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26 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes (art. 782, § 3º) - Fernando da Fonseca Gajardoni

O autorizativo legal do art. 782, § 3º, do CPC/2015 - muito mal posicionado no Código, diga-se de passagem (não tem relação alguma com competência na execução) -, vem na esteira deste ideário de admitir que obrigações de todas as naturezas sejam cumpridas por medida de coerção/indução (e não necessariamente de adjudicação). 4.2. Ao autorizar que o juiz possa determinar, a qualquer momento ou grau de jurisdição, a inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes - inclusive no cumprimento de sentença (art. 782, § 5º, do CPC/2015) -, atua-se indiretamente sobre a vontade do devedor, aumentando as desvantagens do não cumprimento da obrigação positivada no título. Afinal, em uma sociedade de consumo globalizada como a que vivemos, o apontamento no cadastro de maus pagadores (art. 44 do CDC) representa enorme limitador do crédito, consequentemente forçando o devedor a buscar a baixa de negativação a fim de recuperá-lo. 4.3. A negativação pela via judicial só se faz a requerimento da parte, nunca de ofício. 

GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Execução e Recursos: comentários ao CPC de 2015. 1 ed. São Paulo: Método, 2017, p. 62.

24 de abril de 2021

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES, NOS TERMOS DO ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.835.778 - PR (2018/0264494-0) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. QUESTÕES DEVIDAMENTE APRECIADAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES, NOS TERMOS DO ART. 782, § 3º, DO CPC/2015. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NORMA QUE DEVE SER INTERPRETADA DE FORMA A GARANTIR AMPLA EFICÁCIA À EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL EXECUTIVA. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO EM PARTE. 

1. A controvérsia posta no presente recurso especial consiste em saber, além da adequação da tutela jurisdicional prestada, se o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do Código de Processo Civil de 2015, depende da comprovação de prévia recusa administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro. 

2. Da leitura do acórdão recorrido, verifica-se que a Corte local apreciou expressamente a questão relacionada à norma do art. 139, inciso IV, do CPC/2015, não havendo que se falar em negativa de prestação jurisdicional. 

3. O ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito postulado pela parte perante o Poder Judiciário, mas, também, a efetivação desse direito. Trata-se do princípio da efetividade, corolário do devido processo legal, o qual foi alçado pelo Código de Processo Civil de 2015 como norma fundamental, ao estabelecer em seus arts. 4º e 6º o direito à obtenção da atividade satisfativa. 

4. Nessa linha, foram implementados no novo CPC diversas medidas executivas visando garantir a efetividade da tutela jurisdicional prestada, permitindo-se ao Magistrado, ainda, a aplicação de medidas atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a obrigação, em conformidade com o teor do art. 139, inciso IV, do CPC/2015. 

5. Em relação às medidas executivas típicas, uma das novidades trazidas pelo novo diploma processual civil é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, a qual encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do CPC de 2015. 

6. Tal norma deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à concretização da tutela executiva, em conformidade com o princípio da efetividade do processo, não se mostrando razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao implemento dessa medida, condicionando-a à prévia recusa administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro, em manifesto descompasso com o propósito defendido pelo CPC/2015, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas de satisfação do crédito foram todas frustradas. 

7. Considerando que o único fundamento utilizado pelas instâncias ordinárias foi a necessidade de requerimento administrativo prévio pelo exequente, não havendo, portanto, qualquer análise acerca das circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade e a potencialidade de a negativação coagir o devedor à satisfação da obrigação, impõe-se o retorno dos autos para que o pedido seja novamente analisado. 

8. Recurso especial parcialmente provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 04 de fevereiro de 2020 (data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Cuida-se, na origem, de agravo de instrumento interposto por Finanza Fomento Mercantil Ltda. contra a decisão do Juízo de primeiro grau que, na ação de locupletamento em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de inscrição do nome da executada no cadastro de inadimplentes, sob o fundamento de que tal medida é de iniciativa exclusiva do credor. 

A Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná negou provimento ao agravo, em acórdão assim ementado: 

CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. REQUERIMENTO DE INCLUSÃO DO NOME DO EXECUTADO EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. ART. 782. § 3º, DO NCPC. ACIONAMENTO DO APARATO JUDICIÁRIO QUE SOMENTE SE JUSTIFICA SE COMPROVADA A RECUSA DAS ENTIDADES MANTENEDORAS DO CADASTRO À AVERBAÇÃO DA DÍVIDA. DECISÃO CORRETA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 

Os embargos de declaração opostos ao referido decisum foram rejeitados. 

No recurso especial, a Finanza Fomento Mercantil Ltda. afirma que o acórdão recorrido violou os arts. 489, § 1º, inciso V, e 1.022, ambos do Código de Processo Civil de 2015, pois deixou de enfrentar todas as questões suscitadas no agravo de instrumento interposto, caracterizando, assim, negativa de prestação jurisdicional. 

Quanto à questão de fundo, aponta violação dos arts. 139, inciso IV, e 782, § 3º, do CPC/2015, argumentando, em síntese, que, "na sistemática do novo CPC, o juiz tem o poder/dever de buscar, por todos os meios e medidas disponíveis e possíveis, assegurar a obtenção do resultado pretendido pelo processo. No presente caso, o processo já se desenrola a mais de 9 anos, sem ter a parte Recorrente obtido qualquer êxito em receber seu crédito já reconhecido em sentença judicial. Resta sobremaneira óbvio e claro, portanto, que sua pretensão, de inserção da parte Recorrida/Executada nos cadastros de inadimplentes, é legítima e razoável, e busca tão somente dar publicidade a uma situação de fato, qual seja, a inadimplência da parte Recorrida/Executada" (e-STJ, fl. 62). 

Reforça, ainda, que "a lei processual não traz qualquer condicionante à concessão da inscrição ora pretendida", razão pela qual "a alegação do Tribunal de origem no sentido de que deve a parte buscar a inscrição administrativamente antes de solicitá-la ao juízo não procede em absoluto" (e-STJ, fl. 63). 

Busca, assim, o provimento do recurso especial para que seja reformado o acórdão recorrido, deferindo-se "o pedido de inscrição da parte Recorrida/Executada junto aos cadastros de inadimplentes/órgãos de proteção ao crédito, na forma pretendida pela parte Recorrente", ou, caso se entenda pela ausência de prequestionamento, que seja reconhecida a negativa de prestação jurisdicional por parte do Tribunal de origem, determinando-se a devolução dos autos para a reapreciação dos embargos de declaração opostos, a fim de que haja manifestação expressa sobre os dispositivos apontados pela Recorrente. 

A recorrida não apresentou contrarrazões. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): A controvérsia posta no presente recurso especial consiste em saber, além da adequação da tutela jurisdicional prestada, se o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do Código de Processo Civil de 2015, depende da comprovação de prévia recusa administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro. 

1. Delimitação fática. 

Consta dos autos que a Finanza Fomento Mercantil Ltda. ajuizou ação de locupletamento ilícito em desfavor de Ana Paula dos Anjos Samesima Bim, buscando o recebimento de valores constantes em cheques prescritos. 

A ação foi julgada parcialmente procedente. 

Na fase de cumprimento de sentença, considerando o transcurso de tempo significativo sem qualquer êxito em localizar bens ou valores da executada suficientes para saldar o débito, a exequente Finanza pleiteou ao Juízo, dentre outras providências, a expedição de ofícios aos órgãos de proteção ao crédito, para o fim de incluir o nome da executada nos cadastros de inadimplentes. 

O Juízo de primeiro grau, contudo, indeferiu o pedido, sob o fundamento de que a negativação do nome da executada é de iniciativa do próprio credor, não se exigindo a participação do Poder Judiciário (e-STJ, fl. 26). 

Em agravo de instrumento interposto pela exequente, o Tribunal de Justiça do Paraná manteve a referida decisão, aduzindo, para tanto, o seguinte (e-STJ, fl. 42): 

(...), embora o art. 782, § 3º, do NCPC preveja a possibilidade de o juiz determinar, a requerimento da parte, a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, entendo que o acionamento do aparato judiciário somente se justifica se o credor não conseguir obter administrativamente a averbação da existência da ação nos referidos cadastros. De fato, estando o credor/exequente de posse de título judicial (sentença condenatória) e demais documentos comprobatórios da inadimplência, não se afigura necessária, a princípio, a expedição de ofício do juízo requerendo a anotação da dívida, bastando que ele apresente às instituições mantenedoras de tais cadastros os documentos da dívida para a sua anotação. Somente na hipótese de recusa comprovada da averbação é que se justifica a intervenção judicial, conforme precedentes do TJPR mencionados no recurso, o que, no entanto, não é o caso dos autos. 

Feita essa breve síntese do caso, passo à análise das razões recursais. 

2. Da violação aos arts. 489, § 1º, inciso V, e 1.022 do CPC/2015 - omissão do acórdão recorrido em relação à análise da incidência do art. 139, inciso IV, do CPC/2015. 

A recorrente sustenta que houve negativa de prestação jurisdicional por parte do Tribunal de origem no julgamento do agravo de instrumento interposto, pois não se manifestou expressamente sobre a incidência, na hipótese, do art. 139, inciso IV, do CPC/2015, "pelo qual cabe ao juiz 'determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária'" (e-STJ, fl. 59). 

O argumento, contudo, não procede. 

Isso porque, do que se depreende do acórdão que julgou os embargos de declaração opostos na origem, verifica-se que a Corte local apreciou expressamente a questão alegada sobre o referido dispositivo legal - art. 139, IV, do CPC/2015. 

Confira-se, a propósito, trecho do referido acórdão: 

Não era necessário o enfrentamento do art. 139, IV, do NCPC, pois este Colegiado entendeu que a averbação da existência do débito discutido judicialmente nos cadastros de inadimplentes é providência administrativa que independe da atuação do juiz, salvo se o exequente comprovar a recusa das instituições mantenedoras de tais cadastros, o que ainda não aconteceu no caso dos autos. 

Ora, certo ou errado, a questão foi apreciada pelo Tribunal de origem, não havendo, portanto, a apontada negativa de prestação jurisdicional, razão pela qual afasta-se a violação aos arts. 489, § 1º, V, e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015. 

3. Da violação aos arts. 139, inciso IV, e 782, § 3º, do CPC/2015 - possibilidade de inserção do nome da executada nos cadastros de inadimplentes, a requerimento da exequente, independentemente de prévia recusa administrativa. 

O ordenamento jurídico brasileiro deve tutelar não apenas o reconhecimento do direito postulado pela parte perante o Poder Judiciário, mas, também, a efetivação desse direito. 

Trata-se do princípio da efetividade, corolário do devido processo legal, o qual foi alçado pelo CPC de 2015 como norma fundamental do processo civil, ao estabelecer em seus arts. 4º e 6º o direito à obtenção da atividade satisfativa. 

Confiram-se, a propósito, o teor dos referidos dispositivos legais: 

Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. 

Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. 

Sobre o assunto, lecionam Fredie Didier Jr., Leonardo Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira: 

1. PRINCÍPIOS DA EXECUÇÃO 

1.1. Princípio da efetividade. 

Direito fundamental à tutela executiva. O devido processo legal, cláusula geral processual constitucional, tem como um de seus corolários o princípio da efetividade: os direitos devem ser efetivados, não apenas reconhecidos. Processo devido é processo efetivo. O princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva, que consiste 'na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva'. O art. 4º do CPC, embora em nível infraconstitucional, reforça esse princípio como norma fundamental do processo civil brasileiro, ao incluir o direito à atividade satisfativa, que é o direito à execução (...). (Curso de Direito Processual Civil: execução. 7 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p.65) 

Nessa linha, foram implementados no novo Código de Processo Civil diversos mecanismos visando garantir a efetividade da tutela jurisdicional, dentre os quais podemos citar, como exemplos, a possibilidade de protesto da decisão judicial transitada em julgado depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário, nos termos do art. 517 do CPC/2015, bem como a constituição da hipoteca judiciária (CPC/2015, art. 495), dentre outros. 

Além disso, estabeleceu-se a permissão para a adoção de medidas executórias atípicas, a fim de coagir indiretamente o executado a satisfazer a obrigação, dando maior efetividade ao processo civil, possibilitando, por exemplo, a restrição de alguns direitos, como a retenção de passaporte e/ou da carteira nacional de habilitação - CNH. 

A possibilidade de utilização de medidas atípicas é extraída de diversas disposições do CPC/2015, sendo a principal delas o art. 139, inciso IV, que assim estabelece: 

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...) IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; 

Uma das medidas executivas típicas, objeto do presente recurso especial, é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, a qual encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do Código de Processo Civil de 2015, que assim dispõe: 

Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os atos executivos, e o oficial de justiça os cumprirá. (...) 

§ 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. 

§ 4º A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo. 

§ 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial. 

Do que se extrai da referida norma, verifica-se que a negativação do nome pela via judicial somente será possível por requerimento da parte, nunca de ofício. 

Tal medida se mostra extremamente importante na concretização do princípio da efetividade do processo, pois acarreta significativa limitação ao crédito do devedor, em razão da negativação de seu nome, sendo um instrumento eficaz para assegurar a satisfação da obrigação. 

Ao discorrer sobre o tema, Fernando da Fonseca Gajardoni assim leciona: 

O autorizativo legal do art. 782, § 3º, do CPC/2015 - muito mal posicionado no Código, diga-se de passagem (não tem relação alguma com competência na execução) -, vem na esteira deste ideário de admitir que obrigações de todas as naturezas sejam cumpridas por medida de coerção/indução (e não necessariamente de adjudicação). 4.2. Ao autorizar que o juiz possa determinar, a qualquer momento ou grau de jurisdição, a inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes - inclusive no cumprimento de sentença (art. 782, § 5º, do CPC/2015) -, atua-se indiretamente sobre a vontade do devedor, aumentando as desvantagens do não cumprimento da obrigação positivada no título. Afinal, em uma sociedade de consumo globalizada como a que vivemos, o apontamento no cadastro de maus pagadores (art. 44 do CDC) representa enorme limitador do crédito, consequentemente forçando o devedor a buscar a baixa de negativação a fim de recuperá-lo. 4.3. A negativação pela via judicial só se faz a requerimento da parte, nunca de ofício. (Execução e Recursos: comentários ao CPC de 2015. 1 ed. São Paulo: Método, 2017, p. 62) 

Vale ressaltar que a medida prevista no art. 782, § 3º, do CPC/2015 não impõe ao Juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, pois se trata de mera faculdade - em razão do uso da forma verbal "pode" -, e não de uma obrigação legal, devendo ser analisadas as particularidades do caso concreto. 

Assim, nos termos da doutrina acima destacada, "diante do requerimento apresentado, o juiz faz um juízo de viabilidade da execução ou da fase em que ela se encontra, bem como da necessidade e do potencial que a medida requerida (a negativação) tem para coagir o devedor ao cumprimento da obrigação. Decisão fundamentada contra a qual cabe agravo de instrumento, na forma do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015" (GAJARDONI, ob cit., p. 63). 

Ocorre que, conquanto o magistrado não esteja obrigado a deferir a medida executiva prevista no referido dispositivo, não se revela legítimo o fundamento adotado pelas instâncias ordinárias no caso ora em julgamento, no sentido de que "o acionamento do aparato judiciário somente se justifica se o credor não conseguir obter administrativamente a averbação da existência da ação nos referidos cadastros" (e-STJ, fl. 42). 

Ora, além de o Tribunal de origem ter criado um requisito não previsto em lei para a adoção da medida executiva de negativação do nome do devedor, tal entendimento está na contramão de toda a sistemática trazida com o novo Código de Processo Civil, em que se busca a máxima efetividade da tutela jurisdicional prestada, conforme já destacado. 

Com efeito, em decorrência do princípio da efetividade do processo, a norma do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que possibilita a inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à concretização da tutela executiva, não sendo razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao implemento dessa medida sem qualquer fundamento plausível e em manifesto descompasso com o propósito defendido pelo novo CPC, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas de satisfação do crédito foram todas frustradas. 

Não se olvida que nada impede que o credor requeira extrajudicialmente a inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes. Todavia, também não há qualquer óbice para que esse requerimento seja feito diretamente pela via judicial, no bojo da execução, como possibilita expressamente o art. 782, § 3º, do CPC/2015. 

Aliás, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ implementou o sistema "SerasaJud", mediante termo de cooperação técnica firmado com o Serasa, justamente com o intuito de facilitar a tramitação de ofícios expedidos pelo Poder Judiciário com ordens de inscrição de nomes no respectivo cadastro de inadimplentes, facilitando, assim, a operacionalização do disposto no art. 782, §§ 3º a 5º, do CPC/2015. 

A propósito, esta Terceira Turma, em caso bastante semelhante ao presente, em que se discutia a possibilidade do exequente requerer diretamente ao Juízo a busca de informações sobre eventuais veículos pertencentes ao executado, por meio do sistema RENAJUD, entendeu que tal medida não dependia do prévio exaurimento das vias extrajudiciais. O acórdão recebeu a seguinte ementa: 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. SISTEMA RENAJUD. CONSULTA. POSSIBILIDADE. EXAURIMENTO DE DILIGÊNCIAS PARA BUSCA DE BENS DO EXECUTADO. DESNECESSIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia a definir se é dado ao exequente solicitar ao Juízo a busca - pelo sistema RENAJUD - de informação acerca da existência de veículos de propriedade do executado, independentemente da comprovação do esgotamento das vias extrajudiciais para tal finalidade. 2. O RENAJUD é um sistema on-line de restrição judicial de veículos criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que interliga o Judiciário ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e permite consultas e envio, em tempo real, à base de dados do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam) de ordens judiciais de restrições de veículos, inclusive registro de penhora. 3. Considerando-se que i) a execução é movida no interesse do credor, a teor do disposto no artigo 612 do Código de Processo Civil; ii) o sistema RENAJUD é ferramenta idônea para simplificar e agilizar a busca de bens aptos a satisfazer os créditos executados e iii) a utilização do sistema informatizado permite a maior celeridade do processo (prática de atos com menor dispêndio de tempo e de recursos) e contribui para a efetividade da tutela jurisdicional, é lícito ao exequente requerer ao Juízo que promova a consulta via RENAJUD a respeito da possível existência de veículos em nome do executado, independentemente do exaurimento de vias extrajudiciais. 4. Recurso especial provido. (REsp n. 1.347.222/RS, Terceira Turma, Relator o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 2/9/2015 - sem grifo no original) 

Em conclusão, embora o magistrado não esteja obrigado a deferir o pedido de inclusão do nome do executado no cadastro de inadimplentes, visto que a norma do art. 782, § 3º, do CPC/2015 não trata de uma imposição legal, mas mera faculdade atribuída ao juiz da causa, não se revela idôneo condicionar a referida medida à prévia recusa administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro, tal como entendido pelas instâncias ordinárias. 

Considerando que esse foi o único fundamento utilizado para se indeferir o pedido, não havendo, portanto, qualquer análise acerca das circunstâncias do caso concreto para se verificar a necessidade e a potencialidade de a negativação coagir o devedor à satisfação da obrigação, impõe-se o retorno dos autos para que o pedido seja novamente analisado. 

Por essas razões, dou parcial provimento ao recurso especial para, reformando o acórdão recorrido, determinar que o Juízo a quo analise novamente o pedido de inclusão do nome da executada em cadastro de inadimplentes, independentemente de prévio requerimento administrativo pela exequente. 

É o voto. 

20 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Informações / Dados pessoais; Bancos de dados de proteção ao crédito

“Como evidenciado nos itens anteriores, coletar, armazenar e divulgar informações pessoais são atos, em tese, ofensivos à privacidade. Do mesmo modo, difundir, por qualquer meio, a notícia de que alguém não cumpre pontualmente com suas obrigações caracteriza ofensa à honra. Admite-se, excepcionalmente, que os bancos de dados de proteção ao crédito, considerando a presença de outros valores em jogo – em síntese, a importância do crédito para o indivíduo e para a economia nacional, bem como o direito à informação –, realizem, observados determinados requisitos legais, o tratamento de informações pessoais negativas. Desde que atendidos rigorosamente os limites impostos pelo ordenamento jurídico, há exercício regular de direito. O direito brasileiro aceita – e controla – a existência dos bancos de dados de proteção ao crédito. Desse modo, os atos praticados pelas entidades que os administram, desde que atendidos, rigorosamente, os limites impostos pelo ordenamento jurídico, são lícitos, não configurando ofensa à dignidade do consumidor (direito à privacidade e à honra)” 

BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor, 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 320. 

18 de abril de 2021

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. INADIMPLEMENTO. REGIME JURÍDICO APLICÁVEL. DECRETO-LEI 911/69. INSCRIÇÃO DO NOME DO AVALISTA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.833.824 - RS (2019/0251597-0) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. INADIMPLEMENTO. REGIME JURÍDICO APLICÁVEL. DECRETO-LEI 911/69. INSCRIÇÃO DO NOME DO AVALISTA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 

1. Ação ajuizada em 18/04/2016. Recurso especial interposto em 16/05/2019 e concluso ao Gabinete em 26/08/2019. Julgamento: Aplicação do CPC/2015. 

2. O propósito recursal consiste em definir se o credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento do contrato, é obrigado a promover a venda do bem alienado fiduciariamente, na forma do art. 1.364 do CC/02, antes de proceder à inscrição dos nomes dos devedores em cadastros de proteção ao crédito. 

3. No ordenamento jurídico brasileiro, coexiste um duplo regime jurídico da propriedade fiduciária: a) o regime jurídico geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica; b) o regime jurídico especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, dentre as quais o Decreto-Lei 911/69, que trata da propriedade fiduciária sobre coisas móveis fungíveis e infungíveis, além da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, restrito o credor fiduciário à pessoa jurídica instituição financeira. 

4. Hipótese dos autos que envolve cédula de crédito bancário com alienação fiduciária de veículo em garantia firmada com instituição financeira, a atrair o regime do DL 911/69. 

5. Nos termos expressos do art. 5º do DL 911/69, é facultado ao credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento ou mora no cumprimento das obrigações contratuais pelo devedor, optar pela excussão da garantia ou pela ação de execução. 

6. De todo modo, independentemente da via eleita pelo credor, a inscrição dos nomes dos devedores solidários em bancos de dados de proteção ao crédito, em razão do incontroverso inadimplemento do contrato, não se reveste de qualquer ilegalidade, tratando-se de exercício regular do direito de crédito. 

7. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração dos honorários advocatícios. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso especial, com majoração dos honorários advocatícios, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 05 de maio de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): 

Cuida-se de recurso especial interposto por ODANIR BRUNO SARTORI, com fundamento, exclusivamente, na alínea "a" do permissivo constitucional. 

Ação: declaratória c/c pedido de obrigação de fazer, ajuizada pelo recorrente em face de BANCO VOLKSWAGEN S.A. 

Em breve síntese, alega o autor que, na condição de então sócio da empresa Concresart Tecnologia em Concreto LTDA, firmou com o Banco réu, em 30/08/2011, contrato de abertura de crédito fixo com garantia de alienação fiduciária, no qual figurou como avalista. 

No entanto, em fevereiro de 2016 – após a sua retirada do quadro societário, em maio de 2013 –, a empresa entrou em recuperação judicial e se tornou inadimplente com relação às parcelas do contrato, o que ocasionou a inscrição do nome do autor em cadastros de restrição ao crédito. 

Ante esses fatos, argumenta o autor que, por se tratar de contrato garantido por alienação fiduciária, cabia ao Banco réu primeiramente efetivar a venda do bem com vistas ao pagamento da dívida e, assim, apurar eventual saldo devedor, na forma do art. 1.364 do CC/02, para só então proceder à negativação do nome do avalista. 

Dessa maneira, requer a exclusão das anotações já realizadas e que seja determinado ao réu que não efetue a inscrição do nome do autor em cadastro de restrição ao crédito no tocante ao contrato em apreço antes de promovida a venda do bem alienado fiduciariamente. 

Sentença: julgou procedente o pedido, para declarar o direito do autor, ora recorrente, de não ter o seu nome incluído em rol de inadimplentes antes de observado o procedimento de excussão da garantia, confirmando a decisão que, em sede de tutela antecipada, determinou a exclusão das anotações negativas. 

Acórdão: deu provimento à apelação interposta pelo recorrido para julgar improcedentes os pedidos iniciais, nos termos da seguinte ementa: 

“APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. 1. Inexiste obrigação de o credor buscar antes a garantia real e depois a pessoal. Inaplicabilidade do artigo 1.364 do Código Civil no caso concreto. 2. Em sendo o débito devido, pois, regular a inscrição em órgão(s) de proteção ao crédito, inexistindo ato ilícito, razão pela qual não há falar-se em indenização por danos morais. Exercício regular de direito. APELO PROVIDO” (e-STJ fl. 92). 

Recurso especial: alega violação do art. 1.364 do CC/02, reiterando que, na hipótese de inadimplemento de contrato garantido por alienação fiduciária, o credor, a fim de buscar a satisfação de seu crédito, deve obrigatoriamente promover a venda do bem alienado e aplicar o preço obtido no pagamento e/ou abatimento parcial da dívida. Defende que, antes desse procedimento, que permite apurar eventual débito remanescente, não é lícita a inclusão do nome do devedor em órgãos de restrição ao crédito. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJ/RS. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): 

O propósito recursal consiste em definir se o credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento do contrato, é obrigado a promover a venda do bem alienado fiduciariamente antes de proceder à inscrição dos nomes dos devedores em cadastros de proteção ao crédito. 

I. DA DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 

1. O debate trazido a julgamento gira em torno da interpretação do art. 1.364 do CC/02, segundo o qual “vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor”. 

2. A partir de tal dispositivo legal, o ora recorrente defende que a venda do bem alienado fiduciariamente é obrigatória, pois somente após implementada é que se poderia constatar eventual saldo devedor remanescente, que, de seu turno, legitimaria a inscrição do nome do devedor e seus avalistas em cadastros de restrição ao crédito. 

3. O Tribunal de origem, no entanto, rejeitou essa linha argumentativa, ao entendimento de que “inexiste obrigação de o credor buscar antes a garantia real e depois a pessoal, até porque lhe é de direito promover a execução do crédito da maneira que lhe pareça mais exitosa, restando inaplicável o referido artigo do códex no caso presente” (e-STJ fl. 94). 

II. DO DUPLO REGIME JURÍDICO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA 

4. Em linhas gerais, o negócio fiduciário é aquele mediante o qual um sujeito (fiduciante), a fim de garantir uma obrigação, transmite a propriedade de uma coisa ou a titularidade de um direito a outro (fiduciário), que, se cumprido o encargo, devolve o bem ou o direito ao transmitente. Considera-se fiduciária, assim, a propriedade resolúvel de coisa ou direito que o devedor fiduciante, com escopo de garantia, transfere ao credor fiduciário. 

5. No ordenamento jurídico brasileiro, a matéria é disciplinada pelo Código Civil e por uma profusa legislação extravagante. Por isso, aponta a doutrina a coexistência de um duplo regime jurídico da propriedade fiduciária: a) o regime jurídico geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica; b) o regime jurídico especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, basicamente divididas em: (b1) Decreto-Lei 911/69, acrescido do art. 66-B da Lei 4.728/65 (Lei do Mercado de Capitais), atualizados pela redação da Lei 10.931/2004, tratando de propriedade fiduciária sobre coisas móveis fungíveis e infungíveis, além da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, restrito o credor fiduciário à pessoa jurídica instituição financeira; (b2) Lei 9.514/97, também modificada pela Lei 10.931/2004, que trata da propriedade fiduciária imobiliária, seja o credor instituição financeira ou não (Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. Curso de Direito Civil: direitos reais, 14ª ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2018, p. 557). 

6. Aliás, a coexistência de ambos os regimes jurídicos e a solução de eventual conflito de leis foi enfrentada pela Lei 10.931/2004, que acrescentou o art. 1.368-A ao Código Civil para esclarecer que “as demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária” (vale dizer, aquelas que não tratam de negócio fiduciário envolvendo bem móvel infungível e firmado entre quaisquer pessoas, naturais ou jurídicas) “submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial”. 

III. DO REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À HIPÓTESE DOS AUTOS: DECRETO-LEI 911/69 

7. Essa distinção acerca da disciplina legal da propriedade fiduciária segundo a sua natureza mostra-se relevante no presente julgamento pois permite concluir, de início, que o dispositivo legal invocado pelo recorrente, a saber, o art. 1.364 do CC/02, não é aplicável à relação jurídica travada entre as partes. 

8. Com efeito, verifica-se que a hipótese dos autos trata de aval prestado pelo recorrente em cédula de crédito bancário com alienação fiduciária de veículo em garantia, que fora firmada junto ao Banco recorrido (e-STJ fl. 65). 

9. Dessa maneira, em se tratando de alienação fiduciária de coisa móvel infungível envolvendo instituição financeira, o regime jurídico aplicável é aquele do Decreto-Lei 911/69, devendo as disposições gerais do Código Civil incidir apenas em caráter supletivo. 

10. Essa aplicação supletiva do Código Civil, todavia, não se faz necessária na espécie, haja vista que o DL 911/69 contém disposição expressa que faculta ao credor fiduciário, na hipótese de inadimplemento ou mora no cumprimento das obrigações contratuais pelo devedor, optar por recorrer diretamente à ação de execução, caso não prefira retomar a posse do bem e vendê-lo a terceiros. 

11. Nesse sentido é o contido no art. 5º do DL 911/69, in verbis: 

Art. 5º. Se o credor preferir recorrer à ação executiva, direta ou a convertida na forma do art. 4º, ou, se for o caso ao executivo fiscal, serão penhorados, a critério do autor da ação, bens do devedor quantos bastem para assegurar a execução” (grifou-se). 

12. Logo, já se constata que não prospera o argumento do recorrente quanto à obrigatoriedade de o credor proceder à excussão da garantia na hipótese de inadimplemento do contrato garantido por alienação fiduciária. 

IV. DO EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO PELO CREDOR 

13. Não obstante, cabe salientar que, independentemente de optar o credor pela venda do bem alienado fiduciariamente a terceiros ou pela execução direta, a inscrição do nome dos devedores solidários em bancos de dados de proteção ao crédito, na hipótese de inadimplemento, não se reveste de qualquer ilegalidade, tratando-se de exercício regular de direito do credor. 

14. Com efeito, a partir do inadimplemento das obrigações pactuadas pelo devedor, nasce para o credor uma série de prerrogativas, não apenas atreladas à satisfação do seu crédito em particular – do que é exemplo a excussão da garantia ou a cobrança da dívida –, mas também à proteção do crédito em geral no mercado de consumo. 

15. Inclusive, destaca a doutrina, o próprio CDC, ao invés de proibir, aceita e disciplina as atividades desenvolvidas pelos bancos de dados de proteção ao crédito, sinalizando, ademais, a sua relevância para a atividade econômica no país, tão dependente do crédito. 

16. Nesse sentido, veja-se a precisa lição de Leonardo ROSCOE BESSA: “Como evidenciado nos itens anteriores, coletar, armazenar e divulgar informações pessoais são atos, em tese, ofensivos à privacidade. Do mesmo modo, difundir, por qualquer meio, a notícia de que alguém não cumpre pontualmente com suas obrigações caracteriza ofensa à honra. Admite-se, excepcionalmente, que os bancos de dados de proteção ao crédito, considerando a presença de outros valores em jogo – em síntese, a importância do crédito para o indivíduo e para a economia nacional, bem como o direito à informação –, realizem, observados determinados requisitos legais, o tratamento de informações pessoais negativas. Desde que atendidos rigorosamente os limites impostos pelo ordenamento jurídico, há exercício regular de direito. O direito brasileiro aceita – e controla – a existência dos bancos de dados de proteção ao crédito. Desse modo, os atos praticados pelas entidades que os administram, desde que atendidos, rigorosamente, os limites impostos pelo ordenamento jurídico, são lícitos, não configurando ofensa à dignidade do consumidor (direito à privacidade e à honra)” (Manual de Direito do Consumidor, 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 320). 

17. Assim, em conclusão, independentemente da via eleita pelo credor para a satisfação de seu crédito, não há ilicitude na inscrição do nome do devedor e seu avalista nos órgãos de proteção ao crédito, ante o incontroverso inadimplemento da obrigação. 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e NEGO-LHE PROVIMENTO. 

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/15, considerando o trabalho adicional imposto ao advogado da parte recorrida em virtude da interposição deste recurso, majoro os honorários advocatícios fixados anteriormente em R$ 2.000,00 (e-STJ fl. 95) para R$ 3.000,00. 

16 de abril de 2021

BC não pode ser responsabilizado por inscrição indevida no Sistema de Informações de Crédito

 A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial do Banco Central (BC) e reconheceu a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da ação de indenização ajuizada por um cliente de banco que teve o CPF incluído no Sistema de Informações de Crédito (SCR) sem notificação prévia.

Integrante do Sisbacen, o SCR é um instrumento de registro gerido pelo BC e alimentado mensalmente pelas instituições financeiras com informações que permitem avaliar o nível de risco das operações de crédito.

A decisão da Primeira Turma reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que condenou a autarquia federal, solidariamente com o banco, a pagar indenização de R$ 3 mil ao cliente. O TRF4 equiparou o Sisbacen e suas ramificações aos cadastros de proteção ao crédito, aplicando ao caso a Súmula 3​​59 do STJ, segundo a qual "cabe ao órgão mantenedor do cadastro de proteção ao crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição".

Efeito secundário

A relatora, ministra Regina Helena Costa, explicou que o BC é responsável pela regulação, fiscalização e manutenção dos diversos sistemas e recursos tecnológicos que compõem o Sisbacen.

Segundo a magistrada, há inúmeros julgados nos quais o STJ considerou que as informações fornecidas pelas instituições financeiras ao Sisbacen são restritivas de crédito, uma vez que esse sistema permite avaliar a capacidade de pagamento do consumidor de serviços bancários.

Os cadastros integrantes do Sisbacen – esclareceu –, destinados à atividade fiscalizadora exercida pela autarquia, eventualmente podem ser usados para o controle da inadimplência em relação aos clientes de instituições financeiras, gerando restrições ao crédito.

"Todavia, esse efeito secundário, decorrente da operacionalização da política regulatória do sistema financeiro, não é bastante para impor à autarquia a sua responsabilização por ausência de prévia notificação do devedor, como demanda o parágrafo 2º do artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC)", afirmou a ministra. Para ela, não há fornecimento de produto ou serviço pelo BC para ser consumido, mediante pagamento, pelo cliente da instituição financeira.

Natureza pública

Na avaliação da relatora, é inviável que a autarquia cumpra o dever de notificar previamente o cliente do banco acerca da inclusão de seus dados no Sisbacen, uma vez que essa inclusão é promovida individualmente pelas instituições financeiras credoras, e o BC nem mesmo tem acesso prévio à informação a fim de promover a notificação.

Regina Helena Costa ressaltou que o papel do BC como gestor do Sisbacen é de natureza pública, distinto dos cadastros privados como a Serasa e o SPC, que obtêm lucro com o cadastramento dos inadimplentes.

A ministra considerou aplicável ao caso, por analogia, a Súmula 572 do STJ, que dispõe que "o Banco do Brasil, na condição de gestor do Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF), não tem a responsabilidade de notificar previamente o devedor acerca da sua inscrição no aludido cadastro, tampouco legitimidade passiva para as ações de reparação de danos diante da ausência de prévia comunicação".

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1626547

14 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Inscrição do executado em cadastro de inadimplentes - Carlos Alberto Carmona

A comunicação aos órgãos que se encarregam de apontar os devedores inadimplentes deve ser requerida pelo credor (não pode ser decretada de ofício pelo juiz) e, portanto, acarreta responsabilização do exequente caso a execução mostre-se infundada. A anotação, junto aos órgãos de proteção ao crédito, sabem todos, acarreta uma série de entraves à vida civil, com possível bloqueio de crédito e de acesso a serviços bancários diversos. Por isso mesmo, deve o juiz verificar, diante do pedido do credor, se é efetivamente caso de fazer a comunicação. Em outros termos, não basta o pedido do credor para que o juiz proceda à inclusão do nome do devedor no rol dos inadimplentes: é preciso que o juiz pondere se existe dúvida razoável acerca da existência do direito do credor. Se existir algum receio do magistrado de que a execução possa ser abusiva, ilícita ou indevida, o pleito será indeferido. Este o sentido da utilização do verbo poder no § 3º do art. 782 do CPC/2015 (e não do verbo dever).

CARMONA, Carlos Alberto. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo. AASP, 2015, p. 1203-1204. 

13 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Enunciado 190 do CJF - inclusão do devedor em cadastro de inadimplentes

O propósito do enunciado é apenas esclarecer que a possibilidade de o juiz determinar a inclusão de pessoas nesses cadastros não significa que tal determinação seja requisito para o ato. Assim, se o credor for conveniado aos serviços de proteção ao crédito e, por essa razão, tiver condições de remeter, por si mesmo, o nome do devedor para inclusão, poderá fazê-lo livremente. A ordem judicial não foi convertida em requisito para o ato. Ela é útil apenas para os credores não conveniados ao serviço. 

VITORELLI, Edilson. In: FLUMIGNAN, Silvano José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura (Coords.). Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC: organizados por assunto, anotados e comentados. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 603. 

Filigrana Doutrinária: Inscrição do dever em cadastro restritivo de crédito,

Se o exequente requerer, o juiz poderá determinar a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, como, por exemplo, SPC, SERASA etc. A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo. Trata-se de uma medida coativa permitida pela legislação processual para estimular o executado ao cumprimento da obrigação, uma vez que a inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes poderá ensejar inúmeros dissabores, como, por exemplo, restrição ao crédito. O juiz poderá determinar a inscrição do nome do executado em cadastros de inadimplentes tanto em execução de título executivo extrajudicial quanto no cumprimento de título executivo judicial.


SOUZA, Artur César de; FERNANDES, Geraldo Og Nicéas. Execução e cumprimento de sentença. São Paulo: Almedina, 2018, p. 121. 

10 de abril de 2021

Inscrição do devedor em cadastros de inadimplentes em Execução Fiscal

RECURSO ESPECIAL Nº 1.807.180 - PR (2019/0093736-8) 

RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES

1ª SEÇÃO; UNÂNIME


PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. INSCRIÇÃO DO DEVEDOR EM CADASTROS DE INADIMPLENTES POR DECISÃO JUDICIAL. EXECUÇÃO FISCAL. POSSIBILIDADE. ART. 5º, INC. LXXVIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTS. 4º, 6º, 139, INC. IV, 782, §§3º A 5º, E 805 DO CPC/2015. PRINCÍPIOS DA EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO, DA ECONOMICIDADE, DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E DA MENOR ONEROSIDADE PARA O DEVEDOR. ART. 1º DA LEI Nº 6.830/80. EXECUÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CPC. SERASAJUD. DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO PRÉVIO DE OUTRAS MEDIDAS EXECUTIVAS. DEFERIMENTO DO REQUERIMENTO DE NEGATIVAÇÃO, SALVO DÚVIDA RAZOÁVEL QUANTO À EXISTÊNCIA DO DIREITO AO CRÉDITO PREVISTO NA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA - CDA. CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS DA DECISÃO JUDICIAL PARA A PRECISÃO E QUALIDADE DOS BANCOS DE DADOS DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO E PARA A ECONOMIA DO PAÍS. ART. 20 DO DECRETO-LEI Nº 4.657/1942 (ACRESCENTADO PELA LEI Nº 13.655/2018, NOVA LINDB). RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015 C/C ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. 

1. O objeto da presente demanda é definir se o art. 782, §3º do CPC é aplicável apenas às execuções de título judicial ou também às de título extrajudicial, mais especificamente, às execuções fiscais. 

2. O art. 782, §3º do CPC está inserido no Capítulo III ("Da competência"), do Título I ("Da execução em geral"), do Livro II (Do processo de execução") do CPC, sendo que o art. 771 dispõe que "este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial". 

3. Não há dúvidas, portanto, de que o art. 782, §3º, ao determinar que "A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes.", dirige-se às execuções fundadas em títulos extrajudiciais. 

4. O art. 782, §5º, ao prever que "O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial.", possui dupla função: 1) estender às execuções de títulos judiciais a possibilidade de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes; 2) excluir a incidência do instituto nas execuções provisórias, restringindo-o às execuções definitivas. 

5. Nos termos do art. 1º da Lei nº 6.830/80, o CPC tem aplicação subsidiária às execuções fiscais, caso não haja regulamentação própria sobre determinado tema na legislação especial, nem se configure alguma incompatibilidade com o sistema. É justamente o caso do art. 782, §3º do CPC, que se aplica subsidiariamente às execuções fiscais pois: 1) não há norma em sentido contrário na Lei nº 6.830/1980; 2) a inclusão em cadastros de inadimplência é medida coercitiva que promove no subsistema os valores da efetividade da execução, da economicidade, da razoável duração do processo e da menor onerosidade para o devedor (arts. 4º, 6º, 139, inc. IV, e 805 do CPC). Precedentes do STJ. 

6. O Poder Judiciário determina a inclusão nos cadastros de inadimplentes com base no art. 782, §3º, por meio do SERASAJUD, sistema gratuito e totalmente virtual, regulamentado pelo Termo de Cooperação Técnica nº 020/2014 firmado entre CNJ e SERASA. O ente público, por sua vez, tem a opção de promover a inclusão sem interferência ou necessidade de autorização do magistrado, mas isso pode lhe acarretar despesas a serem negociadas em convênio próprio. 

7. A situação ideal a ser buscada é que os entes públicos firmem convênios mais vantajosos com os órgãos de proteção ao crédito, de forma a conseguir a quitação das dívidas com o mínimo de gastos e o máximo de eficiência. Isso permitirá que, antes de ajuizar execuções fiscais que abarrotarão as prateleiras (físicas ou virtuais) do Judiciário, com baixo percentual de êxito (conforme demonstrado ano após ano no "Justiça em Números" do CNJ), os entes públicos se valham do protesto da CDA ou da negativação dos devedores, com uma maior perspectiva de sucesso. 

8. Porém, no momento atual, em se tratando de execuções fiscais ajuizadas, não há justificativa legal para o magistrado negar, de forma abstrata, o requerimento da parte de inclusão do executado em cadastros de inadimplentes, baseando-se em argumentos como: 1) o art. 782, § 3º, do CPC apenas incidiria em execução definitiva de título judicial; 2) em se tratando de título executivo extrajudicial, não haveria qualquer óbice a que o próprio credor providenciasse a efetivação da medida; 3) a intervenção judicial só caberá se eventualmente for comprovada dificuldade significativa ou impossibilidade de o credor fazê-lo por seus próprios meios; 4) ausência de adesão do tribunal ao convênio SERASAJUD ou a indisponibilidade do sistema. Como visto, tais requisitos não estão previstos em lei. 

9. Em suma, tramitando uma execução fiscal e sendo requerida a negativação do executado com base no art. 782, § 3º, do CPC, o magistrado deverá deferi-la, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA, a exemplo da prescrição, da ilegitimidade passiva ad causam, ou outra questão identificada no caso concreto. 

10. Outro ponto importante a ser fixado é que, sendo medida menos onerosa, a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de exaurida a busca por bens penhoráveis. Atende-se, assim, ao princípio da menor onerosidade da execução, positivado no art. 805 do CPC. Precedentes do STJ. 

11. Por fim, sob um prisma da análise econômica do Direito, e considerando as consequências práticas da decisão – nos termos do art. 20 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (acrescentado pela Lei nº 13.655/2018, que deu nova configuração à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB) –, não se pode deixar de registrar a relevância para a economia do país e para a diminuição do "Custo Brasil" de que a atualização dos bancos de dados dos birôs de crédito seja feita por meio dos procedimentos menos burocráticos e dispendiosos, tais como os utilizados no SERASAJUD, a fim de manter a qualidade e precisão das informações prestadas. Postura que se coaduna com a previsão do art. 5º, inc. XXXIII, da CF/88 ("todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado"). 

12. Com base no art. 927, §3º, do CPC, rejeito a modulação dos efeitos proposta pela Associação Norte-Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, uma vez que o entendimento firmado no presente recurso repetitivo é predominante no STJ há bastante tempo. 

13. Tese jurídica firmada: "O art. 782, §3º do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA.". 

14. Recurso especial conhecido e provido, nos termos da fundamentação. 

15. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno deste STJ. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Dra. ADRIANA CRISTINA DULLIUS, pela parte RECORRENTE: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS-IBAMA, e o Dr. FREDIE SOUZA DIDIER JUNIOR, pela parte: INTERES.: ASSOCIAÇÃO NORTE E NORDESTE DE PROFESSORES DE PROCESSO- ANNEP 

Brasília (DF), 24 de fevereiro de 2021(Data do Julgamento)


RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): Trata-se de recurso especial interposto pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA, nos autos de demanda na qual contende com COLOMBELLI & PASINI LTDA E OUTROS, em face de aresto prolatado pelo e. TRF-4ª Região, assim ementado (e-STJ, fl. 12): 

TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. SERASAJUD. Em execução fiscal, a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes deve ser realizada pelo próprio exequente. Precedentes desta Corte. 

Alega a parte recorrente, que o aresto recorrido deve ser reformado, argumentando com base no art. 139 c/c art. 782, §§3º e 5º do CPC, pois da "A medida coercitiva pretendida é aplicável à execução de títulos extrajudiciais, tal como a Certidão de Dívida Ativa, cujo processo de execução rege-se pela Lei 6.830/80. Importante ressaltar que o artigo 782, §3º, do CPC, que dispõe “a requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes”, está previsto na Parte Especial, Livro II, Título I, que tratou “da execução em geral”, enquanto as regras sobre “o cumprimento de sentença, estão estabelecidas na parte Especial, Livro I, Título II, do CPC. Em assim sendo, o §5º do artigo 782, ao determinar que “o disposto nos §§3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial”, o fez com o objetivo de possibilitar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, também nos casos de cumprimento de sentença, uma vez que não houve essa previsão expressa na parte específica do Código que tratou do tema, e não com o propósito de excluir essa alternativa das execuções de título extrajudicial.". 

O Ministro Presidente da Comissão Gestora de Precedentes assinalou a indicação deste feito como representativo de controvérsia, determinando a intimação das partes para que "se entenderem pertinente, apresentem, em prazo comum ao do Ministério Público Federal, manifestações escritas sobre a possível seleção deste recurso como representativo da controvérsia, candidato à afetação ao rito dos repetitivos." (e-STJ, fls. 34-36). 

O Ministério Público Federal manifestou ciência da decisão do Ministro Presidente da Comissão Gestora de Precedentes, ofertando parecer pela admissão do caso como feito repetitivo, e, no mérito, pelo provimento do recurso (e-STJ, fls. 41-46). 

O presente feito foi afetado pela Primeira Seção para ser julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (e-STJ, fls. 58-71), a fim de definir tese vinculante sobre a "Possibilidade ou não de inscrição em cadastros de inadimplentes, por decisão judicial, do devedor que figura no polo passivo de execução fiscal" (afetação conjunta dos dos REsps 1.809.010, 1.807.180, 1.807.923, 1.812.449 e 1.814.310). 

Admitidos como amici curiae no feito, a Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e a União apresentaram manifestações, respectivamente colacionadas às e-STJ fls. 98-123 e e-STJ fls. 135-152. 

À e-STJ, fls. 157-160, novo parecer ofertado pelo MPF, corroborando o parecer anteriormente ofertado em que opinou pelo provimento do recurso especial (e-STJ, fls. 41-46). 

É o relatório.


VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): No caso em exame, quando da afetação deste feito à sistemática dos recursos especiais repetitivos, a questão representativa da controvérsia ficou delimitada nos seguintes termos: 

Possibilidade ou não de inscrição em cadastros de inadimplentes, por decisão judicial, do devedor que figura no polo passivo de execução fiscal. 

1. FUNDAMENTOS RELEVANTES DA QUESTÃO JURÍDICA DISCUTIDA (art. 984, § 2º, c/c o art. 1.038 do CPC/2015 e art. 104-A, I, do RISTJ) 

O INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA, parte recorrente, afirma como fundamentos relevantes da questão debatida neste feito os seguintes pontos: 

a) "O TRF/4 negou provimento ao recurso ao fundamento de que a inclusão do devedor junto ao SERASAJUD restringe-se às hipóteses de execução definitiva de título judicial, nos termos do § 5º do artigo 782 do CPC. Salvo melhor juízo, entende a autarquia que a medida coercitiva pretendida é aplicável no âmbito da execução fiscal como medida válida, útil e legalmente prevista, conforme o disposto nos artigos 139 e §3º do artigo 782 do CPC, abaixo reproduzidos:"; 

b) "Importante ressaltar que o artigo 782, §3º, do CPC, que dispõe “a requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes”, está previsto na Parte Especial, Livro II, Título I, que tratou “da execução em geral”, enquanto as regras sobre “o cumprimento de sentença, estão estabelecidas na parte Especial, Livro I, Título II, do CPC. Em assim sendo, o §5º do artigo 782, ao determinar que “o disposto nos §§3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial”, o fez com o objetivo de possibilitar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, também nos casos de cumprimento de sentença, uma vez que não houve essa previsão expressa na parte específica do Código que tratou do tema, e não com o propósito de excluir essa alternativa das execuções de título extrajudicial."; 

c) "(...) a decisão ora combatida deve ser reformada para que seja utilizado o sistema SERASAJUD, justamente porque a expedição de ofícios desprestigia o avanço tecnológico instituído pelo CNJ, indo de encontro à celeridade do processo e onera ainda mais o executivo fiscal.". 

Às e-STJ fls. 135-152, a UNIÃO manifestou-se como amicus curiae, alegando: 

a) "(...) o tema não é novo: na doutrina ou no Poder Judiciário, é trivial o reconhecimento da possibilidade de inscrição, em cadastro de inadimplentes, do devedor que figura no polo passivo de Execução Fiscal. O Livro II do Código de Processo Civil trata do “Processo de Execução”. O Título I desse Livro: “Da Execução em geral”. E no art. 771, abre-alas do Livro e do Título, lê-se: “Este Livro regula o procedimento da execução fundada em TÍTULO EXTRAJUDICIAL, e suas disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de execução, aos atos executivos realizados no procedimento de cumprimento de sentença, bem como aos efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força executiva”. (...). Notem, Excelências, o § 5° desse art. 782 buscou estender aquilo que seria típico da Execução de Título Extrajudicial também às Execuções de Título Judicial."; 

b) "A interpretação daquele art. 782 e seus parágrafos soara tão pacífica, que o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC) teve de ressalvar o contrário: o quanto o próprio credor público também poderia atuar, sem a intermediação do Juízo. Por isso o Enunciado n. 190 da Carta de Florianópolis: “O art. 782, § 3º, CPC não veda a inclusão extrajudicial do nome do executado em cadastros de inadimplentes, pelo credor ou diretamente pelo órgão de proteção ao crédito”."; 

c) "(...) considerando que o art. 1º da LEF permite a aplicação subsidiária do CPC, conclui-se pela possibilidade de inscrição do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito, mesmo nas dívidas oriundas de Execução Fiscal, sendo o § 3º do art. 782, CPC, dispositivo inserto no Livro II do Código, aplicável à “execução em geral” (Título I). De sorte que não são necessárias delongas para reconhecer que a expedição de Ofícios aos cadastros restritivos (BACENJUD, RENAJUD e SERASAJUD, por exemplo) é permitida pelo CPC e pela LEF, visando a auxiliar os magistrados a dar agilidade e concretude aos processos judiciais que envolvem dívidas (principalmente, dívidas públicas)."; 

d) "(...) o SERASAJUD é um sistema exclusivo de atendimento ao Poder Judiciário. A Administração Fazendária ou qualquer outro credor público não tem acesso e, tampouco, gerencia o SERASAJUD. A diligência de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes não pode ser realizada pelo próprio exequente. Exigir que os credores enviem Ofícios e paguem por esses serviços, mesmo existindo um convênio específico em vigor, mais tecnológico e mais efetivo, data venia, não se coaduna com os princípios da razoável duração do processo e da satisfação dos créditos, contidos no CPC.". 

Às e-STJ fls. 98-123, a ASSOCIAÇÃO NORTE E NORDESTE DE PROFESSORES DE PROCESSO - ANNEP manifestou-se como amicus curiae, alegando: 

a) "A doutrina majoritária, por sua vez, acertadamente, caminha no sentido de estender a aplicabilidade da medida executiva típica em debate para além das execuções de títulos judiciais, abrangendo-se aqui as execuções fiscais. Trata-se de um posicionamento que se mostra compatível com uma interpretação sistemáticateleológica da legislação processual vigente. Também é nesse sentido o entendimento da ANNEP."; 

b) "Quanto à execução fiscal - uma das execuções de títulos executivos extrajudiciais, esta é regida pela Lei 6.830/1980, incidindo sobre ela, subsidiariamente o Código de Processo Civil, conforme dispõe o seu primeiro artigo. (...). Dito isso, seria contraditório admitir que medidas executivas que buscam reduzir o percurso até a satisfação do crédito tributário fossem rechaçadas por somente constarem na legislação processual geral - neste particular, o CPC. Afinal, é a efetividade da execução o propósito existencial da legislação específica. (...). Além disso, essa conclusão mostra-se também em consonância com o art. 771, caput, do CPC, que estabelece a aplicação subsidiária das regras relativas ao processo de execução de título extrajudicial aos procedimentos especiais de execução, no que for cabível."; 

c) "(...) admitir uma interpretação restritiva do 782, §3º, somente com base em sua literalidade (haja vista que só há menção à execução definitiva de título judicial no parágrafo 5º do art. 782 do CPC) é não somente ato contrário à base principiológica da legislação processual, mas também contrário ao próprio propósito da execução."; 

d) "Pergunta-se: deve o exequente necessariamente aguardar o exaurimento de outras medidas executivas, sob pena de indeferimento de seu pedido de inclusão do devedor em cadastro de inadimplentes? Essa análise (do momento para utilização da ferramenta serasajud ou mediante expedição de ofício), assim como em relação à utilização de outras ferramentas como Bacenjud, Renajud e Infojud, também já foi realizada por esta Egrégia Corte. Nestes episódios, ficou estabelecido que não é necessário o exaurimento de outras diligências para que se possa requer a efetivação da medida em comento. Para esta Associação, ora Interveniente, este posicionamento se mostra acertado."; 

e) "(...) Caso a posição adotada pelo STJ seja a de aplicação do art. 782, § 3º do CPC às execuções de títulos extrajudiciais em geral, entre elas a fiscal, problema poderia surgir para aqueles exequentes que tiveram, no passado, o requerimento indeferido. Nesses casos, essa associação entende como razoável a modulação dos efeitos da decisão a ser dada no julgamento do presente Recurso Especial, de modo a não serem considerados preclusos novos requerimentos, visando a negativação do executado. Com isso, os exequentes outrora prejudicados poderão requerer, novamente, a efetivação da medida executiva em debate, cujo deferimento não poderá ter como óbice a necessidade de esgotamento prévio de outras medidas executivas.". 

O Ministério Público Federal, às e-STJ fls. 157-160 reiterou os termos do parecer oferecido às fls. 41-46, em que trouxe os seguintes argumentos: 

a) "A jurisprudência atual do STF corretamente indica a possibili- dade de a medida do art. 782, § 3º, do CPC ser aplicada nas execu- ções fiscais, por ato do juízo, em atendimento ao pedido do interes- sado: eventual possibilidade de a parte interessada obter, por si, a inscrição do devedor em cadastros de inadimplentes não exime o juízo de atender-lhe o pedido, se satisfeitos os demais requisitos le- gais da medida.". 

2. FUNDAMENTOS DETERMINANTES DO JULGADO (art. 984, § 2º, c/c o art. 1.038, do CPC/2015 e art. 104-A, II, do RISTJ) 

Como explicitado no relatório, o presente julgamento visa a definir, sob a sistemática dos recursos repetitivos, se o art. 782, §3º do CPC é aplicável apenas às execuções de título judicial ou também às de título extrajudicial, mais especificamente, às execuções fiscais. 

O art. 782 do CPC prescreve: 

Art. 782. Não dispondo a lei de modo diverso, o juiz determinará os atos executivos, e o oficial de justiça os cumprirá. § 1º O oficial de justiça poderá cumprir os atos executivos determinados pelo juiz também nas comarcas contíguas, de fácil comunicação, e nas que se situem na mesma região metropolitana. § 2º Sempre que, para efetivar a execução, for necessário o emprego de força policial, o juiz a requisitará. § 3º A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. § 4º A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, se for garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo. § 5º O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial. 

A norma sob análise está inserida no Capítulo III ("Da competência"), do Título I ("Da execução em geral"), do Livro II (Do processo de execução") do CPC. 

O art. 771 do CPC, que dá início ao referido Livro II, dispõe: 

Art. 771. Este Livro regula o procedimento da execução fundada em título extrajudicial, e suas disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de execução, aos atos executivos realizados no procedimento de cumprimento de sentença, bem como aos efeitos de atos ou fatos processuais a que a lei atribuir força executiva. (grifou-se) 

Não há dúvidas, portanto, de que o art. 782, §3º, ao determinar que "A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes.", dirige-se às execuções fundadas em títulos extrajudiciais. 

Já tive a oportunidade de defender tal posicionamento em sede doutrinária, que peço vênia para transcrever (SOUZA, Artur César de; FERNANDES, Geraldo Og Nicéas. Execução e cumprimento de sentença. São Paulo: Almedina, 2018, p. 121.): 

Se o exequente requerer, o juiz poderá determinar a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, como, por exemplo, SPC, SERASA etc. A inscrição será cancelada imediatamente se for efetuado o pagamento, garantida a execução ou se a execução for extinta por qualquer outro motivo. Trata-se de uma medida coativa permitida pela legislação processual para estimular o executado ao cumprimento da obrigação, uma vez que a inclusão de seu nome em cadastros de inadimplentes poderá ensejar inúmeros dissabores, como, por exemplo, restrição ao crédito. O juiz poderá determinar a inscrição do nome do executado em cadastros de inadimplentes tanto em execução de título executivo extrajudicial quanto no cumprimento de título executivo judicial. (grifou-se) 

Na mesma trilha, colhe-se a doutrina de Aluísio de Castro Mendes e Larissa Pochmann Silva (MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro; SILVA, Larissa Clare Pochmann. Da efetivação do crédito e os cadastros de inadimplentes no novo Código de Processo Civil: breves notas. In: NETO, Francisco Antônio de Barros e Silva Neto; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; CUNHA, Leonardo Carneiro da; JÚNIOR, Roberto Paulino de Albuquerque; COSTA FILHO, Venceslau Tavares. Relações e Influências Recíprocas entre Direito Material e Direito Processual: Estudos em homenagem ao Professor Torquato Castro. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 82.): 

Destaque-se, por oportuno, que a positivação do cadastro, tanto para títulos judiciais como para titulos extrajudiciais, vem, ainda, corroborar a previsão do artigo 139, inciso IV, do novo diploma, que dispõe como uma das funções do juiz a determinação de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária, valendo-se a nova legislação de mais um instrumento para a busca da satisfação do crédito. (grifou-se) 

O art. 782, §5º, ao prever que "O disposto nos §§ 3º e 4º aplica-se à execução definitiva de título judicial.", possui dupla função: 1) estender às execuções de títulos judiciais a possibilidade de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes; 2) excluir a incidência do instituto nas execuções provisórias, restringindo-o às execuções definitivas. 

Corroborando o afirmado, colhe-se o Enunciado nº 99 da I Jornada de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF: “A inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes poder-se-á dar na execução definitiva de título judicial ou extrajudicial.”. 

Antônio Mota traz a seguinte lição sobre o ponto (In: FLUMIGNAN, Silvano José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura (Coords.). Enunciados das Jornadas de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF: organizados por assunto, anotados e comentados. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 304.): 

Não seria aceitável admitir a inscrição no cadastro de inadimplentes tendo como esteio a obrigação cobrada em sede de execução definitiva de título judicial e não diante da ação de execução de título extrajudicial. As duas carregam o traço da definitividade. 

O Enunciado nº 190 do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC, por sua vez, doutrina: "O art. 782, § 3°, não veda a inclusão extrajudicial do nome do executado em cadastros de inadimplentes, pelo credor ou diretamente pelo órgão de proteção ao crédito.''. 

Nesse tema, trago a doutrina de Edilson Vitorelli (In: FLUMIGNAN, Silvano José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura (Coords.). Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC: organizados por assunto, anotados e comentados. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 603.): 

O propósito do enunciado é apenas esclarecer que a possibilidade de o juiz determinar a inclusão de pessoas nesses cadastros não significa que tal determinação seja requisito para o ato. Assim, se o credor for conveniado aos serviços de proteção ao crédito e, por essa razão, tiver condições de remeter, por si mesmo, o nome do devedor para inclusão, poderá fazê-lo livremente. A ordem judicial não foi convertida em requisito para o ato. Ela é útil apenas para os credores não conveniados ao serviço. 

Há que ser rejeitada, portanto, por desconformidade com a legislação, a argumentação de que o art. 782, §5º teria como intuito restringir as inclusões em cadastros de inadimplentes às execuções de títulos judiciais. 

Fixada a premissa de aplicabilidade do art. 782, §3º do CPC à execução de título extrajudicial, resta examinar se o âmbito de incidência da norma se estende às execuções fiscais. Vejamos. 

A Lei nº 6.830/1980, em seu art. 1º, prescreve: 

Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. (grifou-se) 

O CPC tem aplicação subsidiária às execuções fiscais, caso não haja regulamentação própria sobre determinado tema na legislação especial, nem se configure alguma incompatibilidade com o sistema. 

É justamente o caso do art. 782, §3º do CPC, que se aplica subsidiariamente às execuções fiscais pois: 1) não há norma em sentido contrário na Lei nº 6.830/1980; 2) a inclusão em cadastros de inadimplência é medida coercitiva que promove no subsistema os valores da efetividade da execução, da economicidade, da razoável duração do processo e da menor onerosidade para o devedor (art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal; arts. 4º, 6º, 139, inc. IV, e 805 do CPC). 

De fato, já vigora há alguns anos a utilização, nas execuções fiscais, das ferramentas do protesto de título em cartório e de inclusão em cadastros de inadimplência. 

Embora se trate de instituto que não se confunde com a negativação em cadastros de inadimplência, é importante tecer algumas considerações sobre o protesto de títulos em cartório, devido às similaridades entre os dois instrumentos de recuperação de créditos. 

A Lei nº 12.767/2012 incluiu um parágrafo único no art. 1º da Lei nº 9.492/1997, com a seguinte alteração: Art. 1º. (...). Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas. 

Assim, não há dúvidas de que o exequente, por seus próprios meios, pode promover tanto o protesto da CDA em cartório quanto a inscrição do executado em cadastros de inadimplentes. O CPC inovou ao incorporar a possibilidade de protesto (art. 517) e de inclusão em cadastros de inadimplentes (art. 782) de decisão judicial transitada em julgado. 

De fato, é usual que as Procuradorias da Fazenda em todo o país promovam o protesto de CDA's, bem como a inscrição de devedores em cadastros de inadimplentes. O que se discute neste feito é a possibilidade de tal inscrição ser determinada por ordem judicial, em sede de execução fiscal. 

A propósito, o STF fixou a seguinte tese, no julgamento da ADI nº 5.135-DF: “O protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política.” (ADI 5135, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 09/11/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-022 DIVULG 06-02-2018 PUBLIC 07-02-2018). 

O Provimento nº 86 do CNJ, de 29 de agosto de 2019, dispõe "sobre a possibilidade de pagamento postergado de emolumentos, acréscimos legais e demais despesas, devidos pela apresentação de títulos ou outros documentos de dívida para protesto".

Consoante o art. 2º da norma referida, o pagamento dos emolumentos do protesto foi postecipado, ou seja, é realizado ao final pelo devedor, se quitar a dívida. O credor será responsável pelo pagamento apenas se desistir ou houver cancelamento do protesto. O art. 2º, §1º esclarece que isso se aplica também às certidões de dívida ativa da União Federal, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas Autarquias e Fundações Públicas. 

O protesto de títulos tem sido feito de forma 100% online, por um sistema virtual intitulado Central de Remessa de Arquivos - CRA. 

No caso do cadastro nos órgãos de proteção ao crédito, os custos e a forma de envio dos dados dependem dos termos de eventual convênio firmado com o ente interessado. 

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, por exemplo, tem convênio com o SERASA, com utilização de sistema virtual, cabendo à Procuradoria arcar apenas com o custo das correspondências (envio de cartas aos devedores, por exemplo). Há notícias de outros entes públicos com convênios com o SERASA, com diferentes graus de onerosidade. A título exemplificativo, existe convênio em que se ajusta um quantitativo mensal de negativações que está dentro do valor acordado, sendo pago um valor extra para inclusões adicionais. 

É bastante comum que os Cartórios de Protestos também enviem relatórios dos títulos protestados aos órgãos de proteção ao crédito, como SERASA e SPC. Assim, o protesto da CDA, que é gratuito, já implicaria a inclusão nos cadastros de inadimplência, sem qualquer custo adicional para o ente público interessado. 

O menor custo e o funcionamento totalmente eletrônico do sistema explicam o motivo de estar havendo uma certa predileção dos entes públicos pelo protesto da CDA, em vez da negativação do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes. E também explica a preferência dos entes públicos, em alguns casos, por requerer a referida negativação ao juiz, em vez de promovê-la pelos seus próprios meios. 

O Poder Judiciário determina a inclusão com base no art. 782, §3º, por meio do SERASAJUD, sistema gratuito e totalmente virtual, regulamentado pelo Termo de Cooperação Técnica nº 020/2014 firmado entre CNJ e SERASA. O ente público, por sua vez, tem a opção de promover a inclusão sem interferência ou necessidade de autorização do magistrado, mas isso pode lhe acarretar despesas a serem negociadas em convênio próprio. 

A situação ideal a ser buscada é que os entes públicos firmem convênios mais vantajosos com os órgãos de proteção ao crédito, de forma a conseguir a quitação das dívidas com o mínimo de gastos e o máximo de eficiência. Isso permitirá que, antes de ajuizar execuções fiscais que abarrotarão as prateleiras (físicas ou virtuais) do Judiciário, com baixo percentual de êxito (conforme demonstrado ano após ano no "Justiça em Números" do CNJ), os entes públicos se valham do protesto da CDA ou da negativação dos devedores, com uma maior perspectiva de sucesso. 

Nota-se, a propósito, uma tendência de desjudicialização dos procedimentos executivos, a exemplo dos Projetos de Lei nº 6.204/2019 (execução cível) e 4.257/2019 (execução fiscal), em trâmite no Senado Federal, que propõem a propositura e o andamento da execução perante os tabelionatos de protesto. 

Porém, no momento atual, em se tratando de execuções fiscais ajuizadas, não há justificativa legal para o magistrado negar, de forma abstrata, o requerimento da parte de inclusão do executado em cadastros de inadimplentes, baseando-se em argumentos como: 1) o art. 782, § 3º, do CPC apenas incidiria em execução definitiva de título judicial; 2) em se tratando de título executivo extrajudicial, não haveria qualquer óbice a que o próprio credor providenciasse a efetivação da medida; 3) a intervenção judicial só caberá se eventualmente for comprovada dificuldade significativa ou impossibilidade de o credor fazê-lo por seus próprios meios; 4) ausência de adesão do tribunal ao convênio SERASAJUD ou a indisponibilidade do sistema. Como visto, tais requisitos não estão previstos em lei. 

Em suma, tramitando uma execução fiscal e sendo requerida a negativação do executado com base no art. 782, § 3º, do CPC, o magistrado deverá deferi-la, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA, a exemplo da prescrição, da ilegitimidade passiva ad causam, ou outra questão identificada no caso concreto. 

No mesmo sentido, trago a lição de Carlos Alberto Carmona (CARMONA, Carlos Alberto. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo. AASP, 2015, p. 1203-1204): 

A comunicação aos órgãos que se encarregam de apontar os devedores inadimplentes deve ser requerida pelo credor (não pode ser decretada de ofício pelo juiz) e, portanto, acarreta responsabilização do exequente caso a execução mostre-se infundada. A anotação, junto aos órgãos de proteção ao crédito, sabem todos, acarreta uma série de entraves à vida civil, com possível bloqueio de crédito e de acesso a serviços bancários diversos. Por isso mesmo, deve o juiz verificar, diante do pedido do credor, se é efetivamente caso de fazer a comunicação. Em outros termos, não basta o pedido do credor para que o juiz proceda à inclusão do nome do devedor no rol dos inadimplentes: é preciso que o juiz pondere se existe dúvida razoável acerca da existência do direito do credor. Se existir algum receio do magistrado de que a execução possa ser abusiva, ilícita ou indevida, o pleito será indeferido. Este o sentido da utilização do verbo poder no § 3º do art. 782 do CPC/2015 (e não do verbo dever). (grifou-se) 

Outro ponto importante a ser fixado é que, sendo medida menos onerosa, a anotação do nome da parte executada em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de exaurida a busca por bens penhoráveis. Atende-se, assim, ao princípio da menor onerosidade da execução, positivado no art. 805 do CPC. Nesse prisma, transcrevo trecho da opinião manifestada pela Associação Norte-Nordeste de Professores de Processo - ANNEP como amicus curiae: 

Essa análise (do momento para utilização da ferramenta serasajud ou mediante expedição de ofício), assim como em relação à utilização de outras ferramentas como Bacenjud, Renajud e Infojud, também já foi realizada por esta Egrégia Corte. Nestes episódios, ficou estabelecido que não é necessário o exaurimento de outras diligências para que se possa requer a efetivação da medida em comento. (...). Não fosse isso, o Código de Processo Civil, em seu artigo 139, inciso IV, estabelece como poder-dever do juiz a determinação de todas medidas executivas que se fizerem necessárias à satisfação da prestação pecuniária objeto, não estabelecendo cronologia entre tais medidas (sendo indiferente, portanto, se são indutivas, coercitivas - como é o caso da negativação do nome, mandamentais ou sub-rogatórias). Por fim, a negativação do nome é medida pouco gravosa para o executado, se comparada às outras medidas executivas, tais como penhoras (online, por renajud e de bens, por oficial de justiça) que podem vir a recair sobre o executado. É, portanto, medida compatível com o princípio da menor onerosidade da execução previsto no art. 805 do Código de Processo Civil (cláusula geral de proteção ao executado que versa sobre a necessidade e adequação da medida executiva pleiteada). (grifou-se) 

Por fim, colaciono precedentes das Turmas que compõem a 1ª Seção do STJ, a fim de demonstrar o entendimento predominante na Corte sobre a matéria, em consonância com o voto ora proferido: 

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ART. 782, § 3o. DO CÓDIGO FUX. INCLUSÃO DO NOME DO DEVEDOR EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. POSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR DESPROVIDO. 1. Esta Corte Superior de Justiça entende que o pedido de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, tal como o SerasaJUD, nos termos do art. 782, § 3º. do Código Fux, não pode ser recusado pelo Poder Judiciário sob o argumento de que tal medida é inviável em via de execução fiscal. Precedentes: REsp. 1.826.084/SC, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 23.8.2019 e REsp. 1.799.572/SC, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJe 14.5.2019. 2. Agravo Interno do Particular desprovido. (AgInt no REsp 1814906/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020) (grifou-se) 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. SERASAJUD. ART. 782 DO CPC/2015. POSSIBILIDADE. FACULDADE DO JUIZ. RECUSA POR AUSÊNCIA DE CONVÊNIO OU INDISPONIBILIDADE DO SISTEMA. IMPOSSIBILIDADE. 1. É possível a utilização do sistema Serasajud nos processos de Execução Fiscal. Não há qualquer óbice ao seu emprego em relação a devedores inscritos em Dívida Ativa que, demandados em juízo, não cumpram a obrigação em cobrança. 2. A previsão do § 5º do art. 782 do CPC/2015 de que o disposto nos §§ 3º e 4º do mesmo dispositivo legal aplica-se à execução definitiva de título judicial não constitui vedação à utilização nos executivos fiscais. A norma não prevê tal restrição e deve ser interpretada de forma a dar ampla efetividade à tutela executiva, especialmente quando o credor é o Estado e, em última análise, a própria sociedade. Inteligência dos arts. 1º da Lei 6.830/1980 e 771 do CPC/2015. 3. Como bem ressaltado pelo Min. Francisco Falcão, no REsp 1.799.572/SC, "tal medida concretiza o princípio da efetividade do processo, possuindo respaldo basilar nas Normas Fundamentais do Processo Civil, considerando que 'as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa' (art. 4º do CPC/2015) e o dever de cooperação processual, direcionado igualmente ao Poder Judiciário, 'para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva' (art. 6º do CPC/2015)" (Segunda Turma, DJe 14.5.2019). 4. O STJ possui compreensão firmada de que é legal a realização de pesquisas nos sistemas Bacenjud, Renajud e Infojud, porquanto são meios colocados à disposição da parte exequente para agilizar a satisfação de seus créditos, não sendo necessário o esgotamento das buscas por outros bens do executado. Precedentes: REsp 1.778.360/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 14.2.2019; AgInt no AREsp 1.398.071/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 15.3.2019; AREsp 1.376.209/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 13.12.2018; AgInt no AREsp 1.293.757/ES, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14.8.2018; AgInt no REsp 1.678.675/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 13.3.2018. 5. Sendo medida menos onerosa à parte executada, a anotação do nome em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de que seja esgotada a busca por bens penhoráveis. 6. O uso da expressão verbal "pode" no art. 782, § 3º, do CPC/2015, torna claro que se trata de uma faculdade atribuída ao juiz, a ser por ele exercida ou não, a depender das circunstâncias do caso concreto. 7. Interpretação que encontra amparo no art. 139, IV, do CPC/2015, segundo o qual, no exercício do poder de direção do processo, incumbe ao juiz "determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária". Precedentes da Segunda Turma: REsp 1.794.447/AL, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 22.4.2019; REsp 1.762.254/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 16.11.2018. 8. O magistrado não pode se recusar a incluir o nome do devedor em cadastro de inadimplentes, por inexistência de convênio para negativação pela via eletrônica. 9. A Segunda Turma já se pronunciou que "o pedido de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, tal como o SerasaJUD, nos termos do art. 782, § 3º, do CPC/2015, não pode ser recusado pelo Poder Judiciário sob o argumento de que tal medida é inviável em via de execução fiscal" (REsp 1.799.572/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 14.5.2019). 10. Eventuais adversidades momentâneas no sistema eletrônico igualmente não representam óbice à adoção dessa medida processual, haja vista a possibilidade de expedição de ofício ao Serasa, por meio físico (REsp 1.736.217/SC, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 1º.3.2019). 11. Se compete ao juiz da execução efetivar as medidas executivas tendentes à satisfação do crédito, a ausência de convênio ou a indisponibilidade do sistema não são motivos suficientes à negativa judicial de aplicação do art. 782, § 3º, do CPC/2015. A possibilidade de expedição de ofício ao banco de dados restritivo, por si só, afasta a razoabilidade da recusa. 12. Em síntese: a) é possível a utilização do sistema Serasajud nos processos de Execução Fiscal; b) é legal a realização de pesquisas nos sistemas Bacenjud, Renajud e Infojud, porquanto são meios colocados à disposição da parte executada para agilizar a satisfação de seus créditos, não sendo necessário o esgotamento das buscas por outros bens do executado; c) sendo medida menos onerosa à parte executada, a anotação do nome em cadastro de inadimplentes pode ser determinada antes de esgotada a busca por bens penhoráveis; d) o uso da expressão verbal "pode", no art. 782, § 3º, do CPC/2015, demonstra que cuidar-se de uma faculdade atribuída ao juiz, a ser por ele exercida ou não, a depender das circunstâncias do caso concreto; e) o magistrado não pode recusar o pedido de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, tais como o Serasajud, argumentando apenas a ausência de convênio ou a indisponibilidade do sistema. (...). 15. Recurso Especial não provido. (REsp 1827340/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 11/10/2019) (grifou-se) 

Por fim, sob um prisma da análise econômica do Direito, e considerando as consequências práticas da decisão – nos termos do art. 20 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 (acrescentado pela Lei nº 13.655/2018, que deu nova configuração à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB) –, não se pode deixar de registrar a relevância para a economia do país e para a diminuição do "Custo Brasil" de que a atualização dos bancos de dados dos birôs de crédito seja feita por meio dos procedimentos menos burocráticos e dispendiosos, tais como os utilizados no SERASAJUD, a fim de manter a qualidade e precisão das informações prestadas. 

Tal postura se coaduna com a previsão do art. 5º, inc. XXXIII, da CF/88 ("todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado"). 

3. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DO JULGADO (art. 927, § 3º, do CPC/2015) 

Rejeito a modulação dos efeitos proposta pela Associação Norte-Nordeste de Professores de Processo - ANNEP, uma vez que o entendimento firmado no presente recurso repetitivo é predominante no STJ há bastante tempo. 

O art. 927, § 3º do CPC prevê que "Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.". 

No mesmo sentido, o Enunciado nº 76, aprovado na I Jornada de Processo Civil do CJF, dispõe: 

É considerada omissa, para efeitos do cabimento dos embargos de declaração, a decisão que, na superação de precedente, não se manifesta sobre a modulação de efeitos. (grifou-se) 

O Enunciado nº 55 do Fórum Permanente de Processualistas Civis - FPPC, por sua vez, explicita que: 

Pelos pressupostos do § 3º do art. 927, a modificação do precedente tem, como regra, eficácia temporal prospectiva. No entanto, pode haver modulação temporal, no caso concreto. (grifou-se) 

Ravi Peixoto traz a seguinte lição sobre o ponto (In: FLUMIGNAN, Silvano José Gomes; KOEHLER, Frederico Augusto Leopoldino; PEIXOTO, Marco Aurélio Ventura (Coords.). Enunciados das Jornadas de Direito Processual Civil do Conselho da Justiça Federal - CJF: organizados por assunto, anotados e comentados. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 398-399.): 

No caso da superação de precedentes, a quebra da estabilidade é gerada pelo próprio Poder Judiciário, ao modificar, de forma surpreendente, um posicionamento consolidado, podendo surgir, nessa situação, a necessidade da utilização da modulação de efeitos. Tanto a segurança jurídica como a confiança legítima exigem uma tutela adequada, quando violadas e, uma de suas formas, estudada nesse trabalho, é a modulação de efeitos, sendo um dever do referido órgão jurisdicional ao menos conhecer da matéria. (grifou-se) 

Assim, não se configura presente a necessidade de modulação dos efeitos do julgado, tendo em vista que tal instituto visa a assegurar a efetivação do princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou sendo superado em momento posterior, o que, como se vê claramente, não ocorreu no caso concreto. 

4. TESE JURÍDICA FIRMADA (art. 104-A, inc. III, do RISTJ): 

Para efeito de cumprimento do requisito legal e regimental, firma-se a seguinte tese: "O art. 782, §3º do CPC é aplicável às execuções fiscais, devendo o magistrado deferir o requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, preferencialmente pelo sistema SERASAJUD, independentemente do esgotamento prévio de outras medidas executivas, salvo se vislumbrar alguma dúvida razoável à existência do direito ao crédito previsto na Certidão de Dívida Ativa - CDA.". 

5. SOLUÇÃO DADA AO CASO CONCRETO (art. 104-A, inc. IV, do RISTJ): 

Ante o exposto, conheço do recurso especial e lhe dou provimento, a fim de reformar o acórdão recorrido, reconhecendo o cabimento do pleito de inclusão de devedor no cadastro de inadimplentes (Sistema SERASAJUD) em executivo fiscal, com base no art. 782, §3º, do CPC, impondo-se o retorno dos autos ao juízo de primeira instância, a fim de que examine a viabilidade do petitório no caso concreto, nos termos da fundamentação. 

Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ. 

É como voto.