A NOVA ORDEM DOS PROCESSOS NO
TRIBUNAL: COLEGIALIDADE E GARANTIAS NO CPC/15
The new procedure in the Courts: collegiality and fundamental
guarantees in the CPC/15
Revista de Processo | vol. 272/2017 | p. 237 - 270 | Out / 2017
DTR\2017\5936
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Guilherme
Jales Sokal
Mestre em
Direito Processual pela UERJ. Procurador do Estado do Rio de Janeiro e
Advogado. Ex-Assessor de Ministro no Supremo Tribunal Federal. Ex-Assessor de
Desembargador no Tribunal Regional Federal da 2ª Região. sokal@uol.com.br
Área
do Direito: Processual
Resumo:
Este trabalho analisa o regime
conferido pelo Código de Processo Civil de 2015 ao procedimento nos Tribunais,
com destaque para as regras reunidas sob o Capítulo “Da Ordem dos Processos no
Tribunal”. Além dos avanços em prol das garantias fundamentais do processo, são
destacados, no texto, os problemas que cercam a nova lei, naturalmente
suscetível aos influxos de uma concepção autoritária ou democrática da Justiça
civil.
Palavras-chave:
Ordem dos processos no Tribunal - Procedimento - Recursos - Garantias
- Colegialidade - Novo Código de Processo Civil
Abstract:
This paper analyzes the regime
provided by the CPC/2015 to the procedure in the Courts, with emphasis on the
rules gathered under the Chapter “Da Ordem dos Processos no Tribunal”. In
addition to the advances in favor of the fundamental guarantees, the text
highlights the problems surrounding the new law, which is naturally susceptible
to the influx of an authoritarian or democratic conception of the Civil
Justice.
Keywords:
Procedure in the Courts - Appeal - Guarantees - Collegiality - New
Code of Civil Procedure
Sumário:
1O tema e seu
real significado: o procedimento nos Tribunais1 - 2Um panorama dos
avanços no novo Código - 3Os problemas cruciais e alguns caminhos - 4Os desafios
do CPC/15: entre autoritarismo e democracia
1
O tema e seu real significado: o procedimento nos Tribunais1
As regras hoje
constantes dos arts. 929 a 946 do CPC/15 (LGL\2015\1656), reunidas sob o
Capítulo “Da Ordem dos Processos no Tribunal”, são retratadas por um nome velho
e traiçoeiro. É velho, em primeiro lugar, porque remonta a uma denominação
clássica no nosso direito processual civil, que já figurava com pequena
diferença no CPC/39 (LGL\1939\3) (“Da ordem do processo na superior instância”),
passou pelo CPC/73 (LGL\1973\5) e que agora chega, quase intacta e com o peso
da tradição, no CPC/15 (LGL\2015\1656). E é traiçoeiro, ou simplesmente não
muito adequado, porque não traduz com fidelidade a importância e o significado
teórico do tema ali regulado. O que verdadeiramente está em jogo naquele
segmento do Código é o procedimento nos Tribunais, seja o procedimento dos
recursos, seja o procedimento relativo a incidentes e ações de competência
originária. É, em última análise, o conjunto de formas que cercam a condução do
processo por um órgão singular ou colegiado no Tribunal, com: (i) a sequência
encadeada de atos; e (ii) as exigências formais relativas a cada ato,
considerados individualmente. Assim, e mais uma vez apesar da
denominação, incorreria em incauto erro quem reduzisse a matéria tratada nos
arts. 929 a 946 à mera sucessão ou “ordem” entre os processos à espera de
julgamento, algo que a redação original do art. 12 do Código até virtuosamente
pretendeu impor, em um compromisso com a impessoalidade lamentavelmente
quebrado com a Lei 13.256/16, e que apenas guarda parcial pertinência com o
art. 936, quanto à ordenação dos feitos na sessão.
Se é da forma
e da sequência dos atos nos Tribunais que se ocupa o tema ora versado, há
muitas razões a justificar seja ele submetido a exame crítico sob o ângulo
teórico. O primeiro fator de importância consiste no propósito de mudar uma
cultura. É que o Estado não presta “um favor” ou “dá esmola” com o
tratamento dispensado aos jurisdicionados na fase recursal. A realidade do
Poder Judiciário brasileiro é a de que, conforme se ascende na hierarquia
judiciária, menor respeito merecesse o cidadão na sua interação com a
autoridade. Essa é uma cultura que perpassa o Poder Judiciário e tem reflexos
inclusive nas regras legais, que em muitos casos, sobretudo no CPC/73
(LGL\1973\5), não guardavam a necessária harmonia com as garantias fundamentais
do processo, institucionalizando julgamentos-surpresa, tolerando que as partes
não fossem comunicadas sobre a realização do julgamento colegiado ou
comprimindo de forma geral a amplitude do contraditório2. Essa
lógica, porém, precisa ser quebrada. Como aponta a Corte Europeia de Direitos
Humanos, é até questionável e incerto se há um dever dos Estados de criar
recursos contra toda e qualquer decisão judicial, com as conhecidas polêmicas
que aqui também reverberam sobre a garantia do duplo grau de jurisdição. Se,
porém, o Estado cria, por lei, um recurso, a facultatividade que porventura
existisse na criação não pode servir de motivo para mitigar o devido processo
legal e a eficácia das garantias fundamentais do processo, que devem ser
respeitados no procedimento recursal tal como em qualquer outra etapa do
exercício da jurisdição3. E o CPC/15 (LGL\2015\1656) oferece um importante
instrumento para romper com essa cultura, remodelando as bases do processo
judicial em atenção a uma concepção democrática da Justiça civil, que esteja
verdadeiramente a serviço do cidadão, e não da autoridade.
O segundo
fator de importância do tema é uma espécie de balanço, que deve e merece
ser feito. Ao definir o procedimento para os recursos nos Tribunais, o
legislador é inspirado a atingir algumas metas, algumas virtudes teóricas que
ficam subjacentes às duas espécies de procedimento: o procedimento completo,
que conduz ao julgamento colegiado, e o procedimento abreviado ou sumário, que
conduz ao julgamento monocrático. O julgamento monocrático se destina,
essencialmente, a promover a celeridade no processo, ao passo que o
procedimento que conduz ao julgamento colegiado, muito mais complexo, visa a
assegurar: (i) o reforço da cognição judicial; (ii) a independência
dos membros julgadores; e (iii) a contenção do arbítrio individual, que
podem ser tidas como as virtudes teóricas da colegialidade4. Assim,
é preciso apurar em qual medida o caminho estabelecido pela lei é capaz de
efetivamente contribuir para o atingimento desses fins, promovendo tais
virtudes teóricas, ou se, ao contrário, as formas erguidas pelo sistema
processual servem antes de obstáculo ou de entrave ao que de mais proveitoso se
poderia auferir do julgamento nos Tribunais. E o ponto repercute sobre
importantes institutos, a começar por uma das diretrizes gerais do Código de
2015, com o novo perfil atribuído ao precedente judicial e, mais amplamente,
aos padrões decisórios elencados no art. 927. Como adiante se verá, há impactos
profundos das regras do procedimento nos Tribunais em um sistema que se calca
na força vinculante de pronunciamentos judiciais, porque intimamente relacionadas,
por exemplo, aos cuidados com que o precedente é formado sob o ângulo formal e,
mais ainda, a como o texto do acórdão que o retrata é redigido, com
consequências para a esfera de todos os demais jurisdicionados, para o bem ou
para o mal.
2
Um panorama dos avanços no novo Código
Firmadas essas
premissas, cumpre agora passar em revista as importantes mudanças que o CPC/15
(LGL\2015\1656) fez aportar no procedimento nos Tribunais, em grande parte
muito bem-vindas. Por sinal, o Código de 2015 como um todo realiza avanços
consideráveis no modelo de prestação da jurisdição civil no Brasil. Há passos
virtuosos, de início, no prestígio à vontade das partes, revelada pela
ênfase nos meios adequados de solução de conflitos (arts. 3º, §§ 2º e 3º, e
334) e na cláusula geral de atipicidade das convenções processuais (art. 190).
O Código promove, em paralelo, mudanças voltadas à simplificação das formas
no processo, de que são exemplos a concentração das respostas do réu na peça da
contestação (arts. 337 e 343) e o esforço de unificação dos prazos recursais
(arts. 1.003, § 5º, e 1.070), além de adotar uma linguagem muito mais clara e
direta do que o antecessor. Por fim, é forte a intenção de alinhar o sistema
processual com as garantias fundamentais do processo, como revelado pelo
Capítulo “Das normas fundamentais do processo”, que congrega os arts. 1º a 12.
Tomando de empréstimo a figura de linguagem de Franco Cipriani5, se
pensarmos o sistema processual como um hospital e os jurisdicionados como os
pacientes, este é, seguramente, um hospital (re)construído mais em atenção às
necessidades dos pacientes do que no conforto dos médicos.
Essas três diretrizes
gerais do Código de 2015, a que se soma também a já referida força conferida
à jurisprudência, repercutiram amplamente sobre o procedimento nos
Tribunais. Para demonstrar o quanto, e considerando os limites deste trabalho,
nas páginas que se seguem: (i) será feita a notícia breve e panorâmica de
algumas mudanças pontuais, para logo a seguir; (ii) empreender com o devido
vagar o exame de quatro tópicos que merecem atenção mais detida.
Em primeiro
lugar, o Código acaba com a figura do revisor, que, segundo o art. 551 do
CPC/73 (LGL\1973\5), tinha lugar no julgamento de “apelação, de embargos
infringentes e de ação rescisória” (CPC/73 (LGL\1973\5), art. 551). A
finalidade da figura, no sistema revogado, era a de quebrar, ao menos no plano
ideal, o “senhorio do relator” sobre o exame dos autos, para que assim dois
membros do colegiado analisassem os atos escritos, assegurando um incremento
efetivo na cognição pela diversidade de perspectivas. A rigor, a remessa dos
autos ao revisor era impulsionada também sob o ângulo do contraditório: se o
processo civil brasileiro é, ainda, marcadamente escrito, e se contraditório
significa direito de influência, os membros do colegiado têm de ter contato
pessoal com os atos escritos das partes nos autos; não basta uma espécie de
participação indireta ou mediata, influenciando o relator para
que este influencie os demais julgadores oralmente na sessão. Todos, portanto,
deveriam ser revisores e em todos os casos, com um colegiado consciente e não
pautado por um infeliz “véu da ignorância”. O Código de 2015, porém, talvez
capitulando diante do difundido diagnóstico de que a participação do revisor,
no cotidiano dos Tribunais, teria se convertido em formalidade estéril,
entendeu por bem suprimi-lo, de modo que todos os demais membros da turma
julgadora, de parte o relator, passam a ser vogais sob a nova lei.
Mais feliz foi
a mudança empreendida no regime do voto vencido. No sistema do CPC/73
(LGL\1973\5), a ausência de declaração de voto vencido, pelo membro dissidente
do colegiado, levava à presunção de que a divergência na votação fosse total6.
Mesmo quando declarado, consolidou-se a orientação, também sob a vigência do
Código revogado, de que a matéria de direito exclusivamente tratada no voto
vencido, e que não constasse do voto vencedor, não satisfaria o requisito do
prequestionamento para a admissibilidade dos recursos aos Tribunais Superiores7;
era preciso opor embargos de declaração para forçar a apreciação do tema pela
maioria vencedora, porque somente então é que haveria efetiva decisão a
esse respeito. Em suma, apesar de elemento do acórdão, o voto vencido padecia
de um rebaixamento em sua dignidade, relegado a segundo plano em seu regime
formal. Esse quadro é bruscamente alterado pelo § 3º do art. 941 do Código de
2015, impondo agora que o voto vencido seja declarado e considerado parte
integrante do acórdão para todos os efeitos processuais, inclusive para a
subsequente aferição do prequestionamento.
Em terceiro
lugar, incorporou-se, no art. 944, uma medida objetiva de promoção de
celeridade, e que tem origem próxima na Lei do Mandado de Segurança (art. 17).
Segundo a nova regra, se não lavrado o texto do acórdão em até trinta dias
desde a data da sessão de julgamento colegiado, as notas taquigráficas passam a
substituí-lo, independentemente de revisão. O dispositivo, por um lado, parece
ter a força de sepultar de vez a orientação jurisprudencial que negava a
existência de um direito subjetivo às notas taquigráficas8, com a
relevante consequência de impor a todos os Tribunais o dever de disponibilizar
os meios materiais para o registro dos debates orais em qualquer julgamento
colegiado. E é importante atentar para o fato de que a disponibilização das
notas taquigráficas traz consequências que vão muito além da hipótese específica
tratada no dispositivo, de demora na elaboração do texto do acórdão; do
contrário, sem o acesso a esse fidedigno retrato da deliberação, mesmo o marco
preclusivo para a alteração dos votos, agora expressamente definido como a
proclamação do resultado pelo presidente do órgão colegiado (art. 941, § 1º),
perde-se no vazio, facilmente burlado pela falta de parâmetros de controle.
Por fim, a
quarta e última notícia de mudança, que há de ser necessariamente breve, tem em
mira o art. 942, que contempla o assim chamado “incidente de ampliação da
colegialidade” ou a “técnica de complementação de julgamento não unânime”,
vocacionado a substituir os embargos infringentes. Tal como redigida a regra,
instituiu-se um regime a um só tempo complexo, lacunoso e incoerente, com a
previsão de incidente processual que: (i) passa a tornar certo e automático o
reexame da causa por ao menos mais dois julgadores, quando, sob o CPC/73
(LGL\1973\5), tal fenômeno ocorria apenas mediante provocação, como era próprio
à voluntariedade inerente aos recursos; e que (ii) ainda conta com sensível
ampliação do âmbito de seu cabimento se comparado com o último perfil dos
embargos infringentes, após a Lei n. 10.352/01, ao menos quanto à apelação,
regrada pelo caput. As muitas implicações que o ponto desperta,
entretanto, tornam-no digno de um estudo próprio, a fim de que não se perca o
fio condutor dos propósitos deste trabalho.
2.1
Os poderes do relator
Em meio a
essas mudanças, o primeiro tópico que reclama exame mais minucioso consiste no
novo regime dos poderes do relator.
No CPC/15
(LGL\2015\1656), a sede dos poderes do relator no processo civil passa a ser o
art. 932. O dispositivo, como facilmente se depreende de sua redação, institui
ordenação muito mais sistemática do que o revogado art. 557 do CPC/73
(LGL\1973\5), porque congrega funções que dizem respeito ao papel do relator
como preparador do julgamento colegiado, no procedimento completo, e também
do relator como órgão para decisão singular final, monocraticamente, no
procedimento abreviado. Para as hipóteses em que o relator apenas prepara o
caminho que conduz ao julgamento colegiado, a ideia geral é transmitida pela
primeira parte do inc. I, com a incumbência de “dirigir e ordenar o processo no
tribunal”, sempre orientado teleologicamente à elaboração da importante peça a
seu cargo, o relatório (art. 931), essencial não apenas para organizar a
deliberação colegiada que ocorrerá em sessão, mas também para catalisar o
contraditório, transmitindo às partes a impressão subjetiva do julgador acerca
dos pontos de cuja solução depende o julgamento da causa9. Para
atingir tal meta é que são por ele exercidas as demais funções preparatórias de
produção de provas (art. 932, I, segunda parte), de apreciação da tutela
provisória (art. 932, II) e do exame da admissibilidade de intervenção de
terceiros (art. 932, VI, para o incidente de desconsideração da personalidade
jurídica, subsumindo-se as demais espécies de intervenção na previsão geral do
inc. I, primeira parte), e sem prejuízo de outras atribuições que lhe sejam
fixadas no Regimento Interno do Tribunal (art. 932, VIII).
O espaço do
julgamento monocrático dos recursos é agora delimitado pelos incs. III, IV e V
do art. 932, além, em certa medida, da parte final do inc. I do mesmo
dispositivo10. Vale a ressalva de que estão neles contemplados, a
rigor, apenas os recursos, e não incidentes e ações de competência originária,
como facilmente se infere, por exemplo, do cotejo com a redação do inc. II do
mesmo dispositivo; por isso, e de parte a extensão já de longa data admitida
pela jurisprudência à remessa necessária11, só com apoio em
autorização legal em outra sede é que, para os demais casos que não ostentem
natureza recursal, o caminho se abrirá ao julgamento singular. De todo modo,
são muitas as mudanças nesse terreno. Em primeiro lugar, o Novo Código não faz
mais uso, no ponto, da expressão “negará seguimento”, que constava do art. 557
do CPC/73 (LGL\1973\5) para designar um gênero. E se tratava de um
gênero porque “negar seguimento”, sob a égide do Código revogado, poderia
significar decisão fundada tanto em razões de admissibilidade quanto de mérito
do recurso, se atentamente observado o feixe de hipóteses a que estava o
relator autorizado a agir à luz do caput do art. 557, de modo que, a bem
da verdade, o único denominador comum que as reunia era o fato de o
procedimento recursal ser abreviado em desfavor do recorrente. O Novo Código,
ao contrário, tenta primar pela clareza e separa, nos incs. III, IV e V,
admissibilidade e mérito dos recursos no julgamento monocrático, empregando
corretamente as expressões, no inc. III, “não conhecer”, que traduz a
inadmissibilidade proclamada pelo órgão ad quem, e “negar provimento” e “dar
provimento”, nos incs. IV e V, em casos de julgamento de mérito contra e a
favor do recorrente.
Outra
característica marcante que ressai da leitura dos três incisos é a supressão do
advérbio “manifestamente” e do adjetivo “manifesto”, que constavam,
respectivamente, dos casos de negativa de seguimento e de provimento
monocrático do recurso no caput e no § 1º-A do art. 557 do CPC/73
(LGL\1973\5). A retirada dessas balizas, que ostentavam forte dose de
indeterminação, não deve ser tida, no entanto, como sinal de alargamento do
espaço de atuação singular do relator. É que, a bem da verdade, tais palavras
nunca serviram, sob o Código de 1973, como um limite a quem quer que fosse na
prática; o julgamento monocrático era realizado como verdadeira regra geral,
sem que o “manifestamente” ou o “manifesto” fossem suficientes a incutir
qualquer dose de prudência nos Tribunais para este fim. E, como se verá logo à
frente, apesar de retirado esse dúctil limite textual, a previsão das hipóteses
de julgamento monocrático de mérito ficou seguradamente mais fechada no
Novo Código, por ter de se conformar às alíneas que compõem os incisos IV e V
do dispositivo.
Passando ao
exame das três regras, o inc. III, como já dito, inaugura o julgamento
monocrático com a enunciação dos casos de inadmissibilidade do recurso. Mais
uma vez, o legislador de 2015, seguindo os passos do dispositivo revogado, é
largamente redundante na redação do dispositivo: recurso prejudicado, pela
chamada perda de objeto, é recurso inadmissível por falta superveniente do
interesse em recorrer, assim se reconduzindo a um dos requisitos gerais de
admissibilidade dos recursos; da mesma forma, a falta de impugnação específica
dos fundamentos da decisão atacada, no recurso, revela a ausência do requisito,
também geral, da regularidade formal. Portanto, a rigor bastaria a alusão, na
redação do enunciado normativo, a “não conhecer de recurso inadmissível”,
porque todo o remanescente é apenas repetição de algo que naquela expressão já
se contém12.
Antes de não
conhecer de recurso, no entanto, o Código de 2015 impõe uma virtuosa medida ao
relator, norteada pela ideia, que está subjacente ao art. 4º do Novo Código e
ao sistema de invalidades do processo, de primazia do julgamento de mérito,
em uma linha muito clara de combate à chamada jurisprudência defensiva
dos Tribunais. Por força do parágrafo único do art. 932, a inadmissibilidade só
poderá ser pronunciada se antes for franqueada ao recorrente a oportunidade de
sanar o vício ou complementar a documentação exigível, no prazo de cinco dias.
É, em última análise, a flexibilização da preclusão consumativa em prol da
adoção de uma cláusula de sanabilidade dos requisitos de admissibilidade, desde
que se trate, evidentemente, de vício sanável13. Essa é uma
medida imperativa, e que espelha a mesma diretriz inscrita no art. 317 em
relação ao julgamento sem exame de mérito em primeiro grau, e da qual o relator
não poderá se furtar, sob pena de nulidade, inclusive no que concerne aos
Tribunais Superiores14.
Já nos incs.
IV e V do art. 932 o Código cuida das hipóteses de exame de mérito do recurso
pelo relator, respectivamente, contra o recorrente e a seu favor. Há um fator
relevante nesse novo tratamento, pela unificação, para um lado e para outro,
das hipóteses de julgamento de mérito. No CPC/73 (LGL\1973\5), vigorava um
regime por assim dizer bifurcado: o provimento monocrático de recurso só
era possível, pelo § 1º-A do art. 557, se fosse fundado em súmula ou
jurisprudência dominante do STF ou de Tribunal Superior; já o desprovimento
monocrático do recurso era possível naqueles mesmos casos e também (i) com base
na jurisprudência dominante do Tribunal local e (ii) se o recurso fosse
manifestamente improcedente. O “manifestamente” foi suprimido, na nova lei, junto
com o simples “improcedente”, remanescendo no Código apenas, tanto para dar
quanto para negar provimento, as hipóteses fundadas em orientação
jurisprudencial, mas uniformizadas em hipóteses específicas. Assim, quer no
inc. IV, quer no inc. V, sob o CPC/15 (LGL\2015\1656) o julgamento monocrático
de mérito há de ocorrer baseado em: “a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do
Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal”; “b) acórdão proferido
pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recursos repetitivos”; ou “c) entendimento firmado em incidente
de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência”.
Como se vê, a
vaga expressão “jurisprudência dominante” deixa de figurar no rol, substituída pelo
necessário amparo em súmula, acórdão em recursos repetitivos ou decisão em IRDR
ou assunção de competência, que são técnicas específicas de formação de
precedentes ou de parâmetros decisórios no sistema do CPC/15 (LGL\2015\1656). E
isso é uma mudança brusca. Ao permitir o julgamento monocrático fundado na “jurisprudência
dominante”, o CPC/73 (LGL\1973\5) atribuía ao relator do caso presente – isto
é, aquele a ser julgado – uma margem ampla de manipulação para se arvorar a
proferir decisão de modo singular: bastava, sob o ângulo prático, a menção a
duas ou três ementas, v.g., do Superior Tribunal de Justiça em um mesmo
sentido para formalmente fazer constar que haveria “jurisprudência dominante”,
ainda que existissem diversos outros julgados no sentido oposto do mesmo
Tribunal tido por referência15. Com a mudança operada pelo CPC/15
(LGL\2015\1656), que agora aponta para técnicas específicas de formação de
padrões decisórios como base para o julgamento monocrático, desloca-se o foco
da autoridade na verificação da existência de orientação a ser seguida, com uma
espécie de chamado à consciência do Tribunal. Parte o legislador da
ideia de que, ao editar súmula ou ao proferir julgamentos em casos repetitivos
ou em incidente de assunção de competência, as Cortes terão a consciência de
que a tese jurídica ali posta valerá para outros casos, como mecanismos formais
para consolidar uma orientação com certeza pontual e proclamada, o que é muito
diferente da mera reiteração de decisões em um mesmo sentido. Evidentemente,
ainda caberá ao relator no caso presente identificar a pertinência do padrão
decisório ao caso concreto, mas deverá necessariamente apontar em qual das
alíneas dos incs. IV e V o caso se enquadra, sob pena de nulidade16.
Além dessa
unificação, vale um destaque para a passagem que figura na primeira parte do
inc. V, que agora baliza o provimento monocrático dos recursos com um marco
temporal definido, qual seja: “(...) depois de facultada a apresentação de
contrarrazões, (...)”. Neste ponto, o Código resolve, e para o bem, um problema
nos recursos interpostos diretamente no Tribunal ad quem, que chegam ao
contato do relator antes de o recorrido ter oportunidade de apresentação de
contrarrazões. O exemplo é o agravo de instrumento. Se o relator, neste caso,
julga em desfavor do recorrente, negando provimento monocraticamente ao
recurso, não há vício algum em fazê-lo antes das contrarrazões, porque sem
prejuízo ao recorrido. Se, porém, ocorre o inverso, dando-se provimento
monocrático ao agravo de instrumento sem ouvir, antes, o agravado, há ofensa
clara à garantia do contraditório como audiência bilateral (art. 9º, caput),
que é sempre prévio, só se justificando a postergação quando houver risco para
a própria efetividade do provimento. Sob o Código de 1973, embora inicialmente
vacilante, o STJ veio a fixar, em 2010, em sede de recurso especial repetitivo,
a orientação para prestigiar a garantia do contraditório e vedar a aplicação do
art. 557, § 1º-A, antes das contrarrazões17, em linha que agora é
transformada em lei pelo Código de 2015.
Por fim, duas
últimas observações. Se, por um lado, o parágrafo único do art. 932 abarca
apenas os casos de inadmissibilidade, também o art. 10 do Código deverá ser
observado pelo relator, nos Tribunais, quando for caso de julgamento
monocrático de mérito. E deverá fazê-lo, ao aplicar os padrões decisórios
enumerados nas alíneas “a” à “c” dos incisos IV e V do art. 932, por conta do
que prega o art. 927, § 1º, do Código. Em outras palavras, as partes devem ter
a oportunidade de influenciar o próprio enquadramento do caso presente ao
precedente ou à súmula invocada, no que se inclui a suscitação de eventual distinguishing,
evitando-se a decisão-surpresa. Além disso, no sistema do CPC/15
(LGL\2015\1656), qualquer decisão que o relator proferir com base no art. 932,
seja de julgamento de forma singular ou como mero preparador para a deliberação
colegiada, é impugnável por agravo interno, cujo cabimento é delineado pelo
art. 1.021 de modo bem mais amplo do que no diploma revogado18.
2.2
A intimação prévia da pauta
Destaque
também deve ser conferido ao tema da intimação prévia da pauta nos Tribunais,
que retrata com traços bem nítidos a dimensão do respeito que o Poder
Judiciário dedica ao cidadão, abrindo ou fechando as portas para o efetivo
comparecimento das partes e de seus advogados ao julgamento em sessão. Há,
neste campo, enormes avanços, se comparada a disciplina do CPC/15
(LGL\2015\1656), em especial nos arts. 934 e 935, com a que constava do Código
de 1973, e tanto no que toca: (i) ao rol de casos que devem ser incluídos em
pauta quanto na própria (ii) antecedência exigida pela lei.
Em primeiro
lugar, há mudança considerável quanto ao prazo de antecedência da intimação da
pauta em relação ao dia de realização do julgamento. Sob o CPC/73 (LGL\1973\5),
tal prazo, absolutamente exíguo, consistia em meras quarenta e oito horas, na
forma do art. 552, § 1º, então em vigor. Por força do art. 935 do Código de
2015, ao contrário, a antecedência passa a ser de cinco dias, mais do que o
dobro, e contados apenas em dias úteis, como resulta do art. 219 do novo
diploma, em um notável ganho em previsibilidade, assegurando-se às partes o
amplo acesso aos autos até a data da sessão (art. 935, § 1º).
Em segundo
lugar, o Novo Código reduz em muito os casos dos chamados julgamentos “em mesa”,
um atentado cometido pelo Poder Judiciário ao direito “a um dia na Corte” e, em
última análise, ao contraditório como previsibilidade e vedação à surpresa. A
tônica autoritária dessa prática é escancarada por um simples paralelo com a
Audiência de Instrução e Julgamento em primeira instância: tal como seria
impensável a realização desta última sem que antes fossem intimados autor e réu
quanto ao dia e hora em que o órgão judicial pretende promovê-la, também assim
deveria ser tida a tentativa de levar, silenciosa e sorrateiramente, um
processo a julgamento colegiado nos Tribunais sem prévia comunicação às partes.
Não obstante, tais julgamentos “em mesa” ocorriam, sob o Código anterior,
sobretudo nos Embargos de Declaração, no Agravo Interno e nos casos de
adiamento, contribuindo para um cenário de absoluta insegurança para os
jurisdicionados19. E isso se passava sem nenhum apoio em
justificativa racional, nem mesmo sob a bandeira da celeridade, porque, se é
verdade que o julgamento “em mesa” acelera a realização da sessão colegiada
após a formação da convicção pelo relator, nenhum controle é dedicado ao tempo
na etapa imediatamente anterior, isto é, entre os momentos em que o feito
esteja apto a julgamento e o relator, após exame, dê-se por convencido. Era, em
suma, um emblemático caso de celeridade no interesse exclusivo da administração
da justiça e contra o jurisdicionado, em um grave resquício autoritário
no procedimento nos Tribunais.
Isso muda
radicalmente com o art. 934 do Novo Código. Conforme redigida, a regra é bem
abrangente, para abarcar todas – ou quase todas – as espécies de
recursos do Código, já que o Livro III, em que se insere o dispositivo, cuida “dos
processos nos Tribunais e dos meios de impugnação das decisões judiciais”. Por
força disso, torna-se impositiva a inclusão em pauta, no CPC/15
(LGL\2015\1656), para o agravo interno, o que é reforçado pela parte final do
art. 1.021, § 2º. Os Embargos de Declaração, no entanto, passam a se submeter a
regime especial, fora da regra geral: segundo o art. 1.024, § 1º, “[n]os
tribunais, o relator apresentará os embargos em mesa na sessão subsequente,
proferindo voto, e, não havendo julgamento nessa sessão, será o recurso
incluído em pauta automaticamente”, em regramento que, em teoria,
pressupõe um dever de diligência do advogado no acompanhamento da causa20.
Linha similar
foi acolhida na regência do adiamento. Sob o Código de 1973, estabeleceu o STJ,
na ausência de regra legal expressa, a dispensa de intimação de nova pauta, no
adiamento, se o julgamento fosse retomado em até três sessões posteriores à
sessão original; passado tal prazo, delimitado com a ideia de conferir uma
margem mínima de previsibilidade, nova publicação de pauta seria necessária21.
O Novo CPC altera também esse ponto e aproxima o regime do adiamento daquele
dos Embargos de Declaração: incluído um processo em pauta para determinada
sessão, se o julgamento for adiado para a sessão imediatamente subsequente,
dispensa-se a nova publicação da pauta; se não for julgado na sessão imediata,
porém, impõe-se nova publicação, como prevê o art. 935, caput, parte
final. E, nesse terreno, impactam de forma virtuosa também os princípios da
boa-fé (art. 5º) e da cooperação (art. 6º), agora expressamente proclamados na
Parte Geral do CPC/15 (LGL\2015\1656), ao convergirem para vedar a adoção de
comportamento contraditório pela autoridade judicial. Por força desses vetores,
é evidentemente nula a postura de um dos membros do colegiado de, no início da
sessão colegiada em que a apresentação de voto-vista fora pautada, indicar o
adiamento do julgamento, fazendo com que, diante dessa notícia, os advogados
que patrocinam a causa se retirem da sala de sessão, para logo a seguir, ao
final da mesmíssima assentada, voltar atrás e proferir o voto-vista. Há, neste
cenário, quebra clara e inegável da confiança legítima do jurisdicionado,
porque também a autoridade judicial deve tratar com seriedade seus próprios
atos, como reconhecido pela 1ª Turma do STJ já sob a vigência do CPC/15
(LGL\2015\1656), ao afirmar a nulidade do julgamento e impor, em tal hipótese,
nova intimação prévia da pauta para a apresentação do voto-vista22.
2.3
A sustentação oral
O regime da
sustentação oral agora encontra sede, predominantemente, no art. 937 do Código
de 2015.
O caput
apresenta ligeiras alterações de redação se comparado ao art. 554 do CPC/73
(LGL\1973\5), mantendo o prazo geral de quinze minutos para a fala,
excepcionado apenas para a sustentação oral no julgamento de mérito do
Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR)23. Neste
último caso, autor e réu do processo originário e o Ministério Público passam a
ter, cada um, o prazo de trinta minutos. Para os demais interessados que
intervenham no incidente, e desde que promovam inscrição com dois dias de
antecedência, estipula a lei um prazo único, de trinta minutos, que deve ser dividido
entre todos, ressalvada a possibilidade de prorrogação – que tudo recomenda
seja utilizada com larga dose de generosidade pelo órgão judicial, sob pena de
absoluta inefetividade da participação e de abertura apenas pro forma do
debate no julgamento (art. 937, § 1º, c/c art. 984, I, II, e § 1º).
Nos nove
incisos que se seguem ao caput do art. 937 figuram os casos que
comportam sustentação oral no Novo CPC. A rigor, não há novidade nos recursos
tratados nos incs. I a V, que se referem à apelação, ao recurso ordinário, ao
recurso especial, ao recurso extraordinário e aos embargos de divergência. O
inc. VI, por sua vez, cuida de hipóteses que não são recursos, mas ações
autônomas de impugnação, prevendo a sustentação oral em ação rescisória,
mandado de segurança e reclamação, e que guarda importante conexão com a
inovação constante do § 3º do mesmo dispositivo, a seguir mencionada. A grande
e importante mudança neste tema reside no inc. VIII do art. 937, que agora
autoriza sustentação oral em um caso especial de agravo de instrumento: o
agravo de instrumento interposto contra decisões interlocutórias que versem
sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência. O legislador,
neste ponto, reconheceu a verdade incontrastável de que tais decisões
interlocutórias, por produzirem efeitos para fora do processo em um juízo de
cognição sumária, são relevantíssimas para a vida das partes, algumas vezes até
mais, sob o ângulo prático, do que a sentença de mérito, a ser proferida após a
instrução necessária à cognição exauriente. Sendo assim, justifica-se a feliz
ampliação da possibilidade de influência franqueada às partes, concedendo-se a
sustentação oral no julgamento do agravo.
A versão do
texto do Código de 2015 aprovado no Congresso Nacional continha outra inovação,
para ampliar a sustentação também ao agravo interno em determinadas hipóteses
listadas no inc. VII do art. 937, isto é, “no agravo interno originário de
recurso de apelação, de recurso ordinário, de recurso especial ou de recurso
extraordinário”. Muito embora criticável a redação, por não abarcar outras
hipóteses de recursos originalmente com sustentação que deveriam mantê-la em
agravo interno, como, v.g., o mencionado agravo de instrumento sobre
tutela provisória, o dispositivo representava, inegavelmente, um avanço,
assegurando que o exercício indevido do julgamento monocrático não levasse à
supressão da prerrogativa de participação justamente no julgamento que se
destinava a controlá-lo. A Presidência da República, porém, vetou a regra, sob
o frágil argumento de “perda de celeridade processual, princípio norteador do
novo Código, provocando ainda sobrecarga nos Tribunais”. Apesar do veto
pontual, subsiste, no texto do Código, um caso especial de sustentação oral em
sede de agravo interno, regulado pelo § 3º do art. 937, que a concede nos
processos de competência originária previstos no inciso VI – isto é, ação
rescisória, mandado de segurança e reclamação – no julgamento do agravo contra
decisão extintiva do relator. Em um cenário assim traçado, o suposto ganho em
celeridade invocado pelo veto presidencial, evitando a demonizada ampliação em
quinze minutos do julgamento e mais uma vez contra o jurisdicionado,
trouxe consigo uma crise de coerência, porque, para este fim do cabimento de
sustentação oral, nada justifica a diferença de tratamento entre os recursos e
as ações de competência originária nos Tribunais.
2.4
O feliz art. 933: a incorporação do contraditório como não surpresa
Por fim, o
quarto e último tópico a merecer exame no procedimento recursal sob o CPC/15
(LGL\2015\1656) consiste no art. 933. Esse dispositivo incorpora a concepção do
contraditório como influência sobre questões conhecíveis de ofício24,
que tem a sede principal no art. 10 do Código, situado na Parte Geral, mas
contextualizando essa norma fundamental no procedimento nos Tribunais,
sobretudo no julgamento colegiado. É, também neste ponto, uma inovação virtuosa
do Código, que promove o respeito às garantias fundamentais do processo.
O caput
do art. 933 trata, em primeiro lugar, da hipótese de o relator, ao examinar os
autos, se deparar de ofício com uma questão de direito não debatida ou, ainda,
um fato superveniente, caso em que deverá ordenar a intimação das partes para
manifestação sobre o ponto, no prazo de cinco dias, antes de levar o caso a
julgamento colegiado ou monocrático. Além disso, os §§ 1º e 2º do art. 933
promovem importantes ajustes no procedimento para que essa inclinação de
vedação às decisões-surpresa, explicitada pelo art. 10 mas a rigor decorrente
diretamente da garantia do contraditório participativo insculpida na
Constituição (CF (LGL\1988\3), art. 5º, LV), não seja suplantada por entraves
de ordem formal, que provavelmente encontrariam eco na jurisprudência
defensiva dos Tribunais Superiores. Isso porque a suscitação de questão de
ofício ou o fato superveniente podem vir a lume mesmo depois de já iniciada a
deliberação colegiada, trazidos, por hipótese, por outros membros julgadores
que não o relator. Para não fechar os olhos a essas variantes, o Código, no §
1º, assenta que, estando em curso o julgamento, se sobrevier o exame de uma
questão de ofício, deverá ocorrer a suspensão da deliberação, a fim de que as
partes se manifestem especificamente sobre o ponto. Já o § 2º do art. 933
alberga a hipótese de a questão de ofício ser suscitada na pendência de pedido
de vista por um dos votantes, com os autos em poder dele, caso em que os autos
devem ser encaminhados ao relator, que deverá abrir oportunidade de
manifestação às partes em igual prazo do caput, para que posteriormente
haja nova inclusão em pauta com o prosseguimento do julgamento e exame da
questão pelo colegiado.
Tome-se, por
exemplo, para dimensionar os impactos da nova regra, o exercício do controle
abstrato de constitucionalidade. O STF, de longa data, reconhece a
possibilidade de, no julgamento em tese da validade de um ato normativo,
considerar vícios de inconstitucionalidade não alegados pelo autor, em atenção
à ordem constitucional em seu todo. Essa possibilidade, construída sob a
denominação de abertura da causa de pedir25 e aplicável à
representação de inconstitucionalidade nos Tribunais de Justiça (CF
(LGL\1988\3), art. 125, § 2º), não pode significar ofensa ao contraditório como
não surpresa, já que a perspectiva de conhecimento de ofício jamais há de afastar
a oportunidade de influência das partes. Nada justifica, assim, o afastamento
do art. 933, caput, e parágrafos, no controle abstrato, de modo que
mesmo a razão de inconstitucionalidade considerada de ofício deve ser submetida
ao crivo do contraditório, ainda que surgida nos debates em sessão, sob pena de
nulidade. Do contrário, chegar-se-ia ao contrassenso de o “guardião da
Constituição” (CF (LGL\1988\3), art. 102) desrespeitar as normas desta
justamente no iter da atividade destinada a preservá-las, no que se
inclui a garantia do contraditório participativo26.
A feliz
inspiração e os muitos avanços em prol do contraditório presentes na nova regra
não impedem, contudo, que se lancem luzes sobre um aspecto deficiente no regime
instituído. É que não revela a lei de modo claro qual a forma de
manifestação das partes na hipótese do § 1º, após a imediata suspensão da
deliberação colegiada que teve início: se deve ocorrer de forma escrita e com
prazo de cinco dias, nos termos do caput, ou se oral, imediatamente
na própria sessão. Embora a oralidade seja a tônica da sessão colegiada de
julgamento, a melhor interpretação parece repudiar a forma necessariamente oral
de manifestação em tal hipótese. Se considerarmos especialmente o fato
superveniente trazido de ofício por um dos julgadores na sessão, é fundamental
para a efetividade do contraditório que o advogado da causa presente ao
julgamento tenha oportunidade de consultar a parte sobre os reais limites do
novo fato que atinge a relação jurídica discutida em juízo, bem assim para
saber se há ainda outro fato modificativo ou extintivo passível de
alegação no cenário então alterado. Nada disso, evidentemente, pode ser feito
de imediato na sessão. E mesmo em relação à questão exclusivamente de direito
apreciável de ofício a interpretação não pode ser diferente, para evitar a
surpresa processual, que retira o tempo necessário a articular os elementos de
defesa da maneira mais eficaz à proteção da posição subjetiva da parte,
especialmente por conta da interpretação sistemática com o § 2º e o caput.
Reforça-se essa conclusão pelo fato de o julgador, quando não se considerar “habilitado
a proferir imediatamente seu voto”, ter a seu alcance o pedido de vista dos
autos (art. 940): somente uma concepção autoritária da Justiça civil
reconheceria o peso da dificuldade prática de construir o raciocínio na sessão
apenas para os julgadores, fechando os olhos para as partes27.
Assim, prestigiando-se o contraditório como previsibilidade do procedimento, a
manifestação do art. 933, § 1º, ocorrerá, como regra, de forma escrita, nos
termos do caput, mas sem prejuízo de que as partes, por seus
advogados na sessão, manifestem concordância expressa com a forma oral imediata28.
3
Os problemas cruciais e alguns caminhos
O quadro da
disciplina do procedimento nos Tribunais, como se vê, sai sensivelmente
aprimorado com as alterações promovidas pelo CPC/15 (LGL\2015\1656). Como, no
entanto, um sistema processual ganha vida não apenas guiado pela letra fria da
lei, e como a própria lei, obra humana que é, jamais alcança o ideal de
perfeição, é preciso apontar também o outro lado, isto é, alguns
problemas cruciais neste terreno ou: (i) que o Código, em seus poucos meses de
vigência, já está enfrentando; ou (ii) que o Código mesmo criou ou; por fim,
(iii) que o Código simplesmente não se aventurou a resolver. Tais entraves, que
podem ser sumariados como problemas de negação, problemas de
coerência e problemas de efetividade, serão expostos nas linhas que
se seguem, acompanhados, sempre que possível, da tentativa de abrir caminhos
para a respectiva superação.
3.1
Problemas de negação do novo
Comecemos por
aquilo que pode ser tido como “problemas de negação do novo”, em uma
resistência franca e direta às mudanças introduzidas pelo Código de 2015. Tal
fenômeno assume vez ou outra um disfarce sob a veste de interpretação
principiológica ou coisa que o valha, mas que, em sua dimensão mais sincera,
consiste na pura e simples desobediência, e justamente por quem deveria zelar
pela fiel aplicação da lei.
O primeiro
exemplo diz respeito ao julgamento monocrático dos recursos, e vem
lamentavelmente do Superior Tribunal de Justiça. Como antes visto, o Código de
2015 tentou fechar o julgamento monocrático de mérito, restringindo-o
aos casos em que houver amparo em padrão decisório especificamente listado nas
alíneas dos incs. IV e V do art. 932. O STJ, entretanto, editou, em 18/03/2016,
o dia da entrada em vigor do Código novo, a Emenda 22/2016 ao Regimento
Interno daquela Corte, alterando o art. 34, XVIII, “b” e “c” para autorizar o
provimento ou desprovimento do recurso pelo relator também diante de “jurisprudência
dominante acerca do tema”29. Um dispositivo regimental, portanto, na
franca contramão do regramento que a lei federal institui para o mesmo tema, e
com o condão de fazer naufragar os avanços que esta tencionava promover. E nem
mesmo por hipótese essa inovação do Regimento Interno poderia buscar apoio no
art. 932, VIII, do CPC/15 (LGL\2015\1656), que contempla a possibilidade de o
relator “exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do
tribunal”. Por certo, o campo assim aberto ao Regimento encontra limite naquilo
que a própria lei federal já desde logo discipline, como é precisamente o caso
das balizas para o julgamento monocrático, sob pena de subverter a hierarquia
das fontes. Não fosse assim estaria também ao alcance do Regimento Interno, por
exemplo, autorizar o julgamento monocrático da admissibilidade de pedido de
instauração de IRDR, em sentido diametralmente oposto à reserva de
colegialidade instituída pelo art. 981 do CPC/15 (LGL\2015\1656)30.
Mas não é só.
O grave quadro é ainda complementado pela edição, em 17 de março de 2016, da
Súmula 568 (MIX\2016\17220) do STJ, segundo a qual “o relator, monocraticamente
e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso
quando houver entendimento dominante acerca do tema”, reforçando também por
essa via a tentativa de manutenção do julgamento monocrático fundado em
jurisprudência dominante. De parte, conforme já exposto, o franco descompasso
com a lei cuja entrada em vigor já se avizinhava, a nova Súmula, se invocada
para amparar o julgamento monocrático sob o Código novo, atenta contra a regra
do art. 926, § 2º, do CPC/15 (LGL\2015\1656), e por um motivo muito singelo:
tendo ela sido editada, repita-se, antes da entrada em vigor do Código (!), simplesmente
não havia qualquer decisão a apoiar a suposta consolidação do verbete sob o
sistema do Código de 2015. Sendo assim, ou bem a Súmula deve ser tida por
revogada um dia após sua edição, dada a vigência do Código em 18 de março de 2016,
ou, o que é mais provável, servirá ela de um ilegal escudo mesmo sob a égide do
sistema processual de 2015, criando direito novo em um ato de pura vontade
para, ao fim e ao cabo, deixar as coisas como sempre foram.
Enquanto o
primeiro exemplo vem, por assim dizer, “de cima” na hierarquia judiciária, a
segunda expressão de negação do novo vem dos Juizados Especiais. Há uma
difundida resistência desse ramo da Justiça em observar as novas regras do
Código de 2015: é como se todo o sistema dos Juizados Especiais, composto pelos
Juizados Cíveis (Lei 9.099/95), os Federais (Lei 10.259/01) e os da Fazenda
Pública (Lei 12.153/09), estivessem em uma espécie de trincheira,
lutando contra a incidência do novo Código e contra todas as mudanças que dele
decorrem. As armas, nessa trincheira, são os chamados “princípios” ou “critérios”
reitores dos Juizados, como simplicidade, informalidade, economia processual e
celeridade (art. 2º da Lei 9.099), que impediriam a incidência das regras
gerais do processo civil àquele ramo da Justiça civil por uma suposta
incompatibilidade sistêmica. Como largamente propagado, essa resistência teve
como um de seus principais alvos a delicada questão da contagem dos prazos
apenas em dias úteis, fixada no art. 219 do CPC/2015 (LGL\2015\1656) mas que
não se harmonizaria, segundo uma dada corrente que tomou corpo, à busca por
celeridade nos Juizados Especiais31.
A resistência
com o novo alcançou, como era natural, também o domínio do procedimento dos
julgamentos colegiados nas Turmas Recursais dos Juizados, de que é exemplo o
regime do prazo mínimo de antecedência de intimação da pauta. Enquanto o Código
de 2015 afirma, na linha antes já vista, o prazo de cinco dias entre a
intimação e a data de julgamento (art. 935), o XI Encontro de Juízes de
Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais Cíveis do Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro editou o Enunciado 13/2016, negando a aplicação da
regra geral do sistema processual em vigor para afirmar que o prazo de
antecedência é de quarenta e oito horas32. E o mais impactante é que
tal prazo não encontra previsão em nenhuma regra legal do sistema dos juizados
ou mesmo em outro diploma vigente; decorre ele, muito ao contrário, da previsão
do CPC/73 (LGL\1973\5) (art. 552, § 1º), um dispositivo revogado, que
passa assim a ser caprichosamente ressuscitado de mãos dadas com a recusa em
reconhecer a imperatividade da regra geral processual hoje em vigor.
3.2
Problemas de coerência
A segunda
ordem de problemas que atinge o Código de 2015 é de outra espécie, agora
ligados à coerência interna no sistema, porque há hiatos absolutamente
inexplicáveis em uma disciplina legal que se pretende coesa. E, no domínio do
procedimento nos Tribunais, um ponto fértil para essa crítica é bem retratado
pelo cabimento da sustentação oral.
A começar pelo
agravo de instrumento. Como se sabe, o Código de 2015 institui um regime de
irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias, por força do qual
apenas cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias expressamente
previstas em lei, no art. 1.015 ou em outra regra especial. Sob este pano de
fundo, a nova hipótese de sustentação oral em agravo de instrumento, prevista
no art. 937, VIII, do CPC/2015 (LGL\2015\1656), diz respeito a apenas um
entre todos os outros casos em que é afirmado o cabimento do recurso de agravo,
contra decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de
urgência ou de evidência (art. 1.015, I). A verdade, porém, é que essa
ampliação da sustentação oral deixou em aberto uma condenável lacuna: o agravo
de instrumento contra as decisões interlocutórias de mérito.
Com efeito, o
Código de 2015 rompe, no art. 356, com o dogma da unicidade do julgamento de
mérito, ao prever a possibilidade de julgamento antecipado parcial do mérito:
se um dos pedidos cumulados ou parcela deles comportar julgamento desde logo,
na fase do julgamento conforme o estado do processo, mas o remanescente do
objeto litigioso, por depender de prova, tiver de aguardar para ser objeto de
sentença, o juiz pode conceder a tutela definitiva fracionada que está desde
logo ao seu alcance. Essa é uma decisão interlocutória de mérito, contra
a qual cabe agravo de instrumento, fundado nos arts 356, § 5º, e 1.015, II, do
CPC/15 (LGL\2015\1656). Sendo assim, como justificar, do ponto de vista
sistêmico, que alguém tenha oportunidade de fazer sustentação oral na
apreciação de agravo de instrumento contra uma tutela provisória, de urgência
ou de evidência, como autorizado no art. 937, VIII, e não se possa fazer o mesmo
quando parcela do mérito estiver sendo resolvida de modo definitivo em sede de
agravo? Por que conceder sustentação à revisão da tutela provisória, proferida
em cognição sumária e incapaz de produzir coisa julgada33, e não a
conceder para o agravo de instrumento contra a decisão do art. 356, proferida
em cognição exauriente e apta à formação de coisa julgada material? Não há,
como se vê, qualquer explicação lógica para a diferença de tratamento. E a
incoerência fica escancarada quando se constata que o legislador de 2015 teve o
cuidado de estender ao julgamento do agravo de instrumento, nesta hipótese de
interlocutórias de mérito, o “incidente de ampliação do colegiado”, conforme
prevê o art. 942, § 3º, II, quando o caput daquele mesmo dispositivo
expressamente assegura “às partes e a eventuais terceiros o direito de
sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores”, evidentemente
pressupondo o cabimento da sustentação no julgamento original. Por fim,
ocorrendo ou não o incidente, a verdade é que, depois de apreciado o agravo
sobre a decisão de mérito, o passo seguinte consistirá no cabimento de Recurso
Especial ou Extraordinário, e a sustentação oral autorizada para estes últimos,
no art. 937, III e IV, não distingue conforme a espécie recursal apreciada no
Tribunal a quo, do que resultaria um vácuo de participação e influência
das partes apenas no julgamento na segunda instância, sem qualquer lógica a lhe
servir de base34.
O outro caso,
e possivelmente ainda mais grave se consideradas as repercussões sociais, tem
em mira o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), nova técnica
destinada aos litígios de massa no sistema do Novo Código. A ideia do IRDR, de
forma muito sintética, é permitir que Tribunais de segundo grau façam uso de um
procedimento-padrão para fixação de tese jurídica, determinando-se a suspensão
de todos os demais processos que versem sobre a questão comum. Expande-se a
linha, nesse ponto, do regime do Recurso Especial Repetitivo e do Recurso
Extraordinário com Repercussão Geral, que já existiam para as Cortes Superiores
ao tempo do CPC/73 (LGL\1973\5), mas transpondo a lógica agora para o segundo
grau, para que, depois de firmada a tese, seja ela replicada a todos os demais
casos similares. De parte as inúmeras polêmicas que cercam o novo instituto, o
Código trata de forma muito deficiente o contraditório na importantíssima fase
de admissibilidade do IRDR. A disciplina quanto ao caminho a ser seguido, neste
ponto, consta do art. 981, segundo o qual, depois da distribuição do pedido de
instauração do IRDR a um Relator no Tribunal, é ele levado imediatamente a
julgamento colegiado para a admissibilidade. Tal julgamento é de relevância
ímpar não só para as partes do processo do qual se origina o IRDR, mas também
para todos os outros feitos que versem sobre a questão comum, pois cabe a
decisão de admissibilidade: (i) apreciar a presença dos pressupostos de
instauração do IRDR; (ii) delimitar a questão jurídica comum que será objeto de
pronunciamento vinculante; (iii) servir de norte para despertar a participação
dos demais interessados no julgamento de mérito do Incidente (arts. 979 e 983);
e (iv) desencadear o importante efeito de suspensão de todos os demais
processos pendentes (art. 982, I)35. Apesar da magnitude do thema
decidendum, o Código de 2015 não prevê sustentação oral para este
julgamento colegiado, assegurada apenas para o exame do mérito do Incidente,
com o regime especial a que já se aludiu no art. 984, II, e § 1º, em uma lacuna
que acaba por retirar das partes a plenitude da participação que seria
compatível com um processo verdadeiramente colaborativo desde o limiar dessa
técnica de formação de precedentes.
Para colmatar
essas e outras lacunas no regime da sustentação oral, há a válvula de abertura
no inc. IX do art. 937, autorizando a sustentação oral “em outras hipóteses
previstas em lei ou no regimento interno do tribunal”, cuja menção à lei
evidentemente não haveria de ser reduzida apenas à lei federal, de igual
hierarquia ao CPC/15 (LGL\2015\1656). Sendo assim, a lei estadual com a vocação
para prever regras específicas de procedimento em matéria processual (CF
(LGL\1988\3), art. 24, XI) pode ser um veículo útil a superar o déficit de
racionalidade do sistema e pôr fim à quebra da isonomia36, sem
prejuízo da atuação em paralelo também do Regimento Interno dos Tribunais (CF
(LGL\1988\3), art. 96, I, “a”).
3.3
Problemas de efetividade
A terceira e
última espécie de problemas que cercam o Novo Código atinge o plano da
efetividade, e que verdadeiramente podem frustrar todos os propósitos
transformadores da nova lei.
Em primeiro
lugar, um aparentemente prosaico: a postura do julgador de se deixar
influenciar, abrindo-se para a efetividade do contraditório. Piero Calamandrei
escreveu um estudo, em 1938, sobre as consequências processuais da sonolência
de um dos membros do colegiado no curso do julgamento, isto é, quando um dos
julgadores “busca refúgio naquela doce evasão psíquica que é o sono”37.
Naquela época, a partir da jurisprudência dos tribunais alemães, reconheceu-se
que “a câmara judicante não está legalmente composta quando integrada por um
membro continuadamente incapaz de seguir o desenvolvimento do
julgamento”, de modo que “o sono contínuo do juiz poderia ser arguido como
motivo de nulidade da sentença em decorrência da violação do princípio da
oralidade e da irregular composição da turma julgadora”. Não bastava, porém, um
bocejo: era preciso caracterizar-se a impossibilidade de prosseguir na
discussão com os pares. A imagem tem um quê de caricata mas, lamentavelmente,
não se distancia nem um pouco da realidade judiciária brasileira, em que a
falta de igual consideração e respeito dos juízes para com os advogados já
levou a exemplos bem marcantes de distração no julgamento. Há não muito tempo,
em um Tribunal de Justiça de um dos Estados da federação, um desembargador foi
flagrado, em sessão do Pleno, jogando xadrez online durante a sessão: a
tela de seu computador estava visível ao público e um fotógrafo, bem
posicionado, registrou o momento. E o interessante é que o dito-cujo, indagado
pelo repórter, desconversou, afirmando que teria meramente aberto a página, por
curiosidade, ao começar a sessão, e ela lá ficou durante todo o julgamento, sem
que com ela interagisse. Seria possível, se não fosse a esperteza do fotógrafo:
tirou seis fotos em momentos diferentes, e nesse tempo foi registrada a
alteração dos movimentos 17 e 18 no jogo38.
O desprezo
pelo contraditório como influência, que está nesses exemplos extremos, desce
também a uma roupagem bem mais sutil e, por assim dizer, institucionalizada.
Por exemplo, o Regimento Interno do STJ, em seu art. 162, § 4º, admite que um
dos julgadores, embora ausente ao tempo da leitura do relatório – e, por
consequência, à sustentação oral –, se considere “habilitado a votar”39.
Em outras palavras, por força dessa autorização, é possível que o julgador até
então ausente escute o voto do relator ou de algum vogal, hipoteticamente
proferido depois de sua chegada à sessão, e conclua já ter formado convicção
suficiente a decidir a sorte do processo, contribuindo com seu voto para dar
razão ao autor ou ao réu no conflito de interesses. A situação beira as raias
do absurdo. Se contraditório significa, modernamente, direito de influência,
como é possível a esse julgador renunciar à influência que a parte poderia ter
exercido através da sustentação? Como o julgador, declarando-se “habilitado”,
pode renunciar a um direito que não é dele, mas das partes, de exercer o
contraditório justamente sobre a formação da sua convicção? Isso é uma afronta
a um processo civil democrático e, exatamente por isso, é o mais fiel retrato
de um modelo autoritário de Justiça civil, que vê o jurisdicionado como súdito
e não como um sujeito de direitos que participa do processo de formação da
decisão estatal.
É bem verdade
que também aos advogados cabe uma confissão de culpa, pois o tempo de
sustentação oral não poderia significar, como significa no Brasil, um direito a
espetáculos à disposição do patrono. Para efetivamente contribuir com a
formação do convencimento dos julgadores, é preciso abrir um canal a mais de
colaboração, com a possibilidade de perguntas ou apartes pelos membros do
colegiado, para que haja diálogo e troca de ideias entre a turma julgadora e o
advogado na construção do raciocínio, tal como no modelo norte-americano, e não
meros monólogos pelo prazo de quinze minutos, em sua maioria enfadonhos40.
Se essa busca
por interação e efetividade no diálogo humano poderia ser valiosa, não pode,
por certo, servir mais uma vez de caminho para dar vazão ao autoritarismo no
Judiciário. E esse risco é revelado por um movimento, que tomou corpo no STJ,
mas também presente em outros Tribunais, de vedar a leitura de memoriais pelos
advogados na sustentação oral. O ponto chegou a ser objeto de proposta de
Emenda ao Regimento Interno do STJ, e que só não foi adiante porque a votação
destinada à sua aprovação, em 02.12.2015, terminou empatada – um empate,
a significar que metade dos Ministros presentes ao Tribunal Pleno concordava
com o teor da vedação41. Evidentemente, não cabe ao Poder Judiciário
adentrar ao controle do grau de eloquência do advogado. O contraditório como
direito de influência franqueia às partes a escolha da melhor articulação dos
elementos de defesa, que, na fala oportunizada pela sustentação, pode variar
entre a precisão cirúrgica na escolha das palavras em temas de alta
complexidade, que apenas em atenção a um texto escrito previamente elaborado se
conseguiria alcançar, e a narrativa mais leve e talvez mais cativante feita de
modo livre ou com acesso a meras notas, mas que certamente pecará em alguma
parte no rigor. Some-se a isso o fato de que, na sustentação oral, o grau de
efetividade da defesa pode variar por diversos fatores, desde aspectos
psicológicos ligados à autoconfiança do advogado, o dom da oratória, a robustez
da formação jurídica ou mesmo o tempo de exercício da profissão. Em um cenário
assim traçado, no processo civil compreendido como uma comunidade de trabalho
pautada pela colaboração (art. 6º), não cabe ao juiz eleger quem e de que
maneira poderá com ele colaborar no diálogo para a formação de sua convicção,
como se estivesse em um patamar acima das partes que lhe autorizaria a agir em
substituição às suas escolhas42. Ademais, essa tendência de vedar a
leitura de memoriais configura comportamento contraditório com a própria
postura dos julgadores, que, mesmo no plenário do Supremo Tribunal Federal,
rotineiramente leem votos escritos trazidos à sessão.
Qual o único
caminho para solucionar todos esses problemas de efetividade do contraditório,
que vão desde a distração na sessão, passando pela renúncia do julgador à
sustentação e até a tentativa de controle da eloquência pelos juízes? A
construção de uma cultura que, na lição de Calamandrei, permita e existência de
boas relações entre juízes e advogados43. Enquanto o juiz não
for capaz de enxergar no advogado um colaborador na construção da decisão
judicial, um interlocutor tão idôneo e capaz quanto ele mesmo nessa empreitada,
a promessa constitucional de assegurar o contraditório participativo cairá por
terra como meras palavras levadas ao sabor do vento. Apenas com respeito e
diálogo paritário é que esses desvios deixarão de subsistir, e não há lei que
consiga freá-los em todas as suas possíveis manifestações, porque, mais uma
vez, são reflexos de uma mentalidade incompatível com o processo civil
iluminado a partir da garantia do contraditório como influência, que advém do
valor da democracia. A lei não consegue fazer em um passe de mágica essa
transformação, e, o que é pior, mesmo uma lei que tente transformar o processo
civil para um novo modelo de justiça, como em grande parte é o Novo CPC, pode
ser corrompida em seu âmago, se a cultura autoritária que domina a prática do
procedimento nos Tribunais não for quebrada.
Finalmente, há
ainda outro problema crônico de efetividade, e que atinge em cheio as virtudes
teóricas por trás da colegialidade, com repercussões em todo o sistema de
afirmação da força da jurisprudência no Novo Código. É que, no Brasil, os
órgãos colegiados ainda são pautados pela prática da redação de votos, e
não propriamente de acórdãos44. Como regra, a lavratura do acórdão
se confunde, no plano prático, com a elaboração do texto do voto do próprio
relator, ao qual são apenas acoplados eventuais votos escritos redigidos pelos
outros julgadores, quer sejam divergentes ou concorrentes, com o adendo da
ementa, geralmente já redigida de antemão pelo relator previamente à sessão.
Não há, em um cenário assim traçado, a preocupação sincera em consolidar em um
único texto escrito, após o julgamento, as razões que informaram a conclusão da
maioria vencedora. E os problemas que daí advêm são muitos.
Exemplo
emblemático é o da ADPF 130/DF, na qual entendeu o STF por reputar não
recepcionada pela Constituição de 1988 a antiga Lei de Imprensa (Lei 5.250/67).
A redação do acórdão coube ao Relator do processo, Min. Ayres Britto, que, ao
elaborar a ementa do julgado, conferiu termos excessivamente amplos à proteção
constitucional da liberdade de imprensa, aparentemente vedando mesmo a
determinação judicial casuística que impedisse notícias jornalísticas que
ofendessem os direitos da personalidade dos envolvidos45.
Posteriormente, veio a ser ajuizada no STF reclamação constitucional contra
ordem judicial, em um processo subjetivo, que impedira veículo de imprensa de
noticiar dados relativos a parente de conhecida figura no meio político,
fundando-se a impugnação, como era natural, na assinalada preponderância
absoluta da liberdade de imprensa sobre os direitos da personalidade, tal como
constava da ementa do acórdão da ADPF 130/DF. Ao julgar a reclamação, porém,
entendeu o Supremo Tribunal Federal por não conhecer do pedido, sob o
fundamento de que a ementa redigida pelo redator do acórdão da ADPF 130/DF
não refletia com fidelidade a tese jurídica acolhida pela maioria do colegiado,
cujos votos tinham assentado a necessária harmonização da liberdade de imprensa
com outros direitos fundamentais, sem uma relação de precedência absoluta
apriorística46. O estado da arte, portanto, consiste em um
cenário em que o Supremo Tribunal Federal simplesmente desautoriza as suas
ementas, minando qualquer perspectiva segura de confiança em um precedente,
e praticamente nulificando a imposição, por lei, de que todo acórdão contenha uma
ementa a lhe integrar o corpo (art. 943, § 1º). É bem verdade que cabe a todos
os sujeitos do processo a tarefa de identificar a verdadeira ratio decidendi
do precedente a partir de sua fundamentação, sem assumir o comodismo de ler
irresponsavelmente apenas a ementa. Essa constatação, porém, não deveria
autorizar que o Judiciário fechasse os olhos para as consequências que podem
decorrer de sua conduta na expectativa do jurisdicionado. Se o processo civil
tem de ser visto como uma comunidade de trabalho pautada pelo princípio da
cooperação47, o Judiciário não pode se demitir do seu papel
de contribuir para a segurança jurídica e a confiança dos jurisdicionados ao
fixar o norte a ser seguido, sobretudo em um sistema pautado pela força dos
precedentes.
Essa
preocupação com a forma de redação das decisões e da própria deliberação
colegiada já alcançou o direito constitucional, que atualmente se propõe a
repensar o funcionamento do Supremo na jurisdição constitucional48,
e mesmo o processo civil49. E alguns fatores da técnica processual
são decisivos nesse terreno. Em primeiro lugar, vigora um marco preclusivo
rígido para alteração de votos: a proclamação do resultado pelo Presidente do
órgão fracionário, na sessão de julgamento, já antes acolhido pela doutrina e a
jurisprudência e agora afirmado expressamente pelo art. 941, § 1º, do CPC/15
(LGL\2015\1656). De outro lado, produz consequências diretas nesse tema a
garantia fundamental da publicidade dos julgamentos colegiados (CF
(LGL\1988\3), art. 93, IX), que chega, no STF, ao extremo da TV Justiça, com o
televisionamento ao vivo da deliberação. Essa é uma equação perigosa, que gera
vantagens em termos de controle social, mas, por outro lado, suprime grande
parte dos ganhos epistêmicos que poderiam advir da colegialidade. Como seres
humanos de carne e osso, que respondem a estímulos e incentivos como
qualquer um, os membros do colegiado se preparam previamente para o julgamento
na sessão, praticamente ingressando na deliberação com o convencimento formado.
Nisso se inclui, ordinariamente, a redação do voto já com a ementa a refletir a
tese nele adotada, que o relator, de boa-fé, espera seja sagrada como
vencedora. Nesta dinâmica, parece pouco factível que o membro votante refaça
seu trabalho com fidelidade ao que prevaleceu na maioria quanto ao fundamento
determinante, sobretudo porque, mais uma vez, cada um de seus pares que compõem
a maioria vencedora redigirá um texto escrito individual – um voto,
portanto. Muito mais proveitosa, no entanto, seria a adesão formal de cada
votante concorrente ao voto escrito do outro, para que inclusive houvesse ganho
epistêmico sobre o texto e a linguagem empregada, que, por hipótese,
poderia ter nascido com um sentido mais abrangente quanto aos fundamentos aos
olhos do relator mas, submetido ao crivo dos demais, merecesse restrição para
contar com a adesão dos concordes. E a colegialidade ajudaria nisso, alcançando
um ponto médio através da barganha e da troca de visões entre os julgadores
sobre um único texto a prevalecer, porque, ao fim e ao cabo, se a
atividade de interpretação de textos já é por si só um desafio a dominar a
aplicação do direito, ainda mais intrincada é a missão de combinar múltiplos
textos – três, cinco, onze ou mesmo mais – e interpretá-los em conjunto para
extrair um único norte.
4
Os desafios do CPC/15: entre autoritarismo e democracia
O exame acima
empreendido teve por meta demonstrar como o procedimento nos Tribunais pode
revelar uma dimensão da delicada relação entre o indivíduo e o poder do Estado,
que pode ser mais ou menos democrático, reconhecendo mais ou menos respeito ao
cidadão como sujeito de direitos e como partícipe da tomada de decisão
imperativa. O sistema processual, de um modo geral, é um retrato desses valores
políticos, espelhando de forma bem concreta, na relação entre o jurisdicionado
e o juiz em cada passo do método de solução do conflito, todas as diretrizes
que informam para o bem ou para o mal o regime político.
Como se pode
constatar, o Novo CPC tenta se alinhar com as garantias fundamentais do
processo em diversos domínios. Tal como toda obra humana, também ele peca, mas
a inclinação geral do Código merece os mais sinceros encômios, e está longe de
constituir exagero reconhecer que viveremos melhor com ele do que sem ele50.
Todos os operadores do direito têm à frente um desafio enorme para compreender
na inteireza a nova lei, empreendendo as conexões de significado que tornam
possível falar em um sistema, sempre em harmonia com a Constituição da
República. Nessa caminhada, cabe à advocacia pública e privada construir e
defender o melhor sentido possível para as suas normas, a fim de que o Código
de 2015 seja um veículo de promoção das garantias fundamentais do processo, de
participação democrática e de fundação de um novo modelo de Justiça. E há
fartos instrumentos nele para esse fim.
1 Texto,
acrescido de notas e atualização, de conferência pronunciada no Rio de Janeiro,
em 07.06.2016, no Congresso Internacional de Direito Processual Civil realizado
pela Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro.
2 Para um
panorama do problema sob a égide do CPC/73 (LGL\1973\5), v. SOKAL, Guilherme
Jales. O julgamento colegiado nos tribunais: procedimento recursal,
colegialidade e garantias fundamentais do processo. Rio de Janeiro: Forense;
São Paulo: Método, 2012. Muitas das ideias ali lançadas são agora retomadas nas
páginas que se seguem.
3 GRECO,
Leonardo. Princípios de uma teoria geral dos recursos. Revista Eletrônica de
Direito Processual, REDP da UERJ. 2010, v. V, p. 23-4. Disponível em:
[www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/article/view/22961/16437].
4 Sobre o
ponto, e mais longamente, v. SOKAL, Guilherme Jales. Op. cit., p. 81-108.
5 CIPRIANI,
Franco. I problemi del processo di cognizione tra passato e presente. In: Il
Processo civile nello stato democrático. Napoli: Edizioni Scientifiche
Italiane, 2006. p. 35.
6 NERY JUNIOR,
Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil,
São Paulo: Ed. RT, 2015. p. 1869.
7 Súmula 320
(MIX\2010\1569) do STJ: “A questão federal somente ventilada no voto vencido
não atende ao requisito do prequestionamento”.
8 Assim, v.g.,
STF, RE 592.905-ED, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, j. em 17.06.2010, DJe
05.08.2010; e STJ, ED no REsp 850.069/RS, Rel. Min. Teoria Zavascki, j. em
01.06.2010, DJe 30.06.2010.
9 Nessa linha
é o Enunciado 522 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC): “522.
(art. 489, inc. I; arts. 931 e 933): O relatório nos julgamentos colegiados tem
função preparatória e deverá indicar as questões de fato e de direito
relevantes para o julgamento e já submetidas ao contraditório. (Grupo:
Precedentes, IRDR, Recursos Repetitivos e Assunção de competência)”.
10 Com efeito,
e de parte a função preparatória já aludida, o inc. I do art. 932 prevê a
competência do relator para, “quando for o caso, homologar autocomposição das
partes”, que guarda paralelo com o art. 487, III, do CPC/15 (LGL\2015\1656).
Trata-se, à evidência, de caso em que a atuação do relator põe fim ao
procedimento no Tribunal, mas, por cuidar de mero juízo de delibação sobre ato
através do qual as próprias partes resolvem o litígio, no que se convencionou
chamar, sob o Código anterior, de “falsas sentenças de mérito” (DINAMARCO,
Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Ed.
Malheiros, 2009. v. III. p. 268 e ss.), a análise a seguir feita no texto se
centrará nos incs. III, IV e V do art. 932.
11 As razões
que levaram à edição, pelo STJ, da Súmula 253 sob a vigência do CPC/73
(LGL\1973\5) (Súmula 253: “O art. 557 do CPC (LGL\2015\1656), que autoriza o
relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário”) parecem subsistir
inabaladas no sistema do Código de 2015, com a disciplina agora dedicada à
remessa necessária no art. 496. Nessa mesma linha, TALAMINI, Eduardo. Remessa
necessária (reexame necessário). Revista de Direito Administrativo
Contemporâneo, 2016, v. 24, p. 142.
12 Também
assim, JORGE, Flávio Cheim. Teoria geral dos recursos cíveis. São Paulo:
Ed. RT, 2015. p. 106, em crítica que também se fazia pertinente diante da
redação do caput do art. 557 do CPC/73 (LGL\1973\5).
13 Afirmando
que o campo verdadeiramente útil da regra diz respeito ao requisito extrínseco
da regularidade formal dos recursos, v. JORGE, Flávio Cheim. Op. cit. p.
236 e ss. A orientação foi adotada pelo Enunciado Administrativo n. 6 do STJ (“Nos
recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/2015 (LGL\2015\1656)
(relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), somente será
concedido o prazo previsto no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, §
3º, do novo CPC (LGL\2015\1656) para que a parte sane vício estritamente formal”).
Linha mais restritiva já desponta na Primeira Turma do STF, ao limitar a
incidência do art. 932, parágrafo único, apenas aos casos de falta de
documentos ou procuração, para com isso rejeitar a possibilidade de
complementação de fundamentação do recurso, que, em tese, também se acomodaria
no requisito da regularidade formal, como decidido em STF, ARE 953.221 AgR,
Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. em 07.06.2016, DJe-164, 04.08.2016. Com
a devida vênia, porém, a restrição não se harmoniza com o texto da regra legal,
cuja parte final alude a que “(...) seja sanado vício ou complementada a
documentação exigível” (grifos acrescentados), evidentemente albergando também
os defeitos de regularidade formal que não se resumem à ausência de documentos,
se e enquanto ainda se pretender atribuir algum sentido útil à expressão
situada antes da conjunção alternativa. De todo modo, tratando-se de vício
insanável, ainda assim caberá a aplicação ao caso dos arts. 10 e 933, caput,
do CPC/15 (LGL\2015\1656), de modo que o relator, tendo despertado de ofício
para o motivo de inadmissibilidade, somente poderá não conhecer do recurso se
antes abrir prazo para que as partes sobre ele se manifestem, sem incorrer em
decisão-surpresa.
14 Nesse
sentido, o Enunciado n. 82 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC):
“82. (art. 932, parágrafo único; art. 938, § 1º) É dever do relator, e não
faculdade, conceder o prazo ao recorrente para sanar o vício ou complementar a
documentação exigível, antes de inadmitir qualquer recurso, inclusive os
excepcionais”.
15 Sobre os
problemas da conceituação da “jurisprudência dominante” sob o Código de 1973,
v. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Uma proposta em torno do conceito de jurisprudência
dominante. Revista de Processo, São Paulo: Ed. RT, n. 100, 2000, v. 25,
p. 81-87.
16 É o que
proclama o Enunciado n. 462 do Fórum Permanente de Processualistas Civis
(FPPC): “462. (arts. 932, 489, § 1º, V e VI) É nula, por usurpação de
competência funcional do órgão colegiado, a decisão do relator que julgar
monocraticamente o mérito do recurso, sem demonstrar o alinhamento de seu
pronunciamento judicial com um dos padrões decisórios descritos no art. 932.
(Grupo: Poderes do juiz)”.
17 STJ, REsp
1.148.296/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Corte Especial, j. 01.09.2010, DJe
28.09.2010.
18 À exceção,
por certo, de regras expressas de irrecorribilidade, a exemplo da admissão do amicus
curiae (art. 138, caput) ou da relevação da deserção por justo
impedimento (art. 1.007, § 6º). Não subsiste, no CPC/15 (LGL\2015\1656), a
vedação ao recurso para o colegiado contra o deferimento ou indeferimento da
tutela provisória nos recursos, como reconhece o Enunciado 142 do Fórum
Permanente de Processualistas Civis (FPPC): “142. (art. 298; art. 1.021) Da
decisão monocrática do relator que concede ou nega o efeito suspensivo ao
agravo de instrumento ou que concede, nega, modifica ou revoga, no todo ou em
parte, a tutela jurisdicional nos casos de competência originária ou recursal,
cabe o recurso de agravo interno nos termos do art. 1.021 do CPC (LGL\2015\1656).
(Grupo: Tutela Antecipada)”.
19 Para a
crítica do regime anterior, v. SOKAL, Guilherme Jales. Op. cit., p.
228-252; GRECO, Leonardo. Instituições de processo civil: recursos e
processos da competência originária dos tribunais. Rio de Janeiro: Ed. Forense,
2015. v. III. p. 134, já com alusão ao regime do Código de 2015.
20 O regime
especial assim criado seria razoável se não fosse um detalhe: a falta de
clareza da lei ao estabelecer o referencial para a expressão “na sessão
subsequente”, que serve de marco temporal para a necessidade ou não de
intimação da pauta e, por consequência, para a delimitação do dever de
diligência do advogado. Em outras palavras, os Embargos de Declaração não
dependem de intimação da pauta se forem julgados na sessão subsequente, como
diz a lei, mas subsequente a qual ato? Uma primeira inclinação parece
apontar para que o referencial seja a interposição do recurso. O confronto com
o caput do mesmo art. 1.024, porém, faz com que tal linha seja logo
descartada: se é assegurado o prazo de cinco dias ao juiz de primeiro grau para
decidir os Embargos, não parece correto interpretar a regra do § 1º partindo da
premissa da fixação de prazo menor para o julgamento nos Tribunais, uma vez
que, conforme o cronograma das sessões de julgamento do órgão colegiado, é não
só possível como provável que entre a interposição do recurso e a data da
sessão subsequente medeie espaço menor de dias. Isso conduz a uma segunda
perspectiva de interpretação, para afirmar que o referencial para a publicação
ou não da pauta há de ser a sessão imediatamente subsequente ao transcurso dos
cinco dias depois da interposição do recurso, conciliando o § 1º com o prazo do
caput. Nem esse caminho, porém, é de todo suficiente, porque
desconsidera um ingrediente fundamental na equação: a oportunidade de
contrarrazões em Embargos de Declaração, que deve ser concedida ao embargado
caso o eventual acolhimento do recurso implique modificação da decisão
embargada (art. 1.023, § 2º). Assim, observando-se a garantia do contraditório
como audiência bilateral, a “sessão subsequente” só poderia ser aquela
posterior à apresentação de contrarrazões pelo embargado – ou, a rigor, a
imediatamente subsequente ao transcurso do prazo de cinco dias após o
oferecimento das contrarrazões, guardando a sintonia com o caput –, pois
somente a partir de então é que o recurso estaria em reais condições de
julgamento. Mas mesmo essa última interpretação cai por terra se levado em
conta um agravante: o embargante jamais terá conhecimento, de antemão, da
inclinação do relator por considerar os Embargos de Declaração com possível
efeito modificativo, do que depende, pelo Código, a concessão ou não de
oportunidade de contrarrazões ao embargado, em um critério mais do que distante
da desejável objetividade. Em um cenário com todas essas nuances, e dada a
deficiência na redação da lei, é absolutamente impossível falar em balizas
seguras para a imposição do dever de diligência para o advogado, que ao fim e
ao cabo terá de comparecer a sucessivas sessões sob o risco de o feito ser
julgado sem seu conhecimento, com isso suprimindo, quando menos, o direito de
suscitar questão de ordem para esclarecimento de fato em atenção ao art. 7º, X,
da Lei 8.906/94. Assim, a interpretação do dispositivo verdadeiramente compatível
com a Constituição, à luz do contraditório como previsibilidade do
procedimento, há de assegurar a intimação prévia da pauta para julgamento de
Embargos de Declaração nos Tribunais em todo e qualquer caso, sem variações.
21 Sem
prejuízo de disciplina especial prevista no Regimento Interno de cada Tribunal,
o prazo de três sessões foi afirmado nos seguintes julgados: STJ, REsp
736.610/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 01.09.2009, DJe 15.12.2009;
STJ, EDcl no AgRg no AgRg nos EREsp 884.083/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, Corte
Especial, j. 09.06.2011, DJe 01.08.2011; e STJ, EDcl no REsp 1.340.444/RS, Rel.
Min. Humberto Martins, Rel. p/ Acórdão Min. Herman Benjamin, Corte Especial, j.
29.05.2014, DJe 02.12.2014.
22 STJ, EDcl
no AgRg no REsp 1.394.902/MA, Rel. Min. Regina Helena Costa, Rel. p/ acórdão
Min. Gurgel de Faria, 1ª Turma, DJe 18.10.2016.
23 Por força
do chamado microssistema de julgamento de casos repetitivos (art. 928), o
regime especial da sustentação oral também há de se aplicar ao julgamento de
recursos especial e extraordinários repetitivos, dada a aplicação subsidiária
recíproca entre as duas técnicas de julgamento, conforme proclamado pelo
Enunciado 345 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC): “345. (arts.
976, 928 e 1.036). O incidente de resolução de demandas repetitivas e o
julgamento dos recursos extraordinários e especiais repetitivos formam um
microssistema de solução de casos repetitivos, cujas normas de regência se
complementam reciprocamente e devem ser interpretadas conjuntamente. (Grupo:
Precedentes; redação revista no V FPPC-Vitória)”.
24 DENTI,
Vittorio. Questioni rilevabili d’ufficio e contradditorio. Rivista de
Diritto Processuale, CEDAM, Padova, n. 23, 1968, p. 217-231; e GRECO,
Leonardo. Contraditório efetivo. Revista Eletrônica de Direito Processual,
2015, v. 15, p. 299-310.
25 Na
doutrina, v. DUTRA, Carlos Roberto de Alckmin. Controle abstrato de
constitucionalidade: análise dos princípios processuais aplicáveis. São
Paulo: Ed. Saraiva, 2012. p. 154. A orientação foi afirmada, v.g, em STF, ADI
2396-MC, Rel. Min. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, j. 26.09.2001, DJ 14.12.2001;
e STF, ADI 28-QO, Rel. Min. Octavio Gallotti, Tribunal Pleno, j. 19.09.1991, DJ
25.10.1991. Exceção a essa linha consiste no exame de inconstitucionalidades
materiais quando arguidos exclusivamente vícios formais em relação ao ato
impugnado, o que não é admitido pela Corte, a exemplo do decidido em STF, ADI 2182,
Rel. Min. Marco Aurélio, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Cármen Lucia,
Tribunal Pleno, j. 12.05.2010, DJe 09.09.2010.
26 É o que
reconhece, acolhendo sugestão deste autor, o Enunciado n. 594 do Fórum
Permanente de Processualistas Civis (FPPC): “594. (arts. 933; 10) O art. 933
incide no controle concentrado-abstrato de constitucionalidade. (Grupo: Ordem
do processo nos tribunais e regimentos internos)”.
27 Apesar da
reconhecida fragilidade do argumento a partir da mens legislatoris, o
cotejo entre as versões do texto do Projeto do Código nas Casas do Poder
Legislativo induz à mesma conclusão. Na versão da Câmara dos Deputados, a
redação do § 1º aludia à oportunidade de sustentação por 15 minutos na própria
sessão, o que veio a ser suprimido no retorno ao Senado, com a justificativa de
que seria necessário prazo maior por escrito, como aponta NEVES, Daniel Amorim
Assumpção. Novo Código de Processo Civil: Lei 13.105/2015. Rio de
Janeiro: Ed. Forense, 2015. p. 474-475.
28 Igualmente
nesse sentido, BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil
anotado. São Paulo: Ed. Saraiva, 2015. p. 582.
29 Confira-se
a redação do dispositivo do RISTJ (LGL\1989\44), após a Emenda Regimental
22/2016: “Art. 34. São atribuições do relator: (...) XVIII - distribuídos os
autos: (...) b) negar provimento ao recurso ou pedido que for contrário a tese
fixada em julgamento de recurso repetitivo ou de repercussão geral, a
entendimento firmado em incidente de assunção de competência, a súmula do Supremo
Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça ou, ainda, a jurisprudência
dominante acerca do tema; c) dar provimento ao recurso se o acórdão recorrido
for contrário a tese fixada em julgamento de recurso repetitivo ou de
repercussão geral, a entendimento firmado em incidente de assunção de
competência, a súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de
Justiça ou, ainda, a jurisprudência dominante acerca do tema”.
30 Afirmando
que o julgamento de admissibilidade do pedido de instauração do IRDR é
necessariamente colegiado, v. TEMER, Sofia. Incidente de resolução de
demandas repetitivas. Salvador: Ed. Juspodivm, 2016. p. 120; MARINONI, Luiz
Guilherme. Incidente de resolução de demandas repetitivas: decisão de
questão idêntica x precedente. São Paulo: Ed. RT, 2016. p. 84. Na mesma linha
foi editado o Enunciado 91 do Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC):
“91. (art. 981) Cabe ao órgão colegiado realizar o juízo de admissibilidade do
incidente de resolução de demandas repetitivas, sendo vedada a decisão
monocrática. (Grupo: Recursos Extraordinários e Incidente de Resolução de
Demandas Repetitivas)”.
31 É o que
afirmam o Enunciado Cível 165 (“Nos Juizados Especiais Cíveis, todos os prazos
serão contados de forma contínua”) e o Enunciado da Fazenda Pública 13 (“A
contagem dos prazos processuais nos Juizados da Fazenda Pública será feita de
forma contínua, observando-se, inclusive, a regra especial de que não há prazo
diferenciado para a Fazenda Pública – art. 7º da Lei 12.153/09”), ambos do
Fórum Nacional de Juizados Especiais (FONAJE).
32 Enunciado
13/2016 do XI Encontro de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas
Recursais Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro: “Turmas
recursais – Pauta de julgamento – Prazo de publicação As pautas de julgamento
das Turmas Recursais poderão ser publicadas com a antecedência mínima de 48
horas ao dia da designação das sessões de julgamento”.
33 E que terá
de ser confirmada ou revogada por sentença ao final do procedimento em primeiro
grau, recorrível, por sua vez, por apelação, cujo julgamento ensejará
sustentação oral (CPC/15 (LGL\2015\1656), art. 937, I).
34
Sustentando, com inteira razão, a interpretação extensiva do art. 937, VIII,
para abarcar também o agravo contra decisões interlocutórias de mérito, v.
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo
Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao
Novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Ed. RT, 2015.
p. 1333, aludindo aos casos em que a decisão interlocutória “tenha conteúdo de
sentença”; e NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Op. cit., p. 476-477.
35 Sobre o
tema, cf. DIDIER JUNIOR, Fredie; TEMER, Sofia. A decisão de organização do Incidente
de Resolução de Demandas Repetitivas: importância, conteúdo e o papel do
Regimento Interno do Tribunal. Revista de Processo, 2016, v. 258, p.
257-278.
36 Para um
aprofundamento do ponto, v. SOKAL, Guilherme Jales. O Novo CPC e o federalismo:
perspectivas para a advocacia pública estadual. In: José Henrique Mouta Araújo;
Leonardo Carneiro da Cunha; Marco Antonio Rodrigues (Org.). Coleção
Repercussões do Novo CPC: Fazenda Pública. Salvador: Ed. Juspodivm, 2016,
v. 3. p. 193-224. Também disponível em:
[https://uerj.academia.edu/GuilhermeJalesSokal].
37
CALAMANDREI, Piero. La distrazione dei giudici come motivo di nullità della
sentenza. Rivista di Diritto Processuale Civile, 1938. v. 1. p. 255-256.
Há tradução para o português realizada por José Rogério Cruz e Tucci,
disponível em:
[www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI135818,91041-a+distracao+dos+juizes+como+motivo+de+nulidade+do+julgamento].
Acesso em: 30.10.2016, de onde foram extraídas as expressões referidas no
texto.
38 A notícia
consta de:
[www.conjur.com.br/2009-set-05/desembargador-flagrado-jogando-xadrez-durante-sessao-tj-ba].
Acesso em: 30.10.2016.
39 RISTJ
(LGL\1989\44), “Art. 162. (...) § 4º Não participará do julgamento o Ministro
que não tiver assistido ao relatório, salvo se se declarar habilitado a votar”.
A orientação foi aplicada mesmo em matéria penal, a exemplo do decidido em STJ,
HC 152.107/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. em 03.08.2010, DJe
20.09.2010.
40 Apontando a
ausência de um debate efetivo entre juízes e advogados na sustentação oral no
Brasil, v. BEDAQUE, José Roberto dos Santos; BRASIL JR., Samuel Meira;
OLIVEIRA, Bruno Silveira de. A oralidade no processo civil brasileiro
(relatório nacional). In: Processo Civil: Novas tendências: estudos em
homenagem ao Professor Humberto Theodoro Júnior. Belo Horizonte: Ed. Del Rey,
2008. p. 425. Como se sabe, o cenário é substancialmente diverso na Suprema
Corte norte-americana, em cujas audiências a exposição oral dos advogados é
frequentemente interrompida por indagações e questionamentos pelos julgadores,
com o propósito de pedir esclarecimentos sobre a abrangência de determinada
tese jurídica ou sobre a coerência sistêmica do raciocínio aventado.
41 A notícia
foi veiculada em: [www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI230913,101048-STJ+tenta+proibir+que+advogado+leia+durante+a+sustentacao+oral].
Acesso em: 30.10.2016.
42 Mais feliz
parece ser a orientação do Conselho Nacional de Justiça neste ponto, que, em
24.02.2016, entendeu por bem conceder medida cautelar em Procedimento de
Controle Administrativo para suspender o art. 378 do Regimento Interno do
Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, segundo o qual: “Na sustentação oral
é permitida a consulta a notas e apontamentos, vedada a leitura de memoriais”
(Procedimento de Controle Administrativo 0004120-91.2015.2.00.0000). Consta do
voto do Conselheiro Relator Fabiano Silveira, por unanimidade acompanhado pelo
colegiado do CNJ, que; “[o] verdadeiro problema não está no modo como o
advogado faz uso da palavra, e sim na qualidade do discurso por ele proferido.
Uma sustentação de improviso, mal feita, pode produzir estrago tão grande ou
maior do que a leitura monocórdia e entediante de memoriais. A responsabilidade
é do advogado pela escolha que faz, e ela não é pequena. Ocorre que o Poder
Judiciário não pode censurar previamente, dirigir, glosar ou de alguma forma
estabelecer preferências quanto ao estilo de conduta profissional dos
advogados, mesmo guiado pelo bom propósito de aperfeiçoar as sustentações orais
em seus julgamentos. A questão também se coloca no plano constitucional dos
direitos e garantias fundamentais. O que caracteriza o devido processo legal é
o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, LV, da Constituição Federal). E a
amplitude da defesa inclui – por que não? – a possibilidade de leitura de peças
perante o órgão julgador. Ou seja, a leitura é um recurso legítimo de defesa,
não o único nem necessariamente o melhor. Em todo caso, um recurso que pode ser
utilizado segundo a avaliação de quem foi escolhido para atuar na causa”.
43
CALAMANDREI, Piero. El carácter dialéctico del proceso. In: Proceso y
democracia. Buenos Aires: Ediciones Juridicas Europa-America, 1960. p.
147-173.
44 BARBOSA
MOREIRA, José CarlosComentários ao Código de Processo Civil. Rio de
Janeiro: Ed. Forense, 2009. v. V. p. 710, ao assinalar que “o Supremo Tribunal
Federal, o Superior Tribunal de Justiça e outros tribunais adotaram o costume
de fazer consistir o acórdão, pura e simplesmente, na série de votos proferidos
pelos juízes que hajam participado do julgamento”.
45 Da ementa
extrai-se, dentre outras passagens, o seguinte trecho: “A crítica jornalística,
pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente
suscetível de censura, mesmo que legislativa ou judicialmente intentada” (STF,
ADPF 130, Rel. Min. Carlos Britto, Tribunal Pleno, j. 30.04.2009, DJe
05.11.2009).
46 STF, Rcl
9.428, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, j. 10.12.2009, DJe 24.06.2010,
sendo que no voto do Relator, ao se referir ao acórdão da ADPF 130/DF, lê-se
que a ementa daquele julgado refletiria “(...) apenas a posição pessoal do
eminente Min. Relator, não a opinião majoritária da Corte”.
47 MITIDIERO,
Daniel. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e
éticos. São Paulo: Ed. RT, 2015. p. 52 e ss.
48 Exemplo é a
obra de MELLO, Patrícia Perrone Campos. Nos bastidores do Supremo Tribunal
Federal: Constituição, emoção, estratégia e espetáculo, Rio de Janeiro: Ed.
Forense, 2015, em especial às p. 147-220.
49 SOKAL,
Guilherme Jales. O julgamento colegiado nos tribunais: procedimento
recursal, colegialidade e garantias fundamentais do processo. Rio de Janeiro:
Forense/São Paulo: Método, 2012. p. 290 e ss.; e, mais recentemente, MARINONI,
Luiz Guilherme. Julgamento nas cortes supremas: precedente e decisão do
recurso diante do Novo CPC. São Paulo: Ed. RT, 2015.
50 A Lei
13.256/16, muito ao contrário, foge dessa inspiração e representa em grande
parte a vitória da jurisprudência defensiva, retrocedendo em avanços do Código
em sua versão original, de que é exemplo a alteração promovida na redação do
art. 12. Ela, sim, representa, retomando a metáfora anterior no texto, a
reforma do hospital no interesse mais do conforto dos médicos do que dos pacientes
– ou, quiçá, talvez apenas dos diretores ou mantenedores do hospital.
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