30 de abril de 2021

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. BEM IMÓVEL INDIVISÍVEL EM REGIME DE COPROPRIEDADE. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO BEM POR INTEIRO. POSSIBILIDADE. ART. 843 DO CPC/2015. CONSTRIÇÃO. LIMITES. QUOTA-PARTE TITULARIZADA PELO DEVEDOR.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.818.926 - DF (2019/0154861-7) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA. BEM IMÓVEL INDIVISÍVEL EM REGIME DE COPROPRIEDADE. ALIENAÇÃO JUDICIAL DO BEM POR INTEIRO. POSSIBILIDADE. ART. 843 DO CPC/2015. CONSTRIÇÃO. LIMITES. QUOTA-PARTE TITULARIZADA PELO DEVEDOR. 

1. Cumprimento de sentença em 10/04/2013. Recurso especial interposto em 01/04/2019 e concluso ao gabinete em 21/08/2019. 

2. O propósito recursal consiste em dizer se, para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível – pertencente ao executado em regime de copropriedade –, é necessária a prévia penhora do bem por inteiro ou, de outro modo, se basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor. 

3. O Código de Processo Civil de 2015, ao tratar da penhora e alienação judicial de bem indivisível, ampliou o regime anteriormente previsto no CPC/1973. 

4. Sob o novo quadro normativo, é autorizada a alienação judicial do bem indivisível, em sua integralidade, em qualquer hipótese de copropriedade. Ademais, resguarda-se ao coproprietário alheio à execução o direito de preferência na arrematação do bem ou, caso não o queira, a compensação financeira pela sua quota-parte, agora apurada segundo o valor da avaliação, não mais sobre o preço obtido na alienação judicial (art. 843 do CPC/15). 

5. Nesse novo regramento, a oposição de embargos de terceiro pelo cônjuge ou coproprietário que não seja devedor nem responsável pelo adimplemento da obrigação se tornou despicienda, na medida em que a lei os confere proteção automática. Basta, de fato, que sejam oportunamente intimados da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do CPC/15, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório. 

6. Ainda, a fim de que seja plenamente resguardado o interesse do coproprietário do bem indivisível alheio à execução, a própria penhora não pode avançar sobre o seu quinhão, devendo ficar adstrita à quota-parte titularizada pelo devedor. 

7. Com efeito, a penhora é um ato de afetação, por meio do qual são individualizados, apreendidos e depositados bens do devedor, que ficarão à disposição do órgão judicial para realizar o objetivo da execução, que é a satisfação do credor. 

8. Trata-se, pois, de um gravame imposto pela atuação jurisdicional do Estado, com vistas à realização coercitiva do direito do credor, que, à toda evidência, não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuais responsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados. 

9. Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos termos do voto do(a) Sr(a) Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 13 de abril de 2021(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por NORIYUKI TAKAHASHI e HARUMI KIMURA TAKAHASHI, com fundamento, exclusivamente, na alínea "a" do permissivo constitucional. 

Ação: de indenização, em fase de cumprimento de sentença, ajuizada pelos recorrentes em desfavor de WRJ ENGENHARIA LTDA e LUCILENE MALAQUIAS DA CUNHA PINHO. 

Decisão interlocutória: indeferiu o pedido formulado pelos recorrentes para que fosse levado a leilão judicial a integralidade do imóvel cuja quota-parte de 50%, pertencente à executada WRJ ENGENHARIA LTDA, fora penhorada nos autos. 

Acórdão: negou provimento ao agravo de instrumento interposto pelos recorrentes, nos termos da seguinte ementa (e-STJ fl. 348): 

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMÓVEL. COPROPRIEDADE. CONDOMÍNIO INDIVISÍVEL. PENHORA. FRAÇÃO IDEAL DE TITULARIDADE DO DEVEDOR EXPROPRIAÇÃO. ALIENAÇÃO JUDICIAL. INTEGRALIDADE DO BEM. IMPOSSIBILIDADE. PRESERVAÇÃO DA COTAPARTE DO CO-PROPRIETÁRIO. OBSERVÂNCIA À PENHORA CONSUMADA. IMPRESCINDIBILIDADE. 1. A constrição judicial incidente sobre a parte do imóvel detido em condomínio indiviso pertencente ao condômino executado é legalmente resguardada, não sobejando possível, contudo, diante do alcance da penhora consumada, a expropriação, via alienação judicial, da integralidade da coisa como se houvesse sido penhorada na sua completude, pois implica a desconsideração do ato constritivo e os limites da medida constritiva, afetando o direito do coproprietário sem que antes tivesse oportunidade de salvaguardar seus interesses (CPC, art. 843). 2. Agravo conhecido e desprovido. Unânime". 

Embargos de declaração: opostos pelos recorrentes, foram rejeitados. 

Recurso especial: alega violação do art. 843 do CPC/15, aos argumentos de que: (i) referido dispositivo legal autoriza o leilão de bem imóvel indivisível, devendo a quota-parte do coproprietário recair sobre o produto da alienação do bem; (ii) a norma não exige que haja a penhora da integralidade do bem para que este seja levado à leilão. 

Juízo de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo TJDFT. 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal consiste em dizer se, para que haja o leilão judicial da integralidade de bem imóvel indivisível – pertencente ao executado em regime de copropriedade –, é necessária a prévia penhora do bem por inteiro ou, de outro modo, se basta a penhora da quota-parte titularizada pelo devedor. 

I. DA EXPROPRIAÇÃO DE BEM INDIVISÍVEL. ARTS. 655-B DO CPC/73 E 843 DO CPC/2015. 

1. Desde a vigência do Código de Processo Civil de 1973, busca o legislador tornar o procedimento de satisfação dos créditos mais efetivo, prestigiando, por meio da remoção de óbices formais e da ampliação das medidas executivas, a tutela do direito em favor do credor. 

2. Dentre as diversas reformas empreendidas no Código revogado, procurou o legislador, por meio de dispositivo da Lei 11.382/06, resolver, no âmbito legal, antigo problema que já enfrentava a jurisprudência dos Tribunais, referente à penhora e alienação de bem indivisível – isto é, aquele que, uma vez fracionado, sofre alteração da substância, diminuição considerável do valor ou prejuízo no uso, ex vi do art. 87 do CC/02 –, pertencente ao executado em regime de copropriedade. 

3. À época, a solução legal se focou na questão do devedor casado, incorporando-se ao CPC/73 o art. 655-B, que passou a autorizar a alienação, por inteiro, do bem indivisível de propriedade comum do devedor e seu cônjuge, protegendo-se a meação deste ao lhe ser destinado parte do valor auferido com a venda. 

4. Veja-se o que dispunha o artigo: “Art. 655-B. Tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem”. 

5. Consoante elucida a doutrina, o objetivo da norma em comento foi, à toda evidência, o de estimular a aquisição do bem indivisível no procedimento de alienação judicial, haja vista que a alternativa – qual seja, a criação de um condomínio entre o cônjuge alheio à execução e o adquirente – despertaria pouco ou quase nenhum interesse entre possíveis licitantes. 

6. Realmente, como já anotava Humberto THEODORO JÚNIOR, a alienação judicial de simples cota ideal do bem comum representa reduzida liquidez, pois é “evidente o quase nenhum interesse despertado entre os possíveis licitantes numa hasta pública em tais condições; e quando algum raro interessado aparece só o faz para oferecer preço muito inferior àquele que se apuraria na alienação total do bem” (Curso de direito processual civil, vol. II, 48ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 318). 

7. Na mesma linha de intelecção, lecionou Fernando da Fonseca GAJARDONI: 

“O motivo que levou a jurisprudência a admitir a alienação integral do bem indivisível – o qual certamente acabou por também convencer o legislador reformador – é evidente: bastante reduzida seria a procura pelo bem, caso o arrematante/adjudicante só pudesse adquirir o domínio de parcela do bem, mantendo, assim, o estado de indivisão da coisa e o condomínio com terceiro não executado (o cônjuge do devedor), no mais das vezes pessoa desconhecida. Aliás, seria uma dupla perda de tempo, obrigando o credor/ arrematante/adjudicante a ajuizar ação de dissolução de condomínio, justamente para se chegar naquela mesma fase processual anterior, que é a da alienação do bem em sua totalidade. Óbvio que a solução anterior era totalmente inadequada, para todos os envolvidos, inclusive com discussões sobre o uso exclusivo do bem por um em detrimento do outro. Aliás, se uma das finalidades da penhora é a alienação do bem para que o seu equivalente monetário venha a satisfazer o crédito do exequente (art. 708, I, do CPC), não havia sentido para que se impusessem óbices à efetiva transformação dos bens do devedor em dinheiro, ainda que, com isso, o cônjuge, em certas condições e preservado o direito ao recebimento de parcela de produto, fosse atingido” (Penhora e expropriação de bem indivisível: pela evolução da jurisprudência do STJ em prol da interpretação potencializada do art. 655-b do CPC. In: O papel da jurisprudência no STJ. São Paulo: RT, 2014, p. 919-934, grifou-se). 

8. Sob o mesmo móvel de proporcionar mais efetividade à execução, ao passo em que se concilia o interesse de quem dela não participa, o Código de Processo Civil de 2015 conservou a norma ora em análise, e, indo além, a ampliou, a fim de abranger outras situações condominiais que não aquela decorrente do regime de casamento. 

9. Com efeito, atualmente, por força do art. 843 do CPC/2015, é admitida a alienação integral do bem indivisível em qualquer hipótese de propriedade em comum, resguardando-se, ao coproprietário ou cônjuge alheio à execução, o equivalente em dinheiro da sua quota-parte no bem. 

10. A propósito, para maior elucidação, confira-se a redação do dispositivo em vigor: 

“Art. 843. Tratando-se de penhora de bem indivisível, o equivalente à quota-parte do coproprietário ou do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem. 

§ 1º É reservada ao coproprietário ou ao cônjuge não executado a preferência na arrematação do bem em igualdade de condições. 

§ 2º Não será levada a efeito expropriação por preço inferior ao da avaliação na qual o valor auferido seja incapaz de garantir, ao coproprietário ou ao cônjuge alheio à execução, o correspondente à sua quota-parte calculado sobre o valor da avaliação”. (grifou-se) 

11. É de se notar, aliás, que o novo diploma processual, para além de estender as hipóteses em que admitida a expropriação de bem indiviso quando há coproprietário alheio à execução, também reforçou a proteção a esse terceiro que não é devedor nem responsável pelo pagamento do débito. 

12. Por um lado, a Lei agora expressamente garante ao coproprietário direito de preferência na arrematação do bem, caso não queira perder sua propriedade mediante a compensação financeira (§ 1º). 

13. Não exercendo tal direito, preserva-se hígido, ainda, o seu patrimônio, mediante a liquidação da sua quota-parte com base no valor da avaliação do imóvel (§ 2º), não mais segundo o preço obtido na alienação judicial, como ocorria no regime anterior. 

14. Deveras, como já se pronunciou essa Corte, “essa nova disposição legal (...) amplia a proteção de coproprietários inalcançáveis pelo procedimento executivo, assegurando-lhes a manutenção integral de seu patrimônio, ainda que monetizado” (REsp 1.728.086/MS, 3ª Turma, DJe 03/09/2019, grifou-se). 

II. DA DISPENSABILIDADE DOS EMBARGOS DE TERCEIRO E DOS LIMITES DA PENHORA. 

15. Sob esse novo quadro normativo, introduzido pelo CPC/2015, desponta ainda outro aspecto relevante acerca da alienação de bem indivisível: a oposição de embargos de terceiro pelo cônjuge ou coproprietário alheio à execução se tornou dispensável, na medida em que a lei lhes confere proteção automática, tanto pela preferência na arrematação do bem, como pela preservação integral do seu patrimônio, se convertido em dinheiro. 

16. É suficiente, de fato, que o coproprietário, seja ele cônjuge ou não, seja oportunamente intimado da penhora e da alienação judicial, na forma dos arts. 799, 842 e 889 do Código, a fim de que lhes seja oportunizada a manifestação no processo, em respeito aos postulados do devido processo legal e do contraditório. 17. Por oportuno, calhar anotar que o art. 674, § 2º, do CPC/2015, ao tratar da legitimidade e do interesse para a oposição de embargos de terceiro, faz referência à defesa do cônjuge ou companheiro quanto aos bens próprios ou de sua meação. Todavia, o dispositivo expressamente ressalva o disposto no art. 843 do Código, indicando, de forma indubitável, a desnecessidade dos embargos do cônjuge ou companheiro quando se tratar da hipótese de constrição de bem indivisível comum. 

18. Confira-se: 

“Art. 674. Quem, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiro. § 1º Os embargos podem ser de terceiro proprietário, inclusive fiduciário, ou possuidor. § 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos: I - o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843 (....)” (grifou-se) 

19. A propósito, ressalte-se que, embora não mencionados no texto do art. 674, § 2º, a ressalva feita ao cônjuge ou companheiro estende-se também aos demais coproprietários de bem indivisível, cuja quota-parte restará invariavelmente protegida, por força do art. 843 do Códex, independentemente de embargos. 

20. De fato, “independentemente do ajuizamento de embargos de terceiro, havendo penhora e alienação de bem indivisível, a meação do cônjuge ou o quinhão de condômino serão preservados (...). Em situações tais, com o escopo de evitar outras impugnações e conferir maior eficácia à execução, optou o legislador por dispensar o ajuizamento de embargos de terceiro, conferindo proteção automática ao cônjuge ou condômino” (BAIOCCO, Elton. In Código de Processo Civil Comentado, Coordenador-Geral José Sebastião Fagundes Cunhas, 1ª ed. em e-book. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, grifou-se). 

21. Com o mesmo entendimento, veja-se também: 

“Defesa da meação. Imóvel divisível. A intimação da penhora de bem imóvel divisível propicia ao cônjuge ou companheiro alheio à execução defender sua meação mediante embargos do executado ou embargos de terceiro. Em se tratando de penhora sobre imóvel indivisível, o cônjuge/companheiro alheio à execução não precisará opor embargos de terceiro para livrar sua meação, pois o produto da alienação lhe será destinado, conforme determina o CPC 843. [...] Reserva da meação/da parte ideal. A providência da norma é de evitar-se o ajuizamento de embargos de terceiro (CPC 674) pelo cônjuge ou companheiro meeiro de imóvel indivisível (...). Com o esvaziamento dos embargos de terceiro, garante-se a meação do cônjuge e evitam-se outras impugnações, de modo a tornar a execução mais célere e eficaz (...). A garantia da meação do cônjuge foi ainda mais reforçada pelo fato de que expressamente se exige, agora, que o valor da expropriação alcance a quota parte daquele (...). O atual CPC estendeu a possibilidade da reserva à parte ideal do coproprietário, nas mesmas condições em que ocorre a reserva da meação” (NERY JÚNIOR, Nelson; ANDRADE, Rosa Maria Nery de. Código de Processo Civil comentado, 3ª ed. em e-book. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1806 e 1.807, grifou-se) 

“Além das pessoas referidas no art. 799 do CPC/2015, devem ser intimados, também, o cônjuge, se presentes as circunstâncias referidas no art. 842 do CPC/2015, e o coproprietário de bem indivisível, quando penhorada fração ideal (art. 889, II do CPC/2015). A intimação, nos casos do cônjuge e do coproprietário, deve ser observada sob pena de violação ao devido processo legal (art. 5.º, LIV da Constituição). Ora, no caso, autoriza a lei, a alienação de quota-parte de terceiro não executado, e o direito do terceiro incidirá sobre o produto da alienação, que tomará por base o valor da avaliação (cf. art. 843, § 2.º do CPC/2015). Impõe-se, portanto, a intimação prévia dessas pessoas (...). As intimações referidas devem ser realizadas com pelo menos cinco dias de antecedência da alienação judicial (cf. art. 889, II e ss., do CPC/2015), considerando-se ineficaz a alienação em relação àquele que deveria ter sido cientificado, caso não realizada a intimação (cf. art. 804 do CPC/2015)” (MEDINA, José Miguel Garcia. Código de processo civil comentado, 4. Ed. em e-book. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020). 

22. Entrementes, impõe destacar que o pleno resguardo do interesse do coproprietário do bem indivisível – inclusive para o fim de tornar desnecessária a oposição de embargos de terceiro –, exige, também, que a própria penhora não avance sobre seu quinhão, limitando-se à quota-parte titularizada pelo devedor. 

23. De fato, não se pode olvidar que “a penhora é um ato de afetação porque sua imediata consequência, de ordem prática e jurídica, é sujeitar os bens por ela alcançados aos fins da execução, colocando-os à disposição do órgão judicial para, à custa e mediante sacrifício desses bens, realizar o objetivo da execução, que é a função pública de dar satisfação ao credor” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, vol. II, 48ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 440, grifou-se). 

24. O ato da penhora, efetivamente, importa individualização, apreensão e depósito dos bens do devedor (arts. 838 e 839 do CPC/15), e, uma vez aperfeiçoado, acarreta a indisponibilidade sobre os bens afetados à execução. Trata-se, à toda evidência, de um gravame imposto pela atuação jurisdicional do Estado, com vistas à realização coercitiva do direito do credor. 

25. Nessa ordem de ideias, é indubitável que esse gravame judicial não pode ultrapassar o patrimônio do executado ou de eventuais responsáveis pelo pagamento do débito, seja qual for a natureza dos bens alcançados. 

26. Daí porque, mesmo em se tratando de bem indivisível, a penhora deve cingir-se à quota-parte pertencente ao devedor, pois somente esta está afetada à execução e, uma vez liquidada, é que se destinará ao pagamento do credor. 

27. Ao coproprietário do bem indivisível até pode ser imposta a extinção do condomínio e a conversão de seu direito real de propriedade pelo equivalente em dinheiro – como visto, por uma necessidade de conferir eficiência ao processo executivo –, porém, até que isso ocorra, quando ultimada a alienação judicial, sua parcela do bem deve permanecer livre e desembaraçada. 

28. Em resumo, como afirma Humberto THEODORO JÚNIOR, “a penhora (...) não vai além da quota ideal do executado. O imóvel é alienado judicialmente por inteiro, como meio de liquidar a quota penhorada” (op. cit., p. 512). 

III. DA HIPÓTESE DOS AUTOS. 

29. A par dessas considerações, verifica-se que, na hipótese dos autos, houve a penhora da fração de 50% de uma loja comercial pertencente à executada WRJ ENGENHARIA LTDA, sendo a fração remanescente de titularidade de terceiro alheio à presente execução (Habra Engenharia Indústria e Comércio Ltda). 

30. Os direitos sobre a quota-parte da executada foram levados a leilão judicial, o qual, todavia, restou frustrado, por ausência de licitantes interessados. 

31. Em razão disso, os credores, ora recorrentes, requereram que o imóvel fosse integralmente submetido à hasta pública, com espeque no já mencionado art. 843 do CPC/15; porém, o pedido foi indeferido pelo juiz do 1º grau de jurisdição. 

32. Em segundo grau, o indeferimento do pedido foi mantido pelo TJDFT, nos seguintes termos: 

“Deflui do preceptivo legal trasladado que afigura-se possível a alienação judicial de imóvel indivisível, desde que a constrição judicial incida sobre a integralidade do bem. Nesse caso, deve ser resguardado ao co-proprietário estranho à execução o produto obtido com a alienação, na proporção de seu domínio. [...] Do alinhado germina a compreensão de que, na hipótese, não se afigura possível a alienação da integralidade do imóvel penhorado, tendo em vista que a penhora recaíra apenas sobre a fração ideal de titularidade da primeira agravada, devendo ser preservada, portanto, a parte do outro co-proprietário, titular de 50% (cinquenta por cento) do domínio. Com efeito, a penhora, no caso, incidira somente sobre esse quinhão, tornando inviável que, no momento da expropriação, seja alienado como se a penhora tivesse alcançado a integralidade da coisa” (e-STJ fls. 351-352, grifou-se). 

33. Como se observa, entendeu o Tribunal de origem que o fato de a penhora ter recaído apenas sobre a quota-parte da executada constituiria óbice à posterior alienação judicial do bem em sua integralidade. 

34. Ocorre que, consoante discorrido neste voto, outra não poderia ser a extensão da penhora que não a precisa parcela pertencente à devedora. 

35. Com efeito, como apenas o quinhão desta responde pela presente execução, não poderia a penhora recair sobre o bem por inteiro, porquanto isso implicaria injusto e desnecessário gravame à quota da coproprietária, até que fosse efetivada a alienação judicial e, com isso, se lhe entregasse o equivalente monetário. 

36. Dessa maneira, não subsiste, na espécie, o mencionado impedimento à alienação do imóvel como um todo, sendo de rigor, portanto, o acolhimento do presente recurso especial. 

Forte nessas razões, CONHEÇO do recurso especial e DOU-LHE PROVIMENTO, para autorizar a alienação judicial da integralidade do imóvel cuja fração de 50% foi penhorada nos autos. 

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