18 de abril de 2015

EMBRIAGUEZ LESAO CORPORAL OFENSIVIDADE DA CONDUTA LESAO AO BEM JURIDICO TUTELADO VIOLENCIA DOMESTICA


EMENTA PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. CRIME DE LESÃO CORPORAL (ARTIGO 129, §9º DO CÓDIGO PENAL). RECURSO DEFENSIVO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. ATIPICIDADE MATERIAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. LEGÍTIMA DEFESA OU RECONHECIMENTO DE EXCESSO CULPOSO. PRETENSÃO ALTERNATIVA DE DECLASSIFICAÇÃO PARA A CONTRAVENÇÃO DE VIAS DE FATO. SUBSIDIARIAMENTE, PLEITO DE RECONHECIMENTO DO PRIVILÉGIO E REDUÇÃO DA PENA, EM RAZÃO DA PRÁTICA DO DELITO SOB VIOLÊNCIA EMOÇÃO. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE REPROVAÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS PELA PROVA ORAL. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. VETORES PARA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NÃO OBSERVADOS. ALTA REPROVABILIDADE DO COMPORTAMENTO E GRANDE RISCO SOCIAL DA CONDUTA. AUSÊNCIA DE PROVA SOBRE A EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE DA LEGÍTIMA DEFESA. ANÁLISE DE EVENTUAL EXCESSO CULPOSO PREJUDICADA. PRETENSÃO DESCLASSIFICATÓRIA QUE NÃO SE COMPATIBILIZA COM O TEOR DO LAUDO TÉCNICO. IMPOSSIBLIDADE DE RECONHECIMENTO DA FIGURA PRIVILEGIADA, PELO DOMÍNIO DE VIOLENTA EMOÇÃO. DELITO COMETIDO SOB A INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL, CIRCUNSTÂNCIA CORRIQUEIRA NOS CRIMES COMETIDOS NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, QUE CONTRIBUI PARA AUMENTO DE AGRESSIVIDADE E INTOLERÂNCIA. DESPROVIMENTO DO RECURSO DEFENSIVO.

1. Inicialmente, deve-se consignar que, uma vez mais, se fazem presentes num processo que cuida de delitos praticados no âmbito da violência doméstica, relatos sobre o uso de álcool, o que teria, inclusive, motivado as agressões perpetradas contra a vítima. De se notar que se trata de problema de saúde pública ao qual não se costuma dar a devida relevância e adequado tratamento, lançando-se mão da equipe técnica que guarnece os Juizados de Violência Doméstica, a fim de buscar soluções para os desvios comportamentais que redundam em reiteradas práticas violentas contra a mulher. 2. Atenta, a ilustre representante do parquet em atuação no primeiro grau que subscreveu as contrarrazões recursais, Dra. Renata Christino Cossatis, fez expressa referência, ao fato, quando mencionou que: (...) A experiência prática comprova que a embriaguez é uma das principais causas de agressividade do homem no seio familiar, gerando violência física e psicológica contra a esposa e os filhos.(...) 3. Contudo, é de se lamentar que tal argumentação não tenha se prestado a embasar a impugnação da sentença, que fixou pena no patamar mínimo legal, reconhecendo favoráveis as circunstâncias judiciais, a despeito da narrativa de que as agressões perpetradas contra a vítima se deram enquanto esta trazia em seu colo o filho do casal, de apenas 1 ano e 6 meses de idade. 4. Com efeito, não se pode ignorar que, hodiernamente, requer-se do magistrado, mais que a aplicação da letra fria da lei. Cada vez mais a solução dos feitos reclama sensibilidade e análise sociológica das situações pelo magistrado, a fim de alcançar-se a efetiva justiça e os objetivos de ressocialização, prevenção geral e específica e retribuição. Observe-se que, depois dos fatos, a vítima relatou ter reatado o relacionamento com o apelante, entre idas e vindas, certamente no mesmo cenário de violência doméstica a que esteve submetida, impondo tal rotina violenta, também, ao filho do casal. 5. A materialidade delitiva encontra-se comprovada diante do laudo, que descreve uma lesão equimótica no antebraço direito da vítima. 6. A autoria, por igual, encontra respaldo na prova oral coligida, que apresenta coesão e coerência entre as versões apresentadas tanto em sede policial quanto em juízo pela vítima e pelos policiais militares que atenderam a ocorrência. Não há razão, portanto, para descredenciar-se a prova oral. 7. O apelante, por seu turno, apresentou versões divergentes em sede policial e em juízo. Na primeira oportunidade em que foi ouvido negou categoricamente qualquer agressão em face da vítima, esclarecendo que a discussão foi motivada por ciúmes de sua companheira, quando chegou do trabalho no dia dos fatos. Afirmou que a vítima tentou agredi-lo e, para repelir a agressão, empurrou-a e, em seguida, juntou objetos pessoais da vítima e pediu que ela fosse para a casa de sua mãe. 8. Em juízo, admitiu que no dia dos fatos estava tomando cerveja e estava alterado quando chegou em casa, tendo a discussão se iniciado em razão de ciúmes da vítima. Na ocasião, o apelante admitiu a ocorrência de agressões mútuas, mas negou que o filho do casal estivesse presente. Seguiu afirmando que a vítima tinha o hábito de arranhar-lhe os braços e ameaçá-lo de morte. Admitiu ter jogado os pertences da vítima para fora de casa, ao que esta reagiu, agredindo-o verbalmente, razão pela qual o apelante teria segurado seus braços e a empurrado, provocando seu choque com a parede e, ao depois, uma queda. 9. Como se vê, as declarações da vítima apresentam-se verossimilhantes e encontram respaldo no depoimento do policial militar colhido em sede policial, ao passo que as versões do apelante mostram-se inconsistentes na tentativa de delinear uma linha defensiva de legítima defesa. 10. Como bem salientou o parecer ministerial, impossível acolher-se a pretensão absolutória de atipicidade material por aplicação do princípio da insignificância. Embora sem previsão legal, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite a aplicação do Princípio da Insignificância, desde que presentes os seguintes requisitos: mínima ofensividade da conduta do agente, ausência de periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica causada. Neste sentido, merece transcrição a recente e esclarecedora ementa de julgado, que revela o campo de aplicação do Princípio da Insignificância (RHC 118107, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 18/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-104 DIVULG 29-05-2014 PUBLIC 30-05-2014) 11. Não se pode, portanto, reconhecer a atipicidade material da conduta, como pretende a Defesa Técnica, mas não apenas por se tratar de crime contra a pessoa. Na verdade, é evidente a ofensividade da conduta do agente, assim como o grande risco social da ação e o alto grau de reprovabilidade da conduta. O apelante agrediu sua companheira, causando-lhe lesões corporais, quando esta trazia em seu colo o filho do casal - repita-se, de apenas 1 (um) ano e 6 (seis) meses de idade. Negar a expressividade da lesão ao bem jurídico tutelado, no caso em análise, é praticamente negar o propósito da própria Lei Maria da Penha. 12. A tese defensiva que pretende o reconhecimento da legítima defesa, ou a absolvição em razão da dúvida sobre a excludente em questão, tampouco merece prosperar. Veja-se que a Defesa não produziu qualquer prova capaz de sustentar a tese de autodefesa sobre a legítima defesa, sendo certo que ela incumbiria a realização de tal prova, em razão do que prevê o artigo 333, I do CPC, aplicável subsidiariamente à espécie. 13. Rechaçada a tese de legítima defesa, prejudicada resta a análise da tese que busca o reconhecimento de excesso culposo, que pressupõe a existência da excludente. 14. A pretensão desclassificatória, por seu turno, não encontra respaldo na prova técnica. Como se disse, o laudo de exame de corpo de delito atesta a existência de uma lesão equimótica no antebraço direito da vítima - aliás, descrição absolutamente diversa daquela a que se refere a Defesa Técnica, em suas razões recursais, mencionando a existência de "puxão de cabelo", sequer narrado no processo. 15. Por fim, impossível se afigura o reconhecimento da forma privilegiada do delito, uma vez que o arcabouço probatório não autoriza se diga que o apelante agiu sob o domínio de violenta emoção, após injusta provocação da vítima. 16. O que se verifica, da prova colhida, é que o apelante agiu sob o efeito de álcool, em estado de ânimo alterado - como ele próprio o admitiu em seu interrogatório - perpetrando contra sua companheira agressão, em razão da intolerância e da agressividade fomentadas pelo abuso da bebida alcoólica, como sói ocorrer em casos de violência doméstica. 17. Assim, irrepreensível o juízo de reprovação, que merece ser mantido, embora aplicada com parcimônia a reprimenda penal, ao sentir desta Relatoria, impossibilitada de promover qualquer incremento, por se tratar de recurso exclusivo da defesa e em razão do princípio da vedação à reformatio in pejus. DESPROVIMENTO DO APELO.

0025912-44.2012.8.19.0205 - APELAÇÃO
SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL
Des(a). JOSE MUINOS PINEIRO FILHO - Julg: 15/07/2014

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