6 de setembro de 2017

A REFORMA TRABALHISTA NO BRASIL, por Ives Gandra da Silva Martins Filho, Revista de Direito do Trabalho, Setembro de 2017

A REFORMA TRABALHISTA NO BRASIL

Labor reform in Brazil
Revista de Direito do Trabalho | vol. 181/2017 | p. 19 - 29 | Set / 2017
DTR\2017\5630
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Ives Gandra da Silva Martins Filho
Doutor e Mestre em Direito pela UnB e UFRGS. Professor do IDP e da ENAMAT. Membro das Academias Brasileira e Brasiliense de Direito do Trabalho. Ministro Presidente do TST e do CSJT. ivesgandra@tst.jus.br

Área do Direito: Processual; Trabalho

Resumo: O presente artigo constitui a versão em português do roteiro das palestras proferidas no Wilson Center e no Washington College of Law, em Washington D.C., no dia 13 de junho de 2017, discutindo a reforma trabalhista levada a cabo no Brasil, a partir do Projeto de Lei 6.787/16, apresentado pelo governo, aprovado na Câmara dos Deputados e transformado no PLC 38/17, em discussão, à época, no Senado Federal. Procurou-se apresentar, numa visão panorâmica, a reforma, explicando o contexto em que se deu, as causas que a tornaram necessária, a sua essência em termos de dispositivos da CLT alterados, sua tramitação e o possível impacto que terá nas relações de trabalho no Brasil, com vistas à superação da crise econômica e da elevada taxa de desemprego do país. Abrange tanto as questões de direito material quanto processual do trabalho envolvidas na reforma.

 Palavras-chave:  Reforma trabalhista - Projetos de lei - Crise econômica - Desemprego - Negociação coletiva - Uniformização de jurisprudência - Ativismo judiciário.

Abstract: The present paper is the Portuguese version of the lectures given at the Wilson Center and Washington College of Law in Washington, DC, on June 13th, 2017, concerning the labor reform carried out in Brazil, Bill 6.787/16, presented by the government, approved in the House of Representatives and turned into Bill 38/17, which is currently under discussion in the Federal Senate. This paper is an overview of this reform, examining the context in which it occurred, its main causes, its essence in terms of the provisions altered in the Brazilian Labor Code (CLT), its processing and possible impact on labor relations in Brazil, as a means to overcome the economic crisis and the high unemployment rate in the country. It addresses both substantive and procedural labor issues involved in the reform.

 Keywords:  Labor reform - Bills - Economic crisis - Unemployment - Collective bargaining - Jurisprudence uniformization - Judicial activism.

Sumário:  
1Contexto - 2Causas - 3Substância - 4Tramitação - 5Consequências


1 Contexto

A abordagem que pretendo fazer da reforma trabalhista no Brasil é de alguém que, por um lado, procura olhar de fora, com isenção, o que está acontecendo com as relações laborais em nosso país, mas que, por outro, é um observador privilegiado, por estar mergulhado nos problemas e ouvir as reivindicações e versões de todos os atores, em nível nacional.
O fato de presidir a mais alta Corte Laboral do país e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho não pode ser motivo para não encarar os fatos com parcialidade corporativista, deixando de enfrentar os problemas com a objetividade que se requer, ainda que se possa tomar partido quanto às soluções que se entende sejam melhores e mais eficazes. Ou seja, em vez de uma exposição laudatória de instituições, prefiro uma mais reflexiva, reconhecendo as deficiências que levaram à necessidade imperiosa de uma reforma trabalhista no Brasil.
A reforma trabalhista se insere num contexto mais amplo de reformas que o novo governo do Presidente Michel Temer está promovendo, para superar a crise econômica sem precedentes que se instalou no país após 13 anos do PT no poder, quando o marco inicial dos governos Lula e Dilma era o da estabilização monetária e desenvolvimento econômico, deixado pelo Governo FHC. Além da reforma trabalhista, o governo promoveu o ajuste fiscal de suas contas em face de uma dívida pública estratosférica. E está levando adiante a reforma previdenciária. Todas essas reformas não estão sendo feitas sem grande resistência dos setores afetados. No entanto, a falência do Estado brasileiro, da previdência social e das empresas, com 13 milhões de desempregados, estava cobrando coragem do novo governo para enfrentar tais problemas.
Assim, o governo atual vai levando a cabo tais reformas, mas em meio a grave crise política, envolvendo amplamente as principais figuras do Governo e do Parlamento, em denúncias de corrupção na já legendária Operação Lava-Jato, o que dificulta ainda mais os trabalhos e a aprovação das reformas, entre as quais a Reforma política vai sendo cada vez mais cobrada.

2 Causas

No caso da reforma trabalhista, estou convencido de que só se tornou necessária e está sendo levada a cabo em face dos excessos de protecionismo cometidos pela Justiça do Trabalho ao buscar compor os conflitos laborais, fazendo pesar demais a mão sobre um dos lados da balança. Um juiz do trabalho de 1ª instância, ao criticar a reforma, definiu-a como um acerto de contas do empresariado com a jurisprudência trabalhista. Eu diria que se trata de uma reforma newtoniana, ou seja, calcada na 1ª lei de Newton, segundo a cada ação corresponde uma reação de igual intensidade e de sentido oposto.
O caso mais paradigmático é o relativo à terceirização. Como o TST passou a ver, como no caso dos call centers, tudo como atividade-fim e a terceirização ilícita, nossa Suprema Corte acolheu para julgamento o caso, por violação ao princípio genérico da legalidade, e nosso Parlamento admitiu a terceirização inclusive de atividade-fim das empresas (Lei 6.019/74, arts. 4º-A e 4º-C, seus incisos e §§). Na verdade, o ponto de equilíbrio seria um meio-termo, não admitindo que dois empregados trabalhem juntos, ombro a ombro, em caráter permanente, no mesmo local de trabalho e na mesma função, com um sendo empregado direto da empresa e outro terceirizado, ganhando este a metade do que ganha o outro. Seria o caso de se manter a ilicitude da terceirização da atividade-fim da empresa, mas cabendo a ela definir qual é o seu núcleo central de atividade, que não pretende terceirizar.
Outro exemplo da lei newtoniana da ação e reação foi o corte, na reforma trabalhista, das horas in itinere. Sua origem vinha da Súmula 90 (MIX\2010\2549) do TST, que mandava o empregador pagar como de trabalho o tempo de transporte, quando fornecido pela empresa para lugar de difícil acesso ou não servido por transporte público regular. A súmula virou lei, e, a partir daí, a Justiça do Trabalho não permitiu mais sua flexibilização por negociação coletiva, impondo vultosas condenações em horas extras por esse tempo em que o trabalhador sequer dispende esforço produtivo. A Suprema Corte reformou as decisões excessivas da Justiça do Trabalho e o legislador, na reforma, preferiu acabar com elas (CLT (LGL\1943\5), art. 58, § 2º, em confronto com as Súmulas 90 (MIX\2010\2549) e 429 (MIX\2011\15) do TST).
Mas o sinal mais significativo de que a reforma foi provocada por esses excessos jurisprudenciais está no fato de que o art. 8º da CLT (LGL\1943\5) (código brasileiro do trabalho) passou a incluir duas orientações exegéticas básicas para a magistratura trabalhista: vedação de súmulas instituidoras de direitos (§ 2º) e interpretação de cláusulas de acordos coletivos levando em conta a vontade dos contratantes (§ 3º). O próprio procedimento de criação de súmulas pelos Tribunais trabalhistas passa a ser mais complexo, com maiores exigências (CLT (LGL\1943\5), art. 702, I, f, e §§ 3º e 4º).
Tais diretrizes decorreram do excesso de condenações ao pagamento de vantagens salariais ou indenizatórias baseadas na aplicação de princípios como o da dignidade da pessoa humana, quando inexistentes normas legais impondo tais obrigações aos empregadores. Ademais, no campo da negociação coletiva, a anulação sistemática de cláusulas de acordos coletivos pela Justiça do Trabalho, com base num conceito muito amplo da indisponibilidade de direitos, levou a própria Suprema Corte brasileira a reformar tais decisões, prestigiando a autonomia negocial coletiva.
A reforma, sob tal prisma, veio para colocar limites ao ativismo judiciário trabalhista, não muito diferente daquele praticado por outros ramos do Judiciário, mas vincado pela unilateralidade e excesso, tornando insuportável o seu peso sobre o empresariado nacional, que tem perdido competitividade internacional e capacidade de geração e manutenção de empregos. Não é por menos que vários dos dispositivos alterados pela reforma mudaram a sinalização de súmulas da jurisprudência do TST (demissão em massa, horas de transporte, intervalo intrajornada, equiparação salarial em cadeia, ultratividade dos acordos coletivos etc.).
Pode-se dizer que as denominadas “Semanas do TST” de 2011 e 2012, na qual a nova composição da Corte reviu grande parte de sua jurisprudência, em mais de 50 verbetes, para mudar sua sinalização, em prol dos empregados, foi compensada na reforma trabalhista, no que poderia se chamar de “Semanas do Congresso”, retornando ao ponto de equilíbrio, reformando, mas pela via legal, os direitos criados pela via jurisprudencial.
Por outro lado, as imensas lacunas da CLT (LGL\1943\5) em face dos avanços tecnológicos, surgimento de novas formas de contratação e organização empresarial estavam a exigir a modernização e atualização da legislação laboral, como são exemplos o teletrabalho (regido agora no Capítulo II-A do Título II da CLT (LGL\1943\5), arts. 75-A a 75-E), a terceirização e a proteção dos direitos da personalidade extrapatrimoniais (ora regido no Título II-A da CLT (LGL\1943\5), arts. 223-A a 223-G).
Mais ainda: a matriz da CLT (LGL\1943\5), promulgada em 1943, é de cunho corporativista, calcada na Carta Del Lavoro Italiana do regime fascista de Mussolini, como o controle estatal dos sindicatos. Em que pese a Constituição Federal de 1988 tenha reduzido a intervenção estatal nos sindicatos, ainda pesam sobre nosso sistema sindical duas pechas que ainda o fazem escravo do corporativismo: o imposto sindical e a unicidade sindical. Graças a elas, o Brasil é hoje o país com o maior número de sindicatos, uma vez que contam com fonte de receita garantida. E, com a unicidade, os mesmos dirigentes sindicais vão se perenizando há décadas no comando dos sindicatos, que só se vão desmembrando com redução de base territorial ou especificação de atividade para poder abocanhar o imposto sindical obrigatório.
A reforma, pois, ataca o problema pela raiz, extinguindo o imposto sindical obrigatório (CLT (LGL\1943\5), arts. 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602). O próximo passo é a ratificação, pelo Brasil, da Convenção 187 da OIT, admitindo o pluralismo sindical no Brasil, em regime concorrencial, o que fará com que continuem a existir apenas os sindicatos efetivamente representativos das categorias.

3 Substância

A espinha dorsal da reforma trabalhista proposta pelo governo no Projeto de Lei 6.787/16 era o prestígio da negociação coletiva, sistematicamente desconsiderada pela Justiça do Trabalho. No fundo, estava em jogo a dimensão do intervencionismo estatal no domínio econômico, especialmente nas relações de trabalho.
Como a Justiça do Trabalho se manifestava refratária aos meios alternativos de composição dos conflitos trabalhistas, tais como a negociação coletiva, a conciliação, a mediação e a arbitragem, pretendendo o monopólio judicial para a solução desses conflitos, a reforma fez-se com o prestígio a esses meios alternativos: parametrização do que é passível (CLT (LGL\1943\5), art. 611-A, com 16 incisos), ou não (CLT (LGL\1943\5), art. 611-B, com 29 incisos), de negociação coletiva; admissão da arbitragem para reclamações de altos funcionários (CLT (LGL\1943\5), art. 507-A); regulamentação do dispositivo constitucional que tratava do representante dos empregados nas empresas, para efeito de conciliação dos interesses desses em face das empresas (introdução do Título IV-A na CLT (LGL\1943\5), com seus arts. 510-A a 510-D).
A proposta inicial do governo, negociada pelo Ministro do Trabalho Ronaldo Nogueira, com as Confederações Patronais e as Centrais Sindicais Obreiras, era tímida, pois só abrangia o que foi objeto de consenso entre patrões e empregados, reduzindo muito o âmbito do que se necessitava modernizar e atualizar, para reduzir o número de ações e conflitos.
De qualquer forma, esse mínimo contemplava os parâmetros da negociação coletiva nos seguintes termos: questões afetas à medicina e segurança do trabalho, direitos de terceiros ou normas processuais não seriam passíveis de negociação; elencava-se, explicitamente, 13 matérias que poderiam ser objeto de negociação; e, para cada direito previsto em lei que foi flexibilizado ou reduzido, o empresariado deveria ofertar uma vantagem compensatória, de modo a que o patrimônio jurídico do trabalhador, como um todo, não sofresse redução.
Ocorre que esse núcleo mínimo, de uns 15 artigos a serem modificados na CLT (LGL\1943\5), sofreu, no Congresso Nacional, a pressão natural do empresariado, para que se resolvessem outros problemas pendentes, tendo sido apresentadas mais de 800 emendas ao Projeto de Lei original, que resultou num substitutivo do relator, deputado Rogério Marinho, que alterava mais de 100 artigos da CLT (LGL\1943\5).
Alguns dos destaques dessa reforma são:
a) definição do que seja grupo econômico para efeito de responsabilização de empresa distinta da acionada (CLT (LGL\1943\5), art. 2º, § 3º), bem como limitação temporal da responsabilidade dos sócios retirantes (CLT (LGL\1943\5), art. 10-A);
b) admissão do trabalhador autônomo, sem reconhecimento de vínculo empregatício, como é o caso dos motoristas rodoviários autônomos proprietários de caminhões (CLT (LGL\1943\5), arts. 3º § 2º, e 442-B);
c) definição mais clara do conceito de tempo à disposição do empregador, para efeito de pagamento de salário, quando o empregado está cuidando de interesses pessoais dentro da empresa (CLT (LGL\1943\5), arts. 4º, § 2º, e 452-A, § 5º, em confronto com as Súmulas 118 (MIX\2010\2576) e 366 (MIX\2010\2823) do TST);
d) a hipótese de descumprimento do contrato de trabalho e não só a da sua alteração está sujeita à prescrição total do direito de ação não exercido em dois anos (CLT (LGL\1943\5), art. 11, § 4º, em confronto com a Súmula 294 (MIX\2010\2752) do TST);
e) interrupção da prescrição apenas com a citação válida (art. 11, § 5º, em confronto com a Súmula 268 (MIX\2010\2726) do TST) e a admissão da prescrição intercorrente no processo do trabalho, quando não impulsionada a execução por mais de 2 anos (CLT (LGL\1943\5), art. 11-A, em confronto com a Súmula 114 (MIX\2010\2572) do TST);
f) ampliação da jornada do trabalho a tempo parcial, para chegar até 30 horas semanais (CLT (LGL\1943\5), art. 58-A) e possibilidade de redução do intervalo intrajornada por negociação coletiva, sem a sanção do pagamento de todo o período, como jornada extraordinária, deixando claro que não se trata de norma de medicina e segurança do trabalho (CLT (LGL\1943\5), arts. 71, § 4º, 611-A, III, e 611-B, parágrafo único, em confronto com a Súmula 437 (MIX\2012\2008) do TST);
g) reconhecimento legal da compensação de jornada sem as sanções colocadas pela jurisprudência (CLT (LGL\1943\5), art. 59-C e seu parágrafo único, em confronto com a Súmula 85, III e IV, do TST), bem como do regime 12x36 horas (CLT (LGL\1943\5), arts. 59-B e 60, parágrafo único, em confronto com a Súmula 444 (MIX\2012\2015) do TST);
h) possibilidade do fracionamento das férias em até 3 períodos (CLT (LGL\1943\5), art. 134, § 1º);
i) colocar limites às indenizações por danos morais, fixando hipóteses e níveis de gravidade das ofensas, com exclusão da responsabilidade objetiva pelos danos (CLT (LGL\1943\5), art. 223-G e seu inciso VII e § 1º);
j) previsão legal da figura do trabalho intermitente como modalidade contratual válida e sua regulamentação (CLT (LGL\1943\5), arts. 443 e seu § 3º, e 452-A e seus §§);
k) Disciplina sobre o uso de uniformes, admitindo uso de propaganda, sem indenização por direitos de personalidade, bem como não imposição de pagamento de sua lavagem pela empresa (CLT (LGL\1943\5), art. 456-A e seu parágrafo único);
l) atribuição de natureza salarial apenas as gratificações legais e comissões, passando a ter natureza indenizatória todas as demais parcelas pagas a qualquer título pelo empregador (CLT (LGL\1943\5), art. 457 e seus §§);
m) acabar com a equiparação salarial em cadeia, admitida pelo TST, causando distorções na estrutura salarial das empresas, ao igualar empregados com diferença significativa de tempo de serviço, além de consagrar e generalizar eventual erro judicial (CLT (LGL\1943\5), art. 461, § 5º, em confronto com a Súmula 6 (MIX\2010\2465) do TST);
n) acabar com a necessidade de negociação coletiva prévia à demissão coletiva de empregados, exigência da jurisprudência do TST (CLT (LGL\1943\5), art. 477-A);
o) reconhecer a quitação plena do contrato de trabalho nos casos de plano de desligamento voluntário, na esteira da jurisprudência do STF (CLT (LGL\1943\5), art. 477-B), além de permitir a quitação anual das eventuais dívidas trabalhistas durante o contrato de trabalho, perante o sindicato, para evitar ações postulando os últimos 5 anos de direitos eventualmente não pagos (CLT (LGL\1943\5), art. 507-B);
p) não manutenção da gratificação de função pelo simples decurso de tempo, em caso de reversão ao cargo efetivo (CLT (LGL\1943\5), art. 468, § 2º, em confronto com a Súmula 372, I, do TST);
q) acabar com a ultratividade das normas coletivas expiradas, que antes migravam para os contratos coletivos e dificultavam a concessão de vantagens em nova negociação (CLT (LGL\1943\5), art. 614, § 3º);
r) fixação do princípio de que os acordos coletivos, firmados pelas empresas, terão prevalência, sempre, sobre as convenções coletivas firmadas pelos sindicatos patronais, por serem mais específicas (CLT (LGL\1943\5), art. 620);
s) admitir o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, na Justiça do Trabalho, para os advogados particulares de empregados e empresas, quando antes só eram admitidos para os sindicatos obreiros (CLT (LGL\1943\5), art. 791-A e seus §§), e limitar as hipóteses de a União arcar com os honorários do perito beneficiário da justiça gratuita (CLT (LGL\1943\5), art. 790-B, em confronto com a Súmula 457 (MIX\2014\3408) do TST);
t) aplicação da multa por litigância de má-fé não apenas aos empregadores, mas também aos empregados e às testemunhas, para evitar-se aventuras judiciárias (acréscimo da Seção IV-A do Capítulo II do Título X, com os arts. 793-A a 793-D);
u) admissão de contestação antes da audiência inaugural, no caso de se arguir exceção de incompetência territorial, para evitar-se viagens para se defender (CLT (LGL\1943\5), art. 800 e seus §§);
v) atenuação dos efeitos da revelia, pela admissão da presença apenas do advogado e o cotejo dos fatos alegados pelo reclamante com a prova dos autos e a verossimilhança das alegações (CLT (LGL\1943\5), art. 844, §§ 4º e 5º);
x) limitação da execução de ofício na Justiça do Trabalho para os casos em que o reclamante não tiver advogado constituído nos autos (CLT (LGL\1943\5), art. 878);
w) correção monetária pela variação da TR e não pela SELIC, como havia decidido o TST, em decisão suspensa liminarmente pelo STF, pois representaria a duplicação dos passivos trabalhistas existentes (CLT (LGL\1943\5), art. 879, § 7º);
y) ampliação para 60 dias do prazo para garantia do juízo, em fase de execução, para não ter bens indisponibilizados ou créditos cortados (CLT (LGL\1943\5), art. 883-A); e
z) a redução do depósito recursal para os casos de entidades sem fins lucrativos, entidades filantrópicas, empregadores domésticos, micro e pequenas empresas, além de sua dispensa para os beneficiários da justiça gratuita e empresas em recuperação judicial (CLT (LGL\1943\5), arts. 899, §§ 9º a 11).
Além da modernização da legislação quanto ao direito material do trabalho, foi também promovida uma reforma visando à racionalização judicial e à simplificação recursal, muito ao estilo do que ocorre com o sistema recursal norte-americano, em relação à Suprema Corte.
Com efeito, no sistema norte-americano, a Suprema Corte escolhe os temas que irá julgar, dos milhares de processos que lhe chegam anualmente. No Brasil, o modelo começou a mudar com a reforma do Poder Judiciário de 2004, mas timidamente. Na seara trabalhista, a reforma deste ano faz com que o critério de transcendência (CLT (LGL\1943\5), art. 896-A, §§ 1º a 6º) passe a conviver com a sistemática dos recursos repetitivos introduzida em 2014: o primeiro serve para descartar os recursos sem relevância econômica, política, jurídica ou social, enquanto a segunda serve para eleger os temas relevantes para serem apreciados mais detidamente. Para tanto, foram também revogados os dispositivos que exigiam prévia uniformização da jurisprudência pelos Tribunais Regionais, o que só complicava e fazia demorar o sistema, já que a uniformização é a razão existencial do TST (art. 6º, I, p, do substitutivo ao PL 6.787/16).
Finalmente, um ponto controvertido diz respeito à introdução da sistemática de homologação judicial dos acordos extrajudiciais, como forma de dar segurança jurídica às rescisões contratuais. Antes da reforma, as rescisões eram homologadas pelos sindicatos, mas com possibilidade de ampla discussão de horas extras e verbas rescisórias em juízo, fazendo com que a rescisão do contrato de trabalho, na prática, não terminasse com ele.

4 Tramitação

Enviada ao Congresso no final de 2016, em cerimônia no Palácio do Planalto, à qual compareceram os principais líderes empresariais e sindicais, que se pronunciaram, externando suas esperanças e preocupações, a proposta de reforma trabalhista tomou o número de Projeto de Lei 6.787/16. Para sua análise foi constituída Comissão Especial, tendo como Presidente o Deputado Daniel Vilela e como Relator o Deputado Rogério Marinho.
Tendo realizado dezenas de audiências públicas e recebido e ouvido mais de 700 experts sobre o tema, o Relator apresentou seu relatório no dia 12 de abril, com significativos acréscimos à proposta inicial governamental. Das mais de 800 emendas apresentadas, acabou acolhendo cerca de 100 propostas de alteração de artigos da CLT (LGL\1943\5), decuplicando os originais 10 artigos propostos para revisão. Conseguindo a aprovação do regime de urgência para sua tramitação, passou a contar com a possibilidade de votação, em Plenário, imediatamente após sua discussão na comissão especial.
Assim, no dia 27 de abril foi aprovado pela Câmara dos Deputados o PLC 38/17, que, agora, tramita no Senado Federal, para o qual foi designado como relator o Senador Ricardo Ferraço, que, sabendo da urgência da cristalização da reforma trabalhista para se superar mais rapidamente a crise econômica e de desemprego que país atravessa, propôs a aprovação integral do texto vindo da Câmara dos Deputados, para não ter que voltar para ela caso seja feita alguma alteração pelo Senado Federal.
A estratégia do governo, acolhida pelo Senador, é a de fazer os ajustes através de vetos tópicos e eventual edição de medida provisória visando acrescentar alguma coisa que faltou. Os tópicos de veto propostos pelo relator, cujo voto foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado no dia 6 de junho, seriam referentes a questões relativas às:
a) mulheres – empregada gestante em trabalho insalubre e a dilatação do trabalho da mulher;
b) negociação coletivaregime de 12x36 horas e do intervalo intrajornada; e
c) a regulamentação de matérias novas – trabalho intermitente e dos representantes dos trabalhadores nas empresas (a serem feitas por medida provisória).
A oposição, descontente com os termos e a rapidez da reforma, a ela tem resistido de forma truculenta, promovendo brigas no Senado Federal para impedir a leitura e discussão do relatório no dia 23 de maio e passeatas comandadas por centrais sindicais no dia 24 de maio, com quebra e queima de ministérios na Esplanada.
Em que pese também os ataques ideológicos de juízes, procuradores e auditores do trabalho, veiculando revistinhas, vídeos, abaixo-assinados e votos em separado pela rejeição integral do PLC 38/17, além de promoverem passeatas contra a Reforma, esta poderá ser sancionada pelo governo, com alguns vetos acertados, até o final deste 1º semestre de 2017, dando nova cara ao Direito e ao Processo do Trabalho, mais equilibrados e aptos a comporem os conflitos sociais e harmonizarem as relações trabalhistas.

5 Consequências

Para muitos, especialmente a criação da jurisdição voluntária para homologação de acordos judiciais (CLT (LGL\1943\5), arts. 652, f, e Capítulo III-A do Título X, com seus arts. 855-B a 855-E), pode gerar uma avalanche de processos para a Justiça do Trabalho, pois todos os empregadores quererão que as rescisões sejam sacramentadas pela Justiça do Trabalho. E o volume grande de processos poderá dificultar, sobremaneira, a capacidade dos juízes do trabalho de dar vazão a esses pedidos, a par de não conseguirem verificar se há ainda parcelas a receber. Haveria uma mera burocratização da rescisão contratual.
Por outro lado, a ameaça de parte da magistratura laboral, especialmente se pronunciando por suas associações de classe, de que continuarão julgando do mesmo modo e que judicializarão a reforma, contestando sua constitucionalidade, representa verdadeiro suicídio institucional da Justiça do Trabalho. Isto porque, durante os trâmites da reforma, a começar do presidente da Câmara dos Deputados, passando por muitos de seus deputados, o discurso que chegaram a levantar foi o da extinção da Justiça do Trabalho, pelo excessivo protecionismo que promovia, mais acirrando do que harmonizando as relações trabalhistas.
Esperemos que a reforma possa representar um marco regulatório mais seguro para as relações entre patrões e empregados, bem como para o próprio Judiciário Laboral, de modo a reduzir demandas e promover o retorno ao desenvolvimento e incremento da empregabilidade. E, nesse passo, a Justiça do Trabalho poderá desempenhar um papel de protagonista na superação da crise econômica brasileira, se souber harmonizar as relações de trabalho, distribuindo com justiça os frutos da produção entre o capital e o trabalho, na esteira do comando do art. 766 da CLT (LGL\1943\5).



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