15 de outubro de 2021

INTIMAÇÃO - Mesmo não havendo previsão legal expressa, a prerrogativa do § 2º do art. 186 do CPC/2015 pode ser também requerida pelo defensor dativo

  Fonte: Dizer o Direito

Referência:  https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-703-stj-1.pdf


INTIMAÇÃO - Mesmo não havendo previsão legal expressa, a prerrogativa do § 2º do art. 186 do CPC/2015 pode ser também requerida pelo defensor dativo 

É admissível a extensão da prerrogativa conferida à Defensoria Pública de requerer a intimação pessoal da parte na hipótese do art. 186, §2º, do CPC ao defensor dativo nomeado em razão de convênio entre a Ordem dos Advogados do Brasil e a Defensoria. Art. 186 (...) § 2º A requerimento da Defensoria Pública, o juiz determinará a intimação pessoal da parte patrocinada quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada. STJ. 3ª Turma. RMS 64.894-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João, advogado particular, atuou como defensor dativo em uma ação de alimentos. Esse advogado atuou porque naquele Município não há Defensoria Pública instalada e existe um convênio com a OAB para que esse serviço seja realizado por advogados que receberão honorários pagos pelo Estado. No curso do processo, o juiz proferiu decisão determinando que a parte assistida por João apresentasse um documento considerado imprescindível ao prosseguimento do feito. João, na qualidade de defensor dativo, foi intimado da decisão. Ele, então, peticionou ao juiz pedindo que a parte fosse pessoalmente intimada para trazer o documento. Isso porque ele (advogado) não estava conseguindo contato com ela (parte). João invocou, como fundamento, o art. 186, § 2º do CPC, que prevê: 

Art. 186 (...) § 2º A requerimento da Defensoria Pública, o juiz determinará a intimação pessoal da parte patrocinada quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada. 

Intimação pessoal da parte patrocinada pela Defensoria Pública 

“É possível que no curso do processo, o juiz determine à parte patrocinada pela Defensoria Pública a prática de um determinado ato ou diligência que somente por ela pode ser realizado. Para tanto, fará a intimação pessoal ao defensor público. Não raras vezes, o defensor público tem enormes dificuldades em comunicar tal determinação à parte, tendo em vista, por exemplo, o não atendimento das ligações, a não localização da parte no endereço por ela informado etc.” (LOPES JR., Jaylton. Manual de Processo Civil. Salvador: Juspodivm, 2021, p. 317) Pensando nesse tipo de dificuldade, o CPC/2015, de forma inovadora, trouxe a previsão do art. 186, § 2º do CPC. 

Nas palavras do Min. Ricardo Villas Bôas Cueva: 

“(...) o referido dispositivo objetiva facilitar a defesa judicial da parte representada pela Defensoria Pública, que, muitas vezes, nem consegue o contato direto com os seus assistidos, motivado pela ausência de telefone, pela falta dos dados necessários para realizar a própria comunicação ou pela condição socioeconômica do assistido. Por outro, algumas informações ou atos, por sua natureza, devem ser praticados pela própria parte, o que inviabiliza que sejam levados a efeito diretamente pelo defensor. Em tais situações, caberá ao Poder Judiciário, inclusive em respeito aos princípios da cooperação e da efetividade da tutela jurisdicional (arts. 6º e 8º do CPC/2015), após o requerimento da Defensoria Pública, determinar igualmente a notificação pessoal dos assistidos, utilizando-se do auxílio dos oficiais de justiça.” 

Veja como o tema já foi cobrado em prova: 

 (Defensor Público DPE/MG 2019 Fundep) A pedido da Defensoria Pública, a parte assistida deverá ser intimada pessoalmente para prestar informação ou tomar providência quando somente dela depender o ato processual. (correta) 

 (Analista MPE/SP 2018 Vunesp) A requerimento da Defensoria Pública o juiz determinará a intimação pessoal da parte patrocinada quando o ato processual depender de providência ou informação que somente por ela possa ser realizada ou prestada. (correta) 

 Vale ressaltar que a aplicação do art. 186, § 2º, do CPC depende de requerimento expresso do Defensor Público: 

“A determinação do magistrado para que se proceda à intimação pessoal da parte depende de requerimento expresso da Defensoria Pública” (SILVA, Franklyn Roger Alves; ESTEVES, Diogo. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 689).

 Indaga-se: essa previsão do art. 186, § 2º do CPC/2015 pode também ser aplicada para o defensor dativo? Em nosso exemplo, o juiz deverá deferir o pedido do defensor dativo? SIM. 

É admissível a extensão da prerrogativa conferida à Defensoria Pública de requerer a intimação pessoal da parte na hipótese do art. 186, §2º, do CPC ao defensor dativo nomeado em razão de convênio entre a Ordem dos Advogados do Brasil e a Defensoria. STJ. 3ª Turma. RMS 64.894-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703). 

Não se deve fazer uma interpretação literal, mas sim sistemática e teleológica 

Não existe previsão expressa no CPC autorizando essa extensão. Se você ler o art. 186 e seus parágrafos não irá encontrar essa autorização. Mesmo assim, o STJ afirma que esse conjunto de regras deve ser interpretado de modo sistemático e à luz de sua finalidade. Não há razão jurídica plausível para que se trate a Defensoria Pública e o defensor dativo de maneira diferente (anti-isonômica) nesse ponto. 

Defensor dativo enfrenta as mesmas dificuldades do Defensor Público 

O defensor dativo atua em locais em que não há Defensoria Pública instalada, cumprindo o quase altruísta papel de garantir efetivo e amplo acesso à justiça àqueles mais necessitados. Logo, ele enfrenta as mesmas dificuldades que a Defensoria Pública para se comunicar e obter informações, dados e documentos da parte assistida. Logo, as mesmas razões que levaram o legislador a criar a previsão do art. 186, § 2º para a Defensoria também podem ser aplicadas ao defensor dativo. A altíssima demanda recebida pela Defensoria Pública, que pressiona a instituição a tratar de muito mais causas do que efetivamente teria capacidade de receber, também se verifica quanto ao defensor dativo, especialmente porque se trata de profissional remunerado de maneira módica e que, em virtude disso, naturalmente precisa assumir uma quantidade significativa de causas para que obtenha uma remuneração digna e compatível. 

Interpretação literal e restritiva prejudica o assistido 

Se fosse adotada uma interpretação literal e restritiva para excluir o defensor dativo do âmbito de incidência do art. 186, § 2º, isso prejudicaria justamente o assistido necessitado que o legislador buscou proteger, mitigando o acesso à justiça, o contraditório e a ampla defesa, razão pela qual deve ser admitida a extensão da prerrogativa conferida à Defensoria Pública no art. 186. 

DOD PLUS – INFORMAÇÕES ADICIONAIS 

Defensor dativo só deve ser nomeado se não houver possibilidade de a Defensoria Pública atuar 

Vale ressaltar que a instituição que possui a missão constitucional de fazer a assistência jurídica das pessoas necessitadas é a Defensoria Pública, nos termos do art. 5º, inciso LXXIV c/c art. 134 da CF/88. Dessa forma, o juiz somente deverá designar um advogado como dativo se a Defensoria Pública estiver impossibilitada de atuar. Ex: não existe Defensor Público na cidade. O Estatuto da OAB afirma isso em dois dispositivos: no art. 34, XII (acima transcrito) e no art. 22, § 1º: 

Art. 22 (...) § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, (...) 

Assim, segundo a ordem constitucional vigente, a atuação do defensor dativo é subsidiária à do Defensor Público. 

O advogado que for nomeado e atuar como defensor dativo receberá algum valor por isso? 

SIM. O Estatuto da OAB afirma que o Estado deverá pagar honorários advocatícios ao advogado que atuar como defensor dativo e que o valor desses horários será definido pela própria OAB: 

Art. 22. (...) § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado. 

Assim, o juiz, no próprio processo, condena o Estado (Estado-membro ou União) a pagar os honorários advocatícios ao profissional que atuou como defensor dativo. Essa condenação é título executivo, que poderá ser executado pelo advogado: 

A sentença que fixa a verba honorária, em processo no qual atuou o defensor dativo, faz título executivo judicial certo, líquido e exigível, sendo de responsabilidade do Estado o pagamento da referida verba honorária, quando, na comarca, não houver Defensoria Pública. STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp n. 764.503/BA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 19/2/2016.


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