A maioria dos ministros da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) não reconheceu o direito de Cláudia
Candal Médici, neta do ex-presidente Emílio Garrastazu Médici, a dividir
a herança de sua avó, Scylla Médici, com Roberto, seu pai, e os
herdeiros de Sérgio, seu tio, morto em 2008.
O julgamento pelo
colegiado foi interrompido no último dia 23 de abril por pedido de vista
do ministro Luis Felipe Salomão. O relator do caso, ministro Raul
Araújo, havia reconhecido os direitos de Cláudia, relativamente aos bens
da falecida, entendendo que a adoção por escritura pública, realizada
pelo general Médici e sua esposa, seguindo o Código Civil de 1916, foi
plenamente válida. Com a adoção, Cláudia passou a ter direito à pensão
militar deixada pelo avô.
Raul Araújo destacou que a nova ordem
constitucional, sem fazer nenhuma ressalva quanto a situações
preexistentes, desfez a diferenciação que antes havia entre filhos
legítimos, legitimados e adotados, possuindo todos, doravante, direitos
iguais, inclusive sucessórios.
Retroatividade máxima
Ao
trazer o seu voto-vista, o ministro Luis Felipe Salomão divergiu do
entendimento do relator. Segundo Salomão, transformar a chamada “adoção
simples” de pessoa maior de idade, realizada por mera escritura pública e
com nítida aparência contratual, em adoção plena, não significa
simplesmente apanhar os efeitos futuros relativos ao direito sucessório.
“Em verdade, significa alterar a própria essência do título,
perfeito e acabado por ocasião de sua feitura, agregando-se-lhe novos e
imprevisíveis efeitos, o que configura, na minha percepção, a chamada
retroatividade máxima, não prevista expressamente pela Constituição para
o caso”, afirmou Salomão.
O ministro destacou ainda que a
adoção por avós de neto maior de idade, no sistema do Código Civil de
1916, sem que houvesse a constatação de estado de filiação de fato, em
princípio, não satisfazia nenhum propósito legítimo, notadamente quando o
adotante, como no caso, possuía filhos biológicos.
“Ou seja,
não há outra explicação lógica para a adoção cartorária como a ora em
exame, entre avós (com filhos biológicos) e neta maior de idade, senão a
de que foi levada a efeito para fins exclusivamente previdenciários”,
afirmou o ministro Salomão.
Os demais ministros da Turma, Maria
Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Aurélio Buzzi seguiram o
entendimento do ministro Luis Felipe Salomão.
Entenda o caso
Cláudia
fez pedido de habilitação nos autos dos inventários dos bens deixados
pelo ex-presidente, falecido em outubro de 1985, e também pela avó,
falecida em fevereiro de 2003. O fundamento do pedido de habilitação era
a escritura pública de adoção datada de fevereiro de 1984, realizada
pelos falecidos, que eram avós biológicos da adotada, já maior de idade à
época.
O juízo no qual tramita o inventário deferiu o pedido de
habilitação apenas quanto aos bens deixados pela avó, indeferindo o
pedido quanto aos bens do ex-presidente Médici, sobrevindo recurso
interposto por Sérgio Nogueira Médici, filho biológico dos falecidos.
O
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) excluiu a adotada da
sucessão da adotante. “Não se pode admitir o efeito de legitimação para
suceder pretendido, pela razão única de que se, por um lado, na vigência
da Constituição da República e do novo Código Civil, não pode haver
discriminação entre filhos biológicos ou adotivos, por outro, avós não
podem adotar netos nem se pode admitir adoção com finalidade meramente
previdenciária”, decidiu o TJRJ.
REsp 1292620
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