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9 de maio de 2021

AÇÃO COLETIVA. ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. EXPRESSA AUTORIZAÇÃO ASSEMBLEAR. PRESCINDIBILIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL NO POLO ATIVO. ADMISSÃO.

EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.405.697 - MG (2013/0321952-4) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO DE PREMISSA INSUBSISTENTE NO ACÓRDÃO EMBARGADO. RECONHECIMENTO. INAPLICABILIDADE DA TESE FIRMADA PELO STF NO RE N. 573.232/SC À HIPÓTESE. VERIFICAÇÃO. REJULGAMENTO DO RECURSO. NECESSIDADE. AÇÃO COLETIVA. ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. EXPRESSA AUTORIZAÇÃO ASSEMBLEAR. PRESCINDIBILIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL NO POLO ATIVO. ADMISSÃO. PRECEDENTES DESTA CORTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES PARA JULGAR IMPROVIDO O RECURSO ESPECIAL DA PARTE ADVERSA. 

1. Constatada a inaplicabilidade do entendimento adotado pelo STF à hipótese dos autos, tal como posteriormente esclarecido pela própria Excelsa Corte, é de se reconhecer, pois, a insubsistência da premissa levada a efeito pelo acórdão embargado, assim como a fundamentação ali deduzida, a ensejar, uma vez superado o erro de premissa, o rejulgamento do recurso. 

2. Não se aplica ao caso vertente o entendimento sedimentado pelo STF no RE n. 573.232/SC e no RE n. 612.043/PR, pois a tese firmada nos referidos precedentes vinculantes não se aplica às ações coletivas de consumo ou quaisquer outras demandas que versem sobre direitos individuais homogêneos. Ademais, a Suprema Corte acolheu os embargos de declaração no RE n. 612.043/PR para esclarecer que o entendimento nele firmado alcança tão somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário. 

3. O microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte autora pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado, mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas coletivas. 

4. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para julgar improvido o recurso especial interposto pela parte adversa. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, acolher os embargos declaração, com efeitos infringentes, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 10 de setembro de 2019 (data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Cuida-se de embargos de declaração opostos por Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor — Polidesc contra o acórdão prolatado pela Terceira Turma, desta relatoria, que conferiu provimento ao recurso especial da parte adversa para, "ante a dissolução da associação demandante, sem a assunção da titularidade do polo ativo da ação pelo Ministério Público, extinguir o feito sem julgamento de mérito" (e-STJ, fl. 681). 

O aresto recebeu a seguinte ementa (e-STJ, fls. 663-665): 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROMOVIDA POR ASSOCIAÇÃO DESTINADA A PROTEÇÃO DOS CONSUMIDORES. DISSOLUÇÃO DA DEMANDANTE NO CURSO DO PROCESSO, COM A AÇÃO JÁ ESTABILIZADA. PRETENSÃO DE OUTRA ASSOCIAÇÃO DE ASSUMIR A TITULARIDADE DO POLO ATIVO DA AÇÃO COLETIVA. IMPOSSIBILIDADE, NO ESPECÍFICO CASO DAS ASSOCIAÇÕES (INCOMPATIBILIDADE QUE, EM TESE, NÃO SE ESTENDE AOS DEMAIS LEGITIMADOS). REALINHAMENTO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO STJ, EM CONSONÂNCIA COM A DELIBERAÇÃO EXARADA PELO STF, SOB O REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL. NECESSIDADE. EXPRESSA AUTORIZAÇÃO DOS ASSOCIADOS PARA A ADEQUADA LEGITIMAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO QUE OS REPRESENTA. IMPORTANTE INSTRUMENTO DE CONTROLE JUDICIAL DA ADEQUAÇÃO DA REPRESENTATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Em linha de princípio, afigura-se possível que o Ministério Público ou outro legitimado, que necessariamente guarde uma representatividade adequada com os interesses discutidos na ação, assuma, no curso do processo coletivo (inclusive com a demanda já estabilizada, como no caso dos autos), a titularidade do polo ativo da lide, possibilidade, é certo, que não se restringe às hipóteses de desistência infundada ou de abandono da causa, mencionadas a título exemplificativo pelo legislador (numerus apertus). 2. Justamente por envolver interesses essencialmente ou acidentalmente coletivos (assim nominados, na lição de José Carlos Barbosa Moreira, in Tutela Jurisdicional dos Interesses Coletivos ou Difusos) – nos quais se constatam a magnitude dos bens jurídicos envolvidos, com assento constitucional; a peculiar e considerável dimensão das correlatas lesões; e a inerente repercussão destas na esfera jurídica de um elevado número de pessoas – a resolução dos conflitos daí advindos, por meio do processo coletivo, consubstancia, a um só tempo, destacada atuação do poder jurisdicional na distribuição de justiça social e nas políticas sociais do Estado, bem como verdadeiro anseio da sociedade. 2.1 Ante a natureza e a relevância pública dos interesses tutelados no bojo de uma ação coletiva, de inequívoca repercussão social, ressai evidenciado que os legitimados para promover a ação coletiva não podem proceder a atos de disposição material e/ou formal dos direitos ali discutidos, inclusive porque deles não são titulares. 2.2 No âmbito do processo coletivo, vigora o princípio da indisponibilidade (temperada) da demanda coletiva, seja no tocante ao ajuizamento ou à continuidade do feito, com reflexo direto em relação ao Ministério Público que, institucionalmente, tem o dever de agir sempre que presente o interesse social (naturalmente, sem prejuízo de uma ponderada avaliação sobre a conveniência e, mesmo, sobre possível temeridade em que posta a ação), e, indiretamente, aos demais colegitimados. Como especialização do princípio da instrumentalidade das formas, o processo coletivo é também norteado pelo princípio da primazia do conhecimento do mérito, em que este (o processo) somente atingirá sua função instrumental-finalística se houver o efetivo equacionamento de mérito do conflito. 3. Todavia, esta compreensão quanto à possibilidade de assunção do polo ativo por outro legitimado, não se aplica – ressalta-se – às associações porque de todo incompatível. 3.1 No específico caso das associações, de suma relevância considerar a novel orientação exarada pelo Supremo Tribunal Federal que, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.232/SC, sob o regime do art. 543-B do CPC, reconheceu, para a correta delimitação de sua legitimação para promover ação coletiva, a necessidade de expressa autorização dos associados para a defesa de seus direitos em juízo, seja individualmente, seja por deliberação assemblear, não bastando, para tanto, a previsão genérica no respectivo estatuto. 3.2 Esta exegese permite ao magistrado bem avaliar, no específico caso das associações, se a demandante efetiva e adequadamente representa os interesses da respectiva coletividade, de modo a viabilizar a consecução de direitos que alegadamente guardariam relevância pública e inequívoca repercussão social. Em relação aos demais legitimados, esta análise, ainda que pertinente, afigura-se naturalmente atenuada ante a finalidade institucional decorrente de lei. 3.3 Não se descurando da compreensão de que a lei, ao estabelecer os legitimados para promover a ação coletiva, presumivelmente reconheceu a correlação destes com os interesses coletivos a serem tutelados, certo é que o controle judicial da adequada representatividade, especialmente em relação às associações, consubstancia importante elemento de convicção do magistrado para mensurar a abrangência e, mesmo, a relevância dos interesses discutidos na ação, permitindo-lhe, inclusive, na ausência daquela, obstar o prosseguimento do feito, em observância ao princípio do devido processo legal à tutela jurisdicional coletiva, a fim de evitar o desvirtuamento do processo coletivo. 4. Reconhece-se, pois, a absoluta impossibilidade, e mesmo incompatibilidade, de outra associação assumir o polo ativo de ação civil pública promovida por ente associativo que, no curso da ação, veio a se dissolver (no caso, inclusive, por deliberação de seus próprios associados). Sob o aspecto da representação, afigura-se, pois, inconciliável a situação jurídica dos então representados pela associação dissolvida com a dos associados do "novo ente associativo", ainda que, em tese, os interesses discutidos na ação coletiva sejam comuns aos dois grupos de pessoas. 4.1 Na espécie, a partir da dissolução do ente associativo demandante, a subtrair-lhe não apenas a legitimação, mas a própria capacidade de ser parte em juízo, pode-se concluir com segurança que os então associados não mais são representados pela associação autora, notadamente na subjacente ação judicial. Por sua vez, a nova associação, que pretende assumir a titularidade do polo ativo da subjacente ação civil pública, não detém qualquer autorização para representar os associados do ente associativo demandante. Aliás, da petição de ingresso no presente feito, constata-se que o petitório não se fez acompanhar sequer da autorização de seus próprios associados para, no caso, prosseguir com a presente ação, o que, por si só, demonstra a inviabilidade da pretensão. E, ainda que hipoteticamente houvesse autorização nesse sentido (de prosseguimento no feito), esta, por óbvio, não teria o condão de suprir a ausência de autorização dos então associados da demandante, o que conduz à inarredável conclusão de que a associação interveniente não possui legitimidade para prosseguir com a presente ação. 4.2 In casu, o Ministério Público, ciente da dissolução da associação demandante, não manifestou interesse em prosseguir com a subjacente ação coletiva, o que enseja a extinção do feito, sem julgamento de mérito. 5. Recurso Especial provido. 

Nas razões dos aclaratórios, o embargante aduz, em suma, que o voto condutor mostrou-se contraditório, pois "discorreu corretamente sobre o princípio da indisponibilidade, mas não o aplicou, violando expressamente o art. 6º, VI e VII, do Código de Defesa do Consumidor e o princípio do acesso à justiça e a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, coletivos e difusos" (e-STJ, fl. 700). 

Aduz, após tecer considerações quanto à distinção dos institutos da representação e da substituição processual, que o aresto impugnado "deixou de analisar a possibilidade das associações aturarem como substitutos processuais, para além dos associados, se assim se apresentarem, com fulcro no art. 82, IV, do Código de Defesa do Consumidor (c/c art. 5º, V, da Lei da Ação Civil Pública), em que a coisa julgada atuará erga omnes ou ultra partes (nos interesses difusos e coletivos) ou erga omnes, mas só para beneficiar os membros do grupo, categoria ou classe de pessoas, de acordo com as regras sobre coisa julgada do Código de Defesa do Consumidor (art. 103 e parágrafos)" — (e-STJ, fl. 704). Por conseguinte, o acórdão seria contraditório, pois, ambas as associações, apresentam-se, na espécie, na qualidade de substitutas processuais, e não como representantes de seus associados. 

Entende o embargante, ainda, que o aresto embargado incide em omissão e contradição no tocante à possibilidade de a Polidesc substituir a Andec na mesma posição de substituição processual, sem necessidade de autorização. 

Sustenta, ainda, a absoluta inaplicabilidade da decisão proferida, pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 573.232/SC, à hipótese em análise. Para tanto, anota que o caso julgado pelo STF não cuidava de ação civil de consumo, mas sim de ação civil pública promovida por entidade de classe, representando seus associados. 

Na espécie, diversamente, anota o embargante: "trata-se de ação civil coletiva de consumo, que tem por finalidade proteger os interesses e os direitos do Consumidor, dentre outros, como se demonstra pelo art. 1º do Estatuto Social da Andec e cuja constituição ocorreu há mais de um ano, possui legitimidade e capacidade para estar em juízo substituindo todos os consumidores do país na presente lide, a teor do que determina o art. 82, inciso IV do CDC, motivo pelo qual não trata-se de representação processual, mas sim de SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL" (e-STJ, fl. 730). E conclui, no ponto: "[ser] perfeitamente possível a aplicação do artigo 5º, §3º, da Lei 7347/85, vez que a lei dispõe que 'em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimado, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa', ou seja, as ações coletivas não são privativas de ninguém" (e-STJ, fl. 730). 

Por fim, infirma o julgado de omissão no tocante à ausência de oportunidade de o Ministério Público assumir a demanda. 

A parte adversa apresentou impugnação aos aclaratórios (e-STJ, fls. 949-979). 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE(RELATOR): Em razão da adoção de premissa equivocada pelo acórdão embargado, os presentes embargos de declaração merecem ser acolhidos, conferindo-se-lhes efeitos infringentes, conforme se passa a demonstrar. 

Esclareça-se, de início, que o acórdão embargado parte, de modo expresso, da premissa de que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 573.232/SC, com a repercussão geral a ele inerente, e sob o rito do art. 543-B, do CPC, cuja tese deve ser observada pelos demais órgãos integrantes do Poder Judiciário, teria reconhecido, para a correta delimitação da legitimação de associação para promover ação coletiva, a necessidade de expressa autorização dos associados para a defesa de seus direitos em juízo, seja individualmente, seja por deliberação assemblear, não bastando, para tanto, a previsão genérica no respectivo estatuto. 

Deixou-se assente, assim, que "a compreensão externada pelo Supremo Tribunal Federal, considerados os efeitos vinculativos próprios do recurso extraordinário julgado sob o regime do art. 543-B do CPC, sobrepõe-se, naturalmente, ao então posicionamento perfilhado pelo Superior Tribunal de Justiça, que, diversamente, compreendia que a associação ou o sindicato, na qualidade de substituto processual, atua na esfera judicial na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representa, dispensando-se a relação nominal dos afiliados e suas respectivas autorizações". 

A esse propósito, deu-se destaque, inclusive, à anterior jurisprudência do STJ, que adotava a orientação propugnada pelo embargante: AgRg nos EDcl no AREsp 656.423/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 12/5/2015, DJe 19/5/2015; EDcl no AgRg no REsp 823.465/RS, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Sexta Turma, julgado em 3/5/2012, DJe 16/5/2012; EREsp 941.108/RS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Corte Especial, julgado em 18/12/2009, DJe 8/2/2010; REsp 1.531.371/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 2/6/2015, DJe 5/8/2015; AgRg no REsp 1.423.791/BA, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 17/3/2015, DJe 26/3/2015; AgRg no REsp 1364690/AL, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 21/5/2015, DJe 29/5/2015), 

Salientou-se, na oportunidade, que o Superior Tribunal de Justiça, em recentes julgados, passou a se posicionar em consonância com a novel orientação da Excelsa Corte, tomando-se como referência os seguintes precedentes: AgRg no REsp n. 1.488.825, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma DJe 12/2/2015 e REsp n. 1.374.678, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, Dje 14/08/2015. 

Desse modo, o acórdão embargado propôs o alinhamento ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, consignando-se que, para a correta delimitação da legitimação da associação para promover ação coletiva, em representação aos seus associados, haveria que se estar presente, necessariamente, a expressa autorização destes para tal fim, seja individualmente, seja por deliberação assemblear, afigurando-se insuficiente a previsão genérica no respectivo estatuto. 

Ocorre que a própria Suprema Corte, posteriormente, acolheu os embargos de declaração no RE n. 612.043/PR para esclarecer que o entendimento nele firmado alcança tão somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário, pois são direitos meramente individuais, no qual o autor se limita a representar os titulares do direito material, atuando na defesa de interesses alheios e em nome alheio, o que não ocorre nas ações civis públicas. 

A partir do exato alcance de sua decisão explicitado pelo Supremo Tribunal Federal, esta Corte de Justiça retomou, em seus julgados, a compreensão então adotada, conforme se constata dos seguintes precedentes: 

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO INDICAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. FUNDAMENTAÇÃO. AUSENTE. DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. INTERESSE DE AGIR. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE DAS ASSOCIAÇÕES. REGIME DE SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. AUTORIZAÇÃO ASSEMBLEAR. DESNECESSIDADE. ESTATUTO. REEXAME DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. SÚMULA 5/STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. CUMULAÇÃO. OUTROS ENCARGOS. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PROVA DO ERRO. RELAÇÃO DE CONSUMO. TESES REPETITIVAS. 1. Cuida-se de ação coletiva de consumo, ajuizada por associação civil em favor de todos os consumidores e por meio da qual é questionada a cobrança cumulativa de comissão de permanência com outros encargos, como multa e juros de mora, nos contratos de abertura de crédito em conta corrente. 2. Recurso especial interposto em: 15/09/2016; conclusos ao gabinete em: 30/01/2017; julgamento: CPC/15. 3. O propósito recursal cinge-se a determinar se: a) houve negativa de prestação jurisdicional; b) havia interesse de agir no momento da propositura da presente ação coletiva; c) a associação autora possui legitimidade ativa para propor ação coletiva de consumo que verse sobre os interesses individuais homogêneos de todos os consumidores do Estado do Rio Grande do Sul; d) é válida a cobrança cumulativa de comissão de permanência com outros encargos, como multa e juros de mora; e e) é necessária a prova de erro para a repetição de indébito nas relações de consumo. 4. A ausência de expressa indicação de obscuridade, omissão ou contradição nas razões recursais enseja o não conhecimento do recurso especial. 5. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 6. A ausência de fundamentação ou a sua deficiência importa no não conhecimento do recurso quanto ao tema. 7. O reexame de fatos e provas em recurso especial é inadmissível. 8. Por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa do interesse coletivo em sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo desnecessária nova autorização ou deliberação assemblear. 9. As teses de repercussão geral resultadas do julgamento do RE 612.043/PR e do RE 573.232/SC tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas de rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome alheio. 10. Verificar se o estatuto da autora somente previa a possibilidade de defesa de seus associados demandaria a interpretação de cláusulas contratuais, vedada pela Súmula 5/STJ. 11. A comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios. Tese repetitiva. 12. Tratando-se de relação de consumo ou de contrato de adesão, a compensação/repetição simples do indébito independe da prova do erro. 13. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (REsp 1649087/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 02/10/2018, DJe 04/10/2018 - sem grifo no original) 

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO INDICAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE DAS ASSOCIAÇÕES. TARIFA DE EMISSÃO DE FATURA. CARTÃO DE CRÉDITO. SERVIÇO DIFERENCIADO. RESOLUÇÃO BACEN 3.919/2010. EFICÁCIA SUBJETIVA DA AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. ABRANGÊNCIA ERGA OMNES. SUBSTITUIÇÃO E REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. DISTINÇÃO. 1. Cuida-se de ação coletiva de consumo, por meio da qual é questionada a cobrança das tarifas de "processamento de fatura" nas operações realizadas pelos consumidores com os cartões de crédito emitidos pelo recorrente. 2. Recurso especial interposto em: 19/12/2014; conclusos ao gabinete em: 25/08/2016; julgamento: CPC/73. 3. O propósito recursal cinge-se a determinar se: a) houve negativa de prestação jurisdicional; b) a associação autora possui legitimidade ativa para propor ação coletiva de consumo que verse sobre os interesses individuais homogêneos de todos os consumidores do Estado do Rio Grande do Sul; c) é válida a cobrança da tarifa "de emissão de fatura"; e d) a eficácia subjetiva da sentença deve ser restringida aos associados da autora coletiva. 4. A ausência de expressa indicação de obscuridade, omissão ou contradição nas razões recursais enseja o não conhecimento do recurso especial. 5. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 6. Por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa do interesse coletivo em sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo desnecessária nova autorização ou deliberação assemblear. 7. Verificar se o estatuto da autora somente previa a possibilidade de defesa de seus associados demandaria a interpretação de cláusulas contratuais, vedada pela Súmula 5/STJ. 8. Os serviços relacionados ao cartão de crédito estavam inscritos na categoria de serviços diferenciados, no inciso VI do art. 5º da a Resolução 3.508/2007 BACEN, sendo permitida a cobrança de tarifa, desde que explicitadas ao cliente ou usuário as condições de utilização e pagamento do serviço, conforme caput do citado dispositivo. 9. A enumeração das tarifas que poderiam ser efetivamente cobradas pelo serviço diferenciado de cartão de crédito somente foi disciplinada com a edição da Resolução 3.919/2010 do BACEN, a qual, para os contratos firmados antes de 31/05/2011, passou a produzir efeitos em 1º/06/2012. 10. É permitida a cobrança de tarifa de emissão de fatura até 1º/06/2012, desde que explicitadas ao cliente ou usuário as condições de utilização e de pagamento e ressalvado o abuso devidamente comprovado caso a caso, por meio da invocação de parâmetros objetivos de mercado e circunstâncias do caso concreto, não bastando a mera remissão a conceitos jurídicos abstratos ou à convicção subjetiva do magistrado. 11. No regime específico da extensão subjetiva da coisa julgada de ação coletiva relativa a interesses individuais homogêneos, a coisa julgada se dará sempre erga omnes, como se os co-titulares dos interesses individuais homogêneos fossem sempre indeterminados, apesar de determináveis. 12. A tese de repercussão geral resultado do julgamento do RE 612.043/PR (Tese 499/STF) tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas de rito ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem índole coletiva, pois, nessas situações, o autor se limita a representar os titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome alheio. 13. Na presente hipótese, o acórdão recorrido, embora tenha restringido, em favor do princípio da congruência, a abrangência territorial da ação aos consumidores domiciliados no Estado do Rio Grande do Sul, manteve a extensão a todos os consumidores (erga omnes) dos efeitos da sentença de parcial procedência do pedido, não limitando seu alcance aos associados da autora coletiva, razão pela qual não merece reforma. 14. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido. (REsp 1554821/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 25/09/2018, DJe 04/10/2018 - sem grifo no original) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO AGRAVO. EXTENSÃO DOS EFEITOS A REPRESENTADO QUE NÃO ESTAVA NA LISTAGEM DO PROCESSO DE CONHECIMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Verifica-se da leitura da monocrática que o entendimento exarado vai ao encontro da jurisprudência dessa Corte Superior ao decidir que a associação, na qualidade de substituto processual detém legitimidade para atuar judicialmente na defesa dos interesses coletivos de toda a categoria que representa, sendo prescindível a relação nominal dos filiados e suas respectivas autorizações, razão pela qual a coisa julgada advinda da ação coletiva deverá alcançar todos os integrantes da categoria. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1304797/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 20/09/2018, DJe 26/09/2018 - sem grifo no original) 

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA. ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. EXPRESSA AUTORIZAÇÃO ASSEMBLEAR. PRESCINDIBILIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL NO POLO ATIVO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Não se aplica ao caso vertente o entendimento sedimentado pelo STF no RE n. 573.232/SC e no RE n. 612.043/PR, pois a tese firmada nos referidos precedentes vinculantes não se aplicam às ações coletivas de consumo ou quaisquer outras demandas que versem sobre direitos individuais homogêneos. Ademais, a Suprema Corte acolheu os embargos de declaração no RE n. 612.043/PR para esclarecer que o entendimento nele firmado alcança tão somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário. 2. O microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte ilegítima pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado, mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas coletivas. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1719820/MG, desta relatoria, julgado em 15/04/2019, DJe 23/04/2019) 

Constatada, assim, a inaplicabilidade do entendimento adotado pelo STF à hipótese dos autos, tal como posteriormente esclarecido pela própria Excelsa Corte, é de se reconhecer, pois, a insubsistência da premissa levada a efeito pelo acórdão embargado, assim como a fundamentação ali deduzida, a ensejar, uma vez superado o erro de premissa ora reconhecido, o rejulgamento do recurso. 

Pois bem. Na hipótese dos autos, Associação Nacional dos Consumidores de Crédito - ANDEC, entidade originariamente autora da presente ação coletiva, foi dissolvida, razão pela qual o ora embargante, Polisdec — Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor —, constituído há mais de um 1 (ano) e com a mesma finalidade temática, requereu sua integração no feito na qualidade de demandante, em substituição à Andec. 

Tal pretensão, de fato, é plenamente possível, haja vista que o microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte autora pelo Ministério Público ou por algum outro colegitimado, mormente em decorrência da importância dos interesses envolvidos em demandas coletivas. 

Esse entendimento tem substrato nos arts. 5º, § 3º, da Lei da Ação Civil Pública e 9º da Lei da Ação Popular, in verbis: 

Art. 5º: (...) (...) § 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa. Art. 9º. Se o autor desistir da ação ou der motivo à absolvição da instância, serão publicados editais nos prazos e condições previstos no art. 7º, inciso II, ficando assegurado a qualquer cidadão, bem como ao representante do Ministério Público, dentro do prazo de 90 (noventa) dias da última publicação feita, promover o prosseguimento da ação. 

A jurisprudência do STJ é no mesmo sentido: 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EMBARGOS INFRINGENTES. LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA A PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LIMITADOR CONSTITUCIONAL. DEFESA DOS NECESSITADOS. PLANO DE SAÚDE. REAJUSTE. GRUPO DE CONSUMIDORES QUE NÃO É APTO A CONFERIR LEGITIMIDADE ÀQUELA INSTITUIÇÃO. [...] 8. Diante do microssistema processual das ações coletivas, em interpretação sistemática de seus dispositivos (art. 5°, § 3°, da Lei n. 7.347/1985 e art. 9° da Lei n. 4.717/1965), deve ser dado aproveitamento ao processo coletivo, com a substituição (sucessão) da parte tida por ilegítima para a condução da demanda. Precedentes. 9. Recurso especial provido. (REsp 1192577/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 15/05/2014, DJe 15/08/2014) 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO. SÚMULAS 5/STJ E 7/STJ. EXTINÇÃO DO FEITO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DA DEMANDA COLETIVA. INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRECEDENTES. 1. A irregularidade da representação da associação foi confirmada pela Corte de origem com base na análise do Regimento Interno e Estatuto Social da associação e das provas dos autos, o que inviabiliza sua modificação em sede de recurso especial, ante o óbice das Súmulas n. 5/STJ e 7/STJ. 2. "A norma inserta no art. 13 do CPC deve ser interpretada em consonância com o § 3º do art. 5º da Lei 7.347/85, que determina a continuidade da ação coletiva. Prevalece, na hipótese, os princípios da indisponibilidade da demanda coletiva e da obrigatoriedade, em detrimento da necessidade de manifestação expressa do Parquet para a assunção do pólo ativo da demanda" (REsp 855.181/SC, Rel. Min. CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 1º/9/2009, Dje 18/9/2009). 3. Somente a efetiva e fundamentada demonstração pelo Parquet de que a Ação Civil Pública é manifestamente improcedente ou temerária pode ensejar seu arquivamento, que deverá ainda ser ratificada pelo Conselho Superior do Ministério Público, nos termos do art. 9º da Lei n. 7.347/85. Recurso especial conhecido em parte e provido. (REsp 1372593/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 07/05/2013, DJe 17/05/2013) 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MICROSSISTEMA DE TUTELA DE DIREITOS COLETIVOS (EM SENTIDO LATO). ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DOS ARTS. 9º DA LEI N. 4.717/65 e 5º, § 3º, DA LEI N. 7.347/85. POSSIBILIDADE. ABERTURA PARA INGRESSO DE OUTRO LEGITIMADOS PARA OCUPAR O PÓLO ATIVO DA DEMANDA. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. MEDIDA DE ULTIMA RATIO. OBSERVAÇÃO COMPULSÓRIA DAS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA ABSOLUTA. 1. Trata-se, na origem, de ação civil pública ajuizada pelo Conselho Regional de Medicina da Seccional do Rio Grade do Sul (CREMERS) contra o Estado do Rio Grande do Sul para discutir o direito de pacientes que escolherem pelo atendimento do SUS à opção de pagamento da chamada "diferença de classe" e à abstenção da exigência prévia de que passem por triagem em posto de saúde a fim de que seja, portanto, viabilizado o atendimento pelo médico escolhido pelos próprios pacientes. 2. A sentença reconheceu a ilegitimidade ativa ad causam da autarquia federal por considerar que, segundo a redação do art. 5º da Lei n. 7.347/85 vigente à época da propositura da demanda, as autarquias que intentassem ações como a presente deveriam comprovar a pertinência temática entre seus objetivos institucionais e o objeto da demanda. O acórdão recorrido reformou este entendimento, aplicando a nova redação do referido dispositivo, que franqueia às autarquias, de forma ampla e irrestrita - sem necessidade, pois, de pertinência temática -, a legitimidade ativa para propor ações civis públicas. 3. As conclusões ora impugnadas não merecem reforma, embora seja possível discordar da linha argumentativa desenvolvida pela origem. 4. O motivo de rever o entendimento sufragado pela sentença reside unicamente no fato de que, por se tratar de demanda que envolve direitos coletivos em sentido lato, há atração do microssistema específico, formado basicamente - mas não exclusivamente - pelas Leis n. 4.717/65 (LAP), 7.347/85 (LACP) e 8.038/90 (CDC). 5. De acordo com a leitura sistemática e teleológica das Leis de Ação Popular e Ação Civil Pública, fica evidente que o reconhecimento da ilegitimidade ativa para o feito jamais poderia conduzir à pura e simples extinção do processo sem resolução de mérito. 6. Isto porque, segundo os arts. 9º da Lei n. 4.717/65 e 5º, § 3º, da Lei n. 7.347/85, compete ao magistrado condutor do feito, em caso de desistência infundada, abrir oportunidade para que outros interessados assumam o pólo ativo da demanda. 7. Embora as referidas normas digam respeito aos casos em que parte originalmente legítima opta por não continuar com o processo, sua lógica é perfeitamente compatível com os casos em que faleça legitimidade a priori ao autor. Dois os motivos que levam a esta assertiva. 8. Em primeiro lugar, colacione-se um motivo dogmático evidente, que diz respeito ao valor essencialmente social que impregna demandas como a presente, a fazer com que o Poder Judiciário deva se esmerar em, sempre que possível, ser condescendente na análise de aspectos relativos ao conhecimento das ações, deixando de lado o apego ao formalismo. 9. Normas específicas do microssistema em comento e indicativas do que a doutrina contemporânea convencionou chamar de princípio da primazia do conhecimento do mérito do processo coletivo é o próprio art. 5º, § 4º, da Lei n. 7.347/85, que é especialização do princípio da instrumentalidade das formas (art. 154 do CPC). Excertos de doutrina especializada. 10. Em segundo lugar, parece necessário lembrar um motivo pragmático. É que, diante da multifacetada gama de legitimados ativos para os feitos coletivos, a extinção sem exame de mérito normalmente implicará apenas na necessidade de ajuizamento de nova demanda, com mesmas causas de pedir e pedidos, o que significa apenas postergar o juízo meritório - a teor da formação de coisa julgada secundum eventum litis e secundum eventum probationis. [...] 15. Recurso especial não provido. (REsp 1177453/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 24/08/2010, DJe 30/09/2010) 

É de se concluir, assim, que o acórdão proferido pelo Tribunal de origem, que deferiu o pedido de substituição processual do polo ativo formulado pelo Polisdec — Instituto Mineiro de Políticas Sociais e de Defesa do Consumidor, sob o fundamento de que esta entidade preenche os requisitos legais para tanto, não comporta censura.

Em arremate, na esteira dos fundamentos acima delineados, acolho os presentes embargos de declaração, para, reconhecida a insubsistência da premissa adotada pelo acórdão recorrido, atribuir-se-lhes efeitos infringentes, para negar provimento ao recurso especial. 

É o voto. 

8 de maio de 2021

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. DEMANDA COLETIVA. EXECUÇÃO INDIVIDUAL. PRAZO PRESCRICIONAL ESPECÍFICO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL

AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1807990 - SP (2019/0097781-2) 

RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI 

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. RAZÕES QUE NÃO ENFRENTAM O FUNDAMENTO DA DECISÃO AGRAVADA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO E SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. DEMANDA COLETIVA. EXECUÇÃO INDIVIDUAL. PRAZO PRESCRICIONAL ESPECÍFICO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PRECEDENTES. NÃO PROVIMENTO. 

1. As razões do agravo interno não enfrentam adequadamente o fundamento da decisão agravada. 

2. Dissídio jurisprudencial não demonstrado nos moldes estabelecidos nos artigos 1.029, § 1°, do Código de Processo Civil de 2015 e 255, parágrafos 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. 

3. “Na falta de dispositivo legal específico para a ação civil pública, aplica-se, por analogia, o prazo de prescrição da ação popular, que é o quinquenal (art. 21 da Lei nº 4.717/1965), adotando-se também tal lapso na respectiva execução, a teor da Súmula nº 150/STF. A lacuna da Lei nº 7.347/1985 é melhor suprida com a aplicação de outra legislação também integrante do microssistema de proteção dos interesses transindividuais, como os coletivos e difusos, a afastar os prazos do Código Civil, mesmo na tutela de direitos individuais homogêneos (pretensão de reembolso dos usuários de plano de saúde que foram obrigados a custear lentes intraoculares para a realização de cirurgias de catarata)” Precedentes. (REsp 1473846/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/2/2017, DJe 24/2/2017). 

4. Agravo interno a que se nega provimento. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Antonio Carlos Superior Tribunal de Justiça Ferreira e Marco Buzzi votaram com a Sra. Ministra Relatora. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Marco Buzzi. 

Brasília, 20 de abril de 2020 (Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Trata-se de agravo interno interposto em face de decisão por meio da qual dei parcial provimento ao recurso especial. 

A parte agravante, em suas razões, reiterou os fundamentos de que a prescrição para a hipótese é trienal, havendo tese firmada sobre o assunto, tanto para a ação originária, quanto para a execução individual. 

Intimada, a parte agravada não apresentou impugnação (fl. 877, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI (Relatora): Observo que os frágeis argumentos desenvolvidos pelo agravante não têm plausibilidade jurídica para infirmar a conclusão da decisão impugnada, visto que apenas reiterados os fundamentos utilizados no recurso especial, razão pela qual o presente recurso não merece prosperar. 

Inicialmente, quanto à apontada prescrição de algumas parcelas na ação ordinária, destaco que, como a própria parte recorrente mencionou, essa transitou em julgado e está acobertada pelo manto da imutabilidade, não podendo ser modificada, sob pena de afronta à segurança jurídica e à imutabilidade da decisão, razão pela qual não merece análise a referida questão, a qual deveria ter sido suscitada oportunamente. 

Confiram os seguintes julgados: AgRg no AREsp 559.047/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 2/10/2014, DJe 23/10/2014; AgInt no REsp 1254015/PR, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/4/2018, DJe 25/4/2018; AgInt no AREsp 1110107/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/2/2018, DJe 5/3/2018. 

Como salientado, tratando-se de ação civil pública, já decidiu esta Corte que, à míngua de disposição legal específica, há de valer o julgador de dispositivo inserido no microssistema das tutelas coletivas, tendo este Tribunal Superior firmado o entendimento de que a prescrição prevista para a ação popular é a que melhor se adequa à situação. 

Reitero, assim, que, a despeito da existência de repetitivo sobre a prescrição trienal para ações de cobrança em face de plano de saúde, esse versou sobre as ações ordinárias individuais, de modo que o entendimento referente à aplicação do prazo quinquenal às tutelas coletivas é específico e, consequentemente, prevalece sobre aquele. 

Para exame: 

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. CUMPRIMENTO INDIVIDUAL DE SENTENÇA PROFERIDA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE DECLAROU A NULIDADE DE CLÁUSULA DE REAJUSTE E A CONDENOU À REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL RECONHECIDO NA DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DA ORA AGRAVANTE. AGRAVO INTERNO QUE ALTERA O PEDIDO E A CAUSA DE PEDIR RECURSAIS PARA PLEITEAR A APLICAÇÃO DE PRESCRIÇÃO TRIENAL. NÃO CONHECIMENTO. AGRAVO INTERNO NÃO CONHECIDO. 1. O direito objetivo superveniente somente será considerado no julgamento da lide se não alterar o pedido e a causa de pedir recursais: "Com efeito, a jurisprudência desta Corte Superior tem admitido a apreciação do fato ou direito que possa influir no julgamento da lide, ainda que em instância extraordinária, desde que não importe a alteração do pedido ou da causa de pedir, porquanto a análise do jus superveniens pode ocorrer até a prolação da decisão final. (Precedentes: REsp 614771/DF, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, DJ 01.02.2006 ; REsp 688151/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJ 08.08.2005; AgRg no Ag 322635/MA, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, DJ 19.12.2003; REsp 12673/RS, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, DJ 21.09.1992.)" (REsp 907.236/CE, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/11/2008, DJe de 1º/12/2008). 2. No presente caso, a agravante, no recurso especial, alegou violação ao art. 205 do Código Civil pelo Tribunal de origem e pleiteou a aplicação do prazo prescricional quinquenal aplicável ao microssistema das ações coletivas, à luz do entendimento jurisprudencial da Corte Especial. A decisão monocrática deu provimento ao recurso especial. Nos embargos de declaração e, posteriormente, em sede de agravo interno, requereu a incidência da prescrição trienal do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil. Utilizou como fundamento o precedente da Segunda Seção, no Recurso Especial repetitivo nº 1.360.969/RS, cujo julgamento ocorreu após a interposição de seu apelo extremo. Alteração do pedido e da causa de pedir recursais que impedem a apreciação do jus superveniens. 3. O não conhecimento do apelo impõe-se, outrossim, pela ausência de prequestionamento do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil. Súmulas 282 e 356 do STF. 4. Agravo interno não conhecido. (AgInt nos EDcl no REsp 1663747/SP, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 13/3/2018, DJe 19/3/2018) 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA DE CATARATA. FALTA DE COBERTURA DE LENTES INTRAOCULARES. CONTRATOS ANTIGOS E NÃO ADAPTADOS. ABUSIVIDADE. DANO MORAL COLETIVO. NÃO OCORRÊNCIA. CONDUTA RAZOÁVEL. ENTENDIMENTO JURÍDICO DA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO. TECNOLOGIA MÉDICA E TÉCNICAS DE INTERPRETAÇÃO DE NORMAS. EVOLUÇÃO. OMISSÃO DA ANS. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRETENSÃO DE REEMBOLSO DOS USUÁRIOS. PRESCRIÇÃO. DEMANDA COLETIVA. PRAZO QUINQUENAL. RESSARCIMENTO AO SUS. AFASTAMENTO. OBSERVÂNCIA DE DIRETRIZES GOVERNAMENTAIS. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se o reconhecimento, em ação civil pública, da abusividade de cláusula de plano de saúde que afastava a cobertura de próteses (lentes intraoculares) ligadas à cirurgia de catarata (facectomia) em contratos anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998 enseja também a condenação por dano moral coletivo. 2. O dano moral coletivo, compreendido como o resultado de uma lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade, se dá quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva (arts. 1º da Lei nº 7.347/1985, 6º, VI, do CDC e 944 do CC, bem como Enunciado nº 456 da V Jornada de Direito Civil). 3. Não basta a mera infringência à lei ou ao contrato para a caracterização do dano moral coletivo. É essencial que o ato antijurídico praticado atinja alto grau de reprovabilidade e transborde os lindes do individualismo, afetando, por sua gravidade e repercussão, o círculo primordial de valores sociais. Com efeito, para não haver o seu desvirtuamento, a banalização deve ser evitada. 4. Na hipótese dos autos, até o início de 2008 havia dúvida jurídica razoável quanto à abusividade da negativa de cobertura das próteses ligadas à facectomia nos contratos de assistência à saúde anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998, somente superada com a revisão de entendimento da ANS sobre o tema, de forma que a operadora, ao ter optado pela restrição contratual, não incorreu em nenhuma prática socialmente execrável; tampouco foi atingida, de modo injustificável, a esfera moral da comunidade. Descaracterização, portanto, do dano moral coletivo: não houve intenção deliberada da demandada em violar o ordenamento jurídico com vistas a obter lucros predatórios em detrimento dos interesses transindividuais dos usuários de plano de saúde. 5. Não há necessidade de condenação da ANS à obrigação de fazer consistente na elaboração de um plano de ação que garanta efetividade ao julgado. Após 15/2/2008 (177ª Reunião da Diretoria Colegiada), nenhuma operadora de plano de saúde pode mais recusar, para os contratos anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998, a cobertura de próteses (lentes intraoculares) ligadas à cirurgia de catarata (facectomia). Logo, as operadoras já terão que se adaptar à novel determinação da agência reguladora, podendo o próprio usuário exercer o controle subsidiariamente. 6. Na falta de dispositivo legal específico para a ação civil pública, aplica-se, por analogia, o prazo de prescrição da ação popular, que é o quinquenal (art. 21 da Lei nº 4.717/1965), adotando-se também tal lapso na respectiva execução, a teor da Súmula nº 150/STF. A lacuna da Lei nº 7.347/1985 é melhor suprida com a aplicação de outra legislação também integrante do microssistema de proteção dos interesses transindividuais, como os coletivos e difusos, a afastar os prazos do Código Civil, mesmo na tutela de direitos individuais homogêneos (pretensão de reembolso dos usuários de plano de saúde que foram obrigados a custear lentes intraoculares para a realização de cirurgias de catarata). Precedentes. 7. Não há falar em ressarcimento ao SUS (art. 32 da Lei nº 9.656/1998) quanto aos custos de implante das lentes intraoculares de usuários que procuraram a Saúde Pública para realizar a cirurgia de catarata, visto que as operadoras de plano de saúde não podem ser sancionadas por seguirem diretrizes da própria Administração. Somente após a revisão de entendimento da ANS a respeito da legalidade da cláusula que afastava a cobertura de próteses ligadas à facectomia em contratos anteriores à edição da Lei nº 9.656/1998 é que poderá ser cobrado da operadora o reembolso pelas despesas feitas a esse título no SUS, e segundo normas expedidas pelo próprio ente governamental regulador. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1473846/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/2/2017, DJe 24/2/2017) 

Portanto, tendo a prescrição quinquenal, mesmo a ação de conhecimento, transitado em julgado em 8/11/11, como alega a recorrente, verifico que o cumprimento de sentença foi proposto dentro do prazo, em 30/11/15. 

Ademais, não se conhece da divergência jurisprudencial, visto que o acórdão firmado no julgamento do REsp n. 1.112.864/MG, julgado pelo rito do artigo 543-C do revogado Código de Processo Civil, não cuidou da hipótese de se tratar de ação civil pública, caso dos autos, de modo que está ausente a necessária semelhança fática entre os casos confrontados, como exige o artigo 1.029, § 1º, do Código de Processo Civil (AgInt no AREsp 1179941/MS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 23/8/2018, DJe 3/9/2018). 

Em face do exposto, nego provimento ao agravo interno. 

É o voto. 

7 de maio de 2021

DIREITO AMBIENTAL. DESASTRE DE BRUMADINHO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE. AÇÃO POPULAR. LEI 4.717/1965. COMPETÊNCIA PARA JULGAR A AÇÃO POPULAR QUANDO JÁ EM ANDAMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICO COM OBJETO ASSEMELHADO. DISTINGUISHING. TEMA AMBIENTAL. FORO DO LOCAL DO FATO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 164.362 - MG (2019/0069556-8) 

RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN 

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DIREITO AMBIENTAL. DESASTRE DE BRUMADINHO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE. AÇÃO POPULAR. LEI 4.717/1965. COMPETÊNCIA PARA JULGAR A AÇÃO POPULAR QUANDO JÁ EM ANDAMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICO COM OBJETO ASSEMELHADO. DISTINGUISHING. TEMA AMBIENTAL. FORO DO LOCAL DO FATO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HISTÓRICO DA DEMANDA 

1. Trata-se, na origem, de Ação Popular proposta por Felipe Torello Teixeira, advogado qualificado nos autos, contra a União, o Distrito Federal, o Estado de Minas Gerais e a Vale S.A., objetivando liminarmente o bloqueio de ativos financeiros dos réus, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais) e, ao final, a confirmação da tutela liminar, cumulada com a declaração de nulidade dos atos comissivos da Vale S.A. e omissivos da União, do Distrito Federal e do Estado de Minas Gerais, bem como a condenação dos réus a: a) recuperar o meio ambiente degradado pelo rompimento da barragem da Vale S.A. no Município de Brumadinho – MG; b) pagar indenização pelos danos materiais e morais decorrentes do desastre, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais); c) a pagar multa civil por dano ambiental, em montante a ser arbitrado por este Juízo. Neste momento, o STJ aprecia apenas o Conflito de Competência. 

2. O juiz suscitado entendeu que o foro competente, na situação específica dos autos, não se enquadraria na regra geral do domicílio do autor, haja vista que, em virtude da defesa do interesse coletivo, o processamento da ação seria mais bem realizado no local da ocorrência do ato que o cidadão pretende ver anulado. O juiz suscitante, por sua vez, defende que o julgamento poderá ser atribuído à Vara Federal do domicílio do peticionante. 

A JURISPRUDÊNCIA DO STJ À LUZ DAS CIRCUNSTÂNCIAS PECULIARES DO CASO CONCRETO 

3. Não se desconhece a jurisprudência do STJ favorável a que, sendo igualmente competentes o juízo do domicílio do autor popular e o do local onde houver ocorrido o dano (local do fato), a competência para examinar o feito é daquele em que menor dificuldade haja para o exercício da Ação Popular. A propósito: CC 47.950/DF, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 7/5/2007, p. 252; CC 107.109/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 18/3/2010. 

4. Malgrado isso, as circunstâncias do caso concreto devem ser analisadas de forma que se ajuste o Direito à realidade. Para tanto, mister recordar os percalços que envolveram a definição da competência jurisdicional no desastre de Mariana/MG, o que levou o STJ a eleger um único juízo para todas as ações, de maneira a evitar decisões conflitantes e possibilitar que a Justiça se realize de maneira mais objetiva, célere e harmônica. 

5. A hipótese dos autos apresenta inegáveis peculiaridades que a distinguem dos casos anteriormente enfrentados pelo STJ, o que impõe adoção de solução mais consentânea com a imprescindibilidade de se evitar tumulto processual em demanda de tamanha magnitude social, econômica e ambiental. Assim, necessário superar, excepcionalmente, a regra geral contida nos precedentes invocados, nos moldes do que dispõe o art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015. De fato a tragédia ocorrida em Brumadinho/MG invoca solução prática diversa, a fim de entregar, da melhor forma possível, a prestação jurisdicional à população atingida. Impõe-se, pois, ao STJ adotar saída pragmática que viabilize resposta do Poder Judiciário aos que sofrem os efeitos da inominável tragédia. 

DISTINGUISHING: AÇÃO POPULAR ISOLADA E AÇÃO POPULAR EM COMPETIÇÃO COM AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBJETO ASSEMELHADO 

6. A solução encontrada é de distinguishing à luz de peculiaridades do caso concreto e não de revogação universal do entendimento do STJ sobre a competência para a ação popular, precedentes que devem ser mantidos, já que lastreados em sólidos e atuais fundamentos legais e justificáveis argumentos políticos, éticos e processuais. 

9 [7]. Assim, a regra geral do STJ não será aplicada aqui, porque deve ser usada quando a Ação Popular for isolada. Contudo, na atual hipótese, tem-se que a Ação Popular estará competindo e concorrendo com várias outras Ações Populares e Ações Civis Públicas, bem como com centenas, talvez milhares, de ações individuais, razão pela qual, em se tratando de competência concorrente, deve ser eleito o foro do local do fato. 

AÇÃO POPULAR EM TEMAS AMBIENTAIS 

8. Deveras a Lei de Ação Popular (Lei 4.717/1965) não contém regras de definição do foro competente. À época de sua edição, ainda não vigorava a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985); portanto se utilizava, até então, o CPC, subsidiariamente. Todavia, com a promulgação da retromencionada Lei 7.347/1985, a aplicação subsidiária do CPC passou a ser reservada àqueles casos para os quais as regras próprias do processo coletivo também não se revelassem suficientes. 

9. Nesse contexto, a definição do foro competente para a apreciação da Ação Popular, máxime em temas como o de direito ambiental, reclama a aplicação, por analogia, da regra pertinente contida no artigo 2º da Lei da Ação Civil Pública. Tal medida se mostra consentânea com os princípios do Direito Ambiental, por assegurar a apuração dos fatos pelo órgão judicante que detém maior proximidade com o local do dano e, portanto, revela melhor capacidade de colher as provas de maneira célere e de examiná-las no contexto de sua produção. 

10. É verdade que, ao instituir a Ação Popular, o legislador constituinte buscou privilegiar o exercício da fiscalização e da própria democracia pelo cidadão. Disso não decorre, contudo, que as Ações Populares devam ser sempre distribuídas no foro mais conveniente a ele; neste caso, o de seu domicílio. Isso porque, casos haverá, como o destes autos, em que a defesa do interesse coletivo será mais bem realizada no local do ato que, por meio da ação, o cidadão pretenda ver anulado. Nessas hipóteses, a sobreposição do foro do domicílio do autor ao foro onde ocorreu o dano ambiental acarretará prejuízo ao próprio interesse material coletivo tutelado por intermédio desta ação, em benefício do interesse processual individual do cidadão, em manifesta afronta à finalidade mesma da demanda por ele ajuizada. 

AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA O AUTOR DA AÇÃO POPULAR 

11. Cumpre destacar que, devido ao processamento eletrônico, as dificuldades decorrentes da redistribuição para local distante do domicílio do autor são significativamente minimizadas, se não totalmente afastadas, em decorrência da possibilidade de acesso integral aos autos por meio do sistema de movimentação processual. 

COMPETÊNCIA DO LOCAL DO FATO 

12. Na presente hipótese, é mais razoável determinar que o foro competente para julgamento desta Ação Popular seja o do local do fato. Logo, como medida para assegurar a efetividade da prestação jurisdicional e a defesa do meio ambiente, entende-se que a competência para processamento e julgamento do presente feito é da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais. 

CONCLUSÃO 

13. Conflito de Competência conhecido para declarar competente o Juízo suscitante. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça: ""Prosseguindo no jugamento, a Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Juízo da 17a. Vara da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais, o suscitante, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa e Gurgel de Faria votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente o Sr. Ministro Og Fernandes e, ocasionalmente, o Sr. Ministro Francisco Falcão." 

Brasília, 12 de junho de 2019(data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Cuida-se de Conflito Negativo de Competência instaurado entre o Juízo da 2ª Vara Federal de Campinas (SP), suscitado, e o da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais, suscitante, para processar e julgar o feito 1001868-13.2019.4.01.3800. 

Trata-se, na origem, de Ação Popular proposta por Felipe Torello Teixeira, advogado qualificado nos autos, contra a União, o Distrito Federal, o Estado de Minas Gerais e a Vale S.A., objetivando liminarmente o bloqueio de ativos financeiros dos réus no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais), e, ao final, a confirmação da tutela liminar, cumulada com a declaração de nulidade dos atos comissivos da Vale S.A. e omissivos da União, do Distrito Federal e do Estado de Minas Gerais, bem como a condenação dos réus: (1) a recuperar o meio ambiente degradado pelo rompimento da barragem da Vale S.A. no Município de Brumadinho – MG; (2) a pagar indenização compensatória dos danos materiais e morais, decorrentes do referido rompimento, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais); (3) a pagar multa por dano ambiental, em montante a ser arbitrado por este Juízo. 

O juiz suscitado entendeu que o foro competente, na situação específica dos autos, não se enquadra na regra geral do domicílio do autor, haja vista que, em virtude da defesa do interesse coletivo, o processamento da ação seria mais bem realizado no local da ocorrência do ato que o cidadão pretende ver anulado. 

O juiz suscitante, por sua vez, defende que o julgamento poderá ser atribuído à Vara Federal do domicílio do peticionante. 

Parecer do Ministério Público, opinando pela competência do Juízo suscitado, às fls. 74-79. Cita-se sua ementa: Conflito Negativo de Competência. Ação Popular. Inteligência dos artigos 5º, inciso LXXIII, 109, §2º, ambos da CF/88; 51, § único, 52, § único, do CPC/2015, e 5º, §1º, da Lei 4.717/65. 

Competência Territorial. Aplicação do Princípio da “Perpetuatio Jurisdicionis”. Sendo igualmente competentes os Juízos do domicílio do autor ou onde houver ocorrido o dano (local do fato), o conflito encontra solução no princípio da “perpetuatio jurisdicionis. ” Precedentes. Parecer pelo conhecimento do conflito, proclamando-se a competência do Juízo suscitado. 

Na seção de julgamento do dia 22/5/2019, o Min. Og Fernandes apresentou voto-vogal, com a proficiência que lhe é costumeira, entendendo ser competente o Juízo suscitante. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Os autos foram recebidos neste Gabinete em 16.4.2019. Voto realinhado após debates realizados na sessão de julgamento da Primeira Sessão de 22.5.2019, e voto-vogal lavrado pelo eminente Ministro Og Fernandes. 

Na instância de origem, o autor da ação pleiteou o deferimento de liminar para bloqueio de ativos financeiros dos réus no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais). 

Contudo, neste momento, o STJ aprecia apenas o Conflito de Competência. 

A respeito da competência para analisar este tipo de ação, verifica-se que há discussão acerca da possibilidade de os cidadãos ingressarem com pretensões do mesmo gênero por todo o Brasil, com decisões divergentes. E, por outro lado, questiona-se a existência do interesse do cidadão de ingressar com o remédio constitucional, com maior facilidade, em seu próprio domicílio. 

Portanto, cabe, no presente Conflito, determinar o foro competente para tanto: se o do local em que se consumou o ato danoso ou o do domicílio do autor. 

Dispõe a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, LXXIII, que "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Tal ação é regulada pela Lei 4.717/1965, recepcionada pela Carta Magna. 

Dessarte, o art. 5º da referida norma legal determina que a competência para processamento e julgamento da Ação Popular será aferida considerando-se a origem do ato impugnado. Assim, caberá à Justiça Federal apreciar a controvérsia se houver interesse da União; e à Justiça Estadual se o interesse for dos Estados ou dos Municípios. A citada Lei 4.717/1965, entretanto, em nenhum momento fixa o foro em que a Ação Popular deve ser ajuizada, dispondo, apenas, no art. 22, serem aplicáveis as regras do Código de Processo Civil naquilo em que não contrarie os dispositivos da lei, nem a natureza específica da ação. Portanto, para fixar o foro competente para apreciar a ação em comento, mostra-se necessário considerar o objetivo maior da Ação Popular, isto é, o que esse instrumento, previsto na Carta Magna e colocado à disposição do cidadão, visa proporcionar. 

Consoante a doutrina, o direito do cidadão de promover a Ação Popular constitui um direito político fundamental, da mesma natureza de outros direitos políticos previstos na Constituição Federal. 

A Ação Popular caracteriza um instrumento que garante à coletividade a oportunidade de fiscalizar os atos praticados pelos governantes, de modo que possa impugnar qualquer medida tomada que cause danos à sociedade como um todo, ou seja, visa proteger direitos transindividuais. Não pode, por conseguinte, o exercício desse direito sofrer restrições, isto é, não se pode admitir a criação de entraves que venham a inibir a atuação do cidadão na proteção de interesses que dizem respeito a toda a coletividade. 

Não se desconhece a jurisprudência do STJ segundo a qual, sendo igualmente competentes o juízo do domicílio do autor e o do local onde houver ocorrido o dano (local do fato), a competência para examinar o feito em tela é daquele em que menor dificuldade haja para o exercício da Ação Popular. 

A propósito: 

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO POPULAR AJUIZADA EM FACE DA UNIÃO. LEI 4.717/65. POSSIBILIDADE DE PROPOSITURA DA AÇÃO NO FORO DO DOMICÍLIO DO AUTOR. APLICAÇÃO DOS ARTS. 99, I, DO CPC, E 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Não havendo dúvidas quanto à competência da Justiça Federal para processar e julgar a ação popular proposta em face da União, cabe, no presente conflito, determinar o foro competente para tanto: se o de Brasília (local em que se consumou o ato danoso), ou do Rio de Janeiro (domicílio do autor). 2. A Constituição Federal de 1988 dispõe, em seu art. 5º, LXXIII, que "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência". Tal ação é regulada pela Lei 4.717/65, recepcionada pela Carta Magna. 3. O art. 5º da referida norma legal determina que a competência para processamento e julgamento da ação popular será aferida considerando-se a origem do ato impugnado. Assim, caberá à Justiça Federal apreciar a controvérsia se houver interesse da União, e à Justiça Estadual se o interesse for dos Estados ou dos Municípios. A citada Lei 4.717/65, entretanto, em nenhum momento fixa o foro em que a ação popular deve ser ajuizada, dispondo, apenas, em seu art. 22, serem aplicáveis as regras do Código de Processo Civil, naquilo em que não contrariem os dispositivos da Lei, nem a natureza específica da ação. Portanto, para se fixar o foro competente para apreciar a ação em comento, mostra-se necessário considerar o objetivo maior da ação popular, isto é, o que esse instrumento previsto na Carta Magna, e colocado à disposição do cidadão, visa proporcionar. 4. Segundo a doutrina, o direito do cidadão de promover a ação popular constitui um direito político fundamental, da mesma natureza de outros direitos políticos previstos na Constituição Federal. Caracteriza, a ação popular, um instrumento que garante à coletividade a oportunidade de fiscalizar os atos praticados pelos governantes, de modo a poder impugnar qualquer medida tomada que cause danos à sociedade como um todo, ou seja, visa a proteger direitos transindividuais. Não pode, por conseguinte, o exercício desse direito sofrer restrições, isto é, não se pode admitir a criação de entraves que venham a inibir a atuação do cidadão na proteção de interesses que dizem respeito a toda a coletividade. 5. Assim, tem-se por desarrazoado determinar-se como foro competente para julgamento da ação popular, na presente hipótese, o do local em que se consumou o ato, ou seja, o de Brasília. Isso porque tal entendimento dificultaria a atuação do autor, que tem domicílio no Rio de Janeiro. 6. Considerando a necessidade de assegurar o cumprimento do preceito constitucional que garante a todo cidadão a defesa de interesses coletivos (art. 5º, LXXIII), devem ser empregadas as regras de competência constantes do Código de Processo Civil - cuja aplicação está prevista na Lei 4.717/65 -, haja vista serem as que melhor atendem a esse propósito. 7. Nos termos do inciso I do art. 99 do CPC, para as causas em que a União for ré, é competente o foro da Capital do Estado. Esse dispositivo, todavia, deve ser interpretado em conformidade com o § 2º do art. 109 da Constituição Federal, de modo que, em tal caso, "poderá o autor propor a ação no foro de seu domicílio, no foro do local do ato ou fato, no foro da situação do bem ou no foro do Distrito Federal" (PIZZOL, Patrícia Miranda. "Código de Processo Civil Interpretado", Coordenador Antônio Carlos Marcato, São Paulo: Editora Atlas, 2004, p. 269). Trata-se, assim, de competência concorrente, ou seja, a ação pode ser ajuizada em quaisquer desses foros. 8. Na hipótese dos autos, portanto, em que a ação popular foi proposta contra a União, não há falar em incompetência, seja relativa, seja absoluta, do Juízo Federal do domicílio do demandante. 9. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo da 10ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, o suscitado. (CC 47.950/DF, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ 7/5/2007, p. 252) 

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO POPULAR AJUIZADA CONTRA ATO DO PRESIDENTE DO BNDES, QUE, POR DISCIPLINA LEGAL, EQUIPARA-SE A ATO DA UNIÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, § 1º DA LEI 4.717/65. APLICAÇÃO DOS ARTS. 99, I, DO CPC, E 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. PRINCÍPIO DA PERPETUATIO JURISDICTIONIS. 1. Debate-se a respeito da competência para julgamento de ação popular proposta contra o Presidente do Sistema BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, empresa pública federal. Não se questiona, portanto, a competência da Justiça Federal para processamento e julgamento do feito, mas busca-se a fixação da Seção Judiciária competente, se a do Rio de Janeiro (suscitante), ou de Brasília (suscitada). 2. "O art. 5º da referida norma legal [Lei 4.717/65] determina que a competência para processamento e julgamento da ação popular será aferida considerando-se a origem do ato impugnado. Assim, caberá à Justiça Federal apreciar a controvérsia se houver interesse da União, e à Justiça Estadual se o interesse for dos Estados ou dos Municípios. A citada Lei 4.717/65, entretanto, em nenhum momento fixa o foro em que a ação popular deve ser ajuizada, dispondo, apenas, em seu art. 22, serem aplicáveis as regras do Código de Processo Civil, naquilo em que não contrariem os dispositivos da Lei, nem a natureza específica da ação. Portanto, para se fixar o foro competente para apreciar a ação em comento, mostra-se necessário considerar o objetivo maior da ação popular, isto é, o que esse instrumento previsto na Carta Magna, e colocado à disposição do cidadão, visa proporcionar" (CC 47.950/DF, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, DJU de 07.05.07). 3. Partindo da análise da importância da ação popular como meio constitucional posto à disposição "de qualquer cidadão" para defesa dos interesses previstos no inc. LXXIII do art. 5º da Constituição Federal/88, concluiu a Primeira Seção desta Corte pela impossibilidade de impor restrições ao exercício desse direito, terminando por fixar a competência para seu conhecimento consoante as normas disciplinadas no Código de Processo Civil em combinação com as disposições constitucionais. 4. Ato de Presidente de empresa pública federal equipara-se, por disciplina legal (Lei 4.717/65, art. 5º, § 1º), a ato da União, resultando competente para conhecimento e julgamento da ação popular o Juiz que "de acordo com a organização judiciária de cada Estado, o for para as causas que interessem à União" (Lei 4.717/65, art. 5º, caput). 5. Sendo igualmente competentes os Juízos da seção judiciária do domicílio do autor, daquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, do Distrito Federal, o conflito encontra solução no princípio da perpetuatio jurisdicionis. 6. Não sendo possível a modificação ex officio da competência em razão do princípio da perpetuatio jurisdicionis, a competência para apreciar o feito em análise é do Juízo perante o qual a demanda foi ajuizada, isto é, o Juízo Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, o suscitado. 7. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, o suscitado. (CC 107.109/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 18/3/2010) 

Não se pretende aqui revogar o retromencionado entendimento do STJ sobre a competência, haja vista ser ele indubitavelmente legal e ancorado em precedentes. Mas deve ser realizado um distinguishing, ante as peculiaridades do caso que levam a que se proceda a este julgamento nos termos da eficiência e da eficácia que se deseja no caso desses processos e com a complexidade inerente. 

Desse modo, a regra geral do STJ não será aplicada aqui, porque deve ser usada quando a Ação Popular for isolada. Contudo, na atual hipótese, tem-se que a Ação Popular estará competindo e concorrendo com várias outras Ações Populares e Ações Civis Públicas, bem como com centenas, talvez milhares, de ações individuais. 

Malgrado isso, as circunstâncias do caso concreto devem ser analisadas de forma que se ajuste o Direito à realidade. Para tanto, mister recordar dos percalços que envolvem a competência jurisdicional para apreciar o desastre de Mariana/MG, o que levou o STJ a eleger um único juízo para julgar todas as ações que versassem sobre o tema, precisamente um Juízo Federal em Minas Gerais, para evitar decisões conflitantes e possibilitar que a Justiça possa ser realizada de maneira mais objetiva. 

Assim, consoante o ínclito Min. Og Fernandes, em seu voto-vogal, a presente hipótese apresenta peculiaridades que a distinguem dos feitos anteriormente enfrentados pelo STJ, de modo que fica superada a regra geral contida nos precedentes invocados, nos moldes no que dispõe o art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015. De fato a tragédia sem precedentes ocorrida em Brumadinho/MG traz à tona a necessidade de solução prática diversa, a fim de entregar, da melhor forma possível, a prestação jurisdicional à população atingida. Impõe-se ao STJ adotar saída pragmática que viabilize uma resposta do Poder Judiciário aos que sofrem os efeitos da inominável tragédia. 

Deveras a Lei 4.717/1965 não contém regras de definição do foro competente para o processamento das Ações Populares. À época de sua edição, ainda não vigorava a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), portanto utilizava-se até então o CPC, subsidiariamente. Todavia, com a promulgação da retromencionada Lei 7.347/1985, a aplicação subsidiária do CPC passou a ser reservada àqueles casos para os quais as regras próprias do processo coletivo também não se revelassem suficientes. 

Por conseguinte, a definição do foro competente para a apreciação da Ação Popular, máxime em temas como o de direito ambiental, reclama a aplicação, por analogia, da regra pertinente contida no seu artigo 2º: 

Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa. Parágrafo único. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001). 

Tal medida se mostra consentânea com os princípios do Direito Ambiental, por assegurar a apuração dos fatos pelo órgão judicante que detém maior proximidade com o local do dano e, portanto, revela melhor capacidade de colher as provas de maneira célere e de examiná-las no contexto de sua produção. 

É verdade que, ao instituir a Ação Popular, o legislador constituinte buscou privilegiar o exercício da fiscalização e da própria democracia pelo cidadão. 

Disso não decorre, contudo, que as Ações Populares devam ser sempre distribuídas no foro mais conveniente a ele; no caso, o de seu domicílio. Isso porque casos haverá, como o destes autos, em que a defesa do interesse coletivo será mais bem realizada no local do ato que, por meio da ação, o cidadão pretenda ver anulado. Nessas hipóteses, a sobreposição do foro do domicílio do autor ao foro onde ocorreu o dano ambiental acarretará prejuízo ao próprio interesse material coletivo tutelado por intermédio dessa ação, em benefício do interesse processual individual do cidadão, em manifesta afronta à finalidade mesma da demanda por ele ajuizada. 

No sentido do exposto, cito Celso Antônio Pacheco Fiorillo (Princípios do Direito Processual Ambiental, 4ª edição, São Paulo, Saraiva, 2010, p. 224), para quem, 

“tratando-se de meio ambiente, as regras de fixação de competência serão orientadas pela Lei da Ação Civil Pública e pelo Código de Defesa do Consumidor, de maneira que será competente para o julgamento da ação popular o juízo do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, independente de onde o ato teve sua origem.” O referido autor reputa absoluta a competência mencionada, acrescentando (p. 169): 

Determina o art. 2º da Lei da Ação Civil Pública que o juízo competente para processar e julgar ações coletivas ambientais é o do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano. Trata-se de competência funcional, portanto, absoluta, que não pode ser prorrogada por vontade das partes e, se inobservada, acarreta a nulidade dos atos processuais decisórios (art. 113, § 2º, do CPC) e enseja, após o trânsito em julgado (respeitado o prazo de 2 anos), a propositura de ação rescisória, com fundamento no art. 485, II, do Código de Processo Civil. 

Também, para comentar a natureza absoluta da competência em questão, trago Hugo Nigro Mazzilli (A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses, 25ª edição, São Paulo, Saraiva, 2012, p. 292): 

Diz a LACP que a competência para as ações civis públicas é funcional, do foro do local do dano. Como não foram sequer instituídos juízos com competência funcional para a defesa de interesses difusos ou coletivos, a nosso ver, quis a lei desde já assegurar que a competência nessas ações, embora fixada em razão do local do dano, é absoluta e, portanto, inderrogável e improrrogável por vontade das partes. 

Cumpre destacar, por fim, que, devido ao processamento eletrônico, as dificuldades decorrentes da redistribuição para local distante do domicílio do autor são significativamente minimizadas, se não totalmente afastadas, em decorrência da possibilidade de acesso integral aos autos por meio do sistema de movimentação processual. 

Assim, tem-se que, na presente hipótese, é mais razoável determinar que o foro competente para julgamento desta Ação Popular seja o do local do fato. Logo, como medida para assegurar a efetividade da prestação jurisdicional e a defesa do meio ambiente, entende-se que a competência para processamento e julgamento do presente feito é da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais. 

Pelo exposto, conhece-se do Conflito para declarar competente o Juízo suscitante. 

É o voto. 

VOTO-VOGAL 

O EXMO. SR. MINISTRO OG FERNANDES: Peço vênia para divergir do eminente Relator. Explico. 

O Min. Relator conclui pela competência do juízo suscitado (o Juízo Federal da 2ª Vara de Campinas-SP), como se lê na ementa: 

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DESASTRE DE BRUMADINHO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE. AÇÃO POPULAR. LEI 4.717/1965. POSSIBILIDADE DE PROPOSITURA DA AÇÃO NO FORO DO DOMICÍLIO DO AUTOR. APLICAÇÃO DOS ARTS. 99, I, DO CPC, E 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA PERPETUATIO JURISDICTIONIS. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Na instância de origem, o autor da ação pleiteou o deferimento de liminar para bloqueio de ativos financeiros dos réus, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais), para indenizar os prejuízos sofridos no desastre de Brumadinho. Contudo, neste momento, o STJ aprecia apenas o Conflito de Competência. 2. Trata-se, na origem, de Ação Popular proposta por Felipe Torello Teixeira, advogado qualificado nos autos, contra União, Distrito Federal, Estado de Minas Gerais e Vale S.A., objetivando liminarmente o bloqueio de ativos financeiros dos réus, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais), e, ao final, a confirmação da tutela liminar, cumulada com a declaração de nulidade dos atos comissivos da Vale S.A. e omissivos da União, do Distrito Federal e do Estado de Minas Gerais, bem como a condenação dos réus: (1) à recuperação do meio ambiente degradado pelo rompimento da barragem da Vale S.A. no Município de Brumadinho – MG; (2) ao pagamento de indenização compensatória dos danos materiais e morais decorrentes do referido rompimento, no valor de R$ 4.000.000.000,00 (quatro bilhões de reais); (3) ao pagamento de multa por dano ambiental, em montante a ser arbitrado por este Juízo. 3. O juiz suscitado entendeu que o foro competente, na situação específica dos autos, não seria a regra geral do domicílio do autor, haja vista que, em virtude da defesa do interesse coletivo, o processamento da ação seria mais bem realizado no local da ocorrência do ato que, por meio da ação, o cidadão pretende anular. O juiz suscitante, por sua vez, defende que o julgamento poderá ser atribuído à Vara Federal do domicílio do peticionante. IMPOSSIBILIDADE DE RESTRINGIR A AÇÃO POPULAR 4. Partindo da análise da importância da Ação Popular como meio constitucional posto à disposição "de qualquer cidadão" para defesa dos interesses previstos no inc. LXXIII do art. 5º da Constituição Federal/1988, concluiu a Primeira Seção do STJ pela impossibilidade de impor restrições ao exercício desse direito, terminando por fixar a competência para seu conhecimento consoante as normas disciplinadas no Código de Processo Civil em combinação com as disposições constitucionais. Assim, nos termos do inciso I do art. 99 do CPC, para as causas em que a União for ré, é competente o foro da Capital do Estado. Esse dispositivo, todavia, deve ser interpretado em conformidade com o § 2º do art. 109 da Constituição Federal, de modo que, em tal caso, "poderá o autor propor a ação no foro de seu domicílio, no foro do local do ato ou fato, no foro da situação do bem ou no foro do Distrito Federal". Trata-se, assim, de competência concorrente, ou seja, a ação pode ser ajuizada em quaisquer desses foros (CC 47.950/DF, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 7/5/2007, p. 252). PRINCÍPIO DA PERPETUATIO JURISDICIONIS 5. O STJ já apresentou seu entendimento sobre a matéria ao julgar caso que guarda similitude com o presente, no sentido de que, sendo igualmente competentes os Juízos do domicílio do autor ou onde houver ocorrido o dano (local do fato), o conflito encontra solução no princípio da perpetuatio jurisdicionis (CC 107.109/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 18/3/2010). COMPETÊNCIA TERRITORIAL 6. Com efeito, não sendo possível a modificação ex officio da competência em razão do princípio da perpetuatio jurisdicionis, a competência para examinar o feito em tela é do Juízo perante o qual a demanda foi ajuizada, isto é, o Juízo Federal da 2ª Vara de Campinas – SJ/SP, o suscitado. CONCLUSÃO 7. Conflito de Competência conhecido para declarar competente o Juízo suscitado.” (grifos no original) 

Note-se que o eminente Relator embasa seu voto em dois fundamentos principais: 1) "o direito do cidadão de promover a Ação Popular constitui um direito político fundamental, da mesma natureza de outros direitos políticos previstos na Constituição Federal" e "tem-se por desarrazoado determinar-se como foro competente para julgamento da Ação Popular, na presente hipótese, o do local em que se consumou o ato. Isso porque tal entendimento dificultaria a atuação do autor, que vive em outro domicílio"; 2) a Primeira Seção tem precedentes no sentido da possibilidade de eleição de foro de domicílio do autor nas ações em que a União ou Estado forem os demandados, como, de fato, ocorreu no caso vertente. 

O caso concreto, no entanto, apresenta peculiaridades que o distinguem dos feitos anteriormente enfrentados por esta Corte Superior, de modo a superar a regra geral contida nos precedentes invocados pelo Min. Relator, nos moldes do que dispõe o art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015. 

De fato, a tragédia sem precedentes ocorrida em Brumadinho/MG traz à tona a necessidade de solução prática diversa, a fim de entregar a prestação jurisdicional à população atingida da melhor forma possível. 

Entendo que a fixação do local em que se consumou o ato como foro competente para julgamento da ação popular não representa restrição ao manejo desse tipo especial de ação. Isso porque a ação popular prosseguirá, apenas não tramitando no domicílio do autor. A dificuldade de participação do autor na instrução é muito menos danosa do que o incremento nos custos financeiros e nas dificuldades da realização da instrução no feito em tela. 

A existência de foros concorrentes no art. 109, § 2º, da Constituição Federal, e nos arts. 51 e 52 do CPC/2015, não deve ser interpretado como uma regra absoluta, podendo sofrer restrições, como a que penso devamos realizar no caso concreto. 

A distância de Brumadinho/MG a Campinas/SP é de cerca de 540 km, o que dificultaria sobremaneira a produção da prova, lembrando que a instrução probatória no presente feito é de extrema complexidade técnica e envolve um número avassalador de vítimas. A distância de Brumadinho/MG a Belo Horizonte/MG, por outro lado, é de apenas 60 km. 

O apego a tecnicalidades jurídicas, no presente caso, resultaria em um imenso prejuízo ao interesse público e à participação dos cidadãos em sua defesa, justamente o contrário do que a previsão de foros concorrentes pretende evitar. 

Impõe-se ao STJ, segundo penso, a adoção de uma solução pragmática que viabilize uma resposta do Poder Judiciário à população que sofre os efeitos da inominável tragédia. 

Assim, rogando vênias por divergir do Exmo. Min. Relator, voto pela competência do juízo suscitante (17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais) para o processamento e julgamento do presente processo. 

É como voto. 

VOTO-VOGAL 

MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES: Senhor Presidente, quero registrar que acompanho o Ministro HERMAN BENJAMIN, na solução dada a esse caso. 

Efetivamente, estamos dando aqui uma solução análoga e consentânea com aquela que foi dada em relação às ações do desastre ambiental de Mariana. O local do dano, no caso, é onde se encontra todo o objeto da prova a ser colhida. 

Penso que é a solução, além de coerente com a dada ao desastre de Mariana, a mais adequada ao deslinde dos vários processos que gravitam em torno do trágico desastre. 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.804.186 - SC (2019/0086132-7) 

RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS ESPECIAIS REPRESENTATIVOS DA CONTROVÉRSIA. TEMA 1.029/STJ. RESP 1.804.186/SC E RESP 1.804.188/SC. AÇÃO COLETIVA. EXECUÇÃO. COMPETÊNCIA E RITO. JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. LEI 12.153/2009. IMPOSSIBILIDADE. 

IDENTIFICAÇÃO DA CONTROVÉRSIA 

1. O tema repetitivo ora controvertido (1.029/STJ) consiste em estabelecer a "aplicabilidade do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009) ao Cumprimento de Sentença individual oriundo de Ação Coletiva que seguiu o procedimento ordinário em Vara da Fazenda Pública, independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro competente". 

EXAME DO TEMA REPETITIVO 

2. Na hipótese tratada no presente tema repetitivo, o Tribunal de origem assentou que, por ser absoluta a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (§ 4º do art. 2º da Lei 12.153/2009), o cumprimento de sentença oriundo de Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial instalado na comarca competente. 

3. Com relação à execução de sentenças coletivas, o STJ firmou a compreensão, sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, de que "a liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC.)" (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011). 

4. Também está sedimentado na jurisprudência do STJ o entendimento de que, uma vez instalado Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública, conforme o caso, e se o valor da causa for inferior ao da alçada, a competência é absoluta. Apenas como exemplo: REsp 1.537.768/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 20.8.2019, DJe de 5.9.2019. 

5. A questão que emerge do tema repetitivo é indagar se é possível ajuizar ação executiva no Juizado Especial da Fazenda Pública relativa a título judicial oriundo de Ação Coletiva, em que se seguiu rito próprio desse tipo de ação. 

6. O art. 2º, § 1º, I, da Lei 12.153/2009 dispõe que não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos, o que é argumento suficiente para excluir a competência executória de sentenças exaradas em Ações Coletivas. 

7. Na mesma lei não há disposição expressa acerca da competência executória dos Juizados da Fazenda Pública, havendo apenas regramento (arts. 12 e 13) do rito da execução de seus próprios julgados. 

8. O art. 27 da Lei 12.153/2009 fixa a aplicação subsidiária do CPC, da Lei 9.099/1995 e da Lei 10.259/2001, os quais se examinam a seguir. 

9. A Lei 9.099/1995, no art. 3º, § 1º, delimita a competência dos Juizados Especiais Cíveis e, por aplicação subsidiária, dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para promoverem a execução "dos seus julgados" e "dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo". 

10. Já o art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, também de aplicação subsidiária aos Juizados Especiais da Fazenda Pública, delimita a competência executória a "executar as suas sentenças". 

11. Por fim, a terceira lei de regramento de aplicação subsidiária, o CPC, estabelece (grifos acrescentados): "Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: I - os tribunais, nas causas de sua competência originária; II - o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; III - o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem". 

12. Vale resgatar a possibilidade, estipulada pelo STJ sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011), de a execução individual de sentença coletiva poder ser proposta no foro do domicílio do exequente, interpretação essa advinda da legislação de tutela dos direitos coletivos e difusos: "A liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo". 

13. Nota-se que a Lei 12.153/2009 e as respectivas normas de aplicação subsidiária determinam que os Juizados Especiais da Fazenda Pública têm competência para apreciar apenas as execuções de seus próprios julgados ou de títulos extrajudiciais. 

14. Por derradeiro, o Código de Defesa do Consumidor, norma que rege a tutela coletiva não só no direito do consumidor, mas de forma subsidiária de todos os tipos de direitos, fixa a competência, para a execução, do juízo da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de execução individual, valendo aqui a regra do domicílio do exequente no caso de juízos com a mesma competência. 

15. Na mesma linha de compreensão aqui traçada, cita-se precedente da Primeira Turma que examina a Lei 10.259/2001 (Juizado Especial Federal), aplicada subsidiariamente à Lei 12.153, ora em exame: "Nos termos do art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, 'Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças.' Extrai-se do referido dispositivo legal que a fixação da competência do JEF, no que se refere às execuções, impõe a conjugação de duas condicionantes: (a) o valor da causa deve ser inferior a 60 (sessenta) salários mínimos; (b) o titulo executivo judicial deve ser oriundo do próprio JEF. Caso concreto em que, nada obstante o valor da causa seja inferior ao referido limite legal, a sentença exequenda foi prolatada nos autos da Ação Ordinária nº 2007.81.00.018120-3, que tramitou na 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará, o que afasta a competência do Juizado Especial Federal Cível para a respectiva execução" (REsp 1.648.895/CE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 7.5.2019, DJe 13.5.2019; grifo acrescentado). 

16. Assim, não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva, muito menos impor o citado rito sumaríssimo ao juízo comum. 

17. O Cumprimento da Sentença coletiva deve obedecer o rito previsto nos arts. 534 e seguintes do CPC/2015; e o fato de o valor da execução ser baixo pode apenas resultar, conforme a quantia, em Requisição de Pequeno Valor para o pagamento do débito (art. 535, § 3º, II, do CPC/2015). 

DEFINIÇÃO DA TESE REPETITIVA 

18. Fixa-se a seguinte tese repetitiva para o Tema 1.029/STJ: "Não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito ordinário, assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo comum da execução." 

RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 

19. A Ação Coletiva tramitou na Vara da Fazenda Pública da Comarca de Blumenau/SC e nela foi intentado o cumprimento de sentença sob o rito do art. 534 e seguintes do CPC/21015. 

20. O Tribunal de origem assentou que o cumprimento de sentença oriundo de Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial instalado na comarca competente. 

21. Essa compreensão está dissonante da aqui estabelecida, devendo o cumprimento de sentença observar o rito dos arts. 534 e seguintes do CPC/2015 na Vara da Fazenda Pública. 

CONCLUSÃO 

22. Recurso Especial provido, sob o rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça: "A Seção, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator. Dr. JOSE LUIS WAGNER, pela parte INTERES.: CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO" 

Brasília, 12 de agosto de 2020(data do julgamento). 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Trata-se de Recurso Especial (art. 105, III, "a", da CF/1988) interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina assim ementado: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL EXECUÇÃO DE SENTENÇA DE AÇÃO COLETIVA. SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DE BLUMENAU. PROMOÇÃO POR DESEMPENHO. ADOÇÃO DO RITO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. PROCEDIMENTO APLICÁVEL. VALOR EXECUTADO ABAIXO DE 60 SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA ABSOLUTA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. A partir de 23 de junho de 2015, ex vi do art. 23 da Lei 12.153/2009, tem-se por incontroverso e indiscutível o funcionamento amplo e irrestrito das unidades dos Juizados especiais da Fazenda Pública em Santa Catarina, de forma autônoma, onde instalado juizado especial fazendário, e concorrente com outra unidade jurisdicional no interior. (Primeiras Conclusões Interpretativas sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública. Grupo de Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, DJe 19.12.2014). Sendo a competência absoluta, o rito procedimental a ser observado, mesmo na hipótese em que não tenha sido instalada a unidade especial do Juizado, será o da Lei n° 12.153/2009. 

A parte recorrente alega: 

Atuando na qualidade de substituto processual, o Sindicato Único dos Trabalhadores no Serviço Público de Blumenau (SINTRASEB) propôs contra o Recorrido uma ação para obrigá-lo a avaliar o desempenho de milhares de servidores públicos substituídos, dentre os quais o (a) Recorrente. Esta ação tramita na 12 Vara da Fazenda Pública da Comarca de Blumenau (SC). O pedido foi julgado procedente e a sentença transitou em julgado em 2006. Na fase de execução, a obrigação de avaliar foi convertida em perdas e danos, com a promoção de todos os servidores substituídos independentemente de avaliação. Na prática, isso significa reajustar o vencimento de cada um deles em 6,09% (seis vírgula zero nove por cento). A decisão que converteu a obrigação de avaliar em perdas e danos foi confirmada pela Primeira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (Agravo de Instrumento n° 2012.022801-4, em setembro de 2013), pela Primeira Turma deste egrégio Superior Tribunal de Justiça (REsp n° 1.484.614 -SC, em fevereiro de 2015) e pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (RE n° 869.149, em novembro de 2015). Todas essas decisões já transitaram em julgado. O (a) Recorrente, a exemplo de centenas de outros servidores públicos substituídos, formulou pedido de cumprimento individual da sentença prolatada na referida ação coletiva. (...) Noutra decisão, tomada por impulso oficial, o Juízo de 1° Grau alterou a competência para o processamento do incidente, fixando a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública, fazendo incidir as disposições da Lei 12.153/2009, pelos seguintes fundamentos: Referida decisão, portanto, alterou a competência para processamento do incidente de cumprimento de sentença, da Vara dos Feitos da Fazenda (onde tramita a ação coletiva) para o Juizado da Fazenda Pública. Considerando a gravidade das consequências da tramitação de uma causa perante juízo incompetente (STJ, 4ª Turma, REsp 1.679.909 -RS, Rel. Min. Luís Felipe Salomão), o (a) Recorrente agravou desta decisão. A PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, em Acórdão assim ementado: (...) Considerando tratar-se de execução individual de sentença proferida em ação coletiva com valor inferior a sessenta salários mínimos, o acórdão recorrido manteve a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública para o processamento do feito, contrariando o que dispõe o art. 516, inciso II, do NCPC, de acordo com o qual o cumprimento de sentença fundada em título judicial deve ser processada perante o juízo que processou a causa. Além disso, ao equiparar um incidente processual (cumprimento de sentença) com uma "causa cível" para fins de fixação da regra de competência, o acórdão recorrido contrariou o art. 2° da Lei 12.153/2009 e o art. 3°, § 1°, inciso I, da Lei n° 9.099/1995 (aplicável subsidiariamente), como será visto a seguir. Ao decidir dessa forma, o acórdão recorrido violou os dispositivos de lei federal vigente (art. 516, II, do NCPC e art. 2° da Lei n° 12.153 e 32, § 1°, inciso 1, da Lei n2 9.099), o que viabiliza o manejo do presente recurso. 

Não foram apresentadas contrarrazões pela parte adversa. 

O Tribunal de origem admitiu o Recurso Especial como representativo da controvérsia. 

O eminente Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, na condição de Presidente da Comissão Gestora de Precedentes do STJ, reconheceu a representatividade da controvérsia e o potencial multiplicador desta e determinou que se dê vista às partes e ao Ministério Público Federal. 

A Primeira Seção submeteu a presente controvérsia ao rito dos recursos repetitivos e assim delimitou a tese controvertida (Tema 1.029/STJ): 

Aplicabilidade do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009) ao Cumprimento de Sentença individual oriundo de Ação Coletiva que seguiu o procedimento ordinário em Vara da Fazenda Pública, independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro competente. 

O Ministério Público Federal emitiu parecer "no sentido de que não seja aplicado o rito dos Juizados Especiais Federais às execuções individuais de sentenças coletivas". 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): 

1. Identificação e delimitação da controvérsia 

O tema ora controvertido (1.029/STJ) consiste em estabelecer a "aplicabilidade do rito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei 12.153/2009) ao Cumprimento de Sentença individual oriundo de Ação Coletiva que seguiu o procedimento ordinário em Vara da Fazenda Pública, independentemente de haver Juizado Especial instalado no foro competente". 

2. Exame do tema repetitivo 

Na hipótese tratada no presente tema repetitivo, o Tribunal de origem assentou que, por ser absoluta a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública (§ 4º do art. 2º da Lei 12.153/2009), o cumprimento de sentença oriundo de Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial instalado na comarca competente. 

Com relação à execução de sentenças coletivas, o STJ firmou a compreensão, sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, de que "a liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC.)" (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011). 

Também está sedimentado na jurisprudência do STJ o entendimento de que, uma vez instalado Juizado Especial Federal ou da Fazenda Pública, conforme o caso, e se o valor da causa for inferior ao da alçada, a competência é absoluta. Apenas como exemplo: REsp 1.537.768/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 20.8.2019, DJe de 5.9.2019. 

A primeira questão que emerge do tema repetitivo é indagar se é possível ajuizar ação executiva no Juizado Especial da Fazenda Pública relativa a título judicial oriundo de Ação Coletiva, em que se seguiu rito próprio desse tipo de ação. 

O art. 2º, § 1º, I, da Lei 12.153/2009 determina que não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos, o que é argumento suficiente para excluir a competência executória de sentenças exaradas em Ações Coletivas. 

Na mesma lei não há disposição expressa acerca da competência executória dos Juizados da Fazenda Pública, havendo apenas regramento (arts. 12 e 13) do rito da execução de seus próprios julgados. 

O art. 27 da Lei 12.153/2009 fixa a aplicação subsidiária do CPC, da Lei 9.099/1995 e da Lei 10.259/2001. 

Por seu turno, a Lei 9.099/1995, no art. 3º, § 1º, define a competência dos Juizados Especiais Cíveis e, por aplicação subsidiária, dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para promoverem a execução "dos seus julgados" e "dos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até quarenta vezes o salário mínimo". 

Já o art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, também de aplicação subsidiária aos Juizados Especiais da Fazenda Pública, delimita a competência executória a "executar as suas sentenças". 

Por fim, a terceira lei de regramento de aplicação subsidiária, o CPC, estabelece: 

Art. 516. O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: I - os tribunais, nas causas de sua competência originária; II - o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição; III - o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral, de sentença estrangeira ou de acórdão proferido pelo Tribunal Marítimo. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem. 

Vale resgatar a possibilidade, estipulada pelo STJ sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.243.887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19.10.2011, DJe de 12.12.2011), de a execução individual de sentença coletiva poder ser ajuizada no foro do domicílio do exequente, interpretação essa advinda da legislação de tutela dos direitos coletivos e difusos. 

Nota-se que a Lei 12.153/2009 e as respectivas normas de aplicação subsidiária definem que os Juizados Especiais da Fazenda Pública têm competência para apreciar apenas as execuções de seus próprios julgados ou de títulos extrajudiciais. 

Por derradeiro, o Código de Defesa do Consumidor, norma que rege a tutela coletiva não só no direito do consumidor, mas de forma subsidiária de todos os tipos de direitos, determina a competência, para a execução, do juízo da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de execução individual, valendo aqui a regra do domicílio do exequente no caso de haver juízos com a mesma competência. 

Na mesma linha de compreensão aqui traçada, cito precedente da Primeira Turma que examina a Lei 10.259/2001 (Juizado Especial Federal), aplicada subsidiariamente à Lei 12.153, ora em exame: 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 60 (SESSENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. IRRELEVÂNCIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. Nos termos do art. 3º, caput, da Lei 10.259/2001, "Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as suas sentenças." 2. Extrai-se do referido dispositivo legal que a fixação da competência do JEF, no que se refere às execuções, impõe a conjugação de duas condicionantes: (a) o valor da causa deve ser inferior a 60 (sessenta) salários mínimos; (b) o titulo executivo judicial deve ser oriundo do próprio JEF. 3. Caso concreto em que, nada obstante o valor da causa seja inferior ao referido limite legal, a sentença exequenda foi prolatada nos autos da Ação Ordinária nº 2007.81.00.018120-3, que tramitou na 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará, o que afasta a competência do Juizado Especial Federal Cível para a respectiva execução. 4. Recurso especial provido para reformar o acórdão recorrido, a fim de reconhecer da competência da Justiça Federal para processar e julgar o presente feito. (REsp 1.648.895/CE, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 7/5/2019, DJe 13/5/2019; grifei) 

Assim, não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva, muito menos impor o rito sumaríssimo ao juízo comum. 

O cumprimento da sentença coletiva deve obedecer o rito previsto nos arts. 534 e seguintes do CPC/2015; e fato de o valor da execução ser baixo pode apenas resultar, conforme a quantia, em requisição de pequeno valor (art. 535, § 3º, II, do CPC/2015). 

3. Definição da tese repetitiva 

Sugiro a fixação da seguinte tese repetitiva para o Tema 1.029/STJ: Não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito ordinário, assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo comum da execução. 

4. Resolução do caso concreto 

A Ação Coletiva tramitou na Vara da Fazenda Pública da Comarca de Blumenau/SC e nela foi intentado o cumprimento de sentença sob o rito do art. 534 e seguintes do CPC/21015. 

O Tribunal de origem assentou que o cumprimento de sentença oriundo de Ação Coletiva em que o valor da causa seja inferior a 60 (sessenta) salários mínimos deve seguir o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009, independentemente de haver Juizado Especial instalado na Comarca competente. 

Essa compreensão está dissonante da aqui fixada, devendo o cumprimento de sentença cumprir o rito dos arts. 534 e seguintes do CPC/2015 na Vara da Fazenda Pública. 

5. Conclusão 

Por todo o exposto, dou provimento ao Recurso Especial e fixo, para os fins dos arts. 1.036 e subsequentes do CPC/2015, esta tese repetitiva, relativa ao Tema 1.029/STJ: "Não é possível propor nos Juizados Especiais da Fazenda Pública a execução de título executivo formado em Ação Coletiva que tramitou sob o rito ordinário, assim como impor o rito sumaríssimo da Lei 12.153/2009 ao juízo comum da execução." 

É como voto.