24 de agosto de 2021

Em regra, o Estado responde de forma objetiva pelos danos causados a profissional de imprensa ferido, por policiais, durante cobertura jornalística de manifestação pública

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/08/info-1021-stf.pdf


RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - Em regra, o Estado responde de forma objetiva pelos danos causados a profissional de imprensa ferido, por policiais, durante cobertura jornalística de manifestação pública

O Estado responde de forma objetiva pelos danos causados a profissional de imprensa ferido, por policiais, durante cobertura jornalística de manifestação pública em que ocorra tumulto ou conflito, desde que o jornalista não haja descumprido ostensiva e clara advertência quanto ao acesso a áreas definidas como de grave risco à sua integridade física, caso em que poderá ser aplicada a excludente da responsabilidade por culpa exclusiva da vítima. 

Tese fixada pelo STF: “É objetiva a Responsabilidade Civil do Estado em relação a profissional da imprensa ferido por agentes policiais durante cobertura jornalística, em manifestações em que haja tumulto ou conflitos entre policiais e manifestantes. Cabe a excludente da responsabilidade da culpa exclusiva da vítima, nas hipóteses em que o profissional de imprensa descumprir ostensiva e clara advertência sobre acesso a áreas delimitadas, em que haja grave risco à sua integridade física”. 

STF. Plenário. RE 1209429/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 10/6/2021 (Repercussão Geral – Tema 1055) (Info 1021). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

No ano de 2000, durante um protesto de professores na capital paulista, um repórter fotográfico foi atingido no olho esquerda por bala de borracha disparada pela Polícia Militar de São Paulo, o que lhe causou a perda de 90% da visão. A vítima ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra o estado de São Paulo. O pedido foi julgado improcedente pelas instâncias ordinárias. O TJ/SP reconheceu que o ferimento foi causado pela bala de borracha disparada pelo policial militar. No entanto, entendeu que não ficou demonstrado abuso ou excesso na conduta policial. Para o TJ/SP a vítima assumiu o risco ao permanecer fotografando o conflito instaurado em manifestação pública. Logo, o acidente teria sido causado por culpa exclusiva do repórter. A vítima interpôs recurso extraordinário. 

O que decidiu o STF? O repórter tem direito de ser indenizado? 

SIM. Vamos entender com calma. 

Requisitos da responsabilidade civil do Estado 

A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva e baseia-se na teoria do risco administrativo. Para a configuração do dever de indenizar, é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: a) ocorrência do dano; b) ação ou omissão administrativa; c) existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa; e d) ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. 

A responsabilidade civil do Estado em caso de omissão também é objetiva? 

SIM. A jurisprudência do STF tem entendido que também é objetiva a responsabilidade civil decorrente de omissão, seja das pessoas jurídicas de direito público, seja das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. Nesse sentido: 

No tocante ao art. 37, § 6º, da Carta Magna, o entendimento do Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria encontra-se firmado no sentido de que as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público respondem objetivamente por suas ações ou omissões em face de reparação de danos materiais suportados por terceiros. STF. 1ª Turma. ARE 1043232 AgR, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 01/09/2017. 

Responsabilidade objetiva não é absoluta 

O princípio da responsabilidade objetiva não é absoluto. Como se adota a teoria do risco administrativo, o Estado poderá eximir-se do dever de indenizar caso prove alguma causa excludente de responsabilidade: a) caso fortuito ou força maior; b) culpa exclusiva da vítima; c) culpa exclusiva de terceiro. 

Em regra, não há que se falar em culpa exclusiva da vítima neste caso 

O art. 37, § 6º, da CF/88 prevê a responsabilidade civil objetiva do Estado quando presentes e configurados a ocorrência do dano, o nexo causal entre o evento danoso e a ação ou omissão do agente público, a oficialidade da conduta lesiva e a inexistência de causa excludente da responsabilidade civil (força maior, caso fortuito ou comprovada culpa exclusiva da vítima). Não é adequado, no entanto, atribuir a profissional da imprensa culpa exclusiva pelo dano sofrido, por conduta de agente público, somente por permanecer realizando cobertura jornalística no local da manifestação popular no momento em que ocorre um tumulto, sob pena de ofensa ao livre exercício da liberdade de imprensa e ao direito-dever de informar. A ótica adotada pelo TJ no sentido de que houve culpa exclusiva do repórter fotográfico acaba por inibir a cobertura jornalística, violando o direito ao exercício profissional, bem como o direito-dever de informar (art. 5º, IX, XIII e XIV e art. 220 da CF/88). Para o STF, a PM/SP não levou em conta diretrizes básicas de conduta em eventos públicos nem os protocolos de uso de armas não letais. Além disso, a análise dos fatos exclui a possibilidade de culpa exclusiva da vítima porque, segundo protocolos internacionais, balas de borracha só podem ser desferidas da cintura pra baixo. 

Exceção 

Haverá culpa exclusiva da vítima e, portanto, ausência do dever se indenizar se o profissional de imprensa descumprir as orientações da polícia e entrar em áreas nas quais o acesso está restringido. 

Conclusão: 

O Estado responde de forma objetiva pelos danos causados a profissional de imprensa ferido, por policiais, durante cobertura jornalística de manifestação pública em que ocorra tumulto ou conflito, desde que o jornalista não haja descumprido ostensiva e clara advertência quanto ao acesso a áreas definidas como de grave risco à sua integridade física, caso em que poderá ser aplicada a excludente da responsabilidade por culpa exclusiva da vítima. Tese fixada pelo STF: “É objetiva a Responsabilidade Civil do Estado em relação a profissional da imprensa ferido por agentes policiais durante cobertura jornalística, em manifestações em que haja tumulto ou conflitos entre policiais e manifestantes. Cabe a excludente da responsabilidade da culpa exclusiva da vítima, nas hipóteses em que o profissional de imprensa descumprir ostensiva e clara advertência sobre acesso a áreas delimitadas, em que haja grave risco à sua integridade física.” 

STF. Plenário. RE 1209429/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 10/6/2021 (Repercussão Geral – Tema 1055) (Info 1021).

Nenhum comentário:

Postar um comentário