2 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Ações probatórias autônomas; Exibição de Documento - Cássio Scarpinella Bueno

 Na normalidade dos casos, a própria parte apresenta, em juízo, os documentos ou quaisquer outros suportes materiais de prova que tenha em seu poder. Pode ocorrer, contudo, que, por qualquer razão, tais substratos materiais estejam em poder da parte contrária e, até mesmo de terceiros, isto é, com pessoas estranhas ao processo. É para disciplinar esses casos que se voltam os arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil, sob a denominação de exibição de documentou ou coisa. Didática a propósito a regra do art. 396: "O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder". A exibição de documento ou coisa, tal qual disciplinada pelo Código de Processo Civil, é, ao mesmo tempo, meio de (produção de) prova [...] e meio de obtenção de prova. Com relação a esta última observação, o Código de Processo Civil parece ter dado ouvido aos reclamos de parcela da doutrina de que era fundamental compreender o instituto de viés híbrido. Isso porque se mostra inócuo querer presumir, em todo e qualquer caso, indistintamente, verdadeiro o fato resultante da não exibição do documento ou coisa pela singela razão de que, sem o documento ou coisa, pode ocorrer de não haver condições mínimas para se saber sequer a informação essencial para o exercício de uma pretensão. Tratava-se, outrossim, de forma de dar máximo aproveitamento para o que, para o Código de Processo Civil de 1973, era (mais um) procedimento cautelar específico, previsto nos seus arts. 844 e 845, não por acaso intitulado "exibição". [...] Sobre a abolição — sempre compreendida no sentido de desformalização — da dicotomia constante do CPC de 1973, entre a exibição como meio de prova e a exibição como "cautelar preparatória (arts. 844 e 845 do CPC de 1973), surge uma questão importante. O que fazer nos casos em que a exibição de documentos ou coisa precisar anteceder o início do processo? Há três respostas possíveis. A primeira se inclina à utilização dos procedimentos da tutela provisória antecedente constantes dos arts. 303 e 304 ou 305 a 310, cuja escolha deverá levara em conta o maior ou o menor viés satisfativo do pedido a ser apresentado pelo autor, respectivamente. A segunda é no sentido de o interessado lançar mão do procedimento relativo à "produção antecipada de prova", [...] justificando sua necessidade, inclusive com base em urgência, nos muito bem desenhados incisos do art. 381. A terceira entende que a parte deve se valer do procedimento reservado pelos arts. 397 a 400 ou 401 e 402 para a exibição pretendida contra a parte e em face do terceiro, respectivamente, sendo indiferente que se trate de pedido que anteceda o processo. Dentre as alternativas, a terceira é preferível pela especificidade da hipótese. Afinal, são aqueles artigos — e não os relativos à tutela provisória e à produção antecipada de provas — que conseguirão atender ao desiderato do interessado. A única adaptação que se faz necessária reside no caput do art. 398. Mais do que a intimação lá prevista, a parte contrária deverá ser citada, a exemplo, aliás, do que, para o terceiro, exige (e pertinentemente) o art. 401, tanto quanto os arts. 303, § 1º, II, e 306, quando trata da tutela provisória antecedente, sendo indiferente para os fins da exposição que seu viés seja (predominantemente) satisfativo ou acautelatório. Para os casos em que ficar demonstrado, concretamente, que o tempo necessário ao prévio contraditório (citação) tem o condão de macular a pretensão relativa à exibição, o arsenal da "tutela provisória" será suficientemente amplo para os devidos fins, inclusive com relação à necessária postergação do contraditório. 

BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: Vol. 2. Procedimento Comum, Processos nos Tribunais e Recursos. 8ª Edição. São Paulo: Saraiva. 2019. p. 248-249

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