão do RGI como sendo proprietários do imóvel a ora embargada e o seu ex-companheiro. 4. Deste modo, a ação poderia ser proposta ou mesmo prosseguir em face de ambos ou de apenas um deles, por não se enquadrar a hipótese na espécie de litisconsórcio passivo necessário. 5. A alegação da embargada de que o imóvel apenas lhe pertencia, diga-se, por força de escritura de dissolução de sociedade de fato e outros pactos lavrada já no ano de 2005, isto é, antes do ajuizamento da ação de cobrança, afigura-se sem qualquer substrato legal, porquanto é regra comezinha de Direito Civil, por determinação expressa do art. 1.245 do CC, que a transferência da propriedade imobiliária somente ocorre com o registro do título aquisitivo perante o Registro de Imóveis. 6. Não seria razoável a oponibilidade a terceiro, no caso o condomínio, de pacto celebrado entre os ex-conviventes e coproprietários do imóvel, ao qual não se havia dado publicidade através do competente registro no RGI, pois o interesse prevalente é o da coletividade de receber os recursos para o pagamento de despesas indispensáveis e inadiáveis. 7. Portanto, como bem pontuado no voto vencido, válido o acordo do Senhor Orcinio com o Condomínio, ajuste este que se não foi cumprido enseja o prosseguimento do feito, para execução do débito. DÁ-SE PROVIMENTO AO RECURSO". 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados. 

Recurso especial: alega violação dos arts. 506 e 507 do CPC/15, bem como dissídio jurisprudencial, sustentando que: (i) não é viável a inclusão da recorrente no polo passivo do cumprimento de sentença, eis que não participou da fase de conhecimento, que fora encerrada com homologação de acordo entre o condomínio recorrido e seu ex-companheiro, Orcínio; (ii) o condomínio tinha ciência de que a posse e propriedade sobre o imóvel eram exercidas exclusivamente pela recorrente porém, a despeito disso, optou por desistir da ação em relação a ela; (iii) o redirecionamento da execução contra a recorrente implica em violação dos princípios da ampla defesa e do contraditório, ante a ausência de oportunidade para questionar o débito exequendo; (iv) de todo modo, tal questão encontra-se preclusa, pois o condomínio não recorreu contra o acórdão do TJ/RJ que, nos autos da ação principal, excluiu a recorrente do polo passivo. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJ/RJ. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal consiste em definir se a proprietária do imóvel gerador dos débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado no bojo de ação de cobrança, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo, uma vez que tramitou apenas em face de seu ex-companheiro. 

I. DA DELIMITAÇÃO FÁTICO-PROCESSUAL DA DEMANDA. 

1. Com vistas à melhor compreensão da controvérsia, convém pontuar brevemente os contornos fático-processuais da demanda, tais como delineados pelas instâncias ordinárias. 

2. As cotas condominiais que pleiteia o CONDOMINIO DO EDIFICIO MERLIN SUL venceram entre dezembro de 2006 e outubro de 2008, período em que o imóvel gerador das despesas encontrava-se registrado em nome da recorrente, MARIA EVELINE, e de seu ex-companheiro, ORCINIO, na proporção de 50% para cada um, em que pese a existência de escritura pública de partilha de bens lavrada em dezembro de 2005 – e à época não registrada –, atribuindo à MARIA EVELINE a integralidade da propriedade do imóvel. 

3. Embora inicialmente tenha o CONDOMÍNIO proposto a ação de cobrança apenas em face da recorrente, o juízo a quo determinou a inclusão de ORCINIO no polo passivo da demanda, ante a informação contida no registro imobiliário. Subsequentemente, houve a assinatura de acordo de pagamento entre o CONDOMÍNIO e ORCINIO, com a desistência da ação em relação à recorrente MARIA EVELINE, em especial porque restou infrutífera a tentativa de sua citação. 

4. Após, devido ao descumprimento do acordo firmado, o CONDOMÍNIO deflagrou o cumprimento de sentença e, não efetuado o pagamento da dívida por ORCINIO, foi determinada a penhora do imóvel. Ocorre que, nesse momento, já constava na matrícula do imóvel o registro da escritura pública de partilha de bens entre ORCINIO e MARIA EVELINE, razão pela qual o juízo determinou a retificação do polo passivo da demanda, a fim de fazer constar apenas a recorrente MARIA EVELINE, efetuando-se a penhora que é discutida nos presentes embargos de terceiro. 

II. DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. 

5. A recorrente alega que a questão relativa ao redirecionamento da execução em seu desfavor encontra-se preclusa, haja vista que o CONDOMÍNIO não apresentou recurso contra o acórdão do TJ/RJ que, nos autos do processo executivo, determinou sua exclusão do polo passivo. 

6. No entanto, da análise do presente processo, verifica-se que o Tribunal de origem não se manifestou quanto à alegação de preclusão, circunstância que impossibilita o exame da matéria por esta Corte, porquanto não satisfeito o requisito do prequestionamento. 

7. Tem aplicação na hipótese, destarte, o óbice da Súmula 211/STJ. 

III. DA NATUREZA JURÍDICA DA OBRIGAÇÃO DE PAGAMENTO DAS DESPESAS CONDOMINIAIS. 

8. Segundo o reiterado entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, respaldado em abalizada doutrina, a obrigação de pagamento das despesas condominiais é de natureza propter rem, ou seja, é obrigação “própria da coisa”, ou, melhor ainda, assumida “por causa da coisa”. 

9. Outrora, muito se discutiu se as obrigações ditas propter rem estariam contidas no universo dos direitos reais, ou se, por outro lado, seriam afetas ao universo dos direitos obrigacionais. Referida diferenciação, ao fim e ao cabo, restou suplantada pela constatação de que “a obrigação propter rem se encontra no terreno fronteiriço entre os direitos reais e os pessoais” (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, Parte Geral: das Obrigações, 9ª ed., Saraiva, vol. II, p. 108); que se formam numa situação de imbricação entre os direitos reais e obrigacionais, assimilando características de ambos (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos reais, 14ª ed., JusPodivm, 2018, p. 56). 

10. SERPA LOPES, se aprofundando no estudo dessa espécie de obrigação, concluiu que ela se caracteriza por decorrer da titularidade de um direito real, impondo a satisfação de determinada prestação relativa à coisa. Assim, as obrigações propter rem “recaem sobre uma pessoa por força de um determinado direito real, com o qual se encontram numa vinculação tão estreita, que o seguem a título de acessórios, inseparáveis” (Curso de Direito Civil, Obrigações em Geral, 2ª ed, Freitas Bastos, vol. II, p. 66). 

11. Em outros termos, caracteriza-se a obrigação propter rem pela particularidade de a pessoa do devedor se individualizar única e exclusivamente pela titularidade do direito real, desvinculada de qualquer manifestação da vontade do sujeito. 

12. Por isso é que, em havendo transferência da titularidade, a obrigação é igualmente transmitida. 

13. Diz-se, então, que a obrigação propter rem é dotada de ambulatoriedade, ou, ainda, que se trata, ela mesma, de obrigação ambulatória. Assim, independentemente da vontade dos envolvidos, a obrigação de satisfazer determinadas prestações acompanha a coisa em todas as suas mutações subjetivas. 

14. Essa característica inerente às obrigações propter rem é bem pontuada por Antônio Junqueira de AZEVEDO, segundo o qual, “justamente no fato de que, nelas, o devedor somente é determinado pela sua condição de titular da propriedade; mudando a coisa de dono, muda a obrigação de devedor. Por isso, também se chamam obrigações ambulatórias; ambulant cum domino ou, como seria possível dizer, ambulant cum dominio” (Restrições Convencionais de Loteamento – Obrigações propter rem e suas Condições de Persistência. Revista dos Tribunais, nº 741, 1997, p. 116). 

15. Especificamente no que concerne à obrigação dos condôminos de contribuir para a conservação da coisa comum, o caráter da ambulatoriedade é extraído do art. 1.345 do Código Civil de 2002, segundo o qual “o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multa e juros moratórios”. 

16. Conforme se depreende desse dispositivo legal, a transmissão da obrigação ocorre automaticamente, isto é, ainda que não seja essa a intenção do alienante e mesmo que o adquirente não queira assumi-la. Com efeito, “a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais acompanha a pessoa do adquirente, que não pode eximir-se com alegação de que os encargos foram gerados anteriormente à aquisição do imóvel” (LOPES, João Batista. Condomínio, 8ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 98). 

17. O sentido dessa norma é intuitivo: fazer prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, permitindo que o condomínio receba, a despeito da transferência de titularidade do direito real sobre o imóvel, as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum, impondo ao adquirente, para tanto, a responsabilidade, inclusive pelas cotas condominiais vencidas em período anterior à aquisição. 

18. Deveras, a disposição do art. 1.345 do CC/02 é indispensável para a própria subsistência do condomínio, “cuja saúde financeira não pode ficar à mercê das mudanças na titularidade dominial” (LOPES, op. cit.). 

19. Mais do que isso, conforme salientou a 4ª Turma por ocasião do julgamento do REsp 1.473.484/RS (DJe 23/08/2018), essa previsão legal intensifica a prevalência da "solidariedade condominial", a fim de que seja permitida a continuidade e manutenção do próprio condomínio, impedindo a ruptura da sua estabilidade econômico-financeira, que prejudicaria a todos os comunheiros. 

IV. DA RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS COTAS CONDOMINIAIS. 

20. Por se tratar de obrigação de natureza propter rem, ou seja, decorrente da titularidade de um direito real sobre a coisa, a responsabilidade pelo pagamento das despesas condominiais recai, por excelência, sobre o proprietário da unidade imobiliária, podendo ainda se estender a outros sujeitos que tenham relação jurídica material com o imóvel e que sobre ele exerçam algum dos aspectos da propriedade, a exemplo de promissórios compradores, locatários, arrendatários, dentre outros. 

21. Outrossim, em havendo mais de um proprietário do imóvel, como ordinariamente ocorre entre cônjuges ou companheiros, a responsabilidade pelo adimplemento das cotas condominiais é considerada solidária. Essa responsabilidade solidária, contudo, não implica a existência de litisconsórcio necessário entre os co-proprietários, podendo o condomínio, portanto, demandar contra qualquer um deles ou contra todos em conjunto, conforme melhor lhe aprouver. 

22. Nesse sentido se firmou a jurisprudência desta Corte, consoante se observa do seguinte precedente: 

“AÇÃO RESCISÓRIA. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALEGAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO MANIFESTA A NORMA JURÍDICA. ARTS. 966, V E VIII, DO CPC/2015. AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELA COMPANHEIRA E MEEIRA. REGULAR INTIMAÇÃO DA PENHORA. FATO EXISTENTE. ALEGAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. EXCEÇÃO PREVISTA NO ART. 3º, IV, DA LEI 8.009/90. OBRIGAÇÕES "PROPTER REM". LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. DÍVIDA SOLIDÁRIA. DECISÃO RESCINDENDA EM DISSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RESCISÃO DO JULGADO. PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE. 1. Pedido desconstitutivo de decisão desta Corte que, reformando acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conheceu do agravo para dar provimento ao recurso especial, reconhecendo como "bem de família a parte da meeira objeto de constrição e, por conseguinte, a impenhorabilidade do imóvel em sua totalidade". [...] 6. "Com relação à legitimidade passiva, observa-se que, em se tratando de obrigação 'propter rem', o pagamento de taxas condominiais deve ser exigido de quem consta na matrícula do imóvel como seu proprietário" (AgRg no REsp 1510419/PR, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 19/12/2016). 7. "Os cônjuges, co-proprietários de imóvel, respondem solidariamente pelas despesas de condomínio, mas esta responsabilidade não implica litisconsórcio necessário em razão da natureza pessoal da ação de cobrança de cotas condominiais" (AgRg no AREsp 213.060/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/10/2012, DJe 06/11/2012). 8. DEMANDA RESCISÓRIA JULGADA PROCEDENTE PARA, EM JUÍZO RESCINDENDO, DESCONSTITUIR A DECISÃO PROFERIDA NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL N. 490.442/SP E, EM JUÍZO RESCISÓRIO, CONHECER DO AGRAVO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (AR 5.931/SP, 2ª Seção, DJe 21/06/2018) 

V. DA RESPONSABILIDADE DA RECORRENTE QUANTO À DÍVIDA CONDOMINIAL SUB JUDICE. 

23. À luz das diretrizes anteriormente fixadas, verifica-se que, na hipótese dos autos, a responsabilidade da recorrente pelo pagamento da dívida condominial sub judice é inafastável. 

24. Ab initio, é de se ressaltar que a própria recorrente confessa que exerce a posse exclusiva do imóvel desde 2005, ou seja, antes mesmo do período em que se venceram as cotas condominiais pleiteadas, sendo, portanto, quem primariamente se beneficiou dos serviços de conservação da coisa. Dessa maneira, ainda que a fase de conhecimento da ação de cobrança tenha tramitado apenas em face de seu ex-companheiro ORCINIO – em razão da titularidade que à época constava no registro imobiliário –, não se pode perder de vista que a recorrente, de fato, é a devedora principal da dívida. 

25. Por outro lado, sob um enfoque formal, é certo que, apesar do acordo firmado entre ORCÍNIO e o CONDOMÍNIO, houve modificação da titularidade do domínio no curso do processo, passando a recorrente a deter 100% da propriedade do imóvel. 

26. Dessa maneira, ante a aquisição da titularidade plena da unidade condominial – o que se dá, frise-se, apenas com o ato do registro, na forma do art. 1.245 do CC/02 –, deve recair sobre a recorrente a responsabilidade pelo pagamento dos débitos sobre o imóvel, mesmo aqueles em nome do “alienante”. 

27. A propósito, convém pontuar que não há qualquer irregularidade no acordo firmado pelo CONDOMÍNIO, eis que, à época da fase de conhecimento, ORCINIO, na qualidade de proprietário de 50% do imóvel, tinha legitimidade passiva para a lide e podia transacionar sem qualquer restrição. 

28. Nesse passo, uma vez descumprido o acordo validamente firmado, mostra-se correta a retomada da ação em face de ORCÍNIO. E, ausente o pagamento voluntário do débito, a penhora do imóvel gerador das despesas é inexorável, ainda que conste, nesse novo momento processual, registro em nome de terceiro. 

29. Aliás, no que concerne à argumentação deduzida pela recorrente acerca dos limites da coisa julgada, impõe salientar que, realmente, nos termos do art. 506 do CPC/15, os efeitos da coisa julgada, como regra, apenas se operam inter partes, não beneficiando nem prejudicando estranhos à relação processual em que se formou. 

30. No entanto, essa regra não é absoluta e comporta exceções. Em determinadas hipóteses, a coisa julgada pode atingir, além das partes, terceiros que não participaram de sua formação. 

31. É o que ocorre, deveras, na hipótese de alienação da coisa ou do direito litigioso. 

32. A respeito, o art. 109, § 3º, do CPC/15 dispõe expressamente que “estendem-se os efeitos da sentença proferida entre as partes originárias ao adquirente ou cessionário”. 

33. Trata-se de previsão legal que, verdadeiramente, faz irradiar a terceiros os efeitos da coisa julgada, em virtude da modificação da situação jurídica da coisa ou bem litigioso. 

34. Em certa medida, essa disposição legal reflete a visão da moderna processualística brasileira no sentido de que a alteração da situação das partes no plano do direito material tem inegável influência sobre o processo, que não pode ser desconsiderada, sob pena de se esvaziar de eficácia a própria tutela jurisdicional. 

35. Nessa toada, na hipótese em julgamento, a conclusão que se alcança é que, sendo a recorrente responsável pelo pagamento das despesas condominiais pela aquisição da plena propriedade, não há necessidade de o CONDOMÍNIO promover nova ação contra ela, na medida em que a sentença prolatada na fase de conhecimento lhe é eficaz. 

36. Outrossim, não se vislumbra qualquer óbice na inclusão da recorrente no polo passivo do cumprimento de sentença em curso, em substituição a ORCÍNIO, ex-proprietário, pois, conquanto o disposto no art. 109, § 3º, do CPC/15 não implique automática sucessão processual, é certo que, por outro lado, não a impede. 

37. Aqui, novamente, a solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Afinal, se a norma de direito material contida no art. 1.345 do CC/02 atribui ao débito condominial caráter ambulatório, impondo o pagamento ao adquirente do bem, inclusive das parcelas vencidas, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, se considere o adquirente o sucessor do anterior proprietário, com vistas à plena satisfação da dívida já consolidada. Não se pode olvidar que, em última análise, o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia ao pagamento da dívida, dada a natureza propter rem da obrigação. 

38. A fim de corroborar o real espírito da obrigação de adimplemento das despesas condominiais, cita-se recente precedente julgado por esta 3ª Turma, em que se admitiu a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante do imóvel em hasta pública, que não participou da relação jurídica originária: 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL (CPC/73). AÇÃO DE COBRANÇA. COTAS CONDOMINIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMÓVEL ARREMATADO EM HASTA PÚBLICA. INFORMAÇÃO NO EDITAL ACERCA DA EXISTÊNCIA DE DÉBITOS CONDOMINIAIS. CARÁTER 'PROPTER REM' DA OBRIGAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ARREMATANTE. SUCESSÃO NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO. CABIMENTO. 1. Controvérsia em torno da possibilidade de inclusão do arrematante no polo passivo da ação de cobrança de cotas condominiais na fase cumprimento de sentença. 2. Em recurso especial não cabe invocar ofensa à norma constitucional. 3. Os arts. 204 e 206, § 5º, I, do CC não contêm comandos capazes de sustentar a tese recursal, atraindo o óbice da Súmula 284/STF. 4. Não há violação aos arts. 489, § 1º, IV e 1.022, II e § único, II, do CPC quando a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 5. Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação "propter rem", constando do edital de praça a existência de ônus incidente sobre o imóvel, o arrematante é responsável pelo pagamento das despesas condominiais vencidas, ainda que estas sejam anteriores à arrematação, admitindo-se, inclusive, a sucessão processual do antigo executado pelo arrematante. 6. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (REsp 1.672.508/SP, 3ª Turma, DJe 01/08/2019). 

39. Sob esse espeque, a manutenção da improcedência dos embargos de terceiro é medida que se impõe. 

Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO. 

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/15, considerando o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida em virtude da interposição deste recurso, majoro os honorários fixados anteriormente em 10% sobre o valor da causa (e-STJ fl. 64) para 15%, observada a concessão da gratuidade de justiça à recorrente. 

22 de abril de 2021

STJ: Condomínio pode proibir aluguel por meio de plataformas digitais

 

4ª turma considerou que a locação, nessas circunstâncias, não tem destinação residencial e, sim, comercial.

O recurso analisado é de mãe e filho que recorreram contra acórdão do TJ/RS. O Tribunal gaúcho manteve a ordem de abstenção da atividade de hospedagem nos dois imóveis que os recorrentes detêm, atendendo a pleito do condomínio.

Sustentações

  • Condôminos

Em sustentação oral, a defesa dos recorrentes afirmou que a prática de locação de dormitórios já era recorrente no condomínio: “Até hoje a locação é desenvolvida em outras unidades autônomas que integram o condomínio, sem que a administração tenha adotado iniciativa semelhante para vedar a locação.

Além disso, destacou que “o eixo principal é a defesa do direito de propriedade” desde que respeitas as regras do condomínio, o sossego e a saúde dos demais condôminos, “sempre respeitados pelos recorrentes”.

  • Airbnb

O Airbnb também se manifestou da tribuna, após o relator Salomão deferir o pedido da plataforma de integrar o processo como assistente. Da tribuna, o Airbnb lembrou que a plataforma só faz a aproximação entre locador e locatário: “O contrato não tem participação do Airbnb, as partes negociam entre elas as condições do contrato de locação, e o locador pode esclarecer as normas de condomínio, as regras a serem seguidas.

Conforme a defesa, o Airbnb “é a antítese da hospedagem”, que carrega serviços. “Sem serviços, não há hospedagem.” Por fim, destacou a importância econômica da plataforma, que girou ano passado quase R$ 8 bilhões – além disso, 23% da renda familiar dos que alugam (os anfitriões) resultam do Airbnb.

Economia compartilhada

O ministro Luis Felipe Salomão inaugurou o voto apresentado à turma destacando a importância do julgamento: “Esses temas que são palpitantes, que dizem respeito à evolução da sociedade, aportam primeiro aqui. A palavra do STJ é muito importante para definição da jurisprudência, fundamentar as decisões que começam a pipocar aqui e ali.

O ministro explicou que a solução da controvérsia passa pela análise acerca de eventual destinação comercial conferida aos imóveis. S. Exa. mencionou dispositivos da lei 11.771/08, que traz normas sobre a política nacional de turismo (art. 23º, §3º e 4º).

Conforme Salomão, a jurisprudência delimita de maneira clara o contrato de hospedagem – que tem como atividade preponderante nesse tipo de serviço o complexo de prestações.

“O contrato de hospedagem compreende a prestação de múltiplos serviços, sendo essa se não a tônica do contrato”, disse o ministro, destacando ser “elemento inerente à sua configuração” serviços como portaria, segurança, limpeza e arrumação dos cômodos.

Assim, entendeu não ser possível caracterizar a atividade realizada pelos proprietários como comercial.

A alegação de alta rotatividade de pessoas, ausência de vínculo dos ocupantes e suposto incremento patrimonial dos recorrentes, não demonstrado, não servem para configuração da exploração comercial dos imóveis, sob pena de desvirtuar a própria caracterização da atividade.”

Luis Felipe Salomão ressaltou que a questão nova, de fato, é a potencialização do aluguel por curto ou curtíssimo prazo decorrente da transformação econômica pelo uso da internet. O ministro lembrou o incremento da realização de negócios entre as partes, que se vinculam por meio de plataformas digitais, e citou outros exemplos da economia de compartilhamento, como o Uber e Booking.

S. Exa. leu trecho do voto do ministro Luís Roberto Barroso proferido em julgamento do STF, que concluiu pela constitucionalidade dos aplicativos de transporte individual de passageiros.

Necessidade de regulação

O relator citou dados econômicos que “retratam o impacto da atividade e seus efeitos em relação a novos empregos”, com incremento de riqueza inclusive em atividades indiretas, bem como doutrinadores de Direito Civil que estudaram a economia compartilhada por plataformas virtuais como o Airbnb.

O ministro analisou as proposições legislativas que tratam do tema, e chamou a atenção para o fato de que o legislador entende que é questão locativa, e não de hospedagem, “porque busca inserir as alterações, nas diversas proposições que existem, no âmbito da regulação de locação”.

Ao mencionar o tratamento da matéria no exterior (Berlim, São Francisco, Barcelona, Amsterdã e outras), Salomão afirmou: “Há uma pulverização de regulamentação dessa atividade, mas tem um ponto comum – a busca pela regulação. Há necessidade de regulação.

De acordo com S. Exa., no atual estágio, não há como enquadrar a atividade “em uma das rígidas formas contratuais existentes no tratamento jurídico existente”.

Afastei a atividade comercial, mas não consegui colocá-la como atividade de locação“, disse, ao salientar a multiplicidade de modalidades negociais, que variam caso a caso.

No caso concreto, Salomão considerou que há evidência de locação por temporada – seja no imóvel em que os recorrentes alugam cômodos ou no imóvel que alugam em sua totalidade, por prazos de curta duração: “As relações negociais mais se aproximam aos contratos de locação por temporada.

Direito de propriedade

Em seguida, o relator tratou dos limites da restrição ao direito de propriedade. De início, recordou que o direito à propriedade tem assento constitucional.

Salomão elencou dois precedentes da Corte, da 3ª e 4ª turmas, nos quais afastadas restrições de condomínio (de proibição de animal e de condômino inadimplente frequentar área de uso comum).

Nos dois casos afastou-se a restrição por falta de razoabilidade frente ao direito de propriedade. Os critérios foram pensados sob o prisma da legalidade, razoabilidade, legitimidade, da proporcionalidade da medida de restrição frente ao direito de propriedade.”

O ministro assentou a ausência de qualquer lei que limite tal comportamento dos requeridos, e que os recorrentes realizam as atividades desde 2011 sem que tenha havido oposição de insurgência dos demais condôminos.

Tampouco há qualquer prova de quebra ou vulneração de segurança no convívio do condomínio. É ilícita a prática de privar o condômino do regular exercício de direito de propriedade em sua vertente de exploração econômica. O uso regular da propriedade em inseparável análise da função social permite concluir pela possibilidade de exploração econômica do imóvel.”

Por fim, lembrou, nos limites da lei, o condomínio poderá adotar outras medidas adequadas, mas não poderá impedir a propriedade como se pretendeu.

Assim, deu provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido do condomínio.

Residência x morada

Em seu voto-vista proferido nesta terça-feira, 20, o ministro Raul Araújo ressaltou que residência é a morada de quem chega e fica. “Não é pousada eventual de quem se abriga em um lugar para partir de outro“, completou.

“O que aluga uma casa em uma zona de praia para passar o verão tem ali uma morada, mas não tem residência. Um estudante que passou na Europa recebendo bolsa de estudos, não tem ali seu domicilio, muito embora ela resida e faça o centro de suas atividades estudantis.”

O ministro considerou que a alta rotatividade de pessoas é indicio da hospedagem, o que não é permitido pela convenção do condomínio. Raul Araújo apreciou argumentos levados pela defesa de que o negócio proposto pela dona do imóvel não se amolda a locação residencial ou mesmo locação por temporada.

“A locação por temporada estabelece prazo máximo de 90 dias e o oferecimento de serviço não está incluído no rol de direitos e deveres de locador e locatário. A relação jurídica analisada é atípica, assemelhando a contrato de hospedagem. O que não pode ser admitido, em face da convenção condominial, é a alteração do contrato típico em convento, a qual restou evidenciada pela prova dos autos.”

Para Raul Araújo, trata-se de modalidade singela e inovadora de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de estrutura típica residencial familiar, exercida sem inerente profissionalismo por aquele que atua na produção desse serviço para os interessados.

“Essa peculiar recente forma de hospedagem não encontra ainda clara definição doutrinaria ou mesmo legislação reguladora no Brasil. Não se confunde com aquelas espécies tradicionais de locação, nem mesmo com aquela menos antiga, denominada de aluguel por temporada. Tampouco se mistura com os usuais tipos de hospedagem ofertados de modo formal por hotéis e pousadas.”

Segundo considerou o ministro, está correta a interpretação das instâncias ordinárias de que os negócios jurídicos realizados não se enquadram nas hipóteses de locação, configurando, na prática, contrato atípico de hospedagem.

“Condomínios e Airbnb”

O ministro dispôs em seu voto a íntegra de artigo publicado por Migalhas, do jurista Sílvio de Salvo Venosa, denominado “Condomínios e Airbnb“. No artigo, o professor sustenta que a solução mais eficiente parece ser a previsão ou proibição de hospedagem pela natureza do condomínio na sua convenção.

“O maior entrave para a utilização generalizada dessa modalidade diz respeito aos condomínios estritamente residenciais. Esta, como inúmeras inovações sociais trazidas nesta contemporaneidade, gera inquietação aos moradores, principalmente pela quebra de segurança, sem falar na interferência do sossego e no eventual tumulto da vida condominial.”

Para Raul Araújo, portanto, existindo na convenção de condomínio regra impondo destinação residencial, mostra-se inviável o uso das unidades particulares, que por sua natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade residencial.

Dessa forma, votou para negar provimento ao recurso especial.

Os ministros Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira acompanharam a divergência.

Em nota, o Airbnb afirmou que os ministros destacaram que, no caso específico do julgamento, a conduta da proprietária do imóvel, que transformou sua casa em um hostel, não estimulada pela plataforma, descaracteriza a atividade da comunidade de anfitriões.

“Além disso, os ministros ressaltaram que a locação via Airbnb é legal e não configura atividade hoteleira, e afirmaram que esta decisão não determina a proibição da atividade em condomínios de maneira geral. Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito de propriedade de quem aluga seu imóvel regularmente.”

 STJ/MIGALHAS

8 de abril de 2021

Condomínio que negligenciou segurança deve indenizar proprietários assaltados

 Sistema de identificação eletrônico estava inoperante.

A 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão que condenou condomínio a indenizar, por danos morais, casal que teve a casa invadida e roubada por negligência da equipe de segurança do local.

O valor da reparação foi fixado em R$ 20 mil para cada um.
De acordo com os autos do processo, o criminoso chegou ao condomínio e, na portaria, solicitou acesso a unidade, dizendo se chamar “Rogério”, mesmo nome de um frequentador usual do apartamento.

De forma negligente, o porteiro interfonou à unidade e, sem esclarecer que não se tratava da mesma pessoa que costumeiramente visitava a casa, solicitou autorização para ingresso dele.

Sem saber que não se tratava do mesmo “Rogério”, os funcionários o deixaram entrar e foram surpreendidos com o assalto. Após o crime, os donos do imóvel solicitaram à equipe de segurança os dados pessoais e do veículo que havia entrado no condomínio, mas foram alertados de que, devido a um problema no sistema na hora do ingresso do criminoso, nenhum dado havia sido colhido.

Para o relator da apelação, desembargador Ruy Coppola, apesar de o Superior Tribunal de Justiça ter fixado entendimento de que não há responsabilidade do condomínio se este não assumiu expressamente em sua convenção a obrigação de indenizar os danos sofridos pelos condôminos, decorrentes de atos ilícitos ocorridos nas áreas comuns do prédio, no caso em questão houve negligência da parte do condomínio em não identificar a pessoa que solicitava entrada e nem tomar nota de seus dados pessoais ou do veículo.

“Era obrigação do funcionário do condomínio identificar corretamente. A culpa se agrava ao existir prova de que o citado Rogério, que constantemente ia ao imóvel dos autores, não era aquele que ingressou no momento dos fatos. E o sistema de identificação eletrônico, no momento dos fatos, estava inoperante. Ou seja, omissão total, desleixo, descaso e inoperância do preposto do réu”, escreveu.

Completaram a turma julgadora os desembargadores Kioitsi Chicuta e Francisco Occhiuto Júnior. A votação foi unânime.
Apelação nº 1021132-09.2018.8.26.0506

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo