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6 de junho de 2021

Em regra, o plano de saúde não é obrigado a fornecer medicamentos de uso domiciliar

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-694-stj-1.pdf


PLANO DE SAÚDE - Em regra, o plano de saúde não é obrigado a fornecer medicamentos de uso domiciliar 

REGRA: em regra, os planos de saúde não são obrigados a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar. 

EXCEÇÕES: Os planos de saúde são obrigados a fornecer: 

a) os antineoplásicos orais (e correlacionados); 

b) a medicação assistida (home care); e 

c) outros fármacos incluídos pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) no rol de fornecimento obrigatório. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.692.938/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João é portador de hepatite C crônica. O médico receitou para ele um medicamento chamado “Viekira Pak” que, na época, custava cerca de R$ 100 mil. João solicitou que o plano de saúde fornecesse a ele o medicamento. A operadora negou o custeio, sob o argumento de que se trata de um remédio de uso domiciliar. Medicamento de uso domiciliar é aquele prescrito pelo médico para administração em ambiente externo ao da unidade de saúde. O Viekira Pak é um remédio comercializado em drogarias, constituído por comprimidos que podem ser ingeridos em domicílio. Logo, enquadra-se no conceito de medicamento de uso domiciliar. Inconformado com a recusa, João ajuizou ação de obrigação de fazer contra o plano pedindo o fornecimento do fármaco. 

A questão chegou até o STJ. O que decidiu o Tribunal? O plano de saúde é obrigado a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar (remédios de uso domiciliar)? 

REGRA: em regra, os planos de saúde não são obrigados a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar. 

EXCEÇÕES. Os planos de saúde são obrigados a fornecer: a) os antineoplásicos orais (e correlacionados); b) a medicação assistida (home care); e c) os incluídos no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) para esse fim. 

Assim, os medicamentos receitados por médicos para uso doméstico e adquiridos comumente em farmácias não estão, em regra, cobertos pelos planos de saúde. Isso porque, em regra, os planos de saúde (que integram o Sistema da Saúde Suplementar) somente são obrigados a custear os fármacos usados durante a internação hospitalar. As exceções ficam por conta dos antineoplásicos orais para uso domiciliar (e correlacionados), os medicamentos utilizados no home care e os remédios relacionados a procedimentos listados no Rol da ANS. 

O tema é tratado no art. 10, VI, da Lei nº 9.656/98 

O art. 10 lista em seus incisos tratamentos, procedimentos e medicamentos que os planos de saúde não são obrigados a fornecer. O inciso VI afirma que, em regra, o plano de saúde não é obrigado a fornecer medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto no art. 12, I, “c” e II, “g” da Lei. O art. 12, I, “c” e II, “g” preveem que os planos de saúde são obrigados a fornecer antineoplásicos orais (e correlacionados). Confira: 

Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médicoambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: (...) VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto nas alíneas ‘c’ do inciso I e ‘g’ do inciso II do art. 12; 

Art. 12. (...) I - quando incluir atendimento ambulatorial: (...) c) cobertura de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes; II - quando incluir internação hospitalar: (...) g) cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar; 

Exceção 1: antineoplásicos 

Antineoplásicos são medicamentos que destroem neoplasmas ou células malignas. Têm a função, portanto, de evitar ou inibir o crescimento e a disseminação de tumores. Servem, portanto, para tratamento de câncer. Existem alguns medicamentos antineoplásicos que são de uso oral e, portanto, podem ser ministrados em casa, fora do ambiente hospitalar. A lei prevê que esses medicamentos, se prescritos pelo médico como indicados para o tratamento do paciente, devem ser obrigatoriamente fornecidos pelo plano de saúde. 

Exceção 2: medicação assistida (home care) 

Se o paciente está em home care (tratamento domiciliar), o plano de saúde também será obrigado a fornecer a medicação assistida, ou seja, toda a medicação necessária para o tratamento e que ele receberia caso estivesse no ambiente hospitalar. O home care significa fornecer para o paciente que está em casa o mesmo tratamento que ele receberia caso estivesse no hospital. Se, no hospital, o paciente teria que tomar o remédio “X” a cada 8h, este medicamento deverá ser custeado pelo plano de saúde, tal qual ocorreria se estivesse internado. Obs: essa exceção é uma decorrência do fato de que o STJ entende que os planos de saúde podem ser obrigados a custear o home care. 

Exceção 3: outros fármacos que sejam incluídos pela ANS como sendo de fornecimento obrigatório 

A norma do art. 10, VI, da Lei nº 9.656/98 é voltada à operadora de plano de saúde, a qual, na contratação, pode adotar tal limitação. Esse dispositivo, contudo, não proíbe que a ANS (“órgão regulador setorial”) inclua determinados medicamentos como sendo de custeio obrigatório no rol de cobertura mínima assistencial, ainda que sejam de uso domiciliar. 

Em suma: É lícita a exclusão, na Saúde Suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo os antineoplásicos orais (e correlacionados), a medicação assistida (home care) e os incluídos no rol da Agência Nacional de Saúde para esse fim. STJ. 3ª Turma. REsp 1.692.938/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 27/04/2021 (Info 694). 

DOD PLUS – INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES 

Cobertura de home care por plano de saúde 

João é cliente de um plano de saúde. Após ficar doente, ele foi internado no hospital, onde permaneceu por algumas semanas. Até então, o plano de saúde estava pagando todas as despesas. O médico que acompanhava seu estado de saúde viu que seu quadro clínico melhorou e recomendou que ele fosse para casa, mas lá ficasse realizando tratamento domiciliar (home care) até que tivesse alta completa. Ocorre que o plano de saúde não aceitou, afirmando que, no contrato firmado com João, havia uma cláusula proibindo o serviço de home care. Segundo a operadora, apenas o tratamento hospitalar está incluído. 

O plano de saúde pode ser obrigado a custear o tratamento domiciliar (home care) mesmo que isso não conste expressamente do rol de serviços previsto no contrato? Mesmo que exista cláusula no contrato proibindo o home care? SIM. Ainda que, em contrato de plano de saúde, exista cláusula que vede de forma absoluta o custeio do serviço de home care (tratamento domiciliar), a operadora do plano será obrigada a custeá-lo em substituição à internação hospitalar contratualmente prevista, desde que cumpridos os seguintes requisitos: 

1) tenha havido indicação desse tratamento pelo médico assistente; 

2) exista real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente; 

3) a residência possua condições estruturais para fazer o tratamento domiciliar; 

4) haja solicitação da família do paciente; 

5) o paciente concorde com o tratamento domiciliar; 

6) não ocorra uma afetação do equilíbrio contratual em prejuízo do plano de saúde (exemplo em que haveria um desequilíbrio: nos casos em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera a despesa diária em hospital). 

STJ. 3ª Turma. REsp 1378707-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/5/2015 (Info 564). 

STJ. 3ª Turma. REsp 1537301-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/8/2015 (Info 571).



15 de maio de 2021

É constitucional a proibição — por lei estadual — de que instituições financeiras, correspondentes bancários e sociedades de arrendamento mercantil façam telemarketing, oferta comercial, proposta, publicidade ou qualquer tipo de atividade tendente a convencer aposentados e pensionistas a celebrarem contratos de empréstimo

 DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

DIREITO DO CONSUMIDOR – PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR

Proteção a aposentados e pensionistas e restrição à publicidade - ADI 6727/PR 

Resumo:

É constitucional a proibição — por lei estadual — de que instituições financeiras, correspondentes bancários e sociedades de arrendamento mercantil façam telemarketing, oferta comercial, proposta, publicidade ou qualquer tipo de atividade tendente a convencer aposentados e pensionistas a celebrarem contratos de empréstimo.

A norma, segundo a qual bancos e intermediários não devem realizar publicidade a aposentados e pensionistas para contratação de empréstimos, que somente podem ser concretizados por solicitação expressa, versa estritamente sobre proteção do consumidor e do idoso, não invadindo a competência privativa da União para legislar sobre direito civil, política de crédito ou propaganda comercial. Ademais, observado o princípio da proporcionalidade (art. 5º, LIV, da Constituição Federal), pois não se interferiu na liberdade econômica das partes ou se subtraiu do consumidor a possibilidade de solicitar contratação.

Com base nesse entendimento, o Plenário julgou improcedente o pedido formulado em ação direta para declarar a constitucionalidade da Lei 20.276/2020 do estado do Paraná.

ADI 6727/PR, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 11.5.2021 (terça-feira), às 23:59

É inconstitucional norma estadual que vede ao consumidor, pessoa física, o abastecimento de veículos em local diverso do posto de combustível.

 DIREITO CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

Competência da União para legislar sobre energia e postos de combustíveis - ADI 6580/RJ 

Resumo:

É inconstitucional norma estadual que vede ao consumidor, pessoa física, o abastecimento de veículos em local diverso do posto de combustível.

Há invasão à competência privativa da União, estabelecida no art. 22, IV, da Constituição Federal (CF) (1), para dispor sobre energia. Com fundamento nesse dispositivo, o legislador ordinário federal editou a Lei 9.478/1997, por meio da qual definiram-se normas gerais sobre a política energética nacional, atividades referentes ao monopólio do petróleo, e instituiu o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

No art. 9º da Lei 9.478/1997 (2) e no art. 21, VII, da Resolução 41/2013 (3) da ANP há disciplina regulatória exaustiva da matéria e, ainda, no que tange à regulamentação federal da matéria, entende-se que o art. 238 da CF (4), ao delegar à lei ordenação do setor de energia, em especial, de venda e revenda de combustíveis de petróleo, refere-se à lei de caráter nacional.

Além disso, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou-se no sentido de ser competência legislativa e administrativa da União tema que envolva predominância de interesse nacional (5).

Logo, não havendo qualquer peculiaridade que exija tratamento diverso, a lei estadual, ao pretender regular matéria já disciplinada em lei federal e em regramento editado pela ANP, imiscuiu-se na competência legislativa da União, em invasão do campo constitucionalmente reservado ao ente central da Federação.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 9.023/2020 do estado do Rio de Janeiro.

(1) CF: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;”

(2) Lei 9.478/1997: “Art. 9º Além das atribuições que lhe são conferidas no artigo anterior, caberá à ANP exercer, a partir de sua implantação, as atribuições do Departamento Nacional de Combustíveis - DNC, relacionadas com as atividades de distribuição e revenda de derivados de petróleo e álcool, observado o disposto no art. 78”.

(3) Resolução 41/2003 da ANP: “Art. 21. É vedado ao revendedor varejista de combustíveis automotivos: (...) VII - comercializar e entregar combustível automotivo em local diverso do estabelecimento da revenda varejista e, para o caso de posto revendedor flutuante ou marítimo, em local diverso das áreas adjacentes ao estabelecimento da revenda varejista”.

(4)  CF: “Art. 238. A lei ordenará a venda e revenda de combustíveis de petróleo, álcool carburante e outros combustíveis derivados de matérias-primas renováveis, respeitados os princípios desta Constituição.”

(5) Precedentes: ADI 4.228/SP, relator Ministro Alexandre de Moraes (DJe de 13.8.2018); ADI 3.645/PR, relatora Ministra Ellen Gracie (DJ de 1º.9.2006).

ADI 6580/RJ, relatora Min. Cármen Lúcia, julgamento virtual finalizado em 11.5.2021 (terça-feira), às 23:59

14 de maio de 2021

COMPRA E VENDA - Decai em 1 ano pedido do adquirente para restituição de valor pago por área excedente, decorrente da aquisição de imóvel entregue em metragem menor do que a contratada

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/05/info-693-stj.pdf


COMPRA E VENDA - Decai em 1 ano pedido do adquirente para restituição de valor pago por área excedente, decorrente da aquisição de imóvel entregue em metragem menor do que a contratada 

Na hipótese em que as dimensões de imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão (venda ad mensuram), aplica-se o prazo decadencial de 1 (um) ano, previsto no art. 501 do CC/2002, para exigir: • o complemento da área; • reclamar a resolução do contrato; ou • o abatimento proporcional do preço. STJ. 3ª Turma. REsp 1.890.327/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/04/2021 (Info 693). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João comprou um imóvel da imobiliária. No contrato estava previsto que o imóvel teria 220 m2 . Depois de dois anos após ter sido registrado o título, quando João já estava morando no local, ele percebeu que o imóvel tem um tamanho menor do que estava previsto no contrato. Diante disso, ele ajuizou ação de abatimento proporcional do preço dada a entrega do imóvel com metragem menor do que a contratada. O juiz reconheceu que houve decadência, sob o argumento de que João tinha o prazo de 1 ano para ajuizar a ação, nos termos do art. 501 do Código Civil: 

Art. 501. Decai do direito de propor as ações previstas no artigo antecedente o vendedor ou o comprador que não o fizer no prazo de um ano, a contar do registro do título. Parágrafo único. Se houver atraso na imissão de posse no imóvel, atribuível ao alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência. 

Agiu corretamente o juiz? SIM. Vamos entender com calma. 

Inicialmente, é importante perguntar: a entrega de imóvel com metragem a menor configura vício aparente ou oculto? 

Aparente. A entrega de bem imóvel em metragem diversa da contratada não pode ser considerada vício oculto, mas sim aparente, considerando que é possível que isso seja verificado com a mera medição das dimensões do imóvel. Vale ressaltar, inclusive, que o adquirente, por precaução, deve providenciar essa medição tão logo receba a unidade imobiliária. 

O prazo decadencial, neste caso, deve ser buscado no Código Civil ou no Código de Defesa do Consumidor? 

No Código Civil. Vamos comparar os dois regimes. O Código de Defesa do Consumidor disciplina, em seu art. 26, prazos decadenciais aplicáveis para vícios de qualidade ou quantidade do produto ou serviço, sendo eles aparentes ou ocultos: 

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: 

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis; 

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis. 

Vale ressaltar que o prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC relaciona-se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe são conferidas pelos arts. 18, § 1º, e 20, caput, do mesmo diploma legal (a saber, a substituição do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato. Como não há um prazo específico no CDC que regule a hipótese de reparação de danos decorrentes de vício do produto, entende-se que deve ser aplicado o prazo geral de 10 anos do art. 205 do CC. Nesse sentido: 

(...) 

4. É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC). 

5. No referido prazo decadencial, pode o consumidor exigir qualquer das alternativas previstas no art. 20 do CDC, a saber: a reexecução dos serviços, a restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço. Cuida-se de verdadeiro direito potestativo do consumidor, cuja tutela se dá mediante as denominadas ações constitutivas, positivas ou negativas. 

6. Quando, porém, a pretensão do consumidor é de natureza indenizatória (isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo decorrente dos vícios do imóvel) não há incidência de prazo decadencial. A ação, tipicamente condenatória, sujeita-se a prazo de prescrição. 

7. À falta de prazo específico no CDC que regule a pretensão de indenização por inadimplemento contratual, deve incidir o prazo geral decenal previsto no art. 205 do CC/02 (...) 

STJ. 3ª Turma. REsp 1534831/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/02/2018. 

O Código Civil, por sua vez, estabelece, em seus arts. 500 e 501, prazo decadencial para a situação em que as dimensões do imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão ou com determinação da respectiva área: 

Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço. 

Art. 501. Decai do direito de propor as ações previstas no artigo antecedente o vendedor ou o comprador que não o fizer no prazo de um ano, a contar do registro do título. 

Dessa forma, a previsão do Código Civil é específica para o caso concreto. Vale lembrar que os arts. 500 e 501 acima transcritos aplicam-se para as hipóteses em que a venda do imóvel é realizada na modalidade ad mensuram, ou seja, quando, em regra, será do alienante a responsabilidade por eventual diferença que venha a encontrar entre a área estipulada e a efetivamente existente. Importante ainda ressaltar que também na hipótese de venda ad mensuram – e consequente aplicação do Código Civil -, o prazo decadencial previsto no art. 501 do CC/02 refere-se, tão somente, à propositura de ação para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço. O prazo prescricional para que o consumidor pleiteie indenização decorrente da má-execução do contrato é de 10 anos. 

Abrindo um parêntese: 

Venda ad corpus (venda por referência meramente enunciativa) 

Venda ad corpus é a venda de imóvel como coisa certa e discriminada. Ex: o contrato refere-se à venda da Fazenda Esperança. A dimensão do imóvel, se for mencionada, é feita de forma meramente enunciativo. O preço não tem relação direta com a extensão exata do imóvel. A dimensão exata não é requisito essencial do contrato. Ex: a compra e venda de um apartamento ou terreno urbano normalmente é ad corpus. Na venda ad corpus é comum utilizar-se expressões como “mais ou menos tantos metros”. Na venda ad corpus não cabe complementação do preço, caso a área seja maior, nem complementação da área, se esta for menor. Art. 500 (...) § 3º Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso, se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus. 

Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente enunciativa (presume-se a venda ad corpus), quando a diferença encontrada não exceder de 1/20 (5%) da área total enunciada, ressalvado ao comprador o direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o negócio (art. 500, § 1º).


Venda ad mensuram (venda por extensão) 

Venda ad mensuram é aquela em que o preço é fixado tendo em vista a real dimensão da área. Tal ocorre quando se determina o preço de cada unidade, alqueire, metro quadrado ou metro de frente. Ex: o contrato refere-se à venda de um imóvel de 150m2 . Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento proporcional ao preço. 

Se a área for menor do que estava no contrato: o comprador poderá mover ação ex empto ou ex vendito, por meio do qual se reclamará a complementação da área. Trata-se de ação pessoal. Se não tiver como o devedor complementar, o comprador poderá mover as ações edilícias: 

• Ação redibitória: resolução do contrato. 

• Ação quanti minoris: abatimento do preço. 

Se a área for maior: o vendedor não poderá requerer complementação do preço, salvo se provar erro escusável. Art. 500 (...) § 2º Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço ou devolver o excesso. 

Presume-se que a venda foi ad mensuram quando a diferença encontrada exceder de 1/20 (5%) da área total enunciada. 

Na hipótese em que as dimensões de imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão (venda ad mensuram), aplica-se o prazo decadencial de 1 (um) ano, previsto no art. 501 do CC/2002, para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço. STJ. 3ª Turma. REsp 1.890.327/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/04/2021 (Info 693).

13 de maio de 2021

É inconstitucional a cobrança de tarifa bancária pela disponibilização de limite para “cheque especial”

 DIREITO CONSTITUCIONAL – ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA

 

Cobrança de tarifa bancária sobre a disponibilização de limite para “cheque especial” - ADI 6407/DF 

 

Resumo:

É inconstitucional a cobrança de tarifa bancária pela disponibilização de limite para “cheque especial” (1).

A autorização dessa arrecadação foi a medida encontrada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para compensar financeiramente os atingidos (bancos) pela sua atuação de intervenção na economia, ao limitar os juros na ordem de 8% ao mês, criando-se fonte de receita, instituída coercitivamente, voltada diretamente a favorecer aos mutuantes.

Criou-se, assim, uma “tarifa” com características de taxa tributária, pela simples manutenção mensal da modalidade de contratação de “cheque especial”, vinculada a contrato de conta corrente. Nos termos do art. 4º do Código Tributário Nacional (CTN) (2), independentemente da nomenclatura, o fato gerador da exação é que determina a natureza jurídica do tributo.

Ademais, houve uma desnaturação da natureza jurídica da “tarifa bancária” para adiantamento da remuneração do capital (juros), de maneira que a cobrança de “tarifa” (pagamento pela simples disponibilização) camuflou a cobrança de juros, com outra roupagem jurídica, voltada a abarcar quem não utiliza o crédito efetivamente na modalidade de “cheque especial”. Consequentemente, não se alterou apenas a forma de cobrança, mas a própria natureza da cobrança (juros adiantados), em aparente descumprimento ao mandamento constitucional de proteção ao consumidor [Constituição Federal (CF), art. 170, V] (3).

Além disso, a medida compensatório-interventiva do CMN também não passa pelo filtro da proporcionalidade, tendo em vista que é desproporcional para os fins almejados, existindo soluções menos gravosas que poderiam ter sido adotadas. O CMN poderia, por exemplo, ter optado por instituir autorização de cobrança de juros em faixas, a depender do valor utilizado ou do limite exacerbado, todavia escolheu modalidade de cobrança que se assemelha a tributo ou a adiantamento de juros com alíquota única (0,25% ao mês, cerca de 3% ao ano), por serviço não usufruído (empréstimo de capital próprio ou de terceiros).

De igual modo, o art. 2º da resolução também ostenta contornos de ilegitimidade por incidir sobre contratos em curso, na medida em que retroage sua eficácia (a partir de 1º.6.2020) para alcançar pactos firmados anteriormente que não previam qualquer custeio de manutenção do limite disponível, em clara afronta ao inciso XXXVI do art. 5º da CF (4).

Com esses fundamentos, o Plenário declarou a inconstitucionalidade do art. 2º da Resolução CMN/Bacen 4.765/2019.       

(1) Resolução CMN 4.765/2019: “Art. 2º. Admite-se a cobrança de tarifa pela disponibilização de cheque especial ao cliente. § 1º. A cobrança da tarifa prevista no caput deve observar os seguintes limites máximos: I – 0% (zero por cento), para limites de crédito de até R$ 500,00 (quinhentos reais); e II – 0,25% (vinte e cinco centésimos por cento), para limites de crédito superiores a R$ 500,00 (quinhentos reais), calculados sobre o valor do limite que exceder R$ 500,00 (quinhentos reais). § 2º. A cobrança da tarifa deve ser efetuada no máximo uma vez por mês. § 3º. A cobrança da tarifa deve observar, no que couber, as disposições da Resolução nº 3.919, de 25 de novembro de 2010, não se admitindo a inclusão do serviço de que trata o caput em pacote de serviços vinculados a contas de depósito à vista.”

(2) CTN: “Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.”

(3) CF/1988: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V - defesa do consumidor;”

(4) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

ADI 6407/DF, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 30.4.2021 (sexta-feira), às 23:59

11 de maio de 2021

O dia da destituição da incorporadora, com a consequente assunção da obra pelos adquirentes, é o marco final das obrigações constituídas entre as partes.

REsp 1.881.806-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/05/2021. 

Lei n. 4.591/1964. Incorporação imobiliária. Extinção do contrato. Dia da destituição do incorporador. Marco final das obrigações constituídas entre as partes. Extinção anômala.


O dia da destituição da incorporadora, com a consequente assunção da obra pelos adquirentes, é o marco final das obrigações constituídas entre as partes.


A Lei n. 4.591/1964 previu três situações distintas para a extinção do contrato de incorporação, observado o atraso na entrega da obra, com desfechos que variam de acordo com a conveniência dos adquirentes.

Na primeira, os compradores optam por receber, com atraso, a unidade imobiliária. Nesse caso, "será devida ao adquirente adimplente, por ocasião da entrega da unidade, indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso, pro rata die, corrigido monetariamente conforme índice estipulado em contrato" (art. 43-A, § 2º, com a redação conferida pela Lei n. 13.786/2018).

Na segunda, os adquirentes optam pelo não recebimento do imóvel. Nessa hipótese, "desde que o adquirente não tenha dado causa ao atraso, poderá ser promovida por este a resolução do contrato, sem prejuízo da devolução da integralidade de todos os valores pagos e da multa estabelecida, em até 60 (sessenta) dias corridos contados da resolução, corrigidos nos termos do § 8º do art. 67-A desta Lei" (art. 43-A, § 1º, com a redação conferida pela Lei n. 13.786/2018).

Há, ainda, uma terceira situação: a da destituição do incorporador em razão da completa paralisação da obra. É a hipótese verificada no caso em análise, que foi prevista no art. 43, VI, da Lei n. 4.591/1964 com a seguinte dicção: "(...) VI - se o incorporador, sem justa causa devidamente comprovada, paralisar as obras por mais de 30 dias, ou retardar-lhes excessivamente o andamento, poderá o Juiz notificá-lo para que no prazo mínimo de 30 dias as reinicie ou torne a dar-lhes o andamento normal. Desatendida a notificação, poderá o incorporador ser destituído pela maioria absoluta dos votos dos adquirentes, sem prejuízo da responsabilidade civil ou penal que couber, sujeito à cobrança executiva das importâncias comprovadamente devidas, facultando-se aos interessados prosseguir na obra."

Observa-se, contudo, que para essa hipótese, a Lei não explicita, como fez anteriormente, as consequências jurídicas decorrentes, limitando-se a dispor: "Art. 43. Quando o incorporador contratar a entrega da unidade a prazo e preços certos, determinados ou determináveis, mesmo quando pessoa física, ser-lhe-ão impostas as seguintes normas: (...) II - responder civilmente pela execução da incorporação, devendo indenizar os adquirentes ou compromissários, dos prejuízos que a êstes advierem do fato de não se concluir a edificação ou de se retardar injustificadamente a conclusão das obras, cabendo-lhe ação regressiva contra o construtor, se fôr o caso e se a êste couber a culpa."

Infere-se, portanto, que a primeira situação supracitada descreve uma hipótese de extinção normal, enquanto as duas últimas, representam hipóteses de extinção anômala do contrato de incorporação. Coloca-se ao crivo do adquirente uma possibilidade de extinção regular do contrato e duas possibilidades de extinção anormal da contratação, sendo, a partir desse cenário, possível divisar as consequências da destituição do incorporador.

É de se observar, inicialmente, que a destituição da incorporadora põe fim ao contrato de incorporação. Com isso, o dia da destituição da incorporadora, com a consequente assunção da obra pelos adquirentes, exsurge como o marco final das obrigações constituídas entre as partes.

É, portanto, até essa data que devem ser apurados os prejuízos efetivos que comporão o montante indenizatório devido pelas incorporadora e construtora, solidariamente. Isso, porque os riscos do empreendimento estão limitados às cláusulas e à extensão do contrato, assumindo o incorporador apenas os riscos contratados e tão-somente enquanto durar o ajuste.

Assim, optando os adquirentes pela assunção da obra, com a contratação de outra construtora, é lícito deduzir que eles abrem mão de receber a integralidade de todos os valores pagos, além da multa estabelecida, para prosseguirem, por conta própria, na construção do empreendimento, assumindo, com isso, as consequências dessa deliberação.

De fato, existindo a opção de o adquirente requerer a resolução do contrato, recebendo "a integralidade dos valores pagos devidamente corrigidos, bem como a multa estipulada para o inadimplemento", a escolha pela destituição do incorporador não pode significar um implemento do risco do negócio originalmente assumido.

Desse modo, se o adquirente, ou a maioria dos compradores reunidos em assembleia, decidiu pela continuidade do empreendimento, inclusive com a necessidade de aportes financeiros adicionais, esses valores não podem ser cobrados do incorporador destituído, sob pena de se agravar, unilateralmente, o risco do negócio original.

A destituição do incorporador constitui um exercício regular de um direito legalmente previsto, que pode, conforme o caso, impor novos riscos aos adquirentes, sem que isso conduza, todavia, a uma ampliação dos riscos originariamente assumidos pelo incorporador.

Pela mesma razão, deduz-se que os lucros cessantes serão cabíveis apenas durante o período compreendido entre a data prometida para a entrega da obra até a data efetiva da destituição do incorporador, que, frise-se, é o marco da extinção (anômala) da incorporação.

30 de abril de 2021

Falta de estoque não impede consumidor de exigir entrega do produto anunciado

 ​​Em virtude do princípio da vinculação do fornecedor à oferta, o consumidor só não poderá exigir a entrega do produto anunciado caso ele tenha deixado de ser fabricado e não exista mais no mercado. Se o fornecedor não entregou o produto, mas ainda tiver como fazê-lo – mesmo precisando adquiri-lo de outras empresas –, fica mantida para o consumidor a possibilidade de exigir o cumprimento forçado da obrigação, prevista no artigo 35, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que, após o descumprimento da entrega de mercadoria comprada pela internet em razão da falta de estoque, entendeu que a cliente não poderia optar pelo cumprimento forçado da obrigação, devendo  escolher entre as demais hipóteses do artigo 35 do CDC: aceitar produto equivalente (inciso II) ou rescindir o contrato, com restituição da quantia paga (inciso III).

A relatora do recurso da consumidora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, como previsto pelo artigo 30 do CDC, a informação contida na própria oferta é essencial à manifestação de vontade do consumidor e configura proposta – integrando, por isso, o contrato posteriormente celebrado com o fornecedor.

Como a oferta veiculada obriga o fornecedor ao seu cumprimento, nos termos do artigo 35, a relatora apontou que, em caso de descumprimento no fornecimento, o consumidor pode escolher livremente qualquer das opções do dispositivo legal.

"Todas as opções previstas no artigo 35 do CDC guardam relação com a satisfação da intenção validamente manifestada pelo consumidor ao aderir à oferta do fornecedor, por meio da previsão de resultados práticos equivalentes ao adimplemento da obrigação", disse a ministra.

Boa-fé

Com base em lições da doutrina, Nancy Andrighi ponderou que a única hipótese que autorizaria a exclusão da opção pelo cumprimento forçado da obrigação seria a inexistência do produto de mesma marca e mesmo modelo no mercado, caso não fosse mais fabricado.

"A possibilidade ou não do cumprimento da escolha formulada livremente pelo consumidor deve ser aferida à luz da boa-fé objetiva", declarou a ministra. Segundo ela, "não há razão para se eliminar a opção pelo cumprimento forçado da obrigação" quando o fornecedor dispõe de meios para entregar o produto anunciado, mesmo que precise obtê-lo com outros revendedores.

Como o processo não indicou que a falta do produto no estoque do fornecedor fosse impossível de ser contornada, a Terceira Turma reformou o acórdão do TJRS e determinou o retorno dos autos ao primeiro grau, para que a ação prossiga nos termos do artigo 35, inciso I, do CDC.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1872048

A alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular, tendo sido veiculada publicidade enganosa sobre a existência de autorização do órgão público e de registro no cartório de imóveis, configura lesão ao direito da coletividade e dá ensejo à indenização por dano moral coletivo

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-691-stj.pdf


PROCESSO COLETIVO - Imobiliária deverá pagar dano moral coletivo por vender lotes com falsa propaganda sobre regularização 

A alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular, tendo sido veiculada publicidade enganosa sobre a existência de autorização do órgão público e de registro no cartório de imóveis, configura lesão ao direito da coletividade e dá ensejo à indenização por dano moral coletivo. STJ. 4ª Turma. REsp 1.539.056/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/04/2021 (Info 691). 

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: 

Determinada imobiliária lançou um empreendimento imobiliário voltado para consumidores de baixa renda. Foi feita publicidade anunciando que o loteamento estaria autorizado pelo poder público e que seria possível registrar a propriedade no cartório. Ocorre que isso não era verdade. Diversos consumidores, em sua maioria pessoas de baixa renda, adquiriram os lotes no condomínio acreditando na informação da imobiliária de que o loteamento estaria em situação regular. Entretanto, após a compra, descobriram que não seria possível o registro da propriedade, pois o loteamento não havia sido aprovado pelo Município. Diante disso, o Ministério Público ajuizou ação civil pública contra a imobiliária e seu proprietário. Em primeira instância, o magistrado condenou os réus a pagar indenização por dano moral individual no valor de R$ 5 mil para cada comprador, mas negou o pedido de danos morais coletivos. A sentença foi mantida pelo TJ/MG, sob o argumento de que, no presente caso, o dano moral envolvia, necessariamente, pessoas específicas, de modo que não seria possível reconhecer prejuízo moral transindividual. O Ministério Público recorreu ao STJ. 

O que decidiu o STJ? Neste caso, é possível a condenação em danos morais coletivos? 

SIM. A 4ª Turma do STJ condenou a imobiliária ao pagamento de danos morais coletivos no valor de R$ 30 mil. 

Caracterização do dano moral coletivo 

O dano moral transindividual - conhecido como “dano moral coletivo” -, caracteriza-se pela prática de conduta antijurídica que, de forma absolutamente injusta e intolerável, viola valores éticos essenciais da sociedade, implicando, em razão disso, um dever de reparação. 

O dano moral coletivo tem três objetivos: 

• prevenir novas condutas antissociais (função dissuasória); 

• punir o comportamento ilícito (função sancionatório-pedagógica); e 

• reverter, em favor da comunidade, o eventual proveito patrimonial obtido pelo ofensor (função compensatória indireta). 

Dano moral coletivo é classificado como in re ipsa 

Essa categoria de dano moral é aferível in re ipsa, ou seja, basta que se verifique se, no caso concreto, houve a prática de uma conduta ilícita que, de maneira injusta e intolerável, viole valor ético-jurídico fundamental da sociedade. É desnecessária a demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral. 

Voltando ao caso concreto 

No presente caso, a pretensão reparatória de dano moral coletivo - deduzida pelo Ministério Público estadual na ação civil pública - tem por causas de pedir: 

• a alienação de terrenos em loteamento irregular (o que violou as normas de uso e ocupação do solo); e 

• a veiculação de publicidade enganosa a consumidores de baixa renda, que teriam sido submetidos a condições precárias de moradia. 

As instâncias ordinárias reconheceram a ilicitude da conduta dos réus que, utilizando-se de ardil e omitindo informações relevantes para os consumidores/adquirentes, anunciaram a venda de terrenos em loteamento irregular - com precárias condições urbanísticas - como se o empreendimento tivesse sido aprovado pela Municipalidade e devidamente registrado no cartório imobiliário competente. Apesar disso, tanto o juiz como o TJ negaram o pedido de indenização por dano moral coletivo. 

CDC repudia, inclusive, na esfera criminal, a fraude nas ofertas 

A fim de resguardar os direitos básicos de informação adequada e de livre escolha dos consumidores, o CDC prevê que como crime as condutas relacionadas à fraude em oferta e à publicidade abusiva ou enganosa. Confira: 

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços: Pena - Detenção de três meses a um ano e multa. § 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta. § 2º Se o crime é culposo; Pena Detenção de um a seis meses ou multa. 

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva: Pena Detenção de três meses a um ano e multa. 

Os objetos jurídicos tutelados compreendem, os direitos de livre escolha e de informação adequada dos consumidores, cuja higidez da manifestação de vontade deve ser assegurada, de modo a atender o valor ético-jurídico encartado no princípio constitucional da dignidade humana, conformador do próprio conceito de Estado Democrático de Direito, que não se coaduna com a permanência de profundas desigualdades, tais como a existente entre o fornecedor e a parte vulnerável no mercado de consumo. Ambos os crimes são de mera conduta, não reclamando a consumação do resultado lesivo - efetivo comprometimento da manifestação da vontade do consumidor -, donde se extrai, a evidente intolerabilidade da lesão ao direito transindividual da coletividade ludibriada, não informada adequadamente ou exposta à oferta fraudulenta ou à publicidade enganosa ou abusiva. 

Enganar o consumidor vai muito além de um mero dissabor 

Sob a mesma ótica, destaca-se que o STJ decidiu recentemente que “enganar o consumidor ou dele abusar vai muito além de dissabor irrelevante ou aborrecimento desprezível, de natural conduta cotidiana, aceitável na vida em sociedade”, por configurar prática flagrantemente antiética e ilegal que não poupa “nem pobres nem vulneráveis, nem analfabetos nem enfermos” (STJ. 2ª Turma. REsp 1828620/RO, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 03/12/2019). 

Conduta também é punida pela Lei nº 6.766/79 

Vale ressaltar que, no presente caso, o dano moral coletivo está presente não apenas com base no CDC, mas também com fundamento na Lei nº 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo para fins urbanos. Essa Lei também prevê como crime as condutas de iniciar loteamento de forma irregular: 

Art. 50. Constitui crime contra a Administração Pública. I - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos; II - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença; III - fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo. Pena: Reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinqüenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País. 

Sendo clara a ofensa ao mínimo existencial da coletividade prejudicada pelo loteamento irregular - assim como a publicidade enganosa efetuada em detrimento dos consumidores -, tal conduta configura lesão intolerável a valor essencial da sociedade, o que torna a condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos plenamente viável. 

Em suma: A alienação de terrenos a consumidores de baixa renda em loteamento irregular, tendo sido veiculada publicidade enganosa sobre a existência de autorização do órgão público e de registro no cartório de imóveis, configura lesão ao direito da coletividade e dá ensejo à indenização por dano moral coletivo. STJ. 4ª Turma. REsp 1.539.056/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 06/04/2021 (Info 691).

29 de abril de 2021

Cliente que pagou mais de R$ 1 mi por Ferrari batida será restituído

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, manteve acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que condenou uma loja de veículos a devolver os valores pagos por cliente que adquiriu uma Ferrari F-430 por R$ 1,17 milhão, em 2009, sem saber que o carro teve sua estrutura recuperada após se envolver em acidente grave.

Além da restituição do valor da compra, a loja deverá reembolsar todas as despesas do comprador com seguro DPVAT, IPVA, revisão automotiva e parecer técnico, bem como pagar uma indenização de R$ 25 mil por danos morais. A restituição dos valores, entretanto, foi condicionada à devolução do carro.

No recurso especial, a loja alegou que não havia vício na qualidade do produto, já que o veículo pôde ser utilizado normalmente pelo comprador durante o tempo em que permaneceu com ele. A empresa também defendeu que o desgaste do carro fosse considerado no cálculo da restituição, sob pena de enriquecimento sem causa do cliente.

Além disso, apontou que as despesas de manutenção do veículo durante o tempo de utilização deveriam ser imputadas ao cliente.

Direito à informação

O ministro Marco Aurélio Bellizze destacou que, nas hipóteses de vício de qualidade do produto, o artigo 18, parágrafo 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) possibilita que o cliente opte pela substituição do bem por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; pela restituição imediata da quantia paga, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; ou pelo abatimento proporcional do preço.

Segundo o ministro, o dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o artigo 6º, inciso III, do CDC, que estabelece o direito básico do consumidor à informação adequada e clara sobre todas as características dos produtos e serviços, como qualidade, quantidade, preço e eventuais riscos.

No caso dos autos, Bellizze apontou que, de acordo com as instâncias ordinárias, a loja não cumpriu o seu dever de informação, já que caberia a ela informar o consumidor sobre o sinistro que o veículo havia sofrido. Sem cumprir essa obrigação, afirmou o ministro, a empresa frustrou as legítimas expectativas do consumidor, principalmente em relação à qualidade do produto.

Além disso, o relator destacou que o TJMG entendeu não ser possível minimizar a culpa da empresa pela venda de veículo recuperado, pois se trata de bem de alto valor, e quem se dispõe a pagar preço tão alto não teria interesse em comprar um automóvel danificado em acidente grave – fato que influencia o valor de mercado.

Mitigação de perdas

Em relação aos gastos efetuados pelo cliente após a compra, Bellizze observou que, caso ele não fizesse as revisões, o veículo sofreria depreciação ainda maior, o que poderia gerar a sua condenação ao pagamento pela desvalorização excessiva do bem.

No mesmo sentido, para o magistrado, a despesa com o laudo técnico encomendado pelo cliente deve ficar na responsabilidade do fornecedor, pois somente após essa avaliação especializada é que se constataram os vícios de qualidade do veículo.

Bellizze lembrou ainda que o pagamento do IPVA e do seguro obrigatório não é uma opção para o contribuinte, pois ele poderia ser impedido de utilizar o veículo e teria de arcar com os encargos moratórios no momento da restituição do bem ao fornecedor.

“Portanto, o consumidor agiu em estrita observância ao princípio da boa-fé objetiva, exercendo seu dever de mitigar a própria perda (duty to mitigate the loss), já que, se adotasse comportamento diverso, poderia responder pelo agravamento dos danos e pela maior depreciação do veículo”, concluiu o ministro.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1681785
STJ

27 de abril de 2021

A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.

 ProAfR no REsp 1.823.218/AC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Corte Especial, julgado em 22/04/2021.

Proposta de nova afetação à Corte Especial. Tema 929/STJ. Rito dos recursos especiais repetitivos. 


A Corte Especial, por unanimidade, decidiu afetar o processo ao rito do art. 1.036 do CPC, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Trata-se de desafetação do recurso especial vinculado ao Tema 929/STJ, em face do julgamento em curso de embargos de divergência acerca da mesma questão.

O Ministro Relator defendeu a necessidade de nova afetação do presente recurso especial vinculado ao Tema 929/STJ ("discussão quanto às hipóteses de aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC"), em face da existência de milhares de recursos sobrestados nos tribunais de origem e da ausência de eficácia vinculativa da decisão dos embargos de divergência semelhante à atribuída pela legislação processual aos recursos repetitivos. 

Os ministros votaram pela afetação do referido tema, mas com suspensão dos processos apenas após a interposição de recurso especial, para que os processos sejam sobrestados apenas no STJ.

Na hipótese em que as dimensões de imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão (venda ad mensuram), aplica-se o prazo decadencial de 1 (um) ano, previsto no art. 501 do CC/2002, para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço

 REsp 1.890.327/SP, Rel. min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 20/04/2021.

Imóvel entregue em metragem a menor. Vício aparente. Pretensão de abatimento proporcional do preço. Venda ad mensuram. Prazo decadencial. Art. 501 do CC/2002.


A entrega de bem imóvel em metragem diversa da contratada não pode ser considerada vício oculto, mas sim aparente, dada a possibilidade de ser verificada com a mera medição das dimensões do imóvel - o que, por precaução, o adquirente, inclusive, deve providenciar tão logo receba a unidade imobiliária.

É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC).

O prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC relaciona-se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe são conferidas pelos arts. 18, § 1º, e 20, caput, do mesmo diploma legal (a saber, a substituição do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato.

Nesta última hipótese, à falta de prazo específico no CDC que regule a hipótese de reparação de danos decorrentes de vício do produto, entende-se que deve ser aplicado o prazo geral decenal do art. 205 do CC/02.

Para as situações em que as dimensões do imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão ou com determinação da respectiva área (venda ad mensuram), aplica-se o disposto no art. 501 do CC/02, que prevê o prazo decadencial de 1 (um) ano para a propositura das ações previstas no antecedente artigo (exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço).

Isso significa dizer que, também na hipótese de venda ad mensuram - e consequente aplicação da legislação civilista -, convém sublinhar que o prazo decadencial previsto no art. 501 do CC/02 refere-se, tão somente, à propositura de ação para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço, não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato.

No caso, o Tribunal de origem deixou expressamente consignada a natureza da ação ajuizada, isto é, de abatimento proporcional do preço, afastando-se, por não se tratar de pretensão indenizatória, o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos previsto no art. 205 do CC/02.

24 de abril de 2021

CARTÃO DE CRÉDITO; ANUIDADE; VALOR MÍNIMO EM COMPRAS; CLÁUSULA DE ISENÇÃO; RESTITUIÇÃO SIMPLES; DANO MORAL

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL - 1ª TURMA RECURSAL Processo nº: 0029341-08.2020.8.19.0021 RECORRENTE: ISRAEL SANTOS DO NASCIMENTO RECORRIDO: BANCO SANTANDER BRASIL S.A. VOTO Trata-se de relação de consumo que será analisada sob a ótica da Lei 8.078/90, uma vez que as partes se encontram enquadradas nos artigos 2° e 3° do referido diploma legal. A controvérsia no caso em vertente recai sobre a legalidade da cobrança de anuidade no cartão de crédito da Autora. Em que pese a legalidade da cobrança, ficou comprovado nas faturas de fls.21/30 que o autor alcançou o mínimo de R$100,00 em compras necessário para a isenção da tarifa de anuidade, considerada a existencia de compra parcelada. Indevida, portanto, a sua cobrança, devendo ocorrer a restituição simples, tendo em vista a ausência de má-fé por parte da demandada. Quanto ao dano moral, como de sabença, o mesmo promana dos atos lesivos aos bens integrantes da personalidade do Autor. No caso em tela, indubitável que a falha na prestação do serviço causou danos extrapatrimoniais a parte Autora. Dito isto para a fixação do quantum indenizatório, compete ao julgador orientar-se pela lógica do razoável e fixar o valor de acordo com o grau de reprovabilidade da conduta, a situação econômica do Réu e a condição do autor, de modo a produzir eficácia pedagógica a inibir condutas idênticas e reparando a integralidade do dano causado ao Autor sem implicar em enriquecimento indevido. Considerando isto, fixo os danos morais no valor de R$ 1.000,00. Pelo exposto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para reformar a sentença e julgar procedente o pedido para condenar a ré a pagar, à título de dano material, a quantia de R$ 124,68 (cento e vinte e quatro reais e sessenta e oito centavos), acrescidos de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária da data do desembolso e à título de dano moral, a quantia de R$1.000,00 (mil reais), acrescidos de juros a partir da citação e correção a partir da presente data. Sem ônus sucumbenciais, face ao êxito. Rio de Janeiro, 19 de março de 2021. Rodrigo Faria de Sousa, Juiz Relator



0029341-08.2020.8.19.0021 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 1a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) RODRIGO FARIA DE SOUSA - Julg: 23/03/2021 - Data de Publicação: 24/03/2021

CANCELAMENTO DE VOO; PANDEMIA DE COVID-19; FORÇA MAIOR; INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL; DANO MATERIAL

PROCESSO Nº: 0027668-92.2020.8.19.0210 RECORRENTE: DECOLAR. COM LTDA RECORRIDO: JOSIVAN DE LIMA VALDIVINO, IRANILDA TORQUATO DA SILVA VALDIVINO E GOL LINHAS AEREAS S/A RELATORA: RAQUEL DE OLIVEIRA VOTO Demanda em que se discute falha na prestação dos serviços pela ré, consubstanciada no cancelamento de passagens aéreas de voo que seria realizado em 26/08/2020 devido à pandemia de Covid-19. Os autores formularam os seguintes pedidos: 1) devolução do valor pago de R$ 1.024,00 das passagens canceladas e R$ 1.013,44 pela diferença das novas passagens adquiridas; e 2) danos morais de R$ 15.000,00 para cada autor. A sentença acolheu a pretensão, para condenar as rés, solidariamente, a pagarem danos materiais de R$ 1.024,00, e danos morais de R$ 3.000,00 para cada autor. Em recurso, a 1ª ré requerer a reforma da sentença, reiterando os termos de sua defesa. A lide deve ser solucionada à luz das regras do Código de Defesa do Consumidor, porque, sendo a ré fornecedora de produtos e serviços, deve responder objetivamente pelos danos causados aos consumidores decorrentes da prestação defeituosa (art. 14 do CDC). O cancelamento do voo ocorreu após a OMS declarar estágio de Pandemia para a Covid-19. A 1ª ré, ora recorrente, não deu ao consumidor a assistência para solução administrativa do problema, não disponibilizando em seu site o pedido de reembolso na forma da Lei nº 14.034/2020. Realmente, a pandemia caracterizou motivo de força maior, não gerando responsabilidade quanto ao dano moral, no entanto, isso não se refere ao dano material. A condenação ao pagamento do valor das passagens, solidariamente entre as rés, se faz necessário, mormente porque não se afigura razoável que os autores aguardassem indefinidamente por uma solução por parte das rés, pois, até então, havia a 1ª ré se limitado a atribuir tal responsabilidade à companhia aérea. Portanto, merece reforma em parte a sentença para excluir a condenação por danos morais. Pelo exposto, VOTO PARA CONHECER E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO para REFORMAR A SENTENÇA e excluir a condenação por danos morais. Sem custas judiciais e sem honorários advocatícios. Rio de Janeiro, data da assinatura digital. RAQUEL DE OLIVEIRA JUÍZA RELATORA PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 2ª TURMA RECURSAL CÍVEL



0027668-92.2020.8.19.0210 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) RAQUEL DE OLIVEIRA - Julg: 29/03/2021 - Data de Publicação: 06/04/2021

ESTABELECIMENTO COMERCIAL; FURTO DE AUTOMÓVEL; RESPONSABILIDADE OBJETIVA; SUMULA 130, DO S.T.J.; DANO MATERIAL E DANO MORAL CARACTERIZADOS; INDENIZAÇÃO

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL SEGUNDA TURMA RECURSAL CÍVEL RECURSO Nº: 0246746-36.2020.8.19.0001 Recorrente: HAVAN LOJAS DE DEPARTAMENTOS LTDA. Recorridos: GABRIEL OLIVEIRA CARVALHO e ROSANA ALICE ESSABBÁ SOARES DE SOUSA CARVALHO Origem: 2º Juizado Especial Cível - Castelo - Foro Central - RJ. Juiz Relator: Mauro Nicolau Junior V O T O Pretende a empresa ré a reforma da sentença que a condenou ao pagamento de indenização por danos morais e materiais resultantes de furto do veiculo dos autores ocorrido no interior do estacionamento de uma de suas lojas. Sustenta a inexistência de provas quanto aos bens que a parte autora afirma que se encontravam no interior do veículo e, ainda, ausência de sua responsabilidade indenizatória. No que diz respeito a responsabilidade indenizatória da empresa recorrente não merece prosperar sua tese de exclusão visto que responde ela objetivamente pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, portanto, não há se falar em culpa na ocorrência do fato. Os estacionamentos dos supermercados e estabelecimentos em geral destinam-se a propiciar aos consumidores maior comodidade e com isso atrair mais clientes. Dessa forma o furto de veículos de propriedade dos consumidores no interior do estacionamento oferecido por lojas, supermercados, shopping centers etc., caracteriza defeito na prestação do serviço, ensejando o dever de indenizar eventuais danos suportados. Nesse sentido vem entendendo o Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado. "RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR. Furto de Veículo em Área do Estacionamento do Supermercado. Acidente de Consumo. Fato do Serviço. Responsabilidade Objetiva. Prova dos Danos. Súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação do dano ou furto de veículo ocorrido em seu estabelecimento." Responde o fornecedor, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, entendendo-se como tal, em face da abrangência do conceito legal, toda a atividade por ele realizada no propósito de tornar o seu negócio viável e atraente, aí incluídos o estacionamento, as instalações confortáveis e outras facilidades colocadas à disposição da sua clientela.O dano moral está ínsito na própria ofensa, de tal modo que, provado o fato danoso, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum.Se a indenização pelo dano moral não pode ser fonte de lucro, também não pode servir de estímulo à violação de direitos personalíssimos de outrem.Sentença que bem mensurou os danos sofridos pela vítima, pelo que deve ser integralmente confirmada. Desprovimento dos recursos." APELACAO 2009.001.17665 - DES. SERGIO CAVALIERI FILHO - Julgamento: 13/05/2009 - DECIMA TERCEIRA CAMARA CIVEL "RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. Teoria do Risco. O supermercado Réu responde pelos prejuízos acarretados por furto de veículo ocorrido no pátio de estacionamento instalado em sua dependências e gratuito para os clientes, em razão de falhas no seu sistema de segurança, independentemente de culpa, sendo desinfluente a circunstância de o local ser administrado por empresa 'terceirizada'. Inteligência do verbete 94 da súmula do TJRJ e o verbete 130 da súmula do Superior Tribunal de Justiça. Dano material comprovado nos autos, não havendo impugnação consistente ao valor pedido na inicial e fixado pelo Juízo na sentença. Danos morais arbitrados em valor módico. Correto os valores fixados a título de danos materiais e morais, restando atendidos os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo adequados e suficientes à espécie.NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO". APELACAO 2009.001.17953 - DES. LEILA ALBUQUERQUE - Julgamento: 14/04/2009 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL Dispõe o Enunciado 130 do Superior Tribunal de Justiça que "a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento." No que tange aos danos morais, por toda a narrativa trazida aos autos, verifica-se que os fatos causaram aborrecimentos e transtornos que exorbitaram aos parâmetros da normalidade, mormente por estarem os autores retornando de viagem e, provavelmente, portando suas malas e bagagens, a sensação de impotência, frustração e perda, em não encontrarem o veiculo onde haviam deixado e com a segurança oferecida pela ré, devendo, contudo serem fixados de maneira a atender seu caráter punitivo e pedagógico, tendo por base os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sob pena de vir a causar enriquecimento sem causa o que foi feito com maestria pela magistrada sentenciante. No que diz respeito ao pleito de indenização por danos materiais, da mesma forma, não merece retificação a sentença na medida em que a despeito de efetivamente não ter a parte autora demonstrado e comprovado que no interior do veiculo havia malas e bagagens cuja indenização pleiteiam, é de se notar a extrema dificuldade de trazerem aos autos essas provas até porque se efetivamente o furto ocorreu os itens de sua propriedade já não mais se encontravam no carro. A ré, por sua vez, dispunha de todo seu aparato de segurança, principalmente imagens do circuito de segurança que em momento algum se interessou em trazer aos autos a fim de comprovar o fato impeditivo do direito dos autores, tal como afirmado na peça de resistência. Se por um lado não se pode exigir que qualquer pessoa produza provas contra seus interesses, por outro não há como se ignorar que em tendo a ré condições de demonstrar a veracidade do quanto alegado mas se recusando (ou não se interessando em fazê-lo) deve arcar com as consequências de sua opção processual devendo, assim, ser mantida a condenação em indenização pelos danos materiais dos produtos que foram comprovadamente adquiridos pelos autores. Por esses motivos o VOTO é no sentido de ser conhecido o recurso e no mérito a ele SER NEGADO PROVIMENTO para manter a sentença tal como proferida condenando-se a recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação. Rio de Janeiro, 18 de março de 2021. MAURO NICOLAU JUNIOR Juiz de Direito RESULTADO DO JULGAMENTO. I - Os magistrados componentes da 2ª Turma Recursal deliberaram por conhecer do recurso e no mérito lhe NEGAR provimento nos termos do voto do juiz relator. II - Furto de veiculo ocorrido no interior de estacionamento de estabelecimento comercial. III - Responsabilidade objetiva da empresa pelos danos experimentados por seus clientes. IV - Dano moral caracterizado por conta da sensação de perda, impotência e frustração em encontrar seu veiculo invadido e sem os pertences nele deixados. V - Ainda que não deferida a inversão do ônus da prova, incumbe ao fornecedor a comprovação quanto a inexistência de falha em seus serviços o que, no caso, poderia ter sido feito perfeitamente com a juntada do circuito de imagens de seus instrumentos e câmeras de segurança, o que preferiu não fazer devendo, assim, arcar com as consequências de sua opção processual. VI - Danos morais e materiais configurados. Sentença mantida. Processo 0246746-36.2020.8.19.0001 Pág. 1



0246746-36.2020.8.19.0001 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 2a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) MAURO NICOLAU JUNIOR - Julg: 19/03/2021 - Data de Publicação: 22/03/2021

CEDAE; AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO; RESIDÊNCIA; ENDEREÇO DIVERSO; CANCELAMENTO DE DÉBITO; ABSTENÇÃO DA NEGATIVAÇÃO DO NOME

TJRJ - 4ª TURMA RECURSAL CÍVEL Processo: 0002527-15.2020.8.19.0067 Recorrente: WANDER INACIO DE OLIVEIRA Recorrido: COMPANHIA ESTADUAL DE AGUAS E ESGOTOS CEDAE RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. MATRÍCULA DESCONHECIDA. MUNICÍPIO DIVERSO DA RESIDÊNCIA DO AUTOR. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. MISSIVAS SEM NEGATIVAÇÃO. SÚMULA 230 TJRJ. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. VOTO Recurso Inominado em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais, reconhecendo a ausência de prova mínima do autor. Trata-se de demanda em que questiona o requerente a contratação e vinculação pela ré de seu nome a matrícula de imóvel desconhecido, pretendendo o cancelamento do débito da matrícula, abstenção da ré em negativar seu nome, e compensação por danos morais. A pretensão recursal é no sentido de que seja proferida nova sentença para julgamento do feito. O ônus da prova da contratação é da recorrida-ré, ou seja, de que o autor-recorrente contratou, nos termos do art. 373, II do CPC. À parte não cabe a prova de fato negativo, isto é, de que não contratou, sendo prova impossível de ser realizada pelo autor. Inclusive, há protocolo de atendimento datado de 2011 para solucionar o problema (fl. 12) e nada foi feito pela ré. Portanto, ausente a prova da contratação da matrícula pelo autor junto à ré, o ônus recai sobre esta, segundo a teoria do risco do empreendimento, nos termos do art. 14, caput e §1º do CDC, impondo-se o cancelamento deste e do débito a ela vinculados - matrícula nº 1693351-0 - em nome do autor, bem como a abstenção da ré em inscrevê-lo nos cadastros restritivos por tais débitos. Quanto aos danos morais, não há prova da efetiva negativação do nome do autor, consistindo em meras missivas, a ensejar a incidência da Súmula nº 230 do TJRJ ("Cobrança feita através de missivas, desacompanhada de inscrição em cadastro restritivo de crédito, não configura dano moral, nem rende ensejo à devolução em dobro.") Isso posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para reformar a sentença e JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para condenar o réu a: 1) cancelar a matrícula nº 1693351-0, bem como o débito a ela atrelado vinculado ao nome e CPF do autor, no prazo de 15 dias a contar da intimação desta, sob pena de multa a ser fixada em sede de execução; e 2) a abster-se de inserir o nome do autor nos cadastros restritivos de crédito, relativamente a débitos da matrícula nº 1693351-0, sob pena de multa a ser fixada em sede de execução. Rio de Janeiro, na data da sessão de julgamento. Keyla Blank De Cnop Juíza de Direito



0002527-15.2020.8.19.0067 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) KEYLA BLANK DE CNOP - Julg: 22/03/2021 - Data de Publicação: 23/03/2021

23 de abril de 2021

INSTITUIÇÃO BANCÁRIA; PROGRAMA DE PONTOS; PASSAGEM AÉREA; CANCELAMENTO DE VOO; RESTITUIÇÃO DOS PONTOS; IMPOSSIBILIDADE; INOCORRÊNCIA DE DANO MORAL

ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO CONSELHO RECURSAL IV TURMA CÍVEL PROCESSO Nº: 0282588-77.2020.8.19.0001 RECORRENTE: Banco Santander RECORRIDO: Anderson Messias Palmeira VOTO Recurso interposto em face da sentença de fls. 131/135, que condenou o banco réu, ora recorrente, a reembolsar 15.900 pontos na conta do autor e a pagar-lhe a quantia de R$2.000,00 (dois mil reais) a título de indenização por danos morais. Autor que alega ter trocado seus pontos por uma passagem aérea para sua mãe e, em razão do cancelamento do voo em decorrência da pandemia, o autor solicitou a troca dos pontos por uma passagem para ele mesmo. SENTENÇA QUE MERECE REFORMA. Autor que, a partir da conversão dos pontos junto ao Banco por bilhete de passagem em nome de terceiro, não mais poderia alterar, sem a concordância da companhia aérea, a titularidade do bilhete, muito menos exigir que o Banco-réu o fizesse. Autor que, portanto, não poderia exigir, por tal recusa, a restituição dos pontos junto ao banco, especialmente em razão das regras da Lei nº 14.034/2020, que não lhe assegura o direito ao reembolso. Ausência de falha no serviço prestado que impede o reconhecimento de direito a danos morais. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO. Sem ônus sucumbenciais porque não verificada a hipótese prevista no artigo 55, ¿caput¿, da Lei 9099/95.?? Rio de Janeiro, 19/03/2021. José Guilherme Vasi Werner Juiz Relator



0282588-77.2020.8.19.0001 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) JOSE GUILHERME VASI WERNER - Julg: 19/03/2021 - Data de Publicação: 23/03/2021

CARTÃO DE CRÉDITO; ANUIDADE DIFERENCIADA; SEGURO; DEVER DE INFORMAÇÃO; NEGATIVAÇÃO DO NOME; SOLIDARIEDADE NO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL; DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO

.Processo: 0009085-06.2020.8.19.0066 Recorrente/Autor: ANDRE LUIZ RODRIGUES Recorrido/Réu: CASA E VIDEO RIO DE JANEIRO S A Recorrido/Réu: CRED SYSTEM ADMINISTRADORA DE CARTÕES DE CRÉDITO RECURSO INOMINADO. CARTÃO DE CRÉDITO. ISENÇÃO DE ANUIDADE. SEGURO. COBRANÇAS. NEGATIVAÇÃO. REVELIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. VEROSSIMILHANÇA. CONTRATO. ANUIUDADE DIFERENCIADA. UTILIZAÇÃO. INFORMAÇÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. PROVIMENTO DO RECURSO. VOTO Cuido de ação em que narra a parte autora ter contratado dois cartões no estabelecimento da primeira ré, ora recorrida, um para compras somente no próprio estabelecimento e outro de crédito, este último que não fora recebido. Aceitou a contratação sob a afirmação de que nada pagaria enquanto não efetuasse a primeira compra. Sustenta que nunca realizou compras com o cartão e que o próprio contrato informa se tratar de anuidade diferenciada em que só há cobrança se houver movimentação. No entanto, em razão de seu score ter baixado, buscou informações e tomou conhecimento de que se tratava de débito imputado pelo réu, ora segundo recorrido, de anuidade e seguro. Solicitou o cancelamento do cartão e, embora não reconheça o débito, realizou o pagamento. No entanto, posteriormente, seu nome foi negativado por dívida do mês seguinte, com data de 10/03/2020. Pretende a retirada de seu nome dos cadastros de restrição ao crédito, declaração de inexistência da dívida, repetição em dobro no valor de R$60,42 e indenização por danos morais no valor de R$10.000,00. Decretada a revelia, foi proferida sentença de improcedência. Interposto o recurso inominado do indexador 108 em que a parte autora manifesta irresignação com o julgado, impugnando especificadamente os itens de fundamentação e reiterando as assertivas iniciais. Pugna pela reforma da r. sentença e procedência integral dos pedidos. Contrarrazões da segunda ré no indexador 158. Ausentes as contrarrazões da primeira ré, conforme certidão do indexador 163. É o relatório. Da análise dos autos, verifica-se que a sentença merece reforma. Versa a demanda sobre cartões de crédito contratados e não utilizados, sendo que um deles sequer foi recebido pelo consumidor. Observe-se que as assertivas iniciais são verossímeis e corroboradas pela prova documental - que a cobrança de anuidade estaria condicionada à utilização. É o que se extrai especialmente do documento do indexador 20 que informa: ¿Todas as compras realizadas com o Cartão Casa & Vídeo, independentemente do número de parcelas, haverá incidência da Anuidade Diferenciada (AD) em cada fatura.¿ Em relação aos termos e condições do contrato, também não subsiste a fundamentação da r. sentença, conforme expressamente indicado no item 1, ¿b¿ de fls. 26 (indexador 23), ¿ANUIDADE DIFERENCIADA: tarifa cobrada do TITULAR na FATURA ou CARNÊ DE PAGAMENTO, identificada pela sigla ¿AD¿, mensalmente, sempre que houver movimentação da CONTA, ...¿. Também não consta dos autos qualquer indicativo de que tenha o requerente recebido fatura de cobrança, recebido informação sobre valores, se utilizado dos cartões ou celebrado o contrato de seguro informado. Não lograram as rés em comprovar e sequer alegar a existência de qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Patente o direito à declaração de inexistência de débito, a baixa do apontamento em cadastros de restrição ao crédito e a repetição da quantia cobrada indevidamente, em dobro, na forma do art. 42, parágrafo único, do CDC. Do mesmo modo, patente a responsabilidade solidária das rés, integrantes da cadeira de fornecimento e personalidades dos contratos. É presumido o dano e a configuração do dano moral em casos de inscrição indevida, por inegável abalo ao nome, direito da personalidade, questão extremamente pacífica na jurisprudência pátria. Restou caracterizado o fato da violação, do qual advém o dano (danum in re ipsa), não havendo de se cogitar acerca de sua comprovação. Neste sentido, pertinente a lição de RUI STOCO, in Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, 4ª edição, editora RT, pág. 722, `in verbis¿: "A causação de dano moral independe de prova, ou melhor, comprovada a ofensa moral o direito à indenização desta decorre, sendo dela presumida. Desse modo a responsabilidade do ofensor do só fato da violação do `neminem laedere¿. Significa, em resumo, que o dever de reparar é corolário da verificação do evento danoso, dispensável, ou mesmo incogitável, a prova do prejuízo." Impõe-se, por conseguinte, a responsabilização da parte ré por danos morais sofridos. Considerando que a indenização não deve ser objeto de enriquecimento sem causa, considerando que tem a função de recomposição razoável, fixo o `pretium doloris¿ em R$10.000,00, por ser o suficiente a tutela ressarcitória, considerando assim, as condições do recorrente e dos recorridos, bem como as peculiaridades da causa em questão. Isso posto, VOTO no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para reformar a sentença e JULGAR PROCEDENTE o pedido para declarar a inexistência de débito, bem como determinar a baixa do apontamento em nome do autor nos cadastros de restrição ao crédito, o que deverá ser providenciado mediante expedição de ofício pelo juízo, e, ainda, condenar os réus, solidariamente, ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, com juros e correção monetária a contar desta data, e à restituição da quantia de R$60,42 (sessenta reais e quarenta e dois centavos), já considerada a dobra, com correção monetária desde o desembolso e juros a partir da citação. Sem ônus sucumbenciais, por se tratar de recurso com êxito. Rio de Janeiro, 26 de fevereiro de 2021. KEYLA BLANK DE CNOP Juíza de Direito - Relatora



0009085-06.2020.8.19.0066 - RECURSO INOMINADO

CAPITAL 4a. TURMA RECURSAL DOS JUI ESP CIVEIS

Juiz(a) KEYLA BLANK DE CNOP - Julg: 27/02/2021 - Data de Publicação: 02/03/2021