7 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Instrumentalidade do processo - José Roberto dos Santos Bedaque

 A ciência processual no Brasil encontra-se na fase de sua evolução que autorizada doutrina identifica como instrumentalista. É a conscientização de que a importância do processo está em seus resultados. O legislador constituinte percebeu essa circunstância fundamental e, em boa hora, estabeleceu considerável corpo de normas, que integram o direito processual constitucional, pois elevam garantias processuais ao nível máximo da hierarquia das leis, além de consagrar meios específicos para proteção de determinados direitos, com substancial ampliação da legitimidade para agir. Aliás, já notou a doutrina que as grandes matrizes do direito processual cada vez mais encontram-se disciplinadas em texto constitucional. A importância dessas inovações, como de outras verificadas ao nível infraconstitucional, reside principalmente na sua causa. Depois de longo período caracterizado por preocupações endoprocessuais, volta-se a ciência para os resultados pretendidos pelo direito processual. Trata-se, sem dúvida, de nova visão do fenômeno processual, instrumento cuja utilidade é medida em função dos benefícios que possa trazer para o titular de um interesse protegido pelo ordenamento jurídico material. A conscientização de que o processo vale não tanto pelo que ele é, mas fundamentalmente pelos resultados que produz, tem levado estudiosos a reexaminar os institutos processuais, a fim de sintonizá-los com a nova perspectiva metodológica da ciência. Parece imprescindível, pois, um retorno ao interior do sistema processual, com o objetivo de rever conceitos e princípios, adequando-os à nova visão desse ramo da ciência jurídica. É preciso 'revisitar' os institutos processuais, todos concebidos segundo a visão autonomista ou conceitual da ciência processual, a fim de conferir a eles nova feição, a partir das necessidades identificadas na fase instrumentalista. O tratamento dos institutos fundamentais de nossa ciência deve perder a conotação excessivamente processualista. A abordagem precisa levar em consideração critérios de racionalidade material, não apenas formal. A ciência processual tem-se preocupado com a criação de categorias e institutos, cuja elaboração precisa a transformou no ramo do Direito que mais se desenvolveu nos últimos anos. Por outro lado, passaram os processualistas a se dedicar tanto a conceitos, muitos de extrema sutileza, que as discussões sobre temas de direito processual acabaram por representar verdadeiro exercício de filosofia pura do Direito. Quando voltamos os olhos para a realidade, porém, verificamos que o processo se encontra muito distante dela. 


BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 3ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 15-17 

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