RECURSO ESPECIAL Nº 1.804.186 - SC (2019/0086132-7)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS REPRESENTATIVOS DA
CONTROVÉRSIA. TEMA 1.029/STJ. RESP 1.804.186/SC E RESP
1.804.188/SC. AÇÃO COLETIVA. EXECUÇÃO. COMPETÊNCIA E RITO.
JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. LEI 12.153/2009.
IMPOSSIBILIDADE.
IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA
1. O tema repetitivo ora controvertido (1.029/STJ) consiste em estabelecer a
"aplicabilidade do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei
12.153/2009) ao Cumprimento de Sentença individual oriundo de Ação Coletiva
que seguiu o procedimento ordinário em Vara da Fazenda Pública,
independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro competente".
EXAME DO TEMA REPETITIVO
2. Na hipótese tratada no presente tema repetitivo, o Tribunal de origem assentou
que, por ser absoluta a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública
(§ 4º do art. 2º da Lei 12.153/2009), o cumprimento de sentença oriundo de Ação
Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos
deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver
Juizado Especial instalado na comarca competente.
3. Com relação à execução de sentenças coletivas, o STJ firmou a compreensão,
sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, de que "a liquidação e a execução
individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada
no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença
não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos
do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano
e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474,
CPC e 93 e 103, CDC.)" (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão,
Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011).
4. Também está sedimentado na jurisprudência do STJ o entendimento de que,
uma vez instalado Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública, conforme o
caso, e se o valor da causa for inferior ao da alçada, a competência é absoluta.
Apenas como exemplo: REsp 1.537.768/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia
Filho, Primeira Turma, julgado em 20.8.2019, DJe de 5.9.2019.
5. A questão que emerge do tema repetitivo é indagar se é possível ajuizar ação
executiva no Juizado Especial da Fazenda Pública relativa a título judicial oriundo
de Ação Coletiva, em que se seguiu rito próprio desse tipo de ação.
6. O art. 2º, § 1º, I, da Lei 12.153/2009 dispõe que não se incluem na competência
do Juizado Especial da Fazenda Pública as demandas sobre direitos ou interesses
difusos e coletivos, o que é argumento suficiente para excluir a competência
executória de sentenças exaradas em Ações Coletivas.
7. Na mesma lei não há disposição expressa acerca da competência executória
dos Juizados da Fazenda Pública, havendo apenas regramento (arts. 12 e 13) do
rito da execução de seus próprios julgados.
8. O art. 27 da Lei 12.153/2009 fixa a aplicação subsidiária do CPC, da Lei
9.099/1995 e da Lei 10.259/2001, os quais se examinam a seguir.
9. A Lei 9.099/1995, no art. 3º, § 1º, delimita a competência dos Juizados
Especiais Cíveis e, por aplicação subsidiária, dos Juizados Especiais da Fazenda
Pública para promoverem a execução "dos seus julgados" e "dos títulos
executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo".
10. Já o art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, também de aplicação subsidiária aos
Juizados Especiais da Fazenda Pública, delimita a competência executória a
"executar as suas sentenças".
11. Por fim, a terceira lei de regramento de aplicação subsidiária, o CPC,
estabelece (grifos acrescentados): "Art. 516. O cumprimento da sentença
efetuar-se-á perante: I - os tribunais, nas causas de sua competência originária;
II - o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; III - o juízo
cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença
arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá
optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde
se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde
deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a
remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem".
12. Vale resgatar a possibilidade, estipulada pelo STJ sob o rito dos recursos
repetitivos (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte
Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011), de a execução individual de
sentença coletiva poder ser proposta no foro do domicílio do exequente,
interpretação essa advinda da legislação de tutela dos direitos coletivos e difusos:
"A liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação
civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os
efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos,
mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em
conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses
metaindividuais postos em juízo".
13. Nota-se que a Lei 12.153/2009 e as respectivas normas de aplicação
subsidiária determinam que os Juizados Especiais da Fazenda Pública têm
competência para apreciar apenas as execuções de seus próprios julgados ou de
títulos extrajudiciais.
14. Por derradeiro, o Código de Defesa do Consumidor, norma que rege a tutela
coletiva não só no direito do consumidor, mas de forma subsidiária de todos os
tipos de direitos, fixa a competência, para a execução, do juízo da liquidação da
sentença ou da ação condenatória, no caso de execução individual, valendo aqui a
regra do domicílio do exequente no caso de juízos com a mesma competência.
15. Na mesma linha de compreensão aqui traçada, cita-se precedente da
Primeira Turma que examina a Lei 10.259/2001 (Juizado Especial Federal), aplicada subsidiariamente à Lei 12.153, ora em exame: "Nos termos do art. 3º,
caput, da Lei 10.259/2001, 'Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar,
conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de
sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.' Extrai-se do
referido dispositivo legal que a fixação da competência do JEF, no que se
refere às execuções, impõe a conjugação de duas condicionantes: (a) o
valor da causa deve ser inferior a 60 (sessenta) salários mínimos; (b) o
titulo executivo judicial deve ser oriundo do próprio JEF. Caso concreto
em que, nada obstante o valor da causa seja inferior ao referido limite
legal, a sentença exequenda foi prolatada nos autos da Ação Ordinária nº
2007.81.00.018120-3, que tramitou na 6ª Vara Federal da Seção Judiciária
do Ceará, o que afasta a competência do Juizado Especial Federal Cível
para a respectiva execução" (REsp 1.648.895/CE, Rel. Ministro Sérgio
Kukina, Primeira Turma, julgado em 7.5.2019, DJe 13.5.2019; grifo
acrescentado).
16. Assim, não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda
Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva, muito
menos impor o citado rito sumaríssimo ao juízo comum.
17. O Cumprimento da Sentença coletiva deve obedecer o rito previsto nos arts.
534 e seguintes do CPC/2015; e o fato de o valor da execução ser baixo pode
apenas resultar, conforme a quantia, em Requisição de Pequeno Valor para o
pagamento do débito (art. 535, § 3º, II, do CPC/2015).
DEFINIÇÃO DA TESE REPETITIVA
18. Fixa-se a seguinte tese repetitiva para o Tema 1.029/STJ: "Não é possível
propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título
executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito ordinário,
assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo comum
da execução."
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO
19. A Ação Coletiva tramitou na Vara da Fazenda Pública da Comarca de
Blumenau/SC e nela foi intentado o cumprimento de sentença sob o rito do art.
534 e seguintes do CPC/21015.
20. O Tribunal de origem assentou que o cumprimento de sentença oriundo de
Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários
mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente
de haver Juizado Especial instalado na comarca competente.
21. Essa compreensão está dissonante da aqui estabelecida, devendo o
cumprimento de sentença observar o rito dos arts. 534 e seguintes do CPC/2015
na Vara da Fazenda Pública.
CONCLUSÃO
22. Recurso Especial provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça: "A Seção, por
unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Og Fernandes, Mauro Campbell
Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e
Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr. JOSE LUIS WAGNER, pela parte INTERES.: CONFEDERAÇÃO
NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO"
Brasília, 12 de agosto de 2020(data do julgamento).
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Trata-se
de Recurso Especial (art. 105, III, "a", da CF/1988) interposto contra acórdão proferido pelo
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO E
PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL EXECUÇÃO
DE SENTENÇA DE AÇÃO COLETIVA. SINDICATO DOS SERVIDORES
PÚBLICOS DE BLUMENAU. PROMOÇÃO POR DESEMPENHO.
ADOÇÃO DO RITO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA.
PROCEDIMENTO APLICÁVEL. VALOR EXECUTADO ABAIXO DE 60
SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. DECISÃO
MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
A partir de 23 de junho de 2015, ex vi do art. 23 da Lei
12.153/2009, tem-se por incontroverso e indiscutível o funcionamento amplo e
irrestrito das unidades dos Juizados especiais da Fazenda Pública em Santa
Catarina, de forma autônoma, onde instalado juizado especial fazendário, e
concorrente com outra unidade jurisdicional no interior.
(Primeiras Conclusões Interpretativas sobre os Juizados Especiais
da Fazenda Pública. Grupo de Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça
de Santa Catarina, DJe 19.12.2014).
Sendo a competência absoluta, o rito procedimental a ser
observado, mesmo na hipótese em que não tenha sido instalada a unidade especial
do Juizado, será o da Lei n° 12.153/2009.
A parte recorrente alega:
Atuando na qualidade de substituto processual, o Sindicato Único
dos Trabalhadores no Serviço Público de Blumenau (SINTRASEB) propôs contra
o Recorrido uma ação para obrigá-lo a avaliar o desempenho de milhares de servidores públicos substituídos, dentre os quais o (a) Recorrente. Esta ação
tramita na 12 Vara da Fazenda Pública da Comarca de Blumenau (SC).
O pedido foi julgado procedente e a sentença transitou em julgado
em 2006.
Na fase de execução, a obrigação de avaliar foi convertida em
perdas e danos, com a promoção de todos os servidores substituídos
independentemente de avaliação. Na prática, isso significa reajustar o vencimento
de cada um deles em 6,09% (seis vírgula zero nove por cento).
A decisão que converteu a obrigação de avaliar em perdas e
danos foi confirmada pela Primeira Câmara de Direito Público do Tribunal de
Justiça de Santa Catarina (Agravo de Instrumento n° 2012.022801-4, em
setembro de 2013), pela Primeira Turma deste egrégio Superior Tribunal de
Justiça (REsp n° 1.484.614 -SC, em fevereiro de 2015) e pela Segunda Turma do
Supremo Tribunal Federal (RE n° 869.149, em novembro de 2015). Todas essas
decisões já transitaram em julgado.
O (a) Recorrente, a exemplo de centenas de outros servidores
públicos substituídos, formulou pedido de cumprimento individual da sentença
prolatada na referida ação coletiva.
(...)
Noutra decisão, tomada por impulso oficial, o Juízo de 1° Grau
alterou a competência para o processamento do incidente, fixando a competência
do Juizado Especial da Fazenda Pública, fazendo incidir as disposições da Lei
12.153/2009, pelos seguintes fundamentos:
Referida decisão, portanto, alterou a competência para
processamento do incidente de cumprimento de sentença, da Vara dos Feitos da
Fazenda (onde tramita a ação coletiva) para o Juizado da Fazenda Pública.
Considerando a gravidade das consequências da tramitação de
uma causa perante juízo incompetente (STJ, 4ª Turma, REsp 1.679.909 -RS, Rel.
Min. Luís Felipe Salomão), o (a) Recorrente agravou desta decisão.
A PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO decidiu, por
unanimidade, negar provimento ao recurso, em Acórdão assim ementado:
(...)
Considerando tratar-se de execução individual de sentença
proferida em ação coletiva com valor inferior a sessenta salários mínimos, o
acórdão recorrido manteve a competência do Juizado Especial da Fazenda
Pública para o processamento do feito, contrariando o que dispõe o art. 516,
inciso II, do NCPC, de acordo com o qual o cumprimento de sentença fundada
em título judicial deve ser processada perante o juízo que processou a causa.
Além disso, ao equiparar um incidente processual (cumprimento
de sentença) com uma "causa cível" para fins de fixação da regra de
competência, o acórdão recorrido contrariou o art. 2° da Lei 12.153/2009 e o art.
3°, § 1°, inciso I, da Lei n° 9.099/1995 (aplicável subsidiariamente), como será
visto a seguir.
Ao decidir dessa forma, o acórdão recorrido violou os dispositivos
de lei federal vigente (art. 516, II, do NCPC e art. 2° da Lei n° 12.153 e 32, § 1°,
inciso 1, da Lei n2 9.099), o que viabiliza o manejo do presente recurso.
Não foram apresentadas contrarrazões pela parte adversa.
O Tribunal de origem admitiu o Recurso Especial como representativo da
controvérsia.
O eminente Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, na condição de Presidente da
Comissão Gestora de Precedentes do STJ, reconheceu a representatividade da controvérsia e
o potencial multiplicador desta e determinou que se dê vista às partes e ao Ministério Público
Federal.
A Primeira Seção submeteu a presente controvérsia ao rito dos recursos
repetitivos e assim delimitou a tese controvertida (Tema 1.029/STJ):
Aplicabilidade do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública
(Lei 12.153/2009) ao Cumprimento de Sentença individual oriundo de Ação
Coletiva que seguiu o procedimento ordinário em Vara da Fazenda Pública,
independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro competente.
O Ministério Público Federal emitiu parecer "no sentido de que não seja
aplicado o rito dos Juizados Especiais Federais às execuções individuais de sentenças
coletivas".
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator):
1. Identificação e delimitação da controvérsia
O tema ora controvertido (1.029/STJ) consiste em estabelecer a "aplicabilidade
do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009) ao Cumprimento de
Sentença individual oriundo de Ação Coletiva que seguiu o procedimento ordinário em Vara
da Fazenda Pública, independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro
competente".
2. Exame do tema repetitivo
Na hipótese tratada no presente tema repetitivo, o Tribunal de origem assentou
que, por ser absoluta a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (§ 4º do art.
2º da Lei 12.153/2009), o cumprimento de sentença oriundo de Ação Coletiva em que o valor
da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei
12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial instalado na comarca competente.
Com relação à execução de sentenças coletivas, o STJ firmou a compreensão,
sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, de que "a liquidação e a execução individual de
sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do
beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes
geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta,
para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em
juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC.)" (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro
Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011).
Também está sedimentado na jurisprudência do STJ o entendimento de que,
uma vez instalado Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública, conforme o caso, e se o
valor da causa for inferior ao da alçada, a competência é absoluta. Apenas como exemplo:
REsp 1.537.768/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em
20.8.2019, DJe de 5.9.2019.
A primeira questão que emerge do tema repetitivo é indagar se é possível
ajuizar ação executiva no Juizado Especial da Fazenda Pública relativa a título judicial oriundo
de Ação Coletiva, em que se seguiu rito próprio desse tipo de ação.
O art. 2º, § 1º, I, da Lei 12.153/2009 determina que não se incluem na
competência do Juizado Especial da Fazenda Pública as demandas sobre direitos ou interesses
difusos e coletivos, o que é argumento suficiente para excluir a competência executória de
sentenças exaradas em Ações Coletivas.
Na mesma lei não há disposição expressa acerca da competência executória
dos Juizados da Fazenda Pública, havendo apenas regramento (arts. 12 e 13) do rito da
execução de seus próprios julgados.
O art. 27 da Lei 12.153/2009 fixa a aplicação subsidiária do CPC, da Lei
9.099/1995 e da Lei 10.259/2001.
Por seu turno, a Lei 9.099/1995, no art. 3º, § 1º, define a competência dos
Juizados Especiais Cíveis e, por aplicação subsidiária, dos Juizados Especiais da Fazenda
Pública para promoverem a execução "dos seus julgados" e "dos títulos executivos
extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo".
Já o art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, também de aplicação subsidiária aos
Juizados Especiais da Fazenda Pública, delimita a competência executória a "executar as suas
sentenças".
Por fim, a terceira lei de regramento de aplicação subsidiária, o CPC,
estabelece:
Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante:
I - os tribunais, nas causas de sua competência originária; II - o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição;
III - o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal
condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão
proferido pelo Tribunal Marítimo.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente
poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se
encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser
executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos
autos do processo será solicitada ao juízo de origem.
Vale resgatar a possibilidade, estipulada pelo STJ sob o rito dos recursos
repetitivos (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado
em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011), de a execução individual de sentença coletiva poder ser
ajuizada no foro do domicílio do exequente, interpretação essa advinda da legislação de tutela
dos direitos coletivos e difusos.
Nota-se que a Lei 12.153/2009 e as respectivas normas de aplicação
subsidiária definem que os Juizados Especiais da Fazenda Pública têm competência para
apreciar apenas as execuções de seus próprios julgados ou de títulos extrajudiciais.
Por derradeiro, o Código de Defesa do Consumidor, norma que rege a tutela
coletiva não só no direito do consumidor, mas de forma subsidiária de todos os tipos de
direitos, determina a competência, para a execução, do juízo da liquidação da sentença ou da
ação condenatória, no caso de execução individual, valendo aqui a regra do domicílio do
exequente no caso de haver juízos com a mesma competência.
Na mesma linha de compreensão aqui traçada, cito precedente da Primeira
Turma que examina a Lei 10.259/2001 (Juizado Especial Federal), aplicada subsidiariamente à
Lei 12.153, ora em exame:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR
PÚBLICO. EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA.
VALOR DA CAUSA INFERIOR A 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS.
IRRELEVÂNCIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. Nos termos
do art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, "Compete ao Juizado Especial Federal Cível
processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor
de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças." 2.
Extrai-se do referido dispositivo legal que a fixação da competência do
JEF, no que se refere às execuções, impõe a conjugação de duas
condicionantes: (a) o valor da causa deve ser inferior a 60 (sessenta)
salários mínimos; (b) o titulo executivo judicial deve ser oriundo do próprio JEF. 3. Caso concreto em que, nada obstante o valor da causa seja
inferior ao referido limite legal, a sentença exequenda foi prolatada nos autos da
Ação Ordinária nº 2007.81.00.018120-3, que tramitou na 6ª Vara Federal da
Seção Judiciária do Ceará, o que afasta a competência do Juizado Especial
Federal Cível para a respectiva execução.
4. Recurso especial provido para reformar o acórdão recorrido, a
fim de reconhecer da competência da Justiça Federal para processar e julgar o
presente feito.
(REsp 1.648.895/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 7/5/2019, DJe 13/5/2019; grifei)
Assim, não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a
execução de título executivo formado em Ação Coletiva, muito menos impor o rito
sumaríssimo ao juízo comum.
O cumprimento da sentença coletiva deve obedecer o rito previsto nos arts.
534 e seguintes do CPC/2015; e fato de o valor da execução ser baixo pode apenas resultar,
conforme a quantia, em requisição de pequeno valor (art. 535, § 3º, II, do CPC/2015).
3. Definição da tese repetitiva
Sugiro a fixação da seguinte tese repetitiva para o Tema 1.029/STJ:
Não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública
a execução de título executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito
ordinário, assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo
comum da execução.
4. Resolução do caso concreto
A Ação Coletiva tramitou na Vara da Fazenda Pública da Comarca de
Blumenau/SC e nela foi intentado o cumprimento de sentença sob o rito do art. 534 e seguintes
do CPC/21015.
O Tribunal de origem assentou que o cumprimento de sentença oriundo de
Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve
seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial
instalado na Comarca competente.
Essa compreensão está dissonante da aqui fixada, devendo o cumprimento de
sentença cumprir o rito dos arts. 534 e seguintes do CPC/2015 na Vara da Fazenda Pública.
5. Conclusão
Por todo o exposto, dou provimento ao Recurso Especial e fixo, para os
fins dos arts. 1.036 e subsequentes do CPC/2015, esta tese repetitiva, relativa ao
Tema 1.029/STJ: "Não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a
execução de título executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito
ordinário, assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo comum da
execução."
É como voto.