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24 de junho de 2021

Por usurpar competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil, Comercial e política de seguros, é inconstitucional legislação estadual que impeça as operadoras de planos de saúde de recusarem o atendimento ou a prestação de alguns serviços, no âmbito de seu território, aos usuários diagnosticados ou suspeitos de estarem com Covid-19, em razão de período de carência contratual vigente.

 DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

DIREITO CIVIL – CONTRATOS

DIREITO DA SAÚDE – SAÚDE SUPLEMENTAR

 

Competência legislativa: plano de saúde, carência contratual e Covid-19 - ADI 6493/PB 

 

Resumo:

Por usurpar competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil, Comercial e política de seguros, é inconstitucional legislação estadual que impeça as operadoras de planos de saúde de recusarem o atendimento ou a prestação de alguns serviços, no âmbito de seu território, aos usuários diagnosticados ou suspeitos de estarem com Covid-19, em razão de período de carência contratual vigente.

A imposição de períodos de carência pelas operadoras de planos de saúde é tema que já foi disciplinado pela Lei federal 9.656/1998, no exercício de competência privativa da União [Constituição Federal (CF) art., 22, I e VII] (1), de modo que não cabe ao legislativo estadual inovar na matéria.

Ademais, ao impor obrigações às operadoras de planos de saúde, a Lei 11.716/2020 do estado da Paraíba (2) interfere diretamente nas relações contratuais firmadas entre as operadoras e os usuários contratantes, ocasionando relevante impacto financeiro. Em consequência, influencia na eficácia do serviço prestado pelas operadoras, que se veem obrigadas a alterar substancialmente a atuação apenas naquela unidade federativa.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.716/2020 do estado da Paraíba. Vencidos os ministros Edson Fachin, Marco Aurélio e Rosa Weber.

(1) CF/1988: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; (...) VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;”

(2) Lei 11.716/2020-PB: “Art. 1º Durante a vigência de carência contratual, as operadoras de planos de saúde no âmbito do Estado da Paraíba não poderão recusar atendimento ou prestação de qualquer serviço aos seus usuários que estejam com quadro clínico ainda não diagnosticado ou prováveis de contágio pelo COVlD-19 e que seja indicada a realização de testagem, ou com diagnóstico positivo de contaminação pelo COVlD-19. § 1° Os serviços a serem obrigatoriamente prestados durante a carência correspondem a todos aqueles contratados pelo consumidor e que tenham relação direta com o quadro de saúde apresentado em razão da contaminação pelo COVlD-19. § 2° Os serviços devem ser prestados nas exatas condições pactuadas contratualmente. Art. 2º O descumprimento do disposto nesta Lei sujeitará ao infrator imposição de multa em valor equivalente a 100 (cem) UFR-PB (Unidades Fiscais de Referência do Estado da Paraíba) vigente na data da aplicação da penalidade, cujo valor da multa será destinado ao Fundo Estadual de Saúde. Art. 3° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 4° Revogam-se as disposições em contrário.”

ADI 6493/PB, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 11.6.2021 (sexta-feira), às 23:59


8 de junho de 2021

STF determinou que a Anvisa, no prazo de 30 dias, decida sobre a importação excepcional e temporária da vacina Sputnik V contra a Covid-19

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-1015-stf-1.pdf


DIREITO À SAÚDE-  STF determinou que a Anvisa, no prazo de 30 dias, decida sobre a importação excepcional e temporária da vacina Sputnik V contra a Covid-19 

É possível que ente federado proceda à importação e distribuição, excepcional e temporária, de vacina contra o coronavírus, no caso de ausência de manifestação, a esse respeito, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA no prazo estabelecido pelo art. 16 da Lei nº 14.124/2021. Caso concreto: no dia 08/04/2021, o Estado do Maranhão ingressou com pedido de tutela provisória incidental alegando que a União estaria descumprindo o Plano Nacional de Vacinação, o que teria levado o Estado a adquirir 4 milhões e meio de doses da vacina Sputnik V, produzida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia. O Estado afirmou que, para conseguir trazer regularmente as vacinas para o Brasil, protocolizou na Anvisa, no dia 29/03/2021, pedido de autorização excepcional de uso e de importação da Sputnik V. Ocorre que a agência ainda não teria examinado o requerimento, a despeito da situação de urgência. Diante disso, o Estado do Maranhão pediu ao STF, a título de tutela provisória incidental, que seja determinado à Anvisa que emita autorização excepcional de uso e importação da vacina Sputnik V, conforme requerimento apresentado. O STF deferiu em parte o pedido e determinou que a Anvisa, no prazo máximo de 30 dias, a contar de 29/3/2021, decida sobre a importação excepcional e temporária da vacina Sputnik V. Fundamento legal para a decisão: art. 16, § 4º da Lei nº 14.124/2021. STF. Plenário. ACO 3451 TPI-Ref/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 30/4/2021 (Info 1015). 

ACO 3451 

Em 09/12/2020, o Estado do Maranhão ingressou com ação cível originária contra a União, no STF, alegando que “o Governo Federal, por razões de índole política ou ideológica, tem deixado de adotar medidas necessárias à promoção do direito fundamental à saúde, em especial no que tange à elaboração e execução de um plano de imunização da população brasileira.” Ao final, o autor formulou dois pedidos principais: a) que fosse declarado que o Estado do Maranhão pode realizar um plano estadual de imunização buscando, inclusive, a celebração de acordos para aquisição direta de vacinas, nos termos do art. 3º, VIII, “a”, da Lei nº 13.797/2020; b) que a União fosse condenada a conceder auxílio financeiro ao Estado do Maranhão para a aquisição das vacinas necessárias a imunizar sua população ou, alternativamente, que fosse permitido que o Estado compensasse as despesas que ele terá com a vacinação com as dívidas que possui com a União (Estado gasta com a vacinação e depois pode descontar isso das dívidas que tem com a União). 

Liminar 

No dia 24/02/2021, o Plenário do STF concedeu parcialmente a medida cautelar e decidiu que: 

1) Em princípio, as vacinas a serem oferecidas contra a covid-19 são aquelas incluídas no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação elaborado pela União; 

2) Se o plano for descumprido pela União ou se ele não atingir cobertura imunológica tempestiva e suficiente contra a doença, os Estados, DF e Municípios poderão dispensar (conceder) à população as vacinas que esses entes possuírem, desde que tenham sido previamente aprovadas pela Anvisa; 

3) Se a Anvisa não expedir a autorização competente, no prazo de 72 horas, os Estados, DF e Municípios poderão importar e distribuir vacinas que já tenham sido registradas nos Estados Unidos (EUA), na União Europeia (EMA), no Japão (PMDA) ou na China (NMPA). Além disso, tais entes poderão também importar e distribuir quaisquer outras vacinas que já tenham sido aprovadas, em caráter emergencial (Resolução DC/ANVISA 444, de 10/12/2020), pela ANVISA. 

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no caso de descumprimento do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 ou na hipótese de cobertura imunológica intempestiva e insuficiente, poderão dispensar às respectivas populações (a) vacinas das quais disponham, previamente aprovadas pela Anvisa; e (b) no caso de não expedição da autorização competente, no prazo de 72 horas, vacinas registradas por pelo menos uma das autoridades sanitárias estrangeiras e liberadas para distribuição comercial nos respectivos países, bem como quaisquer outras que vierem a ser aprovadas, em caráter emergencial. STF. Plenário. ADPF 770 MC-Ref/DF e ACO 3451 MC-Ref/MA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 24/2/2021 (Info 1006). 

Vale ressaltar que essa decisão de 24/02/2021 foi apenas referente à medida cautelar. Não se julgou ainda definitivamente a ação. 

Tutela provisória incidental 

No dia 08/04/2021, o Estado do Maranhão ingressou com pedido de tutela provisória incidental alegando que a União estaria descumprindo o Plano Nacional de Vacinação, o que teria levado o Estado a adquirir 4 milhões e meio de doses da vacina Sputnik V, produzida pelo Instituto Gamaleya, da Rússia. O Estado afirmou que, para conseguir trazer regularmente as vacinas para o Brasil, protocolizou na Anvisa, no dia 29/03/2021, pedido de autorização excepcional de uso e de importação da Sputnik V. Ocorre que a agência ainda não teria examinado o requerimento, a despeito da situação de urgência. Diante disso, o Estado do Maranhão pediu ao STF, a título de tutela provisória incidental, que: a) seja determinado à Anvisa que emita autorização excepcional de uso e importação da vacina Sputnik V, conforme requerimento apresentado; b) seja fixada, em caso de eventual descumprimento, multa diária no valor de R$ 1 milhão. 

O que decidiu o STF? 

O Plenário do STF, por maioria, referendou decisão do Min. Relator Ricardo Lewandoswski e determinou que a Anvisa, no prazo máximo de 30 dias, a contar de 29/3/2021, decida sobre a importação excepcional e temporária da vacina Sputnik V. 

Qual é o fundamento legal para essa decisão? 

O § 4º do art. 16 da Lei nº 14.124/2021, que diz o seguinte: 

Art. 16. A Anvisa, conforme estabelecido em ato regulamentar próprio, oferecerá parecer sobre a autorização excepcional e temporária para a importação e a distribuição e a autorização para uso emergencial de quaisquer vacinas e medicamentos contra a covid-19, com estudos clínicos de fase 3 concluídos ou com os resultados provisórios de um ou mais estudos clínicos, além de materiais, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária, que não possuam o registro sanitário definitivo na Anvisa e considerados essenciais para auxiliar no combate à covid19, desde que registrados ou autorizados para uso emergencial por, no mínimo, uma das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição em seus respectivos países: I - Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos da América; II - European Medicines Agency (EMA), da União Europeia; III - Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA), do Japão; IV - National Medical Products Administration (NMPA), da República Popular da China; V - Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency (MHRA), do Reino Unido da GrãBretanha e Irlanda do Norte; VI - Ministry of Health of the Russian Federation, da Federação da Rússia; VII - Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO), da República da Índia; VIII - Korea Disease Control and Prevention Agency (KDCA), da República da Coreia; IX - Health Canada (HC), do Canadá; X - Therapeutic Goods Administration (TGA), da Comunidade da Austrália; XI - Administración Nacional de Medicamentos, Alimentos y Tecnología Médica (ANMAT), da República Argentina; XII - outras autoridades sanitárias estrangeiras com reconhecimento internacional e certificadas, com nível de maturidade IV, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) ou pelo International Council for Harmonisation of Technical Requirements for Pharmaceuticals for Human Use - Conselho Internacional para Harmonização de Requisitos Técnicos para Registro de Medicamentos de Uso Humano (ICH) e pelo Pharmaceutical Inspection Co-operation Scheme - Esquema de Cooperação em Inspeção Farmacêutica (PIC/S). § 1º Compete à Anvisa a avaliação das solicitações de autorização de que trata o caput deste artigo e das solicitações de autorização para o uso emergencial e temporário de vacinas contra a covid19, no prazo de até 7 (sete) dias úteis para a decisão final, dispensada a autorização de qualquer outro órgão da administração pública direta ou indireta para os produtos que especifica. § 2º Para fins do disposto no § 1º deste artigo, a Anvisa poderá requerer, fundamentadamente, a realização de diligências para complementação e esclarecimentos sobre os dados de qualidade, de eficácia e de segurança de vacinas contra a covid-19. § 3º O relatório técnico da avaliação das vacinas contra a covid-19, emitido ou publicado pelas autoridades sanitárias internacionais, deverá ser capaz de comprovar que a vacina atende aos padrões de qualidade, de eficácia e de segurança estabelecidos pela OMS ou pelo ICH e pelo PIC/S. § 4º Na ausência do relatório técnico de avaliação de uma autoridade sanitária internacional, conforme as condições previstas no § 3º deste artigo, o prazo de decisão da Anvisa será de até 30 (trinta) dias. 

O STF afirmou que, depois que ultrapassado o prazo legal de 30 dias, sem que a Anvisa tenha se manifestado, o Estado do Maranhão fica autorizado a importar e a distribuir o referido imunizante à população local, sob sua exclusiva responsabilidade, e desde que observadas as cautelas e recomendações do fabricante e das autoridades médicas. 

Em suma: É possível que ente federado proceda à importação e distribuição, excepcional e temporária, de vacina contra o coronavírus, no caso de ausência de manifestação, a esse respeito, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA no prazo estabelecido pelo art. 16 da Lei nº 14.124/2021. STF. Plenário. ACO 3451 TPI-Ref/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 30/4/2021 (Info 1015). 

Os Estados-membros e os Municípios não podem ser alijados do combate à Covid-19, notadamente porque estão investidos do poder-dever de empreender as medidas necessárias para o enfrentamento da emergência sanitária resultante do alastramento incontido da doença. Isso porque a Constituição outorgou a todos os entes federados a competência comum de cuidar da saúde, compreendida nela a adoção de quaisquer medidas que se mostrem necessárias para salvar vidas e garantir a higidez física das pessoas ameaçadas ou acometidas pela nova moléstia. Exige-se, mais do que nunca, uma atuação fortemente proativa dos agentes públicos de todos os níveis governamentais, diante do elevadíssimo número de novas mortes e infecções diárias, as quais têm crescido exponencialmente, bem como da falta de vagas em Unidades de Terapia Intensiva, da insuficiência de leitos hospitalares, do desabastecimento de oxigênio, da carência de sedativos, relaxantes musculares, antivirais e antibióticos, dentre outros fármacos, sobretudo para atender os pacientes mais graves, o que está a indicar um iminente colapso da rede de saúde pública e privada, com consequências sanitárias inimagináveis.

6 de junho de 2021

O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-694-stj-1.pdf


EXECUÇÃO PENAL 

O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida 

Caso concreto: João cumpria pena em regime semiaberto. O juiz da vara de execuções penais concedeu ao condenado a progressão ao regime aberto. Uma das condições impostas a João foi a de que ele deveria ficar comparecendo mensalmente perante o juízo para informar e justificar suas atividades (art. 113 c/c o art. 115, IV, da LEP). Ocorre que, diante da situação de pandemia decorrente da Covid-19, o CNJ recomendou a suspensão temporária do dever de apresentação regular em juízo das pessoas em cumprimento de pena no regime aberto (art. 5º, inciso V, da Recomendação nº 62/2020 do CNJ). O TJ acolheu a recomendação, assim como o juiz das execuções penais. O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida. STJ. 6ª Turma. HC 657.382/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: 

João cumpria pena em regime semiaberto. O juiz da vara de execuções penais concedeu ao condenado a progressão ao regime aberto. Uma das condições impostas a João foi a de que ele deveria ficar comparecendo mensalmente perante o juízo para informar e justificar suas atividades. 

O juiz poderia ter imposto essa condição? SIM. Isso está previsto no art. 113 c/c o art. 115, IV, da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84): 

Art. 113. O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo Juiz. 

Art. 115. O Juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias: (...) IV - comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades, quando for determinado. 

Recomendação nº 62/2020-CNJ 

Ocorre que, diante da situação de pandemia decorrente da Covid-19, o Conselho Nacional de Justiça recomendou a suspensão temporária do dever de apresentação regular em juízo das pessoas em cumprimento de pena no regime aberto (art. 5º, inciso V, da Recomendação nº 62/2020 do CNJ). O Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina acolheu a recomendação e determinou a suspensão das apresentações mensais em juízo dos apenados em regime aberto (art. 3º, III, da Resolução Conjunta GP/CGJ nº 5/2020). 

Juiz da execução suspendeu o comparecimento obrigatório de João 

Diante de tais atos normativos, o magistrado singular suspendeu o dever de apresentação mensal em Juízo aplicado aos apenados em regime aberto. A defesa de João pleiteou que, mesmo esses meses nos quais o comparecimento está suspenso sejam computados para fins de cumprimento de pena. Em outras palavras, a defesa pediu o reconhecimento do período de suspensão como pena efetivamente cumprida. Isso porque o apenado não está comparecendo por força do ato normativo do TJ (e não por vontade própria). 

O pedido da defesa deve ser acolhido? SIM. 

Conforme visto acima, a suspensão do dever de apresentação mensal em Juízo foi determinada pelo magistrado em cumprimento à recomendação do CNJ e à determinação do TJ/SC, decorrentes da situação de pandemia, circunstância alheia à vontade do paciente. Desse modo, não se mostra razoável o prolongamento da pena sem que tenha sido evidenciada a participação do apenado em tal retardamento. Com a mesma conclusão, cite-se trecho das Orientações sobre Alternativas Penais no âmbito das medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19), também elaborada pelo Conselho Nacional de Justiça para disciplinar situação semelhante à ora analisada: “No âmbito da execução penal, transação penal e condições impostas por suspensão condicional do processo e sursis: (I) Dispensar o comparecimento pessoal para o cumprimento de penas e medidas alternativas - como a prestação de serviços à comunidade, o comparecimento em juízo etc. - durante o período da pandemia; (II) Computar o período de dispensa temporária do cumprimento de penas e medidas alternativas de cunho pessoal e presencial - como a prestação de serviços à comunidade, o comparecimento em juízo etc. - durante o período da pandemia, como período de efetivo cumprimento, considerando que a sua interrupção independe da vontade da pessoa em cumprimento, decorrendo diretamente de imposição determinada por autoridades sanitárias, além do que a manutenção prolongada de pendências jurídico-penais tem um efeito dessocializador, em particular quanto as oportunidades de trabalho e renda”. Vale ressaltar, ainda, que o apenado cumpriu todas as demais condições do regime aberto, que não foram suspensas, inclusive, permaneceu sujeito às sanções relativas a eventual descumprimento, o que reforça a necessidade de se reconhecer o tempo de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo como pena efetivamente cumprida, sob pena de alargar o período em que o apenado está sujeito à disciplina do regime aberto. 

Em suma: O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida. STJ. 6ª Turma. HC 657.382/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 



 



5 de junho de 2021

Atendida a razoabilidade, é constitucional legislação estadual que prevê a vedação do corte do fornecimento residencial dos serviços de energia elétrica, em razão do inadimplemento, parcelamento do débito, considerada a crise sanitária

 Covid-19: Competência legislativa estadual e vedação de interrupção dos serviços públicos de distribuição de energia elétrica por falta de pagamento durante a pandemia - ADI 6588/AM 

Resumo:

Atendida a razoabilidade, é constitucional legislação estadual que prevê a vedação do corte do fornecimento residencial dos serviços de energia elétrica, em razão do inadimplemento, parcelamento do débito, considerada a crise sanitária.

De fato, na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (1), o texto constitucional não impede a elaboração de legislação estadual ou distrital que, preservando o núcleo relativo às normas gerais editadas pelo Congresso Nacional, venha a complementá-las e não substituí-las. Portanto, legítima a complementação, em âmbito regional, da legislação editada pela União, a fim de, ampliando-se a proteção do consumidor, preservar o fornecimento de serviço público.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra as Leis 5.143/2020 e 5.145/2020 do estado do Amazonas que proíbem o corte do fornecimento residencial de seus serviços por falta de pagamento de suas respectivas contas, enquanto perdurar o estado de emergência decorrente de situações de extrema gravidade social.

(1) Precedentes citados: ADI 5.462/RJ, relator Min. Alexandre de Moraes (DJe de 29.10.2018); ADI 5.745/RJ, relator Min. Alexandre de Moraes, redator do acórdão Min. Edson Fachin (DJe de 16.9.2019); ADI 5.940/ES, relator Min. Gilmar Mendes, redator do acórdão Min. Edson Fachin (DJe de 3.2.2020).              

ADI 6588/AM, relator Min. Marco Aurélio, julgamento virtual finalizado em 28.5.2021 (sexta-feira), às 23:59

É inconstitucional lei estadual que estabeleça redução das mensalidades no âmbito da rede privada de ensino, enquanto perdurarem as medidas temporárias para o enfrentamento da pandemia da Covid-19.

 DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA; PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS; ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA

DIREITO CIVIL – CONTRATOS

 

Covid-19: legislação estadual e mensalidades escolares - ADI 6445/PA 

Resumo:

É inconstitucional lei estadual que estabeleça redução das mensalidades no âmbito da rede privada de ensino, enquanto perdurarem as medidas temporárias para o enfrentamento da pandemia da Covid-19.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a natureza de direito civil das normas incidentes sobre a contraprestação de serviços de educação, por tratarem de questão relacionada aos contratos. A lei impugnada, ao dispor sobre os termos em que serão descontados valores nas contraprestações pactuadas entre as instituições de ensino e os estudantes, interfere na essência do contrato, de maneira a suspender a vigência de cláusulas contratuais que estão no âmbito da normalidade dos negócios jurídicos onerosos. Não se cuida, portanto, de típica disciplina acerca da proteção do consumidor contra eventuais ações abusivas por parte dos prestadores de serviços educacionais. De modo que caracterizada usurpação da competência privativa da União para legislar sobre direito civil.

Ademais, além de o ato legislativo estadual contrariar disciplina federal existente sobre o assunto, não se verifica peculiaridade regional a justificar um regramento específico quanto aos efeitos da pandemia da Covid-19 em tais contratos.

Sob o aspecto material, a norma impugnada contraria a livre iniciativa e interfere de forma desproporcional em relações contratuais regularmente constituídas.

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 9.065/2020 do estado do Pará, vencidos os ministros Marco Aurélio (relator), Edson Fachin e Rosa Weber. Os ministros Alexandre de Moraes e Roberto Barroso declararam a inconstitucionalidade formal da mencionada legislação.

ADI 6445/PA, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 28.5.2021 (sexta-feira), às 23:59

14 de maio de 2021

STJ prorroga julgamentos por videoconferência até 1º de julho

 O Superior Tribunal de Justiça (STJ) prorrogou até 1º de julho a realização das sessões de julgamento por videoconferência. A medida foi adotada por meio da Resolução STJ/GP 20/2021, assinada pelo presidente da corte, ministro Humberto Martins.

Em vigor desde abril do ano passado, as sessões ordinárias e extraordinárias por videoconferência foram implementadas para evitar a disseminação da Covid-19. As ações preventivas são reavaliadas regularmente pela Presidência do tribunal, com base nas informações das autoridades de saúde.

13 de maio de 2021

É possível que ente federado proceda à importação e distribuição, excepcional e temporária, de vacina contra o coronavírus, no caso de ausência de manifestação, a esse respeito, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA no prazo estabelecido pela Lei 14.124/2021

DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITO À SAÚDE

 

Covid-19: importação de vacinas por unidade federativa e manifestação da ANVISA - ACO 3451 TPI-Ref/DF 

 

Resumo:

É possível que ente federado proceda à importação e distribuição, excepcional e temporária, de vacina contra o coronavírus, no caso de ausência de manifestação, a esse respeito, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA no prazo estabelecido pela Lei 14.124/2021 (1).

Na linha da jurisprudência da Corte (2), os entes regionais e locais não podem ser alijados do combate à Covid-19, notadamente porque estão investidos do poder-dever de empreender as medidas necessárias para o enfrentamento da emergência sanitária resultante do alastramento incontido da doença. Isso porque a Constituição outorgou a todos os entes federados a competência comum de cuidar da saúde, compreendida nela a adoção de quaisquer medidas que se mostrem necessárias para salvar vidas e garantir a higidez física das pessoas ameaçadas ou acometidas pela nova moléstia.

Exige-se, mais do que nunca, uma atuação fortemente proativa dos agentes públicos de todos os níveis governamentais, diante do elevadíssimo número de novas mortes e infecções diárias, as quais têm crescido exponencialmente, bem como da falta de vagas em Unidades de Terapia Intensiva, da insuficiência de leitos hospitalares, do desabastecimento de oxigênio, da carência de sedativos, relaxantes musculares, antivirais e antibióticos, dentre outros fármacos, sobretudo para atender os pacientes mais graves, o que está a indicar um iminente colapso da rede de saúde pública e privada, com consequências sanitárias inimagináveis.

No caso, trata-se de pedido de tutela provisória incidental em que o estado do Maranhão alega o descumprimento, pela União, do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, o que teria levado a referida unidade federativa a adquirir 4.582.862 (quatro milhões, quinhentas e oitenta e duas mil, oitocentas e sessenta e duas) doses da vacina Sputnik V, produzida pelo Instituto Gamaleya da Rússia, nos termos da Lei 14.124/2021.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, referendou a decisão que deferiu parcialmente liminar em ação cível originária “para determinar que, no prazo máximo de 30 dias, a contar de 29.3.2021, a Anvisa decida sobre a importação excepcional e temporária da vacina Sputnik V, nos termos do art. 16, § 4º, da Lei 14.124/2021. Ultrapassado o prazo legal, sem a competente manifestação da Anvisa, estará o estado do Maranhão autorizado a importar e a distribuir o referido imunizante à população local, sob sua exclusiva responsabilidade, e desde que observadas as cautelas e recomendações do fabricante e das autoridades médicas”. Vencido o ministro Nunes Marques.

(1) Lei 14.124/2021: “Art. 16. A Anvisa, conforme estabelecido em ato regulamentar próprio, oferecerá parecer sobre a autorização excepcional e temporária para a importação e a distribuição e a autorização para uso emergencial de quaisquer vacinas e medicamentos contra a covid-19, com estudos clínicos de fase 3 concluídos ou com os resultados provisórios de um ou mais estudos clínicos, além de materiais, equipamentos e insumos da área de saúde sujeitos à vigilância sanitária, que não possuam o registro sanitário definitivo na Anvisa e considerados essenciais para auxiliar no combate à covid-19, desde que registrados ou autorizados para uso emergencial por, no mínimo, uma das seguintes autoridades sanitárias estrangeiras e autorizados à distribuição em seus respectivos países: (...) § 4º Na ausência do relatório técnico de avaliação de uma autoridade sanitária internacional, conforme as condições previstas no § 3º deste artigo, o prazo de decisão da Anvisa será de até 30 (trinta) dias.”

(2) Precedentes citados: ADI 6.341MC-Ref/DF, relator Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Edson Fachin (DJe de 13.11.2020); ADPF 672 MC-Ref/DF, relator Min. Alexandre de Moraes (DJe de 29.10.2020); ADI 6.362/DF, relator Min. Ricardo Lewandowski (DJe de 9.12.2020); ADI 6.625 MC-Ref/DF, relator Min. Ricardo LEwandowski (DJe de 12.4.2021).

ACO 3451 TPI-Ref/DF, relator Min. Ricardo Lewandowski, julgamento virtual finalizado em 30.4.2021 (sexta-feira) às 23:59 

11 de maio de 2021

A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.

RMS 65.757-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021. 

Concurso público. Enfermeiro. Cadastro de reserva. Direito à nomeação. Contratação temporária. Descaracterização. Contratação decorrente da pandemia causada pelo vírus SARS-COV-2. Determinação judicial para contratação temporária.


A contratação temporária de terceiros para o desempenho de funções do cargo de enfermeiro, em decorrência da pandemia causada pelo vírus Sars-CoV-2, e determinada por decisão judicial, não configura preterição ilegal e arbitrária nem enseja direito a provimento em cargo público em favor de candidato aprovado em cadastro de reserva.


A orientação da jurisprudência do STJ é no sentido de que a simples existência de contratação temporária não significa, por si só, a preterição a direito do aprovado em concurso público, e isso porque além de ter assento constitucional, ou seja, ser uma situação permitida pela lei maior do país, o que denota a sua regularidade intrínseca, a ilegalidade da contratação somente ocorrerá quando não observados os requisitos da lei de regência da respectiva unidade federativa.

No caso analisado, o contexto da demanda revela, de uma lado, que a Administração Pública local agiu com bastante clareza ao arregimentar candidatos para um certame no qual não havia vagas disponíveis, fato que não é debelado, por outro lado, com a contratação temporária de terceiros decorrente da excepcionalidade da situação, ainda atual, da pandemia decorrente do vírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.

Pesa considerar ainda que a contratação temporária questionada teve origem em demanda judicial ajuizada justamente com o escopo da necessidade temporária gerada pelo advento da pandemia.

Isso corrobora ainda a inexistência de preterição ilegal, forte na jurisprudência desta Corte que assim compreende quando a nomeação decorre de determinação judicial.

Normalmente os casos concretos avaliados referem-se à inobservância da ordem classificatória, mas como isso advém de decisão judicial então não haveria ilegalidade na prática administrativa, como no caso do AgInt no RMS 55.701/GO (Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 25/08/2020, DJe 01/09/2020).

No presente caso, embora a situação fática seja distinta, a razão é a mesma, porque a Administração Pública local somente procedeu à contratação em virtude de ordem judicial, o que igualmente retira do fato a pecha da preterição ilegal.

8 de maio de 2021

HABEAS CORPUS COLETIVO IMPETRADO PELA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CONTRA DECISÃO PROFERIDA POR DESEMBARGADOR RELATOR QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR DE WRIT COLETIVO MANEJADO NA ORIGEM, RELEGANDO A ANÁLISE DE EVENTUAL PEDIDO DE SOLTURA, CASO A CASO, DURANTE A PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS, DESDE QUE PRESENTES DETERMINADAS CONDIÇÕES AVENTADAS PELO SEU PROLATOR, ENTRE ELAS, O ESTADO DE SAÚDE DO DEVEDOR DE ALIMENTOS. MANIFESTA TERATOLOGIA DO DECISUM. RECONHECIMENTO

HABEAS CORPUS Nº 569.014 - RN (2020/0075268-5) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

HABEAS CORPUS COLETIVO IMPETRADO PELA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CONTRA DECISÃO PROFERIDA POR DESEMBARGADOR RELATOR QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR DE WRIT COLETIVO MANEJADO NA ORIGEM, RELEGANDO A ANÁLISE DE EVENTUAL PEDIDO DE SOLTURA, CASO A CASO, DURANTE A PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS, DESDE QUE PRESENTES DETERMINADAS CONDIÇÕES AVENTADAS PELO SEU PROLATOR, ENTRE ELAS, O ESTADO DE SAÚDE DO DEVEDOR DE ALIMENTOS. MANIFESTA TERATOLOGIA DO DECISUM. RECONHECIMENTO, A AUTORIZAR A FLEXIBILIZAÇÃO DA SÚMULA N. 691/STF. POSICIONAMENTO PACÍFICO DAS TURMAS DE DIREITO PRIVADO DO STJ QUANTO À ILEGALIDADE DA PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS EM REGIME FECHADO, NO PERÍODO DA PANDEMIA, ANTES OU DEPOIS DA LEI N. 10.410/2020. RECONHECIMENTO. DIVERGÊNCIA SUBSISTENTE DAS TURMAS DE DIREITO PRIVADO DO STJ EM RELAÇÃO AO PERÍODO ANTERIOR À LEI (SE DIFERIDA; OU SE EM REGIME DOMICILIAR) QUE NÃO TEM REPERCUSSÃO NO CASO DOS AUTOS. RECONHECIMENTO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA PARA, EM RATIFICAÇÃO À TUTELA COLETIVA LIMINAR ANTERIORMENTE DEFERIDA, DETERMINAR QUE AS PRISÕES CIVIS POR DÍVIDA ALIMENTARES EM TODO O ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEJAM CUMPRIDAS NA MODALIDADE DOMICILIAR, SEM PREJUÍZO DA EXIGIBILIDADE DAS RESPECTIVAS OBRIGAÇÕES. 

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça prevê a possibilidade de mitigação do entendimento consolidado na Súmula n. 691/STF quando constatada a existência de manifesta ilegalidade ou abuso de poder na decisão unipessoal do relator que, na origem, indefere medida liminar requerida em habeas corpus. 

2. A impetração de habeas corpus coletivo reveste-se de adequação e utilidade, a abarcar todos os pacientes que se encontram objetivamente na situação descrita na norma. 

3. No mérito, o ato coator consiste no indeferimento do pedido coletivo liminar em habeas corpus impetrado na origem, sem prejuízo de que eventual pedido de soltura individual pudesse ser analisado, caso a caso, pelo respectivo Juízo natural. De seus termos, ressai clara a possibilidade de subsistir o aprisionamento em estabelecimento coletivo de devedor de alimentos durante a pandemia causada pelo Coronavírus (Covid-19), devendo-se levar em consideração, segundo a proposição do Desembargador relator, determinadas circunstâncias, como o estado de saúde do devedor. 

4. O ato coator, no cenário pandêmico em que se vivencia, encerra manifesta teratologia. 

4.1. Passados sete meses do primeiro caso de Covid-19 registrado no Brasil (26/2/2020), os dados oficiais do Governo Federal indicam expressivos números de casos e de óbitos, a revelar seu elevado grau de disseminação e de letalidade, indiscutivelmente. Ainda que haja determinados grupos de pessoas mais suscetíveis aos deletérios efeitos causados pelo novo Coronavírus, não se pode precisar, com segurança, no atual estágio científico, a reação de cada organismo, tampouco relegar ao magistrado, por simples dados estatísticos, a tarefa de avaliar, no caso concreto, a existência de risco à saúde para o devedor de alimentos, olvidando, inclusive, o alto índice de transmissibilidade – incontida – do vírus em caso de encarceramento. 

4.2. Em atenção: i) ao estado de emergência em saúde pública declarado pela Organização Mundial de Saúde, que perdura até os dias atuais, decorrente da pandemia de Covid-19, doença causada pelo Coronavírus (Sars-Cov-2); ii) à adoção de medidas necessárias à contenção da disseminação levadas a efeito pelo Poder Público, as quais se encontram em vigor; iii) à Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça consistente na colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia; e, mais recentemente, iv) à edição da Lei n. 10.410, de 10 de junho de 2020, que determinou, expressamente, que, até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida de alimentos seja cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações, mostra-se flagrante a ilegalidade no ato atacado, a autorizar, excepcionalmente, o conhecimento do presente writ e, principalmente, a concessão da ordem impetrada. 

5. As Turmas de Direito Privado do STJ são uníssonas em reconhecer a indiscutível ilegalidade/teratologia da prisão civil, sob o regime fechado, no período de pandemia, anterior ou posterior à Lei n. 10.410/2020. 

6. A divergência subsistente no âmbito das Turmas de Direito Privado refere-se apenas ao período anterior à edição da Lei n. 10.410/2020, tendo esta Terceira Turma, no tocante a esse interregno, compreendido ser possível o diferimento da prisão civil para momento posterior ao fim da pandemia; enquanto a Quarta Turma do STJ tem reconhecido a necessidade de aplicar o regime domiciliar. 

6.1. Essa discussão, todavia, no caso dos autos, não tem maiores repercussões, na medida em que a tutela coletiva deferida em liminar, no bojo da presente impetração, a qual determinou o cumprimento das prisões civis por devedores de alimentos do Estado do Rio Grande do Norte em regime domiciliar perdurou — e ainda perdura — até a entrada em vigor da Lei n. 10.410/2020, que, de modo peremptório e geral, estabeleceu idêntica disposição, qual seja, o cumprimento da prisão civil pelo regime domiciliar. Logo, as decisões de decreto de prisão civil por dívida alimentar, proferidas pelo Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte então em curso, assim como as que se seguiram, tiveram que se amoldar à deliberação exarada por esta Corte de Justiça em 31/03/2020, cuja autoridade é garantida pelos mecanismos processuais próprios. Tal circunstância decorre da abrangência territorial da tutela inicialmente vindicada pela parte impetrante, adstrita, naturalmente, aos seus limites espaciais de atuação. 

6.2. O mesmo cenário, consigne-se, ocorreu no Habeas Corpus Coletivo n. 568.021/CE, em que a Segunda Seção do STJ acabou por reconhecer a perda superveniente de objeto em virtude do julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em 29/04/2020, que concedeu parcialmente ordem coletiva para determinar a substituição da prisão comum dos presos por dívida alimentar daquele Estado por prisão domiciliar. No Ceará, dada a abrangência territorial da ordem concedida, as decisões de decreto de prisão civil por dívida alimentar, mesmo as anteriores à entrada em vigor da Lei n. 10.410/2020, tiveram que se adequar à determinação de cumprimento sob o regime domiciliar (primeiro, em observância à decisão liminar desta Corte de Justiça, de abrangência nacional ali estendida; depois pela concessão parcial da ordem exarada pelo TJCE). 

6.3. Sob esse ponto de vista, aliás, mostra-se questionável a subsistência de alguma decisão proferida no âmbito de todos os Estados da Federação (em momento anterior à Lei n. 10.410/2020) que, de algum modo, tenha se apartado dos termos da decisão liminar proferida por esta Corte de Justiça no Habeas Corpus Coletivo n. 568.021/CE, que determinou o cumprimento em regime domiciliar da prisão civil, com abrangência nacional, enquanto vigente seus efeitos. Rememora-se que a Segunda Seção do STJ, naquele caso, reconheceu a perda de objeto do writ apenas em 24/6/2020, momento em que a Lei n. 10.410/2020 já tinha entrado em vigor. Ainda que de modo precário (mas absolutamente razoável, tanto que a lei veio dispor de modo idêntico), esta decisão produziu efeitos enquanto vigente, devendo ter sua autoridade preservada nesse período. É de se reconhecer, nessa medida, que a própria divergência existente no âmbito das Turmas de Direito Privado, em relação apenas ao interregno anterior à vigência da Lei n. 10.410/2020, por tal circunstância, acabou por se esvaziar. 

7. Ordem parcialmente concedida para, em ratificação à tutela coletiva liminar anteriormente deferida, determinar que as prisões civis por dívida alimentares em todo o Estado do Rio Grande do Norte sejam cumpridas na modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 06 de outubro de 2020 (data do julgamento).

FAMÍLIA. ALIMENTOS. FILHOS MENORES. ADMISSIBILIDADE EM HIPÓTESES EXCEPCIONAIS. PRISÃO CIVIL NA EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ATUAL (SÚMULA 309/STJ). PANDEMIA DE COVID-19. RISCO DE CONTÁGIO. PRISÃO DOMICILIAR. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA

HABEAS CORPUS Nº 561.257 - SP (2020/0033400-1) 

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO 

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. FAMÍLIA. ALIMENTOS. FILHOS MENORES. ADMISSIBILIDADE EM HIPÓTESES EXCEPCIONAIS. PRISÃO CIVIL NA EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ATUAL (SÚMULA 309/STJ). PANDEMIA DE COVID-19. RISCO DE CONTÁGIO. PRISÃO DOMICILIAR. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 

1. O presente habeas corpus foi impetrado como substitutivo do recurso ordinário cabível, o que somente é admitido excepcionalmente pela jurisprudência desta Corte de Justiça e do egrégio Supremo Tribunal Federal quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado, podendo-se, em tais hipóteses, conceder-se a ordem de ofício. 

2. O pagamento parcial do débito não afasta a regularidade da prisão civil, porquanto as quantias inadimplidas caracterizam-se como débito atual, que compreende as três prestações anteriores à citação e as que vencerem no curso do processo, nos termos da Súmula 309/STJ. 

3. Diante do iminente risco de contágio pelo Covid-19, bem como em razão dos esforços expendidos pelas autoridades públicas em reduzir o avanço da pandemia, é recomendável o cumprimento da prisão civil por dívida alimentar em regime diverso do fechado. 

4. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida para que o paciente, devedor de alimentos, cumpra a prisão civil em regime domiciliar. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, conceder a ordem parcialmente, para que o paciente, devedor de alimentos, cumpra a prisão civil em regime domiciliar, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi (Presidente) e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 05 de maio de 2020 (Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por MARCOS DE SOUZA PEIXOTO em favor de M. A. M. A. K., contra v. acórdão proferido pela Segunda Câmara de Direito Privado do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que denegou a ordem no habeas corpus n. 2274384-52.2019.8.26.0000. 

Os autos dão conta de que o paciente acha-se obrigado ao pagamento mensal, em favor de sues filhos Y. M. D. A. A. K. e K. M. A. K., de quantia equivalente a 160% (cento e sessenta por cento) do salário mínimo, a título de alimentos, tendo o alimentante deixado de adimplir integralmente as prestações. 

Sobrevindo ação de execução de alimentos, sob o rito da coerção pessoal, para a cobrança de dívida alimentar relativa aos meses de fevereiro, abril e maio de 2018, no valor de R$ 4.683,31, bem como das parcelas vincendas no curso da execução (e-STJ, fls. 30/35), o douto Juízo de Direito da Vara de Família e Sucessões da Comarca de Taubaté/SP, rejeitando a justificativa apresentada, decretou a prisão civil do devedor. 

Contra o referido decreto prisional, foi impetrado habeas corpus perante o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, cuja ordem foi denegada, conforme v. acórdão de fls. 19/24, ensejando a impetração do remédio heroico sob análise. 

Sustenta o impetrante, em resumo, que: (a) "o executado/paciente esclareceu a sua condição financeira precária, principalmente porque é de país estrangeiro (Egito), não possui CPF e, portanto, não consegue emprego formal, porém, vem pagando mensalmente alimentos aos filhos no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), e já o fez nos meses de outubro, novembro, dezembro/2019 e janeiro/2020. conforme comprovantes em anexo, não deixando os filhos ao desamparo total" (fl. 7); (b) "nas manifestações das exequentes às fls. 57/59, não era a intenção delas que o paciente, pai das infantes, fosse preso, segundo elas, a expedição de mandando de prisão em seu desfavor ensejaria o não cumprimento da obrigação, como de fato ocorreu, já que expedido mandado de prisão em seu desfavor" (fl. 8); (c) "com base nos documentos juntados a presente manifestação que evidenciam a ausência de voluntariedade e inescusabilidade nos alimentos executados, vez que as exequentes tinham conhecimento da possibilidade do inadimplemento e manifestaram a vontade de não desejar a prisão do executado/paciente, é que a ordem de prisão civil é ilegal, pois, com caráter meramente punitivo e não coercitivo, o que vedado pela Constituição Federal" (fl. 13). 

Pede, por isso, seja concedida a "liminar pleiteada, fazendo cessar o constrangimento ilegal ora suportado pelo paciente, tornando-a definitiva após regular processamento, havendo como conseqüência a revogação da ordem de prisão determinada pelo juízo da Vara da Família e Sucessões da Comarca de Taubaté/SP, dentro dos autos n° 0005555-39.2018.8.26.0625, e expedição de contramandado de prisão, pois desta forma essa Colenda Turma estará editando acórdão compatível com os excelsos ditames da Lei, do Direito e da Justiça!" (fl. 14). 

A liminar foi indeferida, nos termos da decisão de fls. 89/94 (e-STJ). 

Informações foram prestadas pela autoridade apontada como coatora, às fls. 99/101, bem como pelo ilustre Juízo da execução, às fls. 103/154. 

A douta Subprocuradoria-Geral da República opinou pelo não conhecimento do writ, conforme parecer de fls. 156/161. 

Às fls. 164/167, o paciente peticionou nos autos pugnando pela extensão dos efeitos da decisão proferida pelo ilustre Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, nos autos do Habeas Corpus nº 568.021/CE, para garantir ao devedor de pensão alimentícia o cumprimento da prisão civil em regime domiciliar, considerando a situação de pandemia do Covid-19. 

Deferi, nos termos da decisão de fls. 169/170, o mencionado pedido para determinar o cumprimento da prisão civil do paciente devedor de alimentos, em regime domiciliar, até ulterior deliberação desta Corte. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator): É importante ressaltar, desde logo, que os valores executados são atuais, tendo em vista que os credores perseguem as 3 (três) últimas parcelas anteriores ao ajuizamento da execução e as que se venceram no curso desta, de modo que a pretensão observa o disposto na Súmula 309 do STJ, que preconiza: "O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo". Nesse sentido: 

"RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. ALEGAÇÃO DE CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR E QUE NÃO FOI INTIMADO PARA REGULARIZAR O DÉBITO. MATÉRIAS NÃO DEBATIDAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. INVIABILIDADE DE EXAME PELO STJ. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INSTRUÇÃO DEFICIENTE DO WRIT E AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA ILEGALIDADE APONTADA. INADIMPLEMENTO DAS TRÊS PARCELAS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO E DAS QUE VENCERAM NO CURSO DA AÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 309 DO STJ. RECOLHIMENTO DAS ÚLTIMAS PARCELAS. INSUFICIÊNCIA. PAGAMENTO PARCIAL DA PENSÃO NÃO AFASTA O DECRETO DE PRISÃO. PRECEDENTES. RECURSO EM HABEAS CORPUS NÃO PROVIDO. 1. A ausência de debate pelo Tribunal de origem das alegações do recorrente de que não houve desídia ou resistência no cumprimento da obrigação alimentar, de falta de intimação para saldar o débito atrasado e, de ausência de planilha com valores discriminados e individualizados para que pudesse contestar o débito, impossibilita o exame dessas matérias pelo STJ, sobre pena de indevida supressão de instância. Precedentes. 1.1. A deficiência da instrução do writ e a inexistência de provas pré-constituídas de que não houve renitência ou desídia no cumprimento da obrigação alimentar ou de que a necessidade dos alimentos não é atual, impossibilitam a aferição da ilegalidade apontada. 2. O decreto de prisão proveniente da execução de alimentos na qual se visa o recebimento integral de até as três parcelas anteriores ao ajuizamento da ação e das que se vencerem no seu curso não é ilegal. Inteligência da Súmula nº 309 do STJ e precedentes. 3. A jurisprudência dominante do STJ segue no sentido de que o não pagamento integral das parcelas alimentares devidas autoriza a prisão civil do devedor de alimentos. Precedentes. 4. Recurso ordinário em habeas corpus improvido. (RHC 94.459/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe de 03/04/2018) 

De outro lado, é imperioso mencionar que a inadimplência, embora parcial, é incontroversa, reconhecida pelo próprio impetrante, de modo que as justificativas apresentadas não encontram no writ sede adequada à demonstração da justa causa para afastar a prisão civil do devedor de alimentos, uma vez que desacompanhadas de qualquer demonstração concreta de que os valores cobrados na execução de alimentos estejam em desacordo com as possibilidades do alimentante ou com o pensionamento mensal arbitrado em favor dos menores alimentados. 

Sobre o tema, aliás, é de bom alvitre transcrever as seguintes passagens do voto condutor que denegou o habeas corpus impetrado perante o Tribunal de origem, confirmando a ordem de prisão exarada em desfavor do aqui paciente, senão vejamos: 

"Ora, primeiramente, não há falar em alegação contraditória dos credores, porquanto, se de um lado não desejavam a prisão civil do pai, de outro, esperavam que, ao menos com a redução do valor da pensão alimentícia, ele cumprisse o acordo, de sorte que, diante do descumprimento, pugnaram pela expedição do mandado de prisão, como, aliás, previsto na avença, observando os credores, apenas para argumentar, que o pai não regulariza sua situação no país para não pagar a pensão alimentícia, recaindo tal ônus, tão somente, à genitora. Nem se diga que não teve direito ao contraditório, porquanto o decreto prisional não foi lançado assim que comunicado o inadimplemento, conferindo ao paciente oportunidades para manifestar-se sobre o quanto alegado, inclusive para pagar a dívida, tendo plena ciência, portanto, da planilha. Ademais, o paciente, ao revelar que realizou o acordo apenas para não ser preso, naquela ocasião, já que todos tinham ciência de sua hipossuficiência, beira á má-fé, porquanto cediço que o acordo pressupõe a boa-fé dos envolvidos em cumprir o quanto avençado e realizá-lo somente com o intuito de não ser preso, apenas evidencia o seu descaso e a intenção de procrastinar a demanda. O paciente já havia sido beneficiado com os termos da avença e, mesmo assim, cumpriu-a minimamente, não se podendo presumir que o inadimplemento é involuntário." (fls. 22/23) 

Com efeito, a incapacidade financeira, como cediço, deve ser demonstrada de plano, pois, na via estreita do habeas corpus, a prova deve ser pré-constituída, não comportando dilação probatória. A propósito: 

"HABEAS CORPUS. PENSÃO ALIMENTÍCIA. INADIMPLÊNCIA. INCAPACIDADE FINANCEIRA ALEGADA. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. VIA INADEQUADA. AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS. AJUIZAMENTO. INSUFICIÊNCIA COMO JUSTIFICATIVA. PRISÃO CIVIL. ART. 733 DO CPC. POSSIBILIDADE. 1. O habeas corpus não é a via adequada para discutir a obrigação de prestar alimentos em si, mas tão somente para analisar a legalidade da ordem judicial que decretou a prisão civil do devedor. 2. A incapacidade financeira do paciente deve ser demonstrada de plano, uma vez que a via estreita do habeas corpus não comporta dilação probatória. 3. A mera existência de ação revisional de alimentos ajuizada pelo paciente, com regular tramitação, desacompanhada de elementos concretos acerca da situação econômica do devedor, é insuficiente para demonstrar a alegada incapacidade financeira para o cumprimento da obrigação. 4. A prisão domiciliar somente deve ser admitida em hipóteses excepcionais, pois a sua concessão, conforme já decidido por esta eg. Corte, contraria a finalidade principal da prisão civil do devedor de alimentos, qual seja, forçar o cumprimento da obrigação. 5. Ordem denegada." (HC 312.800/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe de 19/06/2015) 

"CIVIL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO. PENSÃO ALIMENTÍCIA ENTRE EX-CÔNJUGES. INADIMPLÊNCIA DO DEVEDOR. PRISÃO CIVIL. ALEGADO EXCESSO DA EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. CAPACIDADE FINANCEIRA DO EXECUTADO E REVISÃO DAS JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PARA O INADIMPLEMENTO DA OBRIGAÇÃO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. DÉBITO PRETÉRITO. NÃO CONFIGURAÇÃO. INADIMPLEMENTO DAS TRÊS PARCELAS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO E DAS QUE VENCERAM NO CURSO DA AÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 309 DO STJ. HABEAS CORPUS DENEGADO. 1. A via estreita do habeas corpus exige prova pré-constituída da ilegalidade afirmada e não comporta dilação probatória, de modo que não cabe ao STJ alterar a conclusão da instância ordinária, formada a partir dos exame dos elementos dos autos, de que não houve modificação do valor da verba alimentar. Inexistência de comprovação de plano do alegado excesso da execução. 2. A verificação da incapacidade financeira do executado e a revisão das justificativas apresentadas para o inadimplemento da obrigação demandam dilação probatória, não se mostrando o writ a via adequada para este mister. Precedentes. 3. Promovida a execução com base no art. 733 do CPC, cobrando as três parcelas anteriores ao ajuizamento da ação e as que venceram no curso da ação, não há falar em débito pretérito a ser cobrado pelo rito do art. 732 do mesmo diploma legal. 4. O decreto de prisão proveniente da execução de alimentos na qual se visa o recebimento integral das três parcelas anteriores ao ajuizamento da ação e das que vencerem no curso não é ilegal. Inteligência da Súmula nº 309 do STJ e precedentes. 5. Há orientação pacificada no STJ de que o não pagamento integral das prestações alimentares devidas autoriza a prisão civil do devedor de alimentos. 6. Ordem denegada." (HC 333.214/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2015, DJe de 10/12/2015) 

"HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PRISÃO CIVIL. SÚMULA N. 309/STJ. DESEMPREGO. CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE. INADMISSIBILIDADE NA VIA ELEITA. 1. É incompatível com a via do habeas corpus, de cognição sumária, a aferição da real capacidade financeira do alimentante em prosseguir no pagamento da pensão alimentícia. 2. Agravo regimental desprovido." (AgRg no HC 340.232/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/03/2016, DJe de 28/03/2016) 

Na hipótese, embora seja a inadimplência incontroversa, reconhecida pelo próprio recorrente, e as justificativas apresentadas não demonstrem plenamente a existência de justa causa para afastar, de plano, a prisão civil do devedor de alimentos, uma vez que desacompanhadas de demonstração concreta relativa às condições econômicas do paciente, percebe-se a ilegalidade na forma de fixação da prisão, diante do recente precedente desta Corte a seguir referido. 

Com efeito, o contexto atual de gravíssima pandemia devido ao chamado coronavírus desaconselha a manutenção do devedor em ambiente fechado, insalubre e potencialmente perigoso, devendo ser observada a decisão proferida pelo ilustre Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, publicada em 30.3.2020, nos autos do Habeas Corpus nº 568.021/CE (2020/0072810-3), no qual se estendeu a todos os presos por dívidas alimentícias no país a liminar deferida no mencionado writ, no sentido de garantir prisão domiciliar aos presos, em razão da pandemia de Covid-19, nos seguintes termos: 

"Vistos etc. A Defensoria Pública da União apresenta pedido de ampliação do polo ativo do presente writ sustentando a necessidade de extensão dos efeitos da decisão proferida às fls. 92/97. Ponderou que o pedido de sua admissão tem por objetivo de promover, em escala federal, a tutela de todas as pessoas reclusas em razão de dívida de alimentos, porque privados de sua liberdade em meio à pandemia do Covid19. Reputou importante a necessidade de uniformização de tratamento a todos que se encontram na mesma situação, pois 'nem todos os judiciários das unidades da federação conheceram e julgaram a questão (ex. Goiás) e, os que julgaram, não o fizeram da mesma forma (o Tribunal de Justiça de São Paulo negou a liminar)' (fl. 115). Referiu que, no atual contexto, em que ocorre o surto da COVID-19 em todo o território brasileiro, quase duas mil pessoas estão com suas liberdades cerceadas por força de decretos de prisão civil decorrentes de dívida de alimentos. Diante da excepcionalidade do caso concreto, acolho o pedido da DPU, determinando o seu ingresso nos autos na qualidade de impetrante e determino a extensão dos efeitos da decisão que deferiu parcialmente a medida liminar para determinar o cumprimento das prisões civis por devedores de alimentos em todo o território nacional, excepcionalmente, em regime domiciliar. Ressalto que as condições de cumprimento da prisão domiciliar serão estipuladas pelos juízos de execução de alimentos, inclusive em relação à duração, levando em conta as medidas adotadas pelo Governo Federal e local para conter a pandemia do Covid-19. A presente decisão, entretanto, não revoga a adoção de medidas mais benéficas eventualmente já determinadas pelos juízos locais. Oficie-se os Presidentes dos Tribunais de todos os Estados da Federação para imediato cumprimento." 

No sentido da relativização do regime prisional previsto no § 4º do art. 528 do CPC/2015, enquanto vigente a pandemia do Covid-19, vale mencionar as decisões monocráticas proferidas no RHC 106.403/SP (Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, DJe de 23/04/2020); no RHC 125.728 (Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJe de 16/04/2020); no HC 561.813/MG (Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 02/04/2020); e no RHC 125.395 (Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, DJe de 02/04/2020). 

Diante do exposto, concedo parcialmente a ordem de habeas corpus, confirmando a decisão de fls. 169/170, no sentido de que o cumprimento da prisão civil do paciente devedor de alimentos, enquanto vigente a pandemia de Covid-19 e o decreto de prisão, seja realizado no regime domiciliar e sob as condições a serem fixadas pelo d. Juízo da execução. 

É como voto. 

4 de maio de 2021

informativo 694, SJT: O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida.

 HC 657.382/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 27/04/2021

Execução penal. Condições do regime aberto. Suspensão do dever de apresentação mensal em juízo. Pandemia covid-19. Circunstância alheia à vontade do apenado. Cumprimento das outras condições. Prolongamento da pena. Impossibilidade. Pena efetivamente cumprida. Reconhecimento.


O período de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo, em razão da pandemia de Covid-19, pode ser reconhecido como pena efetivamente cumprida.

Informações do Inteiro Teor

No caso, o Juiz da Vara de Execuções Penais concedeu a progressão do paciente ao regime aberto e, em audiência admonitória, impôs, dentre outras condições, o comparecimento pessoal e obrigatório perante o Juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades.

Ocorre que, diante da situação de pandemia, o Conselho Nacional de Justiça recomendou a suspensão temporária do dever de apresentação regular em juízo das pessoas em cumprimento de pena no regime aberto (art. 5º, inciso V, da Recomendação n. 62/2020 do CNJ).

Nesse sentido, o Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina acolheu a recomendação e determinou a suspensão das apresentações mensais em juízo dos apenados em regime aberto (art. 3.º, inciso III, da Resolução Conjunta GP/CGJ n. 5/2020).

Diante de tais atos normativos, o magistrado singular suspendeu o dever de apresentação mensal em Juízo aplicado aos apenados em regime aberto. A defesa, então, pleiteou o reconhecimento do período de suspensão como pena efetivamente cumprida, no que foi atendida. Todavia, ao julgar o recurso de agravo em execução, o Tribunal local reformou a decisão.

Com efeito, vê-se que a suspensão do dever de apresentação mensal em Juízo foi determinada pelo magistrado em cumprimento à recomendação do Conselho Nacional de Justiça e à determinação do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, decorrentes da situação de pandemia, circunstância alheia à vontade do paciente. Desse modo, não se mostra razoável o prolongamento da pena sem que tenha sido evidenciada a participação do apenado em tal retardamento.

Com a mesma conclusão cite-se trecho das Orientações sobre Alternativas Penais no âmbito das medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19), também elaborada pelo Conselho Nacional de Justiça para disciplinar situação semelhante à ora analisada:

"No âmbito da execução penal, transação penal e condições impostas por suspensão condicional do processo e sursis: (I) Dispensar o comparecimento pessoal para o cumprimento de penas e medidas alternativas - como a prestação de serviços à comunidade, o comparecimento em juízo etc. - durante o período da pandemia; (II) Computar o período de dispensa temporária do cumprimento de penas e medidas alternativas de cunho pessoal e presencial - como a prestação de serviços à comunidade, o comparecimento em juízo etc. - durante o período da pandemia, como período de efetivo cumprimento, considerando que a sua interrupção independe da vontade da pessoa em cumprimento, decorrendo diretamente de imposição determinada por autoridades sanitárias, além do que a manutenção prolongada de pendências jurídico-penais tem um efeito dessocializador, em particular quanto as oportunidades de trabalho e renda".

Outrossim, o paciente cumpriu todas as demais condições do regime aberto, que não foram suspensas, inclusive, permaneceu sujeito às sanções relativas a eventual descumprimento, o que reforça a necessidade de se reconhecer o tempo de suspensão do dever de apresentação mensal em juízo como pena efetivamente cumprida, sob pena de alargar o período em que o apenado está sujeito à disciplina do regime aberto.

30 de abril de 2021

É constitucional lei estadual que proibiu o corte de energia elétrica durante a pandemia da Covid-19

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-1012-stf.pdf


COMPETÊNCIAS LEGISLATIVAS - É constitucional lei estadual que proibiu o corte de energia elétrica durante a pandemia da Covid-19

São constitucionais as normas estaduais, editadas em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, pelas quais veiculados a proibição de suspensão do fornecimento do serviço de energia elétrica, o modo de cobrança, a forma de pagamentos dos débitos e a exigibilidade de multa e juros moratórios. STF. Plenário. ADI 6432/RR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/4/2021 (Info 1012). 

A situação concreta foi a seguinte: 

Em Roraima, foi editada a Lei estadual nº 1.389/2020, que tratou sobre medidas de proteção à população roraimense durante a pandemia da Covid-19. Confira alguns dispositivos da Lei: 

Art. 2º Ficam proibidas as concessionárias de serviços públicos essenciais de cortar o fornecimento residencial de seus serviços por falta de pagamento de suas respectivas contas, enquanto perdurar o estado de emergência decorrente de situações de extrema gravidade social, no âmbito do estado de Roraima. 

§ 1º Entendem-se como serviços públicos essenciais, para efeito do disposto no caput deste artigo, o fornecimento de água, energia elétrica e tratamento de esgoto. 

§ 2º Após o fim das restrições decorrentes do plano de contingência, as concessionárias de serviço público, antes de proceder à interrupção do serviço em razão da inadimplência anterior a março de 2020, deverão possibilitar o parcelamento do débito das faturas referentes ao período de contingência. (...) 

Art. 3º Ao consumidor que tiver suspenso o fornecimento fica assegurado o direito de acionar juridicamente a empresa concessionária por perdas e danos, além de ficar desobrigado do pagamento do débito que originou o referido corte. 

Art. 4º Fica estabelecido que, cessado o estado de emergência, o consumidor deverá procurar as respectivas concessionárias de serviços públicos de água e energia elétrica, a fim de quitar o débito que, por ventura, venha a existir. 

Art. 5º Ficam suspensos a incidência de multas e juros por atraso de pagamento das faturas de serviços públicos concedidos enquanto perdurar o plano de contingência da Secretaria de Estado da Saúde. 

Art. 6º O descumprimento ao disposto na presente Lei ensejará a aplicação de multas, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, pelos órgãos responsáveis pela fiscalização, em especial, o Programa de Proteção e Orientação ao Consumidor do Estado de Roraima (PROCON-RR). 

Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação, com vigência enquanto perdurar o plano de contingência adotado pela Secretaria de Saúde do Estado de Roraima em decorrência da pandemia pelo coronavírus (COVID-19). 

ADI 

A Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – Abradee ajuizou ADI contra a Lei objetivando a declaração de inconstitucionalidade da expressão “energia elétrica”, prevista no § 1º do art. 2º e a interpretação conforme à Constituição do § 2º do art. 2º e dos arts. 3º, 4º, 5º e 6º daquele diploma. O objetivo da associação era afastar qualquer interpretação que inclua o serviço de energia elétrica no regramento estabelecido pelo Estado de Roraima. A autora alegou que a União possui competência privativa para legislar sobre energia elétrica (art. 22, IV) e, portanto, os Estados não estão autorizados a tratar sobre o tema. 

O STF concordou com os pedidos formulados pela autora? A lei foi declarada inconstitucional? 

NÃO. O STF julgou improcedente o pedido formulado na ADI e declarou que são constitucionais as normas previstas no § 1º do art. 2º, no § 2º do art. 2º e nos arts. 3º, 4º, 5º e 6º da Lei 1.389/2020 do estado de Roraima, na parte relacionada com os serviços de “energia elétrica”. 

Inexistência de violação à competência privativa da União 

Não há se falar em invasão da competência legislativa privativa da União para legislar sobre energia elétrica. Isso porque a lei estadual impugnada não atinge de forma direta a relação contratual estabelecida entre a concessionária e o Poder Público concedente, titular do serviço. A lei também não fere o núcleo de atuação das empresas voltadas à prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica, uma vez que não se constata que possa gerar desequilíbrio contratual ou afetar políticas tarifárias, especialmente porque as medidas impostas são excepcionais e transitórias, limitadas ao tempo da vigência do plano de contingência adotado pela Secretaria estadual de saúde em decorrência da pandemia de Covid-19. 

Legislação está fundamentada na dignidade da pessoa humana e em outros direitos fundamentais 

A não interrupção dos serviços públicos de energia elétrica relaciona-se à satisfação das necessidades básicas da população, pelo que a continuidade do serviço é considerada essencial para a adoção de medidas de contenção do novo coronavírus. O fornecimento de energia elétrica é direito fundamental relacionado à dignidade humana, ao direito à saúde, à moradia, à alimentação, à educação e à profissão, constituindo-se em serviço público essencial e universal, que deve estar disponível a todos os cidadãos, especialmente no complexo contexto pandêmico vivenciado. 

Lei nº 14.015/2020 

A lei do Estado de Roraima é de 07/05/2020. Em 15/06/2020, foi editada a Lei federal nº 14.015/2020, que tratou sobre a possibilidade de interrupção do serviço público em caso de inadimplemento do usuário, desde que ele seja previamente avisado. Veja um resumo dos principais pontos da Lei nº 14.015/2020: 

• Em caso de inadimplemento, é possível a suspensão da prestação do serviço público, mesmo que se trate de serviço público essencial (ex: energia elétrica, água etc.); 

• Essa suspensão/interrupção não viola o princípio da continuidade dos serviços públicos; 

• Para que essa suspensão seja válida, contudo, é indispensável que o usuário seja previamente comunicado de que o serviço será desligado, devendo ser informado também do dia exato em que haverá o desligamento; 

• O desligamento do serviço deverá ocorrer em dia útil, durante o horário comercial; 

• É vedado que o desligamento ocorra em dia de feriado, véspera de feriado, sexta-feira, sábado ou domingo. 

• Caso o consumidor queira regularizar a situação e pagar as contas em atraso, a concessionária poderá cobrar uma taxa de religação do serviço. Essa taxa de religação, contudo, não será devida se a concessionária cortou o serviço sem prévia notificação. 

• Assim, se a concessionária não comunicou previamente o consumidor do corte ela estará sujeita a duas consequências: 

a) terá que pagar multa; 

b) não poderá cobrar taxa de religação na hipótese de o cliente regularizar o débito. 

A superveniência da Lei federal nº 14.015/2020 teria prejudicado a eficácia ou validade da Lei do Estado de Roraima? 

NÃO. Para o STF, a superveniência de Lei federal nº 14.015/2020, também editada em razão da pandemia de Covid-19, não afasta a competência estadual para disciplinar a matéria de proteção e defesa do consumidor de forma mais ampla do que a estabelecida pela legislação federal. Em outras palavras, o legislador estadual poderia ter ampliado a proteção dos consumidores. 

Em suma: São constitucionais as normas estaduais, editadas em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, pelas quais veiculados a proibição de suspensão do fornecimento do serviço de energia elétrica, o modo de cobrança, a forma de pagamentos dos débitos e a exigibilidade de multa e juros moratórios. As normas objetivam regulamentar a relação entre o usuário do serviço e a empresa concessionária, tratando-se, portanto, essencialmente de normas sobre defesa e proteção dos direitos do consumidor e da saúde pública. STF. Plenário. ADI 6432/RR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/4/2021 (Info 1012). 

Cuidado 

Em situações “normais”, ou seja, em períodos sem pandemia, o entendimento do STF é outro: É inconstitucional lei estadual que proíbe que as empresas concessionárias ou permissionárias façam o corte do fornecimento de água, energia elétrica e dos serviços de telefonia, por falta de pagamento, em determinados dias (ex: sextas-feiras, vésperas de feriados etc.). STF. Plenário. ADI 3824/MS, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 02/10/2020


STF determinou à União o restabelecimento dos leitos de UTI destinados ao tratamento da Covid-19 que estavam custeados pelo Ministério da Saúde até dezembro de 2020, e que foram reduzidos nos meses de janeiro e fevereiro de 2021

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-1012-stf.pdf


DIREITO À SAÚDE - STF determinou à União o restabelecimento dos leitos de UTI destinados ao tratamento da Covid-19 que estavam custeados pelo Ministério da Saúde até dezembro de 2020, e que foram reduzidos nos meses de janeiro e fevereiro de 2021 

Em condições de recrudescimento da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), não é constitucionalmente aceitável qualquer retrocesso nas políticas públicas de saúde, como a que resulta em decréscimo no número de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) habilitados (custeados) pela União. STF. Plenário. ACO 3473 MC-Ref/DF, ACO 3474 TP-Ref/SP, ACO 3475 TP-Ref/DF, ACO 3478 MCRef/PI e ACO 3483 TP-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 7/4/2021 (Info 1012). 

A situação concreta foi a seguinte: 

No início da pandemia da Covid-19, a União montou, com recursos federais, leitos de UTI exclusivos para o tratamento da Covid-19. Ocorre que esses leitos foram sendo desativados após dezembro de 2020. Com o recrudescimento dos casos, em fevereiro de 2021, cinco Estados-membros ajuizaram ações cíveis originárias no STF pedindo que a União fosse obrigada a reativar esses leitos, custeando a sua manutenção. A Min. Rosa Weber, monocraticamente, concedeu tutela provisória de urgência para determinar à União que restabeleça os leitos de UTI destinados ao tratamento da Covid-19 nos Estados requerentes que estavam habilitados (custeados) pelo Ministério da Saúde até dezembro de 2020, e que foram reduzidos nos meses de janeiro e fevereiro de 2021. 

Referendo pelo Plenário 

Em 07/04/2021, o Plenário do STF referendou as tutelas de urgência concedidas nas cinco ações cíveis originárias, propostas por estados-membros da Federação, para determinar à União que: 

a) analise, imediatamente, os pedidos de habilitação de novos leitos de UTI formulados pelos estadosmembros requerentes junto ao Ministério da Saúde; 

b) restabeleça, imediatamente, de forma proporcional às outras unidades federativas, os leitos de UTI destinados ao tratamento da Covid-19 nos estados requerentes que estavam habilitados (custeados) pelo Ministério da Saúde até dezembro de 2020, e que foram reduzidos nos meses de janeiro e fevereiro de 2021; 

c) preste suporte técnico e financeiro para a expansão da rede de UTI’s nos entes estaduais requerentes, de forma proporcional às outras unidades federativas, em caso de evolução da pandemia. 

O recrudescimento das taxas de contaminação, internação e letalidade em decorrência da pandemia da Covid-19 é incontroverso e notório. Nesse cenário, são preocupantes as alegações de estado federado no sentido de que a União não tem se posicionado sobre requerimento de habilitação de novos leitos de UTI e de que os leitos financiados com recursos federais, destinados exclusivamente ao tratamento de pacientes com Covid-19, têm sido desabilitados. A propósito da tramitação de crédito orçamentário extraordinário para fazer frente às vulnerabilidades, as vidas em jogo não podem ficar na dependência da burocracia estatal ou das idiossincrasias políticas. Estão em xeque cláusulas vitais de saúde coletiva. Além disso, a solução de conflitos sobre o exercício da competência deve pautar-se pela melhor realização do direito à saúde. Identificada omissão estatal ou gerenciamento errático, como aparentemente se apresenta, é viável a interferência judicial para a concretização do direito social à saúde, cujas ações e serviços são marcados constitucionalmente pelo acesso igualitário e universal. Deve ser exigido do governo federal que suas ações sejam respaldadas por critérios técnicos e científicos, e que sejam implantadas as políticas públicas a partir de atos administrativos lógicos e coerentes. Não é lógico, coerente ou cientificamente defensável a diminuição do número de leitos de UTI custodiados pela União em momento desafiador da pandemia, justamente quando constatado incremento das mortes e das internações hospitalares. Cumpre enfatizar que a programática constitucional não aceita retrocessos injustificados no direito social à saúde. Assim, em juízo de delibação, fica evidente a presença do requisito da probabilidade do direito. Mostra-se, ainda, presente o perigo da demora, que se revela intuitivo frente aos abalos causados pela pandemia. Não há nada mais urgente do que o desejo de viver. O não endereçamento ágil e racional do problema pode multiplicar o número de óbitos e potencializar a tragédia humanitária. 

Em suma: Em condições de recrudescimento da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), não é constitucionalmente aceitável qualquer retrocesso nas políticas públicas de saúde, como a que resulta em decréscimo no número de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) habilitados (custeados) pela União. STF. Plenário. ACO 3473 MC-Ref/DF, ACO 3474 TP-Ref/SP, ACO 3475 TP-Ref/DF, ACO 3478 MC-Ref/PI e ACO 3483 TP-Ref/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 7/4/2021 (Info 1012).


Estados e Municípios podem restringir temporariamente atividades religiosas coletivas presenciais a fim de evitar a proliferação da Covid-19

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-1012-stf.pdf


DIREITO À SAÚDE / LIBERDADE DE CULTO - Estados e Municípios podem restringir temporariamente atividades religiosas coletivas presenciais a fim de evitar a proliferação da Covid-19 

Covid-19 É compatível com a Constituição Federal a imposição de restrições à realização de cultos, missas e demais atividades religiosas presenciais de caráter coletivo como medida de contenção do avanço da pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADPF 811/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 8/4/2021 (Info 1012). 

A situação concreta foi a seguinte: 

Diante do aumento do número de casos de Covid-19, alguns Estados e Municípios editaram decretos restringindo temporariamente atividades religiosas coletivas presenciais a fim de evitar a proliferação da doença. Nesse sentido, o Estado de São Paulo editou o Decreto nº 65.563/2021, que em seu art. 2º, II, “a” proibiu a realização de “cultos, missas e demais atividades religiosas de caráter coletivo”. O Partido Social Democrático (PSD) ajuizou ADPF pedindo para suspender esse dispositivo do Decreto nº 65.563/2021. Segundo argumentou o partido, essas restrições não poderiam ser impostas porque violariam a liberdade religiosa (liberdade de crença e de culto) prevista no art. 5º, VI e no art. 19, I, da CF/88 

Art. 5º (...) VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (...) 

O STF concordou com o pedido do autor? 

NÃO. O STF, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado na ADPF. Ficaram vencidos os ministros Nunes Marques e Dias Toffoli, que julgaram o pedido procedente. A conclusão da Corte foi a seguinte: 

É compatível com a Constituição Federal a imposição de restrições à realização de cultos, missas e demais atividades religiosas presenciais de caráter coletivo como medida de contenção do avanço da pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADPF 811/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 8/4/2021 (Info 1012). 

Liberdade religiosa A

 liberdade de crença e de culto, usualmente caracterizada apenas pela fórmula genérica “liberdade religiosa”, constitui uma das primeiras garantias individuais previstas pelas declarações de direitos do Século XVIII. Trata-se de direito humano fundamental. A liberdade religiosa foi prevista em diversos documentos internacionais, podendo destacar os seguintes: 

• artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); 

• artigo 9º da Convenção Europeia de Direitos Humanos (1950); 

• artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos (1969); 

• artigo 8º da Carta Africana de Direitos Humanos (1981). 

Dimensões da liberdade religiosa 

A liberdade religiosa pode ser dividida em duas dimensões: 

a) Dimensão interna (forum internum): consiste na liberdade espiritual íntima de formar a sua crença, a sua ideologia ou a sua consciência; 

b) Dimensão externa (forum externum): diz respeito mais propriamente à liberdade de confissão e à liberdade de culto. 

O aspecto interno do direito à liberdade de pensamento, consciência e religião é um direito absoluto, que não pode ser restringido. O aspecto externo, por sua vez, pode estar sujeito a algumas limitações, como no caso das restrições impostas durante a pandemia do novo coronavírus. Embora advinda da interpretação das fontes supranacionais dos Direitos Humanos, a existência dessa dúplice dimensão do direito à liberdade religiosa também pode ser encontrado no texto da Constituição Federal. Sob a dimensão interna, a liberdade de consciência está prevista no art. 5º, VI, da Constituição, e não abrange apenas o aspecto religioso. Por outro lado, na dimensão externa, o texto constitucional brasileiro alberga a liberdade de crença, de aderir a alguma religião, e a liberdade do exercício do culto respectivo. As liturgias e os locais de culto são protegidos nos termos da lei. A lei deve proteger os templos e não deve interferir nas liturgias, a não ser que assim o imponha algum valor constitucional concorrente de maior peso na hipótese considerada. Os logradouros públicos não são, por natureza, locais de culto, mas a manifestação religiosa pode ocorrer ali, protegida pelo direito de reunião, com as limitações respectivas. 

A própria Constituição afirma que a liberdade religiosa não é absoluta 

Corroborando a tese de que há uma possibilidade de restrição relativa do direito à liberdade religiosa em sua dimensão externa (forum externum), pode-se mencionar que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu inequívoca reserva de lei ao exercício dos cultos religiosos. Nesse sentido, o inciso VI do art. 5º assegura “o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei”. Essa reserva legal, por si só, afasta qualquer compreensão no sentido de afirmar que a liberdade de realização de cultos coletivos seria absoluta. A lei deve proteger os templos e não deve interferir nas liturgias, “a não ser que assim o imponha algum valor constitucional concorrente de maior peso na hipótese considerada”. 

Constitucionalidade formal do decreto 

Sob o prisma da constitucionalidade formal, a imposição de restrições à realização de cultos religiosos por meio de decretos municipais e estaduais está em conformidade com decisões recentes do STF sobre a temática, dentre as quais destaca-se a ADI 6341, na qual se assentou que todos os entes federados possuem competência para legislar e adotar medidas sanitárias voltadas ao enfrentamento da emergência de saúde pública. O STF reafirmou o dever que todos os entes políticos têm na promoção da saúde pública e, coerente ao federalismo cooperativo adotado na CF/88, assentou a competência dos Estados e dos Municípios, ao lado da União, na adoção de medidas sanitárias direcionadas ao enfrentamento da pandemia. 

Constitucionalidade material do decreto 

Sob o aspecto material, a medida sanitária em análise mostra-se adequada, necessária e proporcional, bem como em consonância com as diretrizes científicas propostas pela Organização Mundial da Saúde. É possível afirmar que há um razoável consenso na comunidade científica no sentido de que os riscos de contaminação decorrentes de atividades religiosas coletivas são superiores aos riscos de outras atividades econômicas, mesmo aquelas realizadas em ambientes fechados. Essa noção geral — sobre o elevado risco de contaminação das atividades religiosas coletivas presenciais — foi complementada por um exame de fatos e prognoses subjacente à edição do decreto estadual impugnado. As medidas restritivas, dessa forma, foram resultantes de análises técnicas relativas ao risco ambiental de contágio pela Covid-19 conforme o setor econômico e social, bem como de acordo com a necessidade de preservar a capacidade de atendimento da rede de serviço de saúde pública. 

Não foram apenas as atividades religiosas que foram proibidas 

Vale ressaltar que o art. 2º do Decreto impugnado não se limitou a restringir as atividades religiosas coletivas. Também foram impostas restrições a outras atividades econômicas altamente essenciais, tais como o “atendimento presencial ao público, inclusive mediante retirada ou ‘pegue e leve’, em bares, restaurantes, ‘shopping centers’, galerias e estabelecimentos congêneres e comércio varejista de materiais de construção, permitidos tão somente os serviços de entrega (‘delivery’) e ‘drive-thru’ (inciso I)” e ainda “reunião, concentração ou permanência de pessoas nos espaços públicos, em especial, nas praias e parques”.