1 de maio de 2021

Filigrana Doutrinária: IRDR e processos em tramitação - Aluisio Gonçalves de Castro Mendes

(...) 10 4 A CONTROVÉRSIA EM TORNO DA EXIGÊNCIA DE QUE O INCIDENTE TENHA COMO BASE APENAS PROCESSOS JÁ EM TRAMITAÇÃO NO TRIBUNAL Como mencionado anteriormente, no decorrer do processo legislativo, ficaram caracterizadas duas nítidas concepções sobre a moldura de instituto que se pretendia construir, que correspondiam aos textos aprovados no Senado Federal e na Câmara dos Deputados. Em síntese, a concepção que predominou no Senado, tanto na versão aprovada em primeiro turno, quanto na redação final, foi no sentido de que o incidente poderia ser provocado quando houvesse processos em primeira instância ou no tribunal, razão pela qual o incidente poderia ser suscitado tanto pelo juiz de primeiro grau quanto pelo relator, assim como pelas partes, pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública. No Substitutivo da Câmara dos Deputados, no entanto, constavam dispositivos que expressamente mencionavam a exigência de que, para ser suscitado, o incidente deveria tomar como base processos que já estivessem em tramitação no tribunal de segundo grau e, por isso, o IRDR não poderia ser provocado pelo juiz de primeiro grau. Não obstante a clara manifestação a respeito, no parecer final que norteou o texto aprovado em última versão no Senado Federal, que foi sancionado e publicado, a controvérsia ainda persiste. Por certo, as duas posições encontram-se embasadas em fundamentos jurídicos sólidos e serão a seguir expostas. (...) a) Competência dos tribunais de segundo grau fixada constitucionalmente O primeiro argumento de que os tribunais de segundo grau teriam a sua competência fixada em normas constitucionais, ou seja, no art. 108 da Constituição da República, para os Tribunais Regionais Federais, e nas Constituições Estaduais por força da determinação contida no § 1º do 125 da Magna Carta. Portanto, o Incidente de Resolução de Demandas Repetitiva, ou cláusula geral que pudesse abarcar esta possibilidade deveria estar expressamente arrolado nos respectivos textos constitucionais. Invoca-se ainda que a natureza incidental não afastaria a necessidade de previsão constitucional expressa, pois mesmo nestas hipóteses a Carta Federal tese a preocupação de arrolar a competência dos tribunais, como nos conflitos de competência entre juizes, cuja competência para os TRFs foi fixada no art. 108, inciso I, alínea e Na falta de previsão expressa, os tribunais somente poderiam conhecer dos incidentes pertinentes a processos que fossem da sua competência constitucional A tese, de fato, é sedutora, tendo em vista o principio consagrado do juiz natural Entretanto, devem ser levados em consideração também outros aspectos. Em primeiro lugar, o de que a competência dos tribunais de segundo grau não é matéria constitucional. Poderia ser considerada como matéria constitucional, no máximo, a organização e a competência do Supremo Tribunal Federal13 . No âmbito dos tribunais superiores, nem todos possuem a discriminação da sua competência na Constituição da República. No caso dos Tribunais Superiores do Trabalho, Eleitoral e Militar, a competência é fixada pelo legislador infraconstitucional. A competência do Superior Tribunal de Justiça, de tato, é fixada na Constituição da República. Entretanto, o legislador já estabeleceu, mediante norma ordinária, a ampliação desta competência, fixando o denominado Incidente de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais (JEFs), nos termos do art. 14, § 4, da Lei n. 10.259, de 12.07.2011. De modo similar, também foi instituído o pedido de uniformização de interpretação de lei nas esfera dos Juizados Especiais da Fazenda, perante o Superior Tribunal de Justiça, na hipótese do art. 18, § 3º, da Lei n.º 12.153, de 22.12.2009. Em ambas as hipóteses, os respectivos incidentes não estavam previstos expressamente no rol do art. 105 da Constituição d República e eram suscitados a partir do julgamento proferido por outros órgãos (Turma Nacional de Uniformização e Turmas Estaduais, respectivamente. Por sua vez, estes incidentes não foram declarados inconstitucionais, mas, pelo contrário, chancelados pelo Supremo Tribunal Federal, diante da necessidade de se preservar a segurança jurídica e da compatibilidade com as funções exercidas pelo Superior Tribunal de Justiça. justificando-se a utilização destes incidentes da própria reclamação, em caráter excepcional, diante, na ocasião, da inexistência de procedimento semelhante no âmbito da Justiça Estadual . Os Tribunais Regionais Federais possuem, de fato, a sua competência fixada na Constituição da República, nos termos do art. 108, bem como os Tribunais de Justiça nas respectivas Constituições dos Estados, conforme determinação do art. 125, § 1°, da Carta Federal. Entretanto, o art. 108 da Constituição da República não especifica todos os incidentes cabíveis e apreciáveis pelos TRFs concentrando-se principalmente nas causas originárias e nos respectivos recursos, modelo que, em regra, é adotado também nas Constituições Estaduais. Por isso, efetuou menção apenas ao conflito de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal, nos termos da alínea e, do inciso I, do art. 108 da Magna Carta. 


MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas: sistematização, análise e interpretação do instituto processual. Rio de Janeiro: Forense, 2017, págs. 120/121.

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