13 de maio de 2021

É inconstitucional a cobrança de tarifa bancária pela disponibilização de limite para “cheque especial”

 DIREITO CONSTITUCIONAL – ORDEM ECONÔMICA E FINANCEIRA

 

Cobrança de tarifa bancária sobre a disponibilização de limite para “cheque especial” - ADI 6407/DF 

 

Resumo:

É inconstitucional a cobrança de tarifa bancária pela disponibilização de limite para “cheque especial” (1).

A autorização dessa arrecadação foi a medida encontrada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para compensar financeiramente os atingidos (bancos) pela sua atuação de intervenção na economia, ao limitar os juros na ordem de 8% ao mês, criando-se fonte de receita, instituída coercitivamente, voltada diretamente a favorecer aos mutuantes.

Criou-se, assim, uma “tarifa” com características de taxa tributária, pela simples manutenção mensal da modalidade de contratação de “cheque especial”, vinculada a contrato de conta corrente. Nos termos do art. 4º do Código Tributário Nacional (CTN) (2), independentemente da nomenclatura, o fato gerador da exação é que determina a natureza jurídica do tributo.

Ademais, houve uma desnaturação da natureza jurídica da “tarifa bancária” para adiantamento da remuneração do capital (juros), de maneira que a cobrança de “tarifa” (pagamento pela simples disponibilização) camuflou a cobrança de juros, com outra roupagem jurídica, voltada a abarcar quem não utiliza o crédito efetivamente na modalidade de “cheque especial”. Consequentemente, não se alterou apenas a forma de cobrança, mas a própria natureza da cobrança (juros adiantados), em aparente descumprimento ao mandamento constitucional de proteção ao consumidor [Constituição Federal (CF), art. 170, V] (3).

Além disso, a medida compensatório-interventiva do CMN também não passa pelo filtro da proporcionalidade, tendo em vista que é desproporcional para os fins almejados, existindo soluções menos gravosas que poderiam ter sido adotadas. O CMN poderia, por exemplo, ter optado por instituir autorização de cobrança de juros em faixas, a depender do valor utilizado ou do limite exacerbado, todavia escolheu modalidade de cobrança que se assemelha a tributo ou a adiantamento de juros com alíquota única (0,25% ao mês, cerca de 3% ao ano), por serviço não usufruído (empréstimo de capital próprio ou de terceiros).

De igual modo, o art. 2º da resolução também ostenta contornos de ilegitimidade por incidir sobre contratos em curso, na medida em que retroage sua eficácia (a partir de 1º.6.2020) para alcançar pactos firmados anteriormente que não previam qualquer custeio de manutenção do limite disponível, em clara afronta ao inciso XXXVI do art. 5º da CF (4).

Com esses fundamentos, o Plenário declarou a inconstitucionalidade do art. 2º da Resolução CMN/Bacen 4.765/2019.       

(1) Resolução CMN 4.765/2019: “Art. 2º. Admite-se a cobrança de tarifa pela disponibilização de cheque especial ao cliente. § 1º. A cobrança da tarifa prevista no caput deve observar os seguintes limites máximos: I – 0% (zero por cento), para limites de crédito de até R$ 500,00 (quinhentos reais); e II – 0,25% (vinte e cinco centésimos por cento), para limites de crédito superiores a R$ 500,00 (quinhentos reais), calculados sobre o valor do limite que exceder R$ 500,00 (quinhentos reais). § 2º. A cobrança da tarifa deve ser efetuada no máximo uma vez por mês. § 3º. A cobrança da tarifa deve observar, no que couber, as disposições da Resolução nº 3.919, de 25 de novembro de 2010, não se admitindo a inclusão do serviço de que trata o caput em pacote de serviços vinculados a contas de depósito à vista.”

(2) CTN: “Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação.”

(3) CF/1988: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) V - defesa do consumidor;”

(4) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

ADI 6407/DF, relator Min. Gilmar Mendes, julgamento virtual finalizado em 30.4.2021 (sexta-feira), às 23:59

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