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8 de fevereiro de 2022

Não é aceitável que a parte provoque manifestação do juízo arbitral e, depois de obter pronunciamento acerca da matéria, venha pleitear nulidade decisão ao argumento de que não poderia ter enfrentado o tema

 STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.212-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/10/2021 (Info 717).

Não é aceitável que a parte provoque manifestação do juízo arbitral e, depois de obter pronunciamento acerca da matéria, venha pleitear nulidade decisão ao argumento de que não poderia ter enfrentado o tema

Arbitragem representa uma técnica de solução de conflitos por meio da qual os conflitantes aceitam que a solução de seu litígio seja decidida por uma terceira pessoa, de sua confiança.

arbitragem é uma forma de heterocomposição, isto é, instrumento por meio do qual o conflito é resolvido por um terceiro.

regulada pela Lei nº 9.307/96, havendo também alguns dispositivos no CPC versando sobre o tema

Convenção de arbitragem

cláusula compromissória

Art. 4º, Lei nº 9.307/96: “A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato”

A cláusula compromissória, também chamada de cláusula arbitral, é uma cláusula prevista no contrato, de forma prévia e abstrata, por meio da qual as partes estipulam que qualquer conflito futuro relacionado àquele contrato será resolvido por arbitragem (e não pela via jurisdicional estatal).

compromisso arbitral

exceção de jurisdição

Apresentada pela parte que não concorde com a instauração da arbitragem

Alegação sobre a natureza concursal do crédito objeto da arbitragem

ação de nulidade

 

Recuperação judicial

ações movidas em face de empresas em recuperação judicial que demandam (requeiram) quantias ilíquidas devem tramitar regularmente onde foram propostas, inclusive aquelas submetidas a juízo arbitral, até a apuração do montante devido

Art. 6º, § 1º, Lei nº 11.101/2005: “Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida”

A natureza do crédito (concursal ou extraconcursal) não é critério definidor da competência para julgamento de ações (etapa cognitiva) propostas em face de empresa em recuperação judicial, mas sim as regras ordinárias dispostas na legislação processual.

O que constitui competência exclusiva do juízo universal, segundo a jurisprudência do STJ, é a prática ou o controle de atos de execução de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial - atos de expropriação.

kompetenz-kompetenz

incumbe aos próprios árbitros decidir a respeito de sua competência para avaliar a existência, validade ou eficácia do contrato que contém a cláusula compromissória.

STJ. 2ª Seção. AgIn no CC 162.066/CE, DJe 15/5/2019: “o exame sobre a natureza concursal ou extraconcursal do crédito é de competência do Juízo da recuperação”

juízo arbitral se manifestou sobre a natureza extra-concursal do crédito em cobrança como resposta à exceção de jurisdição, não havendo, no entanto, relação direta com a pretensão deduzida inicialmente. O pedido de arbitragem não era esse

se a competência do juízo arbitral for questionada com fundamento na concursalidade do crédito, é óbvio que o juízo arbitral precise enfrentar esse argumento para decidir sobre a sua competência

3 de fevereiro de 2022

A caracterização de conflito de competência perante o Superior Tribunal de Justiça pressupõe a materialização da oposição concreta do Juízo da execução fiscal à efetiva deliberação do Juízo da recuperação judicial a respeito do ato constritivo

Processo

CC 181.190-AC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 30/11/2021, DJe 07/12/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Empresa em recuperação judicial. Execução fiscal. Constrição judicial dos bens da recuperanda. Conflito de competência. Materialização da oposição concreta à efetiva deliberação do Juízo da recuperação judicial. Imprescindibilidade.

 

DESTAQUE

A caracterização de conflito de competência perante o Superior Tribunal de Justiça pressupõe a materialização da oposição concreta do Juízo da execução fiscal à efetiva deliberação do Juízo da recuperação judicial a respeito do ato constritivo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O incidente processual centra-se em saber se o Juízo em que tramita execução fiscal contra empresa em recuperação judicial - ao rejeitar a exceção de pré-executividade e determinar o prosseguimento do feito executivo, com a realização de atos constritivos sobre o patrimônio da executada -, invade ou não a competência do Juízo da recuperação judicial, segundo dispõe o § 7º-B do art. 6º da Lei de Recuperação e Falência, com redação dada pela Lei n. 14.112/2020.

A divergência jurisprudencial então existente entre esta Segunda Seção e as Turmas integrantes da Seção de Direito Público do Superior Tribunal de Justiça acabou por se dissipar em razão da edição da Lei n. 14.112/2020, que, a seu modo, delimitou a competência do Juízo em que se processa a execução fiscal (a qual não se suspende pelo deferimento da recuperação judicial) para determinar os atos de constrição judicial sobre os bens da recuperanda; e firmou a competência do Juízo da recuperação judicial para, no exercício de um juízo de controle, "determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial".

A partir da vigência da Lei n. 14.112/2020, com aplicação aos processos em trâmite (afinal se trata de regra processual que cuida de questão afeta à competência), não se pode mais reputar configurado conflito de competência perante esta Corte de Justiça pelo só fato de o Juízo da recuperação ainda não ter deliberado sobre a constrição judicial determinada no feito executivo fiscal, em razão justamente de não ter a questão sido, até então, a ele submetida.

A submissão da constrição judicial ao Juízo da recuperação judicial, para que este promova o juízo de controle sobre o ato constritivo, pode ser feita naturalmente, de ofício, pelo Juízo da execução fiscal, em atenção à propugnada cooperação entre os Juízos. O § 7º-B do art. 6º da Lei n. 11.101/2005 apenas faz remissão ao art. 69 do CPC/2015, cuja redação estipula que a cooperação judicial prescinde de forma específica. E, em seu § 2º, inciso IV, estabelece que "os atos concertados entre os juízos cooperantes poderão consistir, além de outros, no estabelecimento de procedimento para a efetivação de medidas e providências para recuperação e preservação de empresas".

Caso o Juízo da execução fiscal assim não proceda, tem-se de todo prematuro falar-se em configuração de conflito de competência perante o STJ, a pretexto de se obter o sobrestamento da execução fiscal liminarmente. Não há, nesse quadro, nenhuma usurpação da competência, a ensejar a caracterização de conflito. A inação do Juízo da execução fiscal - como um "não ato" que é - não pode, por si, ser considerada idônea a fustigar a competência do Juízo recuperacional ainda nem sequer exercida.

Assim, na hipótese de o Juízo da execução fiscal não submeter, de ofício, o ato constritivo ao Juízo da recuperação judicial, deve a recuperanda instar o Juízo da execução fiscal a fazê-lo ou levar diretamente a questão ao Juízo da recuperação judicial, que deverá exercer seu juízo de controle sobre o ato constritivo, se tiver elementos para tanto, valendo-se, de igual modo, se reputar necessário, da cooperação judicial preconizada no art. 69 do CPC/2015.

Registre-se que, após o exercício de tais competências, a caracterização de conflito perante esta Corte de Justiça somente se fará presente se o Juízo da execução fiscal vier, concretamente, a se opor à deliberação do Juízo da recuperação judicial a respeito da constrição do bem, substituindo-o ou tornando-a sem efeito, ou acerca da essencialidade do bem de capital constrito, o que, por ora, nem se cogita.

7 de janeiro de 2022

A cessão fiduciária de título de crédito não se submete à recuperação judicial, independentemente de registro em cartório

Processo

REsp 1.629.470-MS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, por maioria, julgado em 30/11/2021.

Ramo do Direito

DIREITO REGISTRAL, DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Cessão fiduciária de direito de crédito. Recuperação judicial. Não submissão. Cartório de títulos e documentos. Registro para constituição da garantia. Desnecessidade.

 

DESTAQUE

A cessão fiduciária de título de crédito não se submete à recuperação judicial, independentemente de registro em cartório.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

É pacífico na jurisprudência do STJ que os contratos gravados com garantia fiduciária não se submetem ao regime da recuperação judicial, cuidando-se de bens ou valores extraconcursais, conforme previsto no art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005.

Ademais, a ausência de registro, que é requisito apenas para a preservação de direito de terceiros, não constitui requisito para perfectibilizar a garantia. Tal formalidade não está prevista no art. 66-B da Lei n. 4.728/1995, na redação introduzida pela Lei n. 10.931/2004, nem possui respaldo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu o caráter de facultatividade do registro (Pleno, RE 611.639/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio, unânime, DJe de 15/4/2016).

Tal convicção decorre de que o Código Civil, art. 1.361, § 1º, e seguintes, cuida exclusivamente de bens infungíveis, qualidade que não alcança os recebíveis e os direitos de crédito em geral.

Os direitos cedidos fiduciariamente integram o patrimônio do credor fiduciário e não da empresa em recuperação. No caso de cessão fiduciária de recebíveis, dada a especificidade da legislação de regência, até mesmo a posse direta do bem dado em garantia, bem como todos os direitos e ações a ele concernentes, são transferidos ao credor fiduciário tão logo contratada a garantia. A necessidade de registro se destina a salvaguardar eventuais direitos de terceiros, vale dizer, no caso de recebíveis, direitos que possam ser alegados pelos devedores da empresa em soerguimento, e não pelos seus credores, aos quais é indiferente o destino de bem que não integra o patrimônio sujeito à recuperação.

Do mesmo modo, não cabe a invocação do princípio da preservação da empresa, com apoio na parte final do § 3º do art. 49 da LRF, segundo o qual durante o stay period não podem ser retirados do estabelecimento do devedor "os bens de capital essenciais a sua atividade empresarial".

Direitos de crédito cedidos fiduciariamente não se encontram sob o abrigo de tal regra, seja por não estarem no estabelecimento empresarial sob a posse direta da empresa em recuperação, por força de sua disciplina legal específica, seja por não se constituírem "bem de capital".

Para que o bem se compreenda na ressalva contida no § 3º do art. 49, é imprescindível que se trate de bem corpóreo, na posse direta do devedor, e, sobretudo, que não seja perecível e nem consumível, de modo que possa ser entregue ao titular da propriedade fiduciária, caso persista a inadimplência, ao final do stay period.

Com maior razão ainda não podem ser considerados bens de capital os títulos de crédito dados em alienação fiduciária. Estes, ao contrário do estoque, sequer estão na posse direta do devedor e, muito menos, são bens utilizados como insumo de produção. Trata-se patrimônio alienado pelo devedor, em caráter resolúvel, é certo, para garantia de obrigações por ele assumidas.

O credor que financia a atividade produtiva, mediante a alienação fiduciária de recebíveis dados em garantia de CPRs, certamente o faz contando com a segurança da garantia segundo sua disciplina legal, garantia essa que saberia débil, caso recaísse sobre bens de capital utilizados na produção, fossem eles móveis ou imóveis.

Considerar que a mera intenção de fazer caixa, mediante a apropriação de recebíveis (de propriedade resolúvel do credor fiduciário), possa justificar exceção à regra do art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, implicaria tornar sem substância o regime legal da propriedade fiduciária, uma vez que recursos financeiros sempre serão essenciais à recuperação de qualquer empreendimento.

6 de janeiro de 2022

Os credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial somente em relação ao montante alcançado pelos bens alienados em garantia

Processo

REsp 1.953.180-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021, DJe 01/12/2021.

Ramo do Direito

DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Recuperação judicial. Crédito garantido por alienação fiduciária. Extraconcursalidade. Limites. Montante alcançado pelos bens alienados.

 

DESTAQUE

Os credores fiduciários estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial somente em relação ao montante alcançado pelos bens alienados em garantia.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A alienação fiduciária em garantia implica a transferência da propriedade de coisa material ao credor com a finalidade de garantir a obrigação principal. A transferência da propriedade, porém, é resolúvel. Satisfeita a obrigação principal, o bem retorna automaticamente à propriedade do devedor. Na hipótese de inadimplemento, no entanto, o credor poderá retomar a posse do bem para efetivar sua liquidação e saldar a dívida.

Nos termos do artigo 49, § 3º, da Lei n. 11.101/2005, tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva.

Contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, não será permitida a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial. Como se observa da redação do dispositivo legal, busca-se tutelar o direito de propriedade do credor, que poderá retomar a posse do bem, sem se submeter aos efeitos da recuperação judicial, salvo algumas restrições que podem lhe ser impostas se os bens forem essenciais à atividade.

Diante disso, é possível concluir que o que diferencia o credor garantido por alienação fiduciária dos demais credores é a propriedade do bem alienado em garantia. Assim, é o objeto da garantia que traça os limites da extraconcursalidade do crédito.

Em outras palavras, se a alienação do bem dado em garantia for suficiente para quitar o débito, extingue-se a obrigação. Por outro lado, se o valor apurado com a venda do bem não for bastante para extinguir a obrigação, o restante do crédito em aberto não mais poderá ser exigido fora da recuperação judicial do devedor, pois não mais existirá a característica que diferenciava o credor titular da posição de proprietário fiduciário dos demais.

Portanto, o crédito do titular da posição de credor fiduciário será extraconcursal no limite do bem dado em garantia, sobre o qual se estabelece a propriedade resolúvel.

Não pertencendo os bens alienados em garantia ao avalista em recuperação judicial, não podem ser expropriados outros bens de sua titularidade, pois devem servir ao pagamento de todos os credores

Processo

REsp 1.953.180-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 25/11/2021, DJe 01/12/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Crédito garantido por alienação fiduciária. Bens alienados pertencentes ao avalizado. Avalista em recuperação judicial. Expropriação de bens do avalista. Impossibilidade.

 

DESTAQUE

Não pertencendo os bens alienados em garantia ao avalista em recuperação judicial, não podem ser expropriados outros bens de sua titularidade, pois devem servir ao pagamento de todos os credores.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Conforme consignado no julgamento do REsp 1.677.939/SP, "O aval apresenta 2 (duas) características principais, a autonomia e a equivalência. A autonomia significa que a existência, validade e eficácia do aval não estão condicionadas à da obrigação principal. A equivalência torna o avalista devedor do título da mesma forma que a pessoa por ele avalizada. (...) Disso decorre que o credor pode exigir o pagamento tanto do devedor principal quanto do avalista, que não pode apresentar exceções pessoais que aproveitariam o avalizado, nem invocar benefício de ordem."

Desse modo, se o avalizado for devedor principal, o avalista será tratado como se devedor principal fosse.

Assim, caso os bens alienados em garantia fossem dos avalistas, poderiam ser perseguidos pelo credor fora da recuperação judicial, já que a extraconcursalidade do crédito está diretamente ligada à propriedade fiduciária.

No entanto, sendo os bens alienados em garantia de propriedade do devedor principal, o crédito em relação aos avalistas em recuperação judicial não pode ser satisfeito com outros bens de sua propriedade, que estão submetidos ao pagamento de todos os demais credores.


Incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre dívida cobrada de empresa em recuperação judicial, mas relativa a crédito extraconcursal

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-713-stj.pdf


RECUPERAÇÃO JUDICIAL Incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre dívida cobrada de empresa em recuperação judicial, mas relativa a crédito extraconcursal 

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em curso, pode ser acrescido das penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015. STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.197-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/10/2021 (Info 713). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

Cleber ajuizou ação de indenização contra empresa de telefonia Oi (em recuperação judicial). Vale ressaltar que o ato ilícito que deu origem à ação de indenização ocorreu depois que já havia sido deferida a recuperação judicial. O juiz julgou o pedido procedente, condenado a Oi a pagar R$ 100 mil em favor do autor. Foi iniciada a fase de cumprimento de sentença. 

Por que foi iniciada a fase de cumprimento de sentença e o crédito não foi incluído no plano de credores? 

Porque se trata de crédito surgido depois do deferimento da recuperação judicial. Logo, é um crédito extraconcursal, nos termos do art. 49 da Lei nº 11.101/2005: 

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. 

Voltando ao caso concreto: 

Cleber ingressou com pedido de cumprimento de sentença e o magistrado determinou a intimação da Oi para pagar a dívida no prazo de 15 dias, nos termos do caput do art. 523 do CPC: 

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver. 

A Oi que, como vimos, estava em processo de recuperação judicial, não efetuou o pagamento, razão pela qual o juízo da vara cível afirmou que o débito agora seria acrescido de multa e de honorários advocatícios, invocando o § 1º do art. 523 do CPC: 

Art. 523 (...) § 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento. 

Agiu corretamente o magistrado? Aplica-se o § 1º do art. 523 ao caso? SIM. 

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em curso, pode ser acrescido das penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015. STJ. 3ª Turma. REsp 1.953.197-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/10/2021 (Info 713). 

A multa e os honorários advocatícios previstos no art. 523, § 1º, do CPC/2015 somente incidem sobre o valor da condenação nas hipóteses em que o executado não paga voluntariamente a quantia devida estampada no título judicial no prazo de 15 dias. Nos termos do art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido (ainda que não vencidos), sendo certo que a aferição da existência ou não do crédito deve levar em consideração a data da ocorrência de seu fato gerador (fonte da obrigação). Na hipótese, contudo, o crédito em discussão possui caráter extraconcursal, não se sujeitando, desse modo, aos efeitos do plano de soerguimento. Conforme prevê o art. 59, caput, da LFRE, apenas as dívidas da recuperanda estão sujeitas ao plano de soerguimento (créditos concursais) e necessitam ser adimplidas de acordo com as condições nele pactuadas: 

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei. 

As obrigações não atingidas pela recuperação judicial, consequentemente, devem continuar sendo cumpridas normalmente pela devedora, uma vez que os créditos correlatos estão excluídos do plano e de seus efeitos. Dessa forma, a recuperanda não está impedida de satisfazer voluntariamente créditos extraconcursais perseguidos em execuções individuais, de modo que as consequências jurídicas previstas na norma do dispositivo precitado devem incidir quando não pago o montante devido. Não é, portanto, defeso à recuperanda dispor de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos extraconcursais (observada a exceção do art. 66 da LFRE), uma vez recebida a comunicação do juízo do soerguimento para depósito da quantia objeto da execução, deve passar a correr o prazo de 15 dias estabelecido no art. 523, caput, do CPC/2015. 

Não confundir com o Info 703 do STJ 

Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida. STJ. 3ª Turma. REsp 1.937.516-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703).

19 de novembro de 2021

Aplica-se o § 3º do art. 49 da Lei 11.101/2005 mesmo que o bem dado em alienação judiciária seja de propriedade de terceiros, isto é, mesmo que o fiduciante não seja a empresa em recuperação judicial

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/11/info-710-stj-2.pdf 


RECUPERAÇÃO JUDICIAL Aplica-se o § 3º do art. 49 da Lei 11.101/2005 mesmo que o bem dado em alienação judiciária seja de propriedade de terceiros, isto é, mesmo que o fiduciante não seja a empresa em recuperação judicial 

O afastamento dos créditos de titulares de posição de proprietário fiduciário dos efeitos da recuperação judicial da devedora independe da identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem imóvel ofertado em garantia ou com a própria recuperanda. Art. 49 (...) § 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, (...) seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais (...) O fato de o bem imóvel alienado fiduciariamente não integrar o acervo patrimonial da empresa devedora não tem o condão de afastar a regra prevista no § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. STJ. 3ª Turma. REsp 1.938.706-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 14/09/2021 (Info 710). 

Quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial 

Na recuperação judicial, a empresa devedora, que está “sufocada” por dívidas, irá pagar os seus credores de uma forma mais “suave”, a fim de que consiga quitar todos os débitos e se manter funcionando. Assim, os credores da empresa em recuperação judicial são inscritos no “quadro geral de credores”, e cada um receberá seu crédito de acordo com o que for definido no plano de recuperação. Um dos temas importantes sobre esse assunto é saber quais créditos estão sujeitos à recuperação judicial, ou seja, quais credores terão que receber seus créditos conforme o plano de recuperação.  

Regra 

Em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial, ainda que não vencidos (art. 49, caput, da Lei nº 11.101/2005). Ex.: a empresa tem que pagar uma dívida com um fornecedor daqui a 9 meses; se o pedido de recuperação foi feito hoje, esse crédito já será incluído nas regras da recuperação judicial, mesmo que ainda não tenha chegado a data do vencimento. 

Consequência dessa regra: 

Como vimos acima, tendo sido decretada a recuperação judicial, os credores irão receber conforme o plano. Como consequência disso, em regra, as ações e execuções que tramitam contra a empresa em recuperação são suspensas para poder não atrapalhar a execução do plano. Veja: 

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei; II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência; III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência. (...) § 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal. 

Exceções à regra: 

A regra acima exposta (caput do art. 49) possui exceções, que estão elencadas nos §§ 3º e 4º. Dessa feita, nesses parágrafos estão previstos determinados créditos que não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial. Veja o § 3º, que interessa para explicar o julgado: 

Art. 49 (...) § 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

 Créditos decorrentes de alienação fiduciária enquadram-se no § 3º 

Se a empresa em recuperação tinha um contrato de alienação fiduciária com o credor “X” e este credor tinha, como garantia da dívida, a propriedade fiduciária de um bem que está na posse da empresa, esse “crédito” enquadra-se no § 3º. Ex.: a empresa tinha feito uma alienação fiduciária para adquirir um caminhão “XYZ”; como não tinha dinheiro para pagar à vista, fez um financiamento e o veículo ficou na propriedade fiduciária do banco “ABC”, sendo usado pela empresa (que tinha a posse direta do bem). Se a empresa entra com pedido de recuperação judicial, esse crédito do banco não está submetido aos efeitos do plano de credores. Em outras palavras, a empresa terá que continuar pagando as prestações da mesma forma que já estava ajustada no contrato e, se atrasar, o banco poderá propor a ação de busca e apreensão. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

A sociedade empresária Medical Line Comércio Ltda. celebrou contrato de empréstimo com o Banco e, como garantia de que a dívida seria paga, João, um dos sócios da empresa, transferiu seu imóvel para a instituição financeira. Na prática, foi feito um contrato de alienação fiduciária, no entanto, a garantia relativa à alienação fiduciária de imóvel foi prestada por terceiro, não afetando nenhum bem do patrimônio da empresa devedora. Passado algum tempo, foi decretada a recuperação judicial da empresa. A Medical Line Comércio Ltda ainda não pagou a dívida com o banco, devendo ainda R$ 500 mil. 

Daí surgiu a seguinte divergência: esse crédito de R$ 500 mil está fora dos efeitos da recuperação judicial? Aplica-se, ao caso, o § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005? 

1ª posição: NÃO. O administrador judicial defendeu que não. Para o administrador judicial, o banco deverá pleitear o crédito segundo o plano de credores. Isso porque a garantia relativa à alienação fiduciária de imóvel foi prestada por terceiro, de forma que a situação não se amoldaria ao § 3º do art. 49 da Lei nº 11. A 101/2005. 

2ª posição: SIM. O Banco sustentou que seu crédito estaria fora dos efeitos da recuperação judicial (o que, para ele é bom, já que é mais fácil de receber). Para a instituição financeira, o crédito em questão possui natureza extraconcursal, na medida em que o art. 49, § 3º, da Lei “não faz qualquer distinção quanto ao fato do bem dado em alienação fiduciária ser de propriedade de terceiros, ou seja, não exige que o fiduciante seja empresa em recuperação judicial”. 

Qual das duas posições foi acolhida pelo STJ? 

A segunda. O fato de o bem imóvel alienado fiduciariamente não integrar o acervo patrimonial da empresa devedora não tem o condão de afastar a regra prevista no § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. Esse dispositivo legal estabelece que o crédito que o proprietário fiduciário possui não se submete aos efeitos da recuperação. O legislador não delimitou o alcance da regra em questão exclusivamente aos bens alienados fiduciariamente originários do acervo patrimonial da própria sociedade empresária recuperanda, tendo apenas estipulado a não sujeição aos efeitos da recuperação do crédito titularizado pelo “credor titular da posição de proprietário fiduciário”. Portanto, o dispositivo legal em análise afasta por completo dos efeitos da recuperação judicial não apenas o bem alienado fiduciariamente, mas o próprio contrato por ele garantido. Tal compreensão se coaduna com a sistemática legal arquitetada para albergar o instituto da propriedade fiduciária, de modo que, estando distanciado referido instituto jurídico dos interesses dos sujeitos envolvidos - haja vista estar o bem alienado vinculado especificamente ao crédito garantido - afigura-se irrelevante a identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o objeto da garantia ou com a própria sociedade recuperanda. Nesse sentido: 

(...) 1. Debate-se nos autos a necessidade de o bem imóvel objeto de propriedade fiduciária ser originariamente vinculado ao patrimônio da recuperanda para fins de afastamento do crédito por ele garantido dos efeitos da recuperação judicial da empresa. 2. Na propriedade fiduciária, cria-se um patrimônio destacado e exclusivamente destinado à realização da finalidade de sua constituição, deslocando-se o cerne do instituto dos interesses dos sujeitos envolvidos para o escopo do contrato. 3. O afastamento dos créditos de titulares de propriedade fiduciária dos efeitos da recuperação, orientado por esse movimento que tutela a finalidade de sua constituição, independe da identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem imóvel ou com o próprio recuperando, simplifica o sistema de garantia e estabelece prevalência concreta da propriedade fiduciária e das condições contratuais originárias, nos termos expressos pelo art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/05. (...) STJ. 3ª Turma. REsp 1549529/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18/10/2016. 

Em suma: O afastamento dos créditos de titulares de posição de proprietário fiduciário dos efeitos da recuperação judicial da devedora independe da identificação pessoal do fiduciante ou do fiduciário com o bem imóvel ofertado em garantia ou com a própria recuperanda. STJ. 3ª Turma. REsp 1.938.706-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 14/09/2021 (Info 710).

18 de novembro de 2021

Não é aceitável que a parte provoque a manifestação do juízo arbitral e, depois de obter o pronunciamento acerca da matéria, venha a pleitear a nulidade da decisão ao argumento de que não poderia ter enfrentado o tema

Processo

REsp 1.953.212-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 26/10/2021, DJe 03/11/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Juízo arbitral. Recuperação judicial. Competência. Parte provoca manifestação. Obtenção do pronunciamento. Requerimento de nulidade da decisão. Argumento de que não poderia ter havido o enfrentamento do tema. Impossibilidade.

 

DESTAQUE

Não é aceitável que a parte provoque a manifestação do juízo arbitral e, depois de obter o pronunciamento acerca da matéria, venha a pleitear a nulidade da decisão ao argumento de que não poderia ter enfrentado o tema.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

De acordo com a iterativa jurisprudência do STJ, as ações movidas em face de empresas em recuperação judicial que demandam quantias ilíquidas devem tramitar regularmente onde foram propostas, inclusive aquelas submetidas a juízo arbitral, até a apuração do montante devido.

A natureza do crédito (concursal ou extraconcursal) não é critério definidor da competência para julgamento de ações (etapa cognitiva) propostas em face de empresa em recuperação judicial, mas sim as regras ordinárias dispostas na legislação processual.

O que constitui competência exclusiva do juízo universal, segundo a jurisprudência deste Tribunal, é a prática ou o controle de atos de execução de créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação judicial.

Ainda que o juízo arbitral, na espécie, tenha se manifestado, em sua fundamentação, acerca da natureza extraconcursal do crédito em cobrança, isso decorreu como resposta à arguição da própria parte, não guardando, sequer, relação direta com a pretensão deduzida inicialmente.

Ora, se a competência do juízo arbitral foi questionada com fundamento na concursalidade do crédito, era de rigor que tal circunstância fosse enfrentada pelos julgadores justamente para decidir acerca dessa questão. Veja-se que em nenhum momento o tribunal determinou a inclusão ou a exclusão do crédito dos efeitos da recuperação judicial, tendo, exclusivamente, reconhecido sua competência para apurar a existência e a expressão econômica do crédito em cobrança (an debeatur e quantum debeatur).

Não é aceitável que a parte provoque a manifestação do órgão julgador e, depois de obter o pronunciamento acerca da matéria por ela mesma invocada, venha a pleitear a nulidade da decisão ao argumento de que não poderia ter havido o enfrentamento do tema.

Por fim, o deferimento do pedido de recuperação judicial não tem o condão de transmudar a natureza de direito patrimonial disponível do crédito que procura-se ver reconhecido e quantificado no procedimento arbitral.

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19 de outubro de 2021

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em curso, pode ser acrescido das penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015

Processo

REsp 1.953.197-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/10/2021, DJe 08/10/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • Paz, Justiça e Instituições Eficazes
Tema

Recuperação judicial. Crédito extraconcursal. Cumprimento de sentença. Não pagamento voluntário. Penalidades do art. 523, § 1º, do CPC/2015. Incidência.


DESTAQUE

O crédito extraconcursal devido por empresa em recuperação judicial, objeto de cumprimento de sentença em curso, pode ser acrescido das penalidades previstas no art. 523, § 1º, do CPC/2015.


INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A multa e os honorários advocatícios previstos no art. 523, § 1º, do CPC/2015 somente incidem sobre o valor da condenação nas hipóteses em que o executado não paga voluntariamente a quantia devida estampada no título judicial no prazo de 15 dias.

Nos termos do art. 49, caput, da Lei n. 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido (ainda que não vencidos), sendo certo que a aferição da existência ou não do crédito deve levar em consideração a data da ocorrência de seu fato gerador (fonte da obrigação).

Na hipótese, contudo, ressai que o crédito em discussão possui caráter extraconcursal, não se sujeitando, desse modo, aos efeitos do plano de soerguimento.

Sucede que, nos termos do art. 59, caput, da LFRE, tão somente as dívidas da recuperanda sujeitas ao plano de soerguimento (créditos concursais) necessitam, em obediência à sistemática própria da lei de regência, ser adimplidas de acordo com as condições nele pactuadas.

As obrigações não atingidas pela recuperação judicial, consequentemente, devem continuar sendo cumpridas normalmente pela devedora, uma vez que os créditos correlatos estão excluídos do plano e de seus efeitos.

Dessa forma, a recuperanda não está impedida de satisfazer voluntariamente créditos extraconcursais perseguidos em execuções individuais, de modo que as consequências jurídicas previstas na norma do dispositivo precitado devem incidir quando não pago o montante devido.

 

Não é, portanto, defeso à recuperanda dispor de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos extraconcursais (observada a exceção do art. 66 da LFRE), uma vez recebida a comunicação do juízo do soerguimento para depósito da quantia objeto da execução, deve passar a correr o prazo de 15 dias estabelecido no art. 523, caput, do CPC/2015.

15 de outubro de 2021

RECUPERAÇÃO JUDICIAL - Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida

 Fonte: Dizer o Direito

Referência:  https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-703-stj-1.pdf


RECUPERAÇÃO JUDICIAL - Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida 

Exemplo: João foi atropelado por um ônibus da Transportadora. A vítima ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a empresa. Antes que fosse julgada a demanda, a Transportadora ingressou com pedido de recuperação judicial, tendo sido deferido seu processamento pelo juiz da vara empresarial. O juiz da vara cível, responsável pela ação de indenização, condenou a ré a pagar R$ 100 mil em favor do autor. João ingressou com pedido de cumprimento de sentença e o magistrado determinou a intimação da Transportadora para pagar a dívida no prazo de 15 dias, nos termos do caput do art. 523 do CPC. A Transportadora que, como vimos, estava em processo de recuperação judicial, não efetuou o pagamento, razão pela qual o juízo da vara cível afirmou que o débito agora seria acrescido de multa e de honorários advocatícios, invocando o § 1º do art. 523 do CPC: § 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento. Não agiu corretamente o juízo. Não há como fazer incidir à espécie a multa estipulada no art. 523, § 1º do CPC, uma vez que o pagamento do valor da condenação não era obrigação passível de ser exigida no cumprimento de sentença, devendo ser paga segundo as regras do plano de recuperação, nos termos definidos pela Lei nº 11.101/2005. STJ. 3ª Turma. REsp 1.937.516-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João foi atropelado por um ônibus da Transportadora Vantroba Ltda. A vítima ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a empresa. Antes que fosse julgada a demanda, a Transportadora ingressou com pedido de recuperação judicial, tendo sido deferido seu processamento pelo juiz da vara empresarial. O juiz da vara cível, responsável pela ação de indenização, condenou a ré a pagar R$ 100 mil em favor do autor. João ingressou com pedido de cumprimento de sentença e o magistrado determinou a intimação da Transportadora para pagar a dívida no prazo de 15 dias, nos termos do caput do art. 523 do CPC: 

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver. 

A Transportadora que, como vimos, estava em processo de recuperação judicial, não efetuou o pagamento, razão pela qual o juízo da vara cível afirmou que o débito agora seria acrescido de multa e de honorários advocatícios, invocando o § 1º do art. 523 do CPC: 

Art. 523 (...) § 1º Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo do caput, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento. 

Agiu corretamente o magistrado? Aplica-se o § 1º do art. 523 ao caso? NÃO. 

Não incide a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 sobre o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida. STJ. 3ª Turma. REsp 1.937.516-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/08/2021 (Info 703). 

Primeira pergunta: esse crédito decorrente da indenização estava sujeito à recuperação judicial? Em outras palavras, esse valor deverá ser pago pela Transportadora segundo as regras da recuperação judicial? 

SIM. Para saber se um crédito está, ou não, sujeito à recuperação judicial, deve-se analisar o art. 49 da Lei nº 11.101/2005, que afirma: 

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. 

Assim, em regra, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial. Para se aferir a existência ou não do crédito deve-se levar em consideração a data da ocorrência de seu fato gerador (fonte da obrigação). Como o acidente foi antes do pedido de recuperação, a fonte da obrigação (ato ilícito que gerou dano) foi anterior à recuperação judicial e, portanto, está sujeito a ela. E por que motivo a ação de indenização continuou tramitando normalmente? Por que a ação de conhecimento não foi suspensa, nos termos do art. 6º da Lei nº 11.101/2005? O art. 6º afirma o seguinte: 

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: 

I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta Lei; 

II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência; 

III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência. 

Ocorre que o § 1º do art. 6º traz uma exceção e diz que, se a ação busca uma obrigação ilíquida (como é o caso de uma ação de indenização por danos morais), ela continua tramitando na fase de conhecimento: 

Art. 6º (...) § 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida. 

A execução (cumprimento de sentença) desse crédito também continua a correr no juízo cível independentemente da recuperação judicial? João poderia executar o crédito fora da recuperação? 

NÃO. Tratando-se de crédito derivado de ação na qual se demandava quantia ilíquida, a Lei nº 11.101/2005 (LFRE) estabelece que ele somente passa a ser passível de habilitação no quadro de credores a partir do momento em que adquire liquidez, de modo que o prosseguimento da execução singular, desse momento em diante, deve ficar obstado (inteligência do art. 6º, § 1º). Logo, somente a fase de conhecimento poderia continuar (não a fase de execução). Conforme expressamente pontuou a Min. Nancy Andrighi: 

“No que concerne à habilitação, em processo de recuperação judicial, de quantias decorrentes de demandas cujos pedidos são ilíquidos, esta Corte Superior entende que, nos termos do art. 6, § 1º, da Lei 11.101/05, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta até a determinação do valor do crédito, momento a partir do qual este deverá ser habilitado no quadro geral de credores da recuperanda.” 

O art. 59, caput, da LFRE, prevê que o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos: 

Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1º do art. 50 desta Lei. 

Desse modo, o adimplemento das dívidas da recuperanda deverá seguir as condições pactuadas entre os sujeitos envolvidos no processo de soerguimento, sempre respeitando-se o tratamento igualitário entre os credores de cada classe. Assim, fica claro que a satisfação (execução) do crédito objeto da ação indenizatória deverá ocorrer, após devidamente habilitado, de acordo com as disposições do plano de recuperação judicial. Logo, João deverá habilitar seu crédito na recuperação judicial. 

Não há que se falar na penalidade do § 1º do art. 523 do CPC se a Transportadora não podia pagar João fora do plano de recuperação 

Nesse contexto, não se pode considerar que a causa que dá ensejo à aplicação da penalidade prevista no § 1º do art. 523 do CPC/2015 - recusa voluntária ao adimplemento da obrigação constante de título executivo judicial - tenha se perfectibilizado na hipótese. Em outras palavras, não há como fazer incidir à espécie a multa estipulada no art. 523, § 1º do CPC, uma vez que o pagamento do valor da condenação não era obrigação passível de ser exigida, por força da Lei nº 11.101/2005. Estando em curso processo recuperacional, a livre disposição, pela devedora, de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos individuais sujeitos ao plano de soerguimento violaria o princípio segundo o qual os credores devem ser tratados em condições de igualdade dentro das respectivas classes (princípio da par conditio creditorum).