5 de maio de 2021

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015.

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1411485 - SP (2018/0321955-8) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO NCPC. NÃO CABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. 

1. A jurisprudência desta Corte já assentou o entendimento de que "é possível ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou prejudicado não ofendendo, assim, o princípio da colegialidade. Ademais, com a interposição do agravo regimental, fica superada a alegação de nulidade pela violação ao referido princípio, ante a devolução da matéria à apreciação pelo Órgão Julgador" (AgRg no REsp n. 1.113.982/PB, Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 29/8/2014). 

2. Consoante dispõe o art. 356, caput, I e II, e § 5º, do CPC/2015, o juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrarem-se incontroversos ou estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355, sendo a decisão proferida com base neste artigo impugnável por agravo de instrumento. 

3. No caso, conforme asseverou o acórdão recorrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

4. A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime. A condenação do agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno mostre-se manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória, o que, contudo, não se verifica na hipótese. 

5. Agravo interno desprovido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Moura Ribeiro. 

Brasília, 01 de Julho de 2019 (Data do Julgamento) 

RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Trata-se de agravo interno interposto por Fabracor Serviços Combinados - Eireli e outro contra a decisão que, nos autos da ação de revisão contratual cumulada com indenização por danos materiais proposta em desfavor de Banco Itauleasing S.A., conheceu do agravo e negou provimento ao recurso especial, confirmando o entendimento do acórdão recorrido de que, no caso, não houve julgamento de mérito, sendo inviável se falar, por conseguinte, na impugnação da decisão do Juízo singular, por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

Em suas razões, os insurgentes alegam, preliminarmente, violação ao princípio da colegialidade (RISTJ, art. 13, IV), razão pela qual pedem a nulidade da decisão agravada. 

No tocante ao tema de fundo, reprisam os argumentos deduzidos no recurso especial, de ofensa aos arts. 356, § 5º, do CPC/2015, sustentando, em síntese, a possibilidade de aplicação extensiva do art. 1.015 do NCPC, a fim de admitir a interposição do agravo de instrumento contra qualquer decisão que verse sobre o mérito processual, como no caso, ante o indeferimento do pedido para julgamento antecipado parcial da pretensão inicial. 

Impugnação apresentada às fls. 197-202 (e-STJ), pugnando pela aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015. 

Posteriormente, foi apresentada petição pelos agravantes (e-STJ, fls. 205-210), manifestando oposição ao julgamento virtual do respectivo inconformismo (art. 184-D do RISTJ), e requerendo autorização para a realização de sustentação oral. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): De início, de acordo com os Enunciados Administrativos do STJ n. 2 e 3, os requisitos de admissibilidade a serem observados são os previstos no Código de Processo Civil de 1973, se a decisão impugnada tiver sido publicada até 17 de março de 2016, inclusive; ou, se publicada após 18 de março de 2016, os preconizados no Código de Processo Civil de 2015" (e-STJ, fl. 1.425). 

Na hipótese, tem aplicação a dinâmica processual estabelecida pelo Código de Processo Civil de 2015, porquanto, à época da publicação da decisão que realizou o exame de admissibilidade do recurso especial, já estava em vigência o novo regramento processual, o qual foi aplicado no julgamento do agravo em comento. 

Vale anotar, outrossim, que este Tribunal tem jurisprudência firmada no sentido de que "(...) é possível ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou prejudicado não ofendendo, assim, o princípio da colegialidade. Ademais, com a interposição do agravo regimental, fica superada a alegação de nulidade pela violação ao referido princípio, ante a devolução da matéria à apreciação pelo Órgão Julgador" (AgRg no REsp n. 1.113.982/PB, Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 29/8/2014). 

Convém destacar que o art. 184-A, parágrafo único, II, do RISTJ possibilita o julgamento virtual do agravo interno, como na hipótese: 

Art. 184-A. Ficam criados Órgãos Julgadores virtuais, correspondentes à Corte Especial, às Seções e às Turmas do Superior Tribunal de Justiça, com finalidade de julgamento eletrônico de recursos, excetuados os de natureza criminal. Parágrafo único. Os seguintes recursos podem ser submetidos ao julgamento virtual: I- Embargos de declaração; II- Agravo Interno; III- Agravo Regimental. 

Na hipótese, os insurgentes se opõem à realização do julgamento virtual do respectivo agravo interno. No entanto, não há fundamento suficiente a derruir a conclusão delineada na deliberação unipessoal, razão pela qual indefiro o pedido de realização de julgamento presencial do recurso. 

Também não merece acolhida o pedido de sustentação oral, visto que, nos termos do art. 159, IV, do RISTJ, não haverá sustentação oral no julgamento de agravo interno, salvo disposição legal expressa em contrário. 

A propósito: 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REQUISITOS DO ART. 1.022 E INCISOS DO CPC DE 2015. OMISSÃO CONSTATADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. [...] 2. Não merece acolhida o pedido de sustentação oral formulado pela agravante às fls. 2353-2356, e-STJ, visto que a teor do artigo 159, inciso IV, do Regimento Interno do STJ, não haverá sustentação oral no julgamento de agravo interno, salvo disposição legal expressa em contrário. Ademais, a sustentação oral somente é cabível em recurso manejado contra decisão de relator que extinguir processos de competência originária, conforme artigo 937, § 3º, do NCPC, o que não é o caso. Precedentes. 3. Embargos de declaração acolhidos sem efeitos modificativos. (EDcl no AgInt no AREsp n. 1.225.288/DF, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 19/12/2018). 

Em relação à questão jurídica controvertida, verifica-se que, na origem, os ora recorrentes interpuseram agravo de instrumento contra a decisão do Juízo a quo que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c indenização por danos materiais movida em desfavor de Banco Itauleasing S.A., fixou como ponto controvertido da lide, entre outros, "ter o banco recebido o valor do resgate de R$ 764.909,82 com dedução do referido valor do saldo devedor do contrato" (e-STJ, fl. 68), deferindo a produção de provas testemunhal e pericial. Opostos embargos de declaração contra essa decisão o magistrado singular indeferiu o pedido de julgamento parcial do mérito formulado pelos agravantes, ao fundamento de que, relativamente à devolução da importância acima, "o documento a fls. 67-77, por si só, não comprova ter o banco recebido indevidamente referido valor", além disso, "o v. Acórdão a fls. 310-316 entendeu que essa matéria em especial (fls. 314) não é unicamente de direito, o que depende da produção de prova" (e-STJ, fls. 67-68). 

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento ao recurso, nos termos do acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 66): 

Processual. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que não conheceu de agravo de instrumento na consideração de que o pronunciamento atacado não se enquadra nas hipóteses permissivas do rol taxativo do artigo 1.015, I a XIII e parágrafo único, do CPC. Pretensão à reforma. Decisão agravada que não se conforma à hipótese do artigo 1.015, inciso II, do Código de Processo Civil. RE CURSO DESPROVIDO. 

Seguiu-se, então, a interposição de recurso especial, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, dando por malferido o art. 356, § 5º, do CPC/2015, ao argumento de que, na espécie, seria possível a aplicação extensiva do art. 1.015 do NCPC, a fim de admitir a interposição do agravo de instrumento contra qualquer decisão que verse sobre o mérito processual, como no caso, ante o indeferimento do pedido para julgamento antecipado parcial da pretensão inicial. 

Em relação ao tema de fundo, a Vigésima Sétima Câmara de Direito Privado do TJSP negou provimento ao agravo interno dos ora insurgentes, aos seguintes fundamentos (e-STJ, fls. 67-70): 

A decisão monocrática de fls. 17/23 consignou que o agravo de instrumento é inadmissível, porquanto a decisão agravada não se enquadra nas hipóteses previstas nos incisos do art. 1.015, I a XIII (inclusive artigo 356, § 5º) e parágrafo único do Código de Processo Civil de 2015, não havendo se cogitar, também, de hipótese de incidência do inciso II de referido artigo, própria para decisões que versarem sobre o “mérito do processo”. E isso ocorre simplesmente porque, à evidência, o MM. Juízo a quo não proferiu decisão parcial de mérito, pressuposto necessário à incidência tanto do artigo 356, caput, e § 5º, quanto do inciso II do artigo 1.015, ambos do CPC. Decidir o mérito, total ou parcialmente, significa acolher ou rejeitar, no todo ou em parte, o pedido deduzido na ação ou na reconvenção (art. 487, I, do CPC). Os agravantes, por seu turno, tecem considerações no sentido de que, quanto ao pedido de restituição dos valores retirados da conta corrente do agravante Paulo Sérgio Boschim, não houve impugnação específica do agravado, o que torna o fato incontroverso (art. 374, inciso III, do Código de Processo Civil de 2015), passível de julgamento antecipado de mérito. Aduzem que o decisum de fls. 365/366 resultou da análise do conjunto fático-probatório, de tal sorte que, adotando-se os critérios estabelecidos nos artigos 489, § 3º, e 356, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015, pode ser equiparado à improcedência do pedido então formulado, cuidando-se, portanto, de uma decisão de mérito. E, nesse cenário, tornou-se o decisum passível de impugnação por meio de agravo de instrumento, nos termos do artigo 356, § 5º, do Código de Processo Civil de 2015. Entretanto, a decisão monocrática de fls. 17/23 consignou que, bem ao contrário, neste caso concreto o juiz da causa fez exatamente o oposto: não decidiu o mérito (ainda que parcialmente, como pretendido pelos ora agravantes), exatamente porque entendeu que não era caso de julgamento antecipado. Bem por isso, o que o juiz decidiu (sem tocar o mérito), sim, foi no sentido da necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial, decisão que também não se enquadra em nenhuma das taxativas hipóteses permissivas do CPC. Sob ângulo inverso, se os agravantes tivessem pedido no agravo de instrumento que fosse determinado ao juiz da causa julgar parcialmente o mérito, obviamente isso não seria possível, tanto quanto não o seria se a pretensão fosse de julgamento antecipado da lide como um todo, porque ausente permissão legal, em ambos os casos, para o agravo de instrumento. Mas não é esse o pedido recursal, tal como ressaltado na decisão monocrática de fls. 17/ 23. (...). Portanto, não se cuida o decisum de fls. 365/366 dos autos principais de pronunciamento de mérito, ficando bem evidenciado que as razões recursais não abalam os fundamentos da decisão monocrática vergastada. Essa circunstância (que torna mesmo discutível a observância do princípio da dialeticidade) impõe a relativização da exigência feita no § 3º, do art. 1.021, do Código de Processo Civil de 2015, porque não é necessário ir além das razões de decidir que animaram a decisão hostilizada. 

Consoante dispõe o art. 356, caput, I e II, e § 5º, do CPC/2015, o juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrarem-se incontroversos ou estiver em condições de imediato julgamento – nos termos do art. 355 –, sendo a decisão proferida com base neste artigo impugnável por agravo de instrumento. 

Ao comentar o dispositivo em questão, esclarecem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero que, como não é justo, do ponto de vista da tempestividade da tutela jurisdicional, obrigar a parte a esperar pela resolução de determinada parcela do litígio que não depende de nenhum ato processual para ser elucidada, o legislador permitiu o julgamento imediato da parcela do mérito que já se encontra madura. Vale dizer, "que é incontroversa – e por isso independe de prova (art. 374, III, do CPC) – ou que não depende de prova outra para sua elucidação do que aquelas já constantes dos autos. Com a previsão da possibilidade de julgamento imediato parcial do mérito, o legislador busca densificar o direito fundamental à tutela jurisdicional tempestiva (arts. 5º, LXXVIII, CF e 4º do CPC). Trata-se de julgamento fundado em cognição exauriente e cuja ausência de recurso gera coisa julgada (art. 356, § 3º, do CPC). A decisão que julga imediatamente parcela do mérito é irrevogável pelo juiz (art. 494, CPC). Em sendo o caso, a decisão que julga parcialmente o mérito pode reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida (art. 356, § 1º, CPC)" – (Código de Processo Civil Comentado. 4ª ed. São Paulo: RT. 2018, pg. 488). 

Desse modo, a possibilidade de julgamento imediato parcial do mérito depende desses requisitos, a saber, que um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrem-se incontroversos ou que estejam em condições de imediato julgamento, tendo em vista a desnecessidade de produção de prova diversa daquela já colhida. 

Ocorre que, no caso, conforme asseverou o acórdão recorrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

Por fim, a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime. A condenação da parte agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno se mostre manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória. 

No presente caso, contudo, não vejo como considerar abusiva ou protelatória a interposição do agravo interno, razão pela qual rejeito o pedido da parte agravada de cominação de multa. 

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno. 

É o voto. 

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