1 de maio de 2021

Filigrana Doutrinária: IRDR e Musteverfahren

"(...) qual o modelo de processamento de IRDR adotado em nosso sistema? Como antecipado, numa microcomparação nos sistemas processuais relevantes que adotam técnicas para solução de processos repetitivos, há dois sistemas possíveis: regime da causa-modelo (simbolizado pelo Musteverfahren do direito processual alemão) e regime da causa-piloto (Pilotverfahren, a exemplo do Testprozess do direito processual austríaco). Como bem aponta Sofia Temer (2016, p. 66), a incerteza do modelo de processamento do IRDR ocorre porque o CPC de 2015 não Documento: 1811010 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 22/11/2019 Página 40 de 15 Superior Tribunal de Justiça esclarece se o incidente compreenderá julgamento da causa concreta ou se apenas haverá solução da questão jurídica, em abstrato, fixando-se a tese jurídica sem a solução da lide. A questão é muito bem proposta pela referida autora, nos seguintes termos (TEMER, 2016, p. 66): Diverge-se sobre a circunstância de haver, em razão do incidente, uma cisão cognitiva e decisória, ou não. Discute-se se o IRDR leva ao julgamento da demanda (pretensão) ou se apenas fixa tese jurídica, sem resolver a 'lide'. Permeia tal discussão a referência aos modelos da 'causa piloto' e do 'procedimento-modelo', empregados para identificar a unidade cognitiva e decisória ou a sua cisão, respectivamente. O CPC, como dito, não aponta a direção. Ora determina a concomitância do julgamento da causa pendente e do incidente, apontando para um modelo de causa-piloto; ora determina o prosseguimento do incidente em caso de desistência da causa pendente, conforme o procedimento-modelo. Segundo a exposição de motivos: No direito alemão a figura se chama Musterverfahren e gera decisão que serve de modelo (= Muster) para a resolução de uma quantidade expressiva de processos em que as partes estejam na mesma situação, não se tratando necessariamente, do mesmo autor nem do mesmo réu. No entanto, o IRDR, tal como previsto no CPC, muito se afastou do Musterverfahren. Afastou-se, outrossim, do Testprozess do direito processual austríaco, símbolo do procedimento-modelo. Sem ignorar ou alongar o debate doutrinário, o fato é que o IRDR, tal como previsto no CPC e tal como vem sendo tratado nos TRFs, como veremos adiante, não adotou puramente nenhum dos sistemas conhecidos. Mais uma vez, como típico no Direito Brasileiro, desenvolvemos um modelo próprio, um tertium genus procedimental para solução de demandas de massa. Garantidamente não é causa-modelo (Musterverfahren), pois o CPC e os Tribunais buscam, sempre que possível, o julgamento concomitante do processo pendente (seja uma ação originária, seja um processo em fase recursal ou devolvido por força de remessa necessária). Oportunamente veremos claramente a tendência dos TRFs de, sempre que possível, atrelarem o caso concreto ao incidente, inclusive sob um mesmo Relator. Garantidamente não é causa-piloto, pois o CPC permite 'vida própria' ao incidente em caso de desistência do caso concreto adjacente. Ademais, reconhecendo-se a possibilidade de IRDR em matéria de juizados, por óbvio, o Tribunal jugará a questão jurídica sem julgar o caso concreto, sobre o qual falece competência". 

ALMEIDA, Marcelo Eugênio Feitosa. Musterverfahren X Pilotverfahren: os regimes de IRDR adotados pelos Tribunais Regionais Federais. Publicações da Escola da AGU. v. 9 - n. 4 - Brasília-DF: out./dez. 2017, págs. 149-151.

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