18 de abril de 2021

EXECUÇÃO FISCAL - Na execução fiscal não cabe a retenção de passaporte ou a suspensão da CNH como forma de compelir o executado a pagar o débito

EXECUÇÃO FISCAL - Na execução fiscal não cabe a retenção de passaporte ou a suspensão da CNH como forma de compelir o executado a pagar o débito

Em execução fiscal não cabem medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte e da licença para dirigir. STJ. 1ª Turma. HC 453.870-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/06/2019 (Info 654). O entendimento acima é diferente no caso da execução “comum”. O STJ possui julgados dizendo que, na execução “comum”, é possível a adoção de meios executivos atípicos desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade (STJ. 3ª Turma. REsp 1788950/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/04/2019). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João ajuizou execução cobrando R$ 200 mil de Pedro. O executado foi citado para pagar a dívida no prazo de 3 dias, contado da citação (art. 829 do CPC). O devedor, contudo, não efetuou o pagamento. A requerimento do exequente, tentou-se a penhora de bens do devedor, mas sem sucesso. Diante disso, o credor pediu que o juiz determinasse a suspensão do passaporte e da carteira nacional de habilitação (CNH) do executado. 

Essa providência é prevista expressamente na lei? NÃO. Não há previsão expressa dessa medida executiva no CPC. 

Em tese, é possível que o juiz, no cumprimento de sentença ou em um processo autônomo de execução comum, determine a suspensão do passaporte e da CNH do executado? SIM. Tais providências são classificadas como medidas executivas atípicas (meios executivos atípicos). A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que cumpridos os seguintes requisitos: 

• existam indícios de que o devedor possui patrimônio expropriável (bens que podem ser penhorados); 

• essas medidas atípicas sejam adotadas de modo subsidiário; 

• a decisão judicial que a determinar contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta;

 • sejam observados o contraditório substancial e o postulado da proporcionalidade. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1788950/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 23/04/2019. 

Efetividade do processo, princípio do resultado na execução e atipicidade das medidas executivas 

O principal fundamento para isso seria o art. 139, IV, do CPC/2015, que representou uma importante novidade do Código e que teve por objetivo dar mais efetividade ao processo: 

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...) IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; 

No caso do processo de execução, a adoção de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou subrogatórias apresenta-se como um importante instrumento para permitir a satisfação da obrigação que está sendo cobrada (obrigação exequenda). Com isso, podemos dizer que esse dispositivo homenageia (prestigia) o “princípio do resultado na execução”. Veja alguns enunciados doutrinários a respeito deste inciso: 

Enunciado 48 da ENFAM. O art. 139, IV, do CPC/2015 traduz um poder geral de efetivação, permitindo a aplicação de medidas atípicas para garantir o cumprimento de qualquer ordem judicial, inclusive no âmbito do cumprimento de sentença e no processo de execução baseado em títulos extrajudiciais. 

Enunciado 12 do FPPC. A aplicação das medidas atípicas sub-rogatórias e coercitivas é cabível em qualquer obrigação no cumprimento de sentença ou execução de título executivo extrajudicial. Essas medidas, contudo, serão aplicadas de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art. 489, § 1º, I e II. 

Enunciado 396 do FPPC. As medidas do inciso IV do art. 139 podem ser determinadas de ofício, observado o art. 8º. 

Esse dispositivo representa a adoção, pelo CPC, de um modelo de atipicidade das medidas executivas. O que isso quer dizer? As medidas que o juiz pode determinar para a execução dos comandos judiciais não precisam estar expressamente previstas na lei, podendo o magistrado impor outras medidas que não estão listadas no Código. 

Tais medidas são permitidas também na EXECUÇÃO FISCAL? Imagine, por exemplo, que o Município ingressou com execução fiscal contra Carlos. O executado não pagou nem foram localizados bens penhoráveis. Diante disso, será possível, em tese, a determinação judicial de retenção do passaporte e suspensão da CNH? NÃO. 

O Estado é considerado superprivilegiado em sua condição de credor. Dispõe de varas comumente especializadas para condução de seus feitos, um corpo de Procuradores altamente devotado a essas causas, e possui lei própria regedora do procedimento (Lei nº 6.830/80), com inúmeros privilégios processuais. Um exemplo desses privilégios é o fato de que o devedor, na execução fiscal, só pode apresentar embargos à execução se oferecer garantia do juízo (art. 16, § 1º, da LEF), ao contrário do que ocorre na execução “comum”. Desse modo, o crédito fiscal é altamente blindado dos riscos de inadimplemento, por sua própria conformação jusprocedimental. Além disso, existem diversas outras garantias previstas pelo ordenamento jurídico em favor do crédito tributário, como, por exemplo: 

• o crédito tributário é privilegiado (art. 184 do CTN), podendo, se for o caso, atingir até mesmo bens gravados como impenhoráveis, por serem considerados bem de família (art. 3º, IV da Lei nº 8.009/90); 

• o crédito tributário tem altíssima preferência para satisfação em procedimento falimentar (art. 83, III da Lei de Falências); 

• os bens do devedor podem ser declarados indisponíveis para assegurar o adimplemento da dívida (art. 185-A do CTN). 

Em razão de todos esses “privilégios” acima expostos, a 1ª Turma do STJ entendeu que haveria um excesso se na execução fiscal fossem permitidas medidas atípicas aflitivas pessoais, como é o caso da apreensão de passaporte e da suspensão da CNH. 

Resumindo: Em execução fiscal não cabem medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte e da licença para dirigir. 

STJ. 1ª Turma. HC 453.870-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 25/06/2019 (Info 654)

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