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9 de maio de 2021

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO PARA PAGAMENTO, SOB PENA DE MULTA E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO

RECURSO ESPECIAL Nº 1837211 - MG (2019/0127971-9) 

RELATOR : MINISTRO MOURA RIBEIRO 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO PARA PAGAMENTO, SOB PENA DE MULTA E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 

1. Aplicabilidade do novo Código de Processo Civil, devendo ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 

2. As decisões proferidas em liquidação ou cumprimento de sentença, execução e inventário, são impugnáveis por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único, do NCPC). 

3. Com o advento do Novo Código de Processo Civil, o início da fase de cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa passou a depender de provocação do credor. Assim, a intimação do devedor para pagamento é consectário legal do requerimento, e, portanto, irrecorrível, por se tratar de mero despacho de expediente, pois o juiz simplesmente cumpre o procedimento determinado pelo Código de Processo Civil (art. 523 do NCPC), impulsionando o processo. 

4. Recurso especial a que se nega provimento. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino (Presidente), Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 09 de março de 2021. 


RELATÓRIO 

Da leitura da minuta de agravo de instrumento, que deu origem ao presente inconformismo, pode aferir que a CASA GUARAGIL LTDA (CASA GUARAGIL) propôs ação de repetição de indébito contra o BANCO BRADESCO S.A. (BRADESCO), que foi julgada procedente para decotar a capitalização de juros do contrato firmado entre as partes, dada a ausência de provas de sua previsão expressa na avença celebrada, devendo ser recalculado o débito da parte autora, restituindo de forma simples os valores cobrados indevidamente, corrigido pelos índices da Tabela da Corregedoria Geral de Justiça desde o desembolso e com juros de mora a partir da citação (e-STJ, fl. 581). 

Com o trânsito em julgado do decisum, teve início a liquidação do julgado, tendo a CASA GUARAGIL, credora, apresentado parecer com o valor do débito no montante de R$3.614.522,45 (três milhões, seiscentos e quatroze mil, quinhentos e vinte e dois reais e quarenta e cinco centavos) (e-STJ, fl. 706/711). 

Intimado para apresentar os contratos e extratos da movimentação financeira da conta nº 132.502-7, agência nº 0080-9, nos termos do art. 524, § 4º, do NCPC, o BRADESCO quedou-se inerte, ocasião em que foram reputados corretos os cálculos juntados pela CASA GUARAGIL, credora (e-STJ, fl. 715). 

Ato seguinte, na e-STJ, fl. 752 o BRADESCO foi intimado para pagamento em 15 dias, sob pena de multa e fixação de honorários. 

Contra essa determinação o BRADESCO interpôs agravo de instrumento, sob o argumento de que foi equivocadamente certificado o decurso de prazo para apresentação dos documentos e impugnação dos cálculos da CASA GUARAGIL, pleiteando para que fossem anulados todos os atos praticados desde a indevida certificação de decurso do prazo, ou então, da decisão homologatória, permitindo-se a juntada dos documentos e a impugnação aos valores que foram apresentados pela agravada (e-STJ, fl. 859). 

O recurso não foi conhecido, por inadequação da via eleita, cujo acórdão encontra-se assim ementado: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – PRELIMINAR – INADEQUAÇÃO RECURSAL - MERO DESPACHO ORDINATÓRIO - IRRECORRIBILIDADE - NÃO CONHECIMENTO. É patente a inadmissibilidade de agravo de instrumento interposto em razão de despacho citatório pois, despido de conteúdo decisório, esse é incapaz de gerar prejuízo às partes, tratando-se de ato judicial irrecorrível, nos termos do art. 1.001, do Código de Processo Civil de 2015. Recurso inadmitido (e-STJ, fl. 877). 

Contra esse julgado o BRADESCO manejou recurso especial, fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando (1) a nulidade da intimação da decisão que homologou as contas apresentadas pela CASA GUARAGIL, credora; e, (2) divergência jurisprudencial e violação dos arts. 203 e 1.105, ambos do NCPC, pois com a intimação do executado para pagamento, sob pena de multa e fixação de honorários advocatícios tem conteúdo decisório, cabível sua impugnação por agravo de instrumento. 

Foram apresentadas contrarrazões. 

O apelo nobre foi admitido por ocasião do provimento do agravo interposto contra a decisão do juízo prévio de admissibilidade. 

É o relatório. 

VOTO 

O recurso ora em análise foi interposto na vigência do NCPC, razão pela qual devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista, nos termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 

A pretensão recursal está em definir se, sob a égide do Novo Código de Processo Civil, é recorrível por agravo de instrumento o pronunciamento judicial que determina a intimação do executado para pagar o valor judicialmente reconhecido, sob pena de multa e fixação de honorários advocatícios. 

No art. 1.015 do NCPC foi elencado o rol de decisões interlocutórias sujeitas a impugnação por agravo de instrumento, ressaltando o parágrafo único que também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. 

De início, deve ser pontuado que as decisões interlocutórias proferidas em liquidação ou cumprimento de sentença, em execução e no processo de inventário não se restringem àquelas elencadas nos incisos do caput do art. 1.015 do NCPC. 

Pela nova sistemática processual, via de regra, nos termos do §1º do art. 1.009 do NCPC, as decisões proferidas durante o trâmite processual podem ser objeto de impugnação na apelação, salvo as exceções previstas no art. 1.015 do NCPC, que serão objeto de agravo de instrumento. 

Por isso, considerando que na liquidação ou cumprimento de sentença, na execução e no inventário não são proferidas novas sentenças de mérito, onde as decisões interlocutórias poderiam ser objeto de irresignação, os pronunciamentos judicias realizados naquelas circunstâncias são impugnáveis por agravo. 

Colhe-se das lições do professor HUMBERTO THEODORO JÚNIOR: 

Com efeito, no processo de execução e no cumprimento de sentença não há a perspectiva de uma nova sentença sobre o mérito da causa, já que o provimento esperado não é o acertamento do direito subjetivo da parte, mas sua material satisfação, que se consumará antes de qualquer sentença, e nem mesmo a posteriori se submeterá a uma sentença que lhe aprecie o conteúdo e validade. Daí que os atos executivos preparatórios e finais, que provocam imediatamente repercussões patrimoniais para os litigantes, reclamam pronta impugnação por agravo de instrumento. No inventário, a fase que discute a admissão ou não de herdeiros, termina por decisão interlocutória e, não por sentença. O mesmo acontece na fase de liquidação de sentença. É por isso que os incidentes desses dois procedimentos devem ser objeto de agravo de instrumento (in Curso de Direito Processual Civil, Volume III. 52. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 1126). 

Na mesma linha é o escólio de FREDIE DIDIER JR. e LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA: 

A lista taxativa de decisões agraváveis do caput do art. 1.015, CPC, aplica-se apenas à fase de conhecimento. Na fase de liquidação de sentença, na de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário e partilha, toda e qualquer decisão interlocutória é agravável. Como o processo de falência é um processo de execução universal, também caberá, sempre, agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias, nesses casos. Em todos esses casos, não há limitação: toas as decisões interlocutórias proferidas nesses ambientes são, em tese, agraváveis, cabendo examinar concretamente, se há interesse recursal. (in Curso de Direito Processual Civil, v. 3, 16. ed. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2019, p. 276) 

Ademais, não se pode olvidar o entendimento proferido pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do REsp nº 1.696.396/MT, julgado sob o rito dos processos repetitivos, da Relatoria da Excelentíssima Senhora Ministra NANCY ANDRIGHI, segundo o qual o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação". 

Assim, toda e qualquer decisão interlocutória proferida em sede de liquidação ou cumprimento de sentença, execução e inventário, é impugnável por agravo de instrumento. 

Nesse sentido, confiram-se o seguinte precedente: 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERIU O PEDIDO DE NULIDADE DAS INTIMAÇÕES OCORRIDAS APÓS A PROLATAÇÃO DA SENTENÇA. CABIMENTO DO RECURSO EM FACE DE TODAS AS DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS PROFERIDAS EM LIQUIDAÇÃO E CUMPRIMENTO DE SENTENÇA, EXECUÇÃO E INVENTÁRIO, INDEPENDENTEMENTE DO CONTEÚDO DA DECISÃO. INCIDÊNCIA ESPECÍFICA DO ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. LIMITAÇÃO DE CABIMENTO DO RECURSO, PREVISTA NO ART. 1.015, CAPUT E INCISOS, QUE SOMENTE SE APLICA ÀS DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS PROFERIDAS NA FASE DE CONHECIMENTO. [...] 2- O propósito recursal consiste em definir se é recorrível, de imediato e por meio de agravo de instrumento, a decisão interlocutória que indeferiu o pedido de declaração de nulidade das intimações ocorridas após a prolatação da sentença. 3- Somente as decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento se submetem ao regime recursal disciplinado pelo art. 1.015, caput e incisos do CPC/2015, segundo o qual apenas os conteúdos elencados na referida lista se tornarão indiscutíveis pela preclusão se não interposto, de imediato, o recurso de agravo de instrumento, devendo todas as demais interlocutórias aguardar a prolação da sentença para serem impugnadas na apelação ou nas contrarrazões de apelação. 4- Para as decisões interlocutórias proferidas em fases subsequentes à cognitiva - liquidação e cumprimento de sentença -, no processo de execução e na ação de inventário, o legislador optou conscientemente por um regime recursal distinto, prevendo o art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015, que haverá ampla e irrestrita recorribilidade de todas as decisões interlocutórias, quer seja porque a maioria dessas fases ou processos não se findam por sentença e, consequentemente, não haverá a interposição de futura apelação, quer seja em razão de as decisões interlocutórias proferidas nessas fases ou processos possuírem aptidão para atingir, imediata e severamente, a esfera jurídica das partes, sendo absolutamente irrelevante investigar, nesse contexto, se o conteúdo da decisão interlocutória se amolda ou não às hipóteses previstas no caput e incisos do art. 1.015 do CPC/2015. 5- Na hipótese, tendo sido proferida decisão interlocutória - que indeferiu o pedido de nulidade das intimações após a prolatação da sentença - após o trânsito em julgado e antes do efetivo cumprimento do comando sentencial, cabível, de imediato, o recurso de agravo de instrumento, na forma do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015. 6- Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1.736.285/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, DJe 24/5/2019) 

Reconhecidas as hipóteses em que seja admissível a interposição de agravo de instrumento, passa-se a análise da natureza jurídica da intimação do BRADESCO para pagar em 15 dias, o valor apurado e homologado em liquidação, sob pena de multa e fixação de honorários. 

Na vigência do CPC/73, o início da fase de cumprimento de sentença se dava de ofício pelo juiz da causa, com a intimação do devedor para pagar a quantia fixada na sentença transitada em julgado ou apurada em liquidação. 

Dessa forma, o Superior Tribunal de Justiça, ao interpretar o art. 475-J daquele diploma legal, firmou entendimento que, no cumprimento de sentença, a intimação do vencido para pagamento, sob pena de imposição de multa, tem o condão de causar gravame a parte, possuindo, portanto, conteúdo decisório. 

Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. COBRANÇA DE ASTREINTES. INTIMAÇÃO DA DEVEDORA. PAGAMENTO DO DÉBITO EXEQUENDO. MULTA DO ART. 475-J DO CPC/1973. CONTEÚDO DECISÓRIO. POTENCIALIDADE DE GRAVAME. DECISÃO AGRAVÁVEL. [...]. DECISÃO MANTIDA. [...] 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, "as decisões prolatadas que não põe fim à execução ou cumprimento de sentença são desafiadas por meio do recurso de agravo de instrumento" (AgInt no AREsp n. 1.596.799/SP, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 30/3/2020, DJe 1º/4/2020). Além disso, "o que distingue o despacho da decisão interlocutória impugnável via agravo de instrumento é a existência ou não de conteúdo decisório e de gravame para a parte" (AgRg no REsp n. 1.309.949/MS, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 5/11/2015, DJe 12/11/2015). Ademais, "possui caráter decisório o ato judicial que determina a intimação da parte executada para pagamento do débito indicado na petição de cumprimento de sentença, sob pena de incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC/73" (AgRg no REsp n. 1.258.517/SP, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 20/3/2018, DJe 27/3/2018). [...] 6. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1.257.439/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, DJe 28/8/2020) 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INTIMAÇÃO NOS TERMOS DO ART. 475-J DO CPC. RECORRIBILIDADE. 1.- O ato judicial que determinou a intimação da recorrente para pagar a quantia de R$ 264.867,40, no prazo de 15 dias, acrescidos da multa de 10% (CPC, art. 475-J), em caso de descumprimento, possui conteúdo decisório, sendo recorrível por meio de Agravo de Instrumento, na medida em que impõe o pagamento de vultosa importância em dinheiro, no âmbito de execução provisória, a qual sequer admite a incidência da referida multa, podendo causar gravame à executada, ainda que seja possível combater a irregularidade por meio de impugnação ao cumprimento de sentença. 2.- Recurso Especial provido. (REsp 1.187.805/AM, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Terceira Turma, DJe 27/11/2013) 

Todavia, com o advento do Novo Código de Processo Civil, o início da fase de cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa passou a depender de requerimento do credor. 

Eis o teor do art. 523 do NCPC: 

Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver. 

Observa-se que, agora, a intimação do devedor para pagamento se afigura como despacho de mero expediente, pois é consectário legal da provocação do credor para a satisfação do seu crédito. O juiz simplesmente cumpre o procedimento determinado pelo Código de Processo Civil. 

Mutatis mutandis, confira-se o seguinte precedente: 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. [...]. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL. INTIMAÇÃO PARA PAGAMENTO. NATUREZA. DESPACHO. ART. 203 DO CPC/15. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MATÉRIA. LIQUIDEZ DA OBRIGAÇÃO. REQUISITO DE EXEQUIBILIDADE. ART. 783 DO CPC/15. CONTEÚDO DO ATO JUDICIAL. CARGA DECISÓRIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. [...] 3. O propósito recursal consiste em determinar se é impugnável por meio de agravo de instrumento o ato judicial que, em embargos de declaração opostos contra o despacho que determina a intimação da ré para início do cumprimento provisório de sentença, decidiu matéria relacionada à liquidez da obrigação constante no título executivo. [...] 5. No CPC/15, seguindo a mesma linha do CPC/73, os pronunciamentos jurisdicionais são classificados em sentenças, decisões interlocutórias e despachos, permanecendo como critério de distinção entre as decisões interlocutórias e os despachos a ausência de conteúdo decisório nos últimos, os quais tem como desiderato o mero impulso da marcha processual. 6. Por visarem unicamente ao impulsionamento da marcha processual, não gerando danos ou prejuízos às partes, os despachos são irrecorríveis (art. 1.001 do CPC/15). 7. Sob a égide do CPC/15, o início do cumprimento de sentença, definitivo ou provisório (art. 520, caput, do CPC/15), passou a depender de requerimento expresso do credor, conforme disposto no art. 513, § 1º, do atual Código, razão pela qual o despacho que intima para pagamento não gera, por si só, prejuízo à parte. 8. A defesa do devedor, no cumprimento de sentença, deve, em regra, ser deduzida na impugnação à referida fase processual, mas certas matérias, como a iliquidez da dívida lançada no título, podem ser arguidas por meio de mera petição, na forma do art. 518 do CPC/15. 9. Na hipótese concreta, embora a questão relacionada à liquidez do título tenha sido suscitada em embargos de declaração opostos contra mero despacho, o pronunciamento judicial proferido no julgamento dos aclaratórios possui carga decisória, haja vista possuir o condão de gerar danos e prejuízos aos interesses da recorrente. 10. Assim, apesar de a questão ter sido decidida em embargos de declaração opostos contra mero despacho, o Tribunal de origem deveria ter conhecido e examinado o mérito do agravo de instrumento interposto pela recorrente. 11. Recurso especial provido. (REsp 1.725.612/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, DJe 4/6/2020) 

Dessa forma, é irrecorrível o ato judicial que determina a intimação do devedor para o pagamento de quantia certa, por ter natureza jurídica de despacho. 

Na espécie, iniciada a fase de cumprimento de sentença por requerimento da CASA GUARAGIL (e-STJ, fls. 23/24), o juiz determinou a intimação do BRADESCO para pagamento, como era de rigor. 

Eis o teor do pronunciamento: 

VISTOS, ETC, INTIME-SE PARA PAGAMENTO EM 15 DIAS SOB PENA DE MULTA E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS. I. (e-STJ, fl. 26) 

Não se verifica, portanto, conteúdo decisório no ato judicial. 

Escorreito o entendimento do Tribunal mineiro no sentido de que 

[...] é patente a inadmissibilidade de agravo de instrumento interposto em razão de despacho citatório pois, despido de conteúdo decisório, esse é incapaz de gerar prejuízo às partes, tratando-se de ato judicial irrecorrível, nos termos do art. 1.001, do Código de Processo Civil de 2015 (e-STJ, fl. 877). 

Nessas condições, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial. 

EXECUÇÃO. LIQUIDAÇÃO. LAUDO PERICIAL. HOMOLOGAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. INTIMAÇÃO PRÉVIA DA PARTE EMBARGADA. AUSÊNCIA. NULIDADE. ART. 1.023, § 2º, DO CPC/2015. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. VIOLAÇÃO. ACLARATÓRIOS. REJEIÇÃO. MAIORIA DE VOTOS. VOTO VENCIDO QUE ANULAVA O ACÓRDÃO EMBARGADO. TÉCNICA DE JULGAMENTO AMPLIADO. ART. 942 DO CPC/2015. NÃO APLICAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.841.584 - SP (2019/0297642-3) 

RECURSO ESPECIAL. COBRANÇA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. EXECUÇÃO. LIQUIDAÇÃO. LAUDO PERICIAL. HOMOLOGAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 1.022 DO CPC/2015. NÃO OCORRÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. INTIMAÇÃO PRÉVIA DA PARTE EMBARGADA. AUSÊNCIA. NULIDADE. ART. 1.023, § 2º, DO CPC/2015. PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. VIOLAÇÃO. ACLARATÓRIOS. REJEIÇÃO. MAIORIA DE VOTOS. VOTO VENCIDO QUE ANULAVA O ACÓRDÃO EMBARGADO. TÉCNICA DE JULGAMENTO AMPLIADO. ART. 942 DO CPC/2015. NÃO APLICAÇÃO. 

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

2. Cuida-se, na origem, de execução de sentença fundada em título executivo judicial que condenou a instituição financeira ré ao pagamento de diferenças de correção monetária (expurgos inflacionários do Plano Verão) incidentes sobre aplicação financeira em Certificado de Depósito Bancário (CDB). A decisão interlocutória que deu origem ao agravo de instrumento e subsequentes embargos de declaração cujo acórdão é atacado pelo recurso especial homologou laudo pericial produzido na fase de liquidação de sentença. 

3. As questões decididas no julgamento do presente recurso podem ser assim resumidas: (i) se o acórdão recorrido padece de vício de nulidade por negativa de prestação jurisdicional; (ii) se houve ofensa ao princípio do contraditório ao acolher embargos de declaração com efeitos infringentes sem intimação da parte adversa, e (iii) se a nova técnica de ampliação do julgamento colegiado foi corretamente aplicada no julgamento dos aclaratórios. 

4. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 

5. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que a atribuição de efeitos infringentes aos embargos de declaração supõe a prévia intimação da contraparte, visto que, sem o contraditório, o respectivo julgamento é nulo. Tal entendimento jurisprudencial encontra-se atualmente chancelado pelo § 2º do artigo 1.023 do Código de Processo Civil de 2015, o qual estabelece que "O juiz intimará o embargado para, querendo, manifestar-se, no prazo de 5 (cinco) dias, sobre os embargos opostos, caso seu eventual acolhimento implique a modificação da decisão embargada". 

6. Segundo lições doutrinárias, em se tratando de aclaratórios opostos a acórdão que julga agravo de instrumento, a convocação de outros julgadores para compor o colegiado ampliado (técnica de julgamento prevista no artigo 942 do CPC/2015) somente ocorrerá se os embargos de declaração forem acolhidos para modificar o julgamento originário do magistrado de primeiro grau que houver proferido decisão parcial de mérito. 

7. Recurso especial provido para declarar a nulidade do julgamento dos embargos de declaração com determinação de retorno dos autos à origem para novo julgamento, com a prévia intimação da parte embargada para apresentação de impugnação. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 10 de dezembro de 2019(Data do Julgamento)

8 de maio de 2021

AGRAVO DE INSTRUMENTO. HIPÓTESES DE CABIMENTO DO RECURSO (ART. 1.015, INCISO II, DO CPC). AUSÊNCIA INJUSTIFICADA A AUDIÊNCIA DE CONCILIÇÃO. MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.762.957 - MG (2018/0221473-0) 

RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. HIPÓTESES DE CABIMENTO DO RECURSO (ART. 1.015, INCISO II, DO CPC). AUSÊNCIA INJUSTIFICADA A AUDIÊNCIA DE CONCILIÇÃO. MULTA POR ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA. 

1. Controvérsia em torno da recorribilidade, mediante agravo de instrumento, contra a decisão cominatória de multa à parte pela ausência injustificada à audiência de conciliação. 

2. O legislador de 2015, ao reformar o regime processual e recursal, notadamente do agravo de instrumento, pretendeu incrementar a celeridade do processo, que, na vigência do CPC de 1973, era constantemente obstaculizado pela interposição de um número infindável de agravos de instrumento, dilargando o tempo de andamento dos processos e sobrecarregando os Tribunais, Federais e Estaduais. 

3. A decisão cominatória da multa do art. 334, §8º, do CPC, à parte que deixa de comparecer à audiência de conciliação, sem apresentar justificativa adequada, não é agravável, não se inserindo na hipótese prevista no art. 1.015, inciso II, do CPC, podendo ser, no futuro, objeto de recurso de apelação, na forma do art. 1.009, §1º, do CPC. 

4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília, 10 de março de 2020(data do julgamento)

INTIMAÇÃO DO EXECUTADO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL APTO A CAUSAR PREJUÍZO. RECURSO CABÍVEL. JULGAMENTO: CPC/15

RECURSO ESPECIAL Nº 1.758.800 - MG (2017/0023348-8) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. VIOLAÇÃO DE SÚMULA. NÃO CABIMENTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL APTO A CAUSAR PREJUÍZO. RECURSO CABÍVEL. JULGAMENTO: CPC/15. 

1. Ação de complementação de benefício de previdência privada ajuizada em 2007, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 06/07/2016 e atribuído ao gabinete em 06/03/2017. 

2. O propósito recursal é dizer sobre a negativa de prestação jurisdicional bem como sobre a recorribilidade do pronunciamento judicial que, na fase de cumprimento de sentença, determina a intimação do executado, na pessoa do advogado, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa. 

3. Não cabe recurso especial para impugnar eventual violação de súmula, porquanto não se enquadra no conceito de lei federal, disposto no art. 105, III, "a" da CF/88. 

4. A mera referência à existência de omissão, sem demonstrar, concretamente, o ponto omitido, sobre o qual deveria ter se pronunciado o Tribunal de origem, e sem evidenciar a efetiva relevância da questão para a resolução da controvérsia, não é apta a anulação do acórdão por negativa de prestação jurisdicional. 

5. A Corte Especial consignou que a irrecorribilidade de um pronunciamento judicial advém, não só da circunstância de se tratar, formalmente, de despacho, mas também do fato de que seu conteúdo não é apto a causar gravame às partes. 

6. Hipótese em que se verifica que o comando dirigido à recorrente é apto a lhe causar prejuízo, em face da inobservância da necessidade de intimação pessoal da devedora para a incidência de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer. 

7. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, parcialmente provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO NANCY ANDRIGHI (RELATOR): Cuida-se de recurso especial interposto por FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL - VALIA, fundado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão do TJ/MG. 

Ação: de complementação de benefício de previdência privada ajuizada por ARLINDO GOMES E OUTROS em face de FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, julgada procedente, atualmente na fase de cumprimento definitivo de sentença. 

Decisão: o Juízo de primeiro grau determinou a intimação da executada para comprovar o pagamento no prazo de 15 dias, sob pena de multa de 10% do valor devido, nos termos do art. 475-J do CPC/73, bem como para, no mesmo prazo, implementar as suplementações revisadas, sob pena de multa que arbitrou no dobro devido para cada mês vincendo, a partir da intimação, fixando, desde logo, os honorários em 10% sobre o valor do débito líquido. 

Acórdão: o TJ/MG negou provimento ao agravo regimental interposto pela FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, mantendo a decisão monocrática do Desembargador Relator que havia negado seguimento ao agravo de instrumento. A ementa está redigida nestes termos: 

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHECIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA. DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO DECISÓRIO. IRRECORRIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. 1. Deve ser mantida a decisão unipessoal do Relator que não conheceu do agravo de instrumento interposto contra ato judicial sem conteúdo decisório, que somente determinou a intimação da parte para cumprimento voluntário da obrigação de fazer. 2. Se o comando contra o qual se insurge a recorrente é de mero expediente, não pode ser objeto de recurso, a teor do disposto no artigo 504 do CPC. 

Embargos de declaração: opostos pela FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, foram rejeitados. 

Recurso especial: aponta violação da súmula 211/STJ, dos arts. 1.022, 536, § 1º, e 815, do CPC/15, bem como dissídio jurisprudencial. 

Sustenta, a par da negativa de prestação jurisdicional, que “a decisão que manteve a intimação da Valia, na pessoa de seus advogados, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa não merece prevalecer e possui notório caráter decisório, visto se tratar de uma decisão interlocutória que deu marcha ao processo, instaurando o início da fase de cumprimento de sentença” (fl. 180, e-STJ). 

Afirma “que não se questionou a intimação recebida para efetuar o depósito em garantia, nos termos do art. 475-J do CPC/1973, mas tão somente a necessidade de reforma da decisão para que fosse determinada a realização da intimação pessoal da devedora, sob pena de não se poder fazer incidir (ou ainda que incidisse, não se pudesse cobrar) a multa diária arbitrada” (fl. 182, e-STJ). 

Defende, por isso, o cabimento do agravo de instrumento. 

Juízo prévio de admissibilidade: o TJ/MG inadmitiu o recurso, dando azo à interposição do AREsp 1.051.026/MG, provido para determinar a conversão em especial (fl. 286, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO NANCY ANDRIGHI (RELATOR): O propósito recursal é dizer sobre a negativa de prestação jurisdicional bem como sobre a recorribilidade do pronunciamento judicial que, na fase de cumprimento de sentença, determina a intimação do executado, na pessoa do advogado, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa. 

1. DA VIOLAÇÃO DE SÚMULA 

Não cabe recurso especial para impugnar eventual violação de súmula, porquanto não se enquadra no conceito de lei federal, disposto no art. 105, III, "a" da CF/88. 

2. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL 

Constata-se que a recorrente faz mera referência à existência de omissão no acórdão recorrido, mas não demonstra, concretamente, os pontos omitidos, sobre os quais deveria ter se pronunciado o TJ/MG, tampouco evidencia a efetiva relevância das questões para a resolução da controvérsia, a justificar a anulação do acórdão por negativa de prestação jurisdicional. 

Aplica-se, neste ponto, a Súmula 284/STF. 

3. DA NATUREZA JURÍDICA DO ATO QUE DETERMINA A INTIMAÇÃO DO EXECUTADO, INSTAURANDO A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA 

Sobre esse pronunciamento judicial, cuja natureza jurídica ora se analisa, registrou o TJ/MG: 

Na hipótese dos autos, não deveria mesmo ser conhecido o agravo de instrumento, pois, a meu ver, ao contrário do alegado pela agravante, o ato judicial que desafiou o agravo de instrumento, sem sombra de dúvida, possui natureza de despacho de mero expediente, por ter determinado tão somente a intimação da agravante para cumprimento voluntário da obrigação de fazer, a teor do artigo 461 do CPC, o qual permite a intimação do devedor na pessoa de seus procuradores. (fl. 148, e-STJ). 

Há julgados desta Corte no sentido de que é “incabível agravo de instrumento contra o despacho que determina a citação dos devedores para pagamento ou oferta de bens à penhora” (AgRg no Ag 550.748/MG, Terceira Turma, julgado em 23/03/2004, DJ 19/04/2004; REsp 460.214/SP, Segunda Turma, julgado em 01/06/2006, DJ 02/08/2006; REsp 141.592/GO, Quarta Turma, julgado em 04/10/2001, DJ 04/02/2002, p. 366), ao fundamento de que tal pronunciamento judicial não contém qualquer carga decisória. 

A Corte Especial, ao julgar o AgRg na Rcl 9.858 (julgado em 17/04/2013, DJe 25/04/2013), consignou que a irrecorribilidade de um pronunciamento judicial advém, não só da circunstância de se tratar, formalmente, de despacho, mas também do fato de que seu conteúdo não é apto a causar gravame às partes. 

Sob essa ótica, verifica-se, no particular, que o comando dirigido à recorrente é apto a lhe causar prejuízo, em face da inobservância da necessidade de intimação pessoal da devedora para a incidência de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer, consoante determinou a Corte Especial, no julgamento do EREsp 1.360.577/MG (julgado em 19/12/2018, DJe de 07/03/2019). 

Isso porque a ordem judicial, ainda que contrária ao entendimento do STJ, produz plenamente seus efeitos até que seja invalidada. 

Então, num primeiro momento, revela-se o prejuízo causado à recorrente, que poderá ser compelida ao pagamento da multa, se não cumprir a obrigação no prazo estipulado pelo Juízo de primeiro grau, ainda que não tenha sido, para tanto, devidamente comunicada por meio da sua intimação pessoal; num segundo momento, entretanto, vislumbra-se o prejuízo para os próprios recorridos, na hipótese de eventual invalidação da ordem judicial. 

Convém ressaltar, por oportuno, que a orientação extraída da súmula 410/STJ é no sentido de que a multa incide desde o momento em que vence o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, ou melhor, a partir da intimação pessoal do devedor se inicia a contagem do prazo para o cumprimento da decisão, sob pena de incidência imediata da multa previamente estabelecida. 

Daí se constata o equívoco do TJ/MG ao afirmar que “a intimação pessoal do devedor tão somente se dá para ensejar a cobrança da multa cominatória fixada, o que não é o caso dos autos” (fl. 149, e-STJ). 

Dessa forma, tendo sido essa questão trazida a debate neste recurso especial, há de ser reformado o acórdão recorrido, a fim de que se determine, desde logo, a intimação pessoal da recorrente para o cumprimento da obrigação de fazer. 

4. DA CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, a fim de reformar o acórdão recorrido e determinar, desde logo, a intimação pessoal da recorrente para cumprimento da obrigação de fazer, nos termos da decisão exarada pelo Juízo de primeiro grau. 

6 de maio de 2021

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITA A ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO ARGUIDA PELO RÉU. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSIBILIDADE. CABIMENTO DO RECURSO COM BASE NO ART. 1.015, II, DO CPC/2015. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. QUESTÕES DE MÉRITO, SEJA NO ACOLHIMENTO, SEJA NA REJEIÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.738.756 - MG (2018/0102683-6) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITA A ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO ARGUIDA PELO RÉU. RECORRIBILIDADE IMEDIATA POR AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSIBILIDADE. CABIMENTO DO RECURSO COM BASE NO ART. 1.015, II, DO CPC/2015. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. QUESTÕES DE MÉRITO, SEJA NO ACOLHIMENTO, SEJA NA REJEIÇÃO. 

1- Ação proposta em 27/10/2007. Recurso especial interposto em 26/09/2017 e atribuído à Relatora em 08/05/2018. 

2- O propósito recursal consiste em definir se a decisão interlocutória que afasta a alegação de prescrição é recorrível, de imediato, por meio de agravo de instrumento interposto com fundamento no art. 1.015, II, do CPC/2015. 

3- O CPC/2015 colocou fim às discussões que existiam no CPC/73 acerca da existência de conteúdo meritório nas decisões que afastam a alegação de prescrição e de decadência, estabelecendo o art. 487, II, do novo Código, que haverá resolução de mérito quando se decidir sobre a ocorrência da prescrição ou da decadência, o que abrange tanto o reconhecimento, quanto a rejeição da alegação. 

4- Embora a ocorrência ou não da prescrição ou da decadência possam ser apreciadas somente na sentença, não há óbice para que essas questões sejam examinadas por intermédio de decisões interlocutórias, hipótese em que caberá agravo de instrumento com base no art. 1.015, II, do CPC/2015, sob pena de formação de coisa julgada material sobre a questão. Precedente. 

5- Provido o recurso especial pela violação à lei federal, fica prejudicado o exame da questão sob a ótica da divergência jurisprudencial. 

6- Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. 

Brasília (DF), 19 de fevereiro de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por MARCOS HENRIQUE DE PAULA PEREIRA, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em face de acórdão do TJ/MG que, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno interposto em face de decisão unipessoal que não conheceu do agravo de instrumento interposto pelo recorrente. 

Recurso especial interposto e m: 26/09/2017. Atribuído ao gabinete e m: 08/05/2018. 

Ação: indenizatória, ajuizada por MARIA ELIS DOS SANTOS, fundada em erro médico alegadamente causado por MARCOS HENRIQUE DE PAULA e MATERNIDADE P. P. DOUTOR EUGÊNIO GOMES DE CARVALHO. 

Decisão interlocutória: em saneamento e organização do processo, foi indeferido o pedido de inversão do ônus da prova e foi rejeitada a alegação de prescrição suscitada pelos réus (fls. 17/18, e-STJ). 

Acórdão: por unanimidade, negou provimento ao agravo interno interposto em face de decisão unipessoal que não conheceu do agravo de instrumento interposto pelo recorrente, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO INTERNO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO – HIPÓTESE NÃO PREVISTA NO ART. 1.015 DO CPC/2015 – ROL TAXATIVO – RECURSO NÃO PROVIDO. Não há que se falar em reforma da decisão monocrática que negou seguimento ao recurso, ante a ausência de previsão da hipótese dos autos no rol do art. 1.015 do CPC/2015, na medida em que tal rol estabelece taxativamente os casos de cabimento do agravo de instrumento. (fls. 127/132, e-STJ). 

Embargos de declaração: opostos pelo recorrente, foram rejeitados, por unanimidade, com imposição de multa (fls. 151/157, e-STJ). 

Recurso especial: alega-se violação aos arts. 487, II, e 1.015, II, ambos do CPC/2015, bem como dissídio jurisprudencial (fls. 160/169, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal consiste em definir se a decisão interlocutória que afasta a alegação de prescrição é recorrível, de imediato, por meio de agravo de instrumento interposto com fundamento no art. 1.015, II, do CPC/2015. 

1. DA IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE AFASTA A ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 487, II, E 1.015, II, AMBOS DO CPC/2015. 

Afastada, por intermédio de decisão interlocutória, a alegação de prescrição suscitada em 1º grau de jurisdição, foi interposto o recurso de agravo de instrumento pelo recorrente com fundamento nos arts. 487, II, e 1.015, II, ambos do CPC/2015, que assim dispõem: 

Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: II – decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição; (...) Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: V – mérito do processo. 

O agravo de instrumento não foi conhecido por intermédio de decisão unipessoal do Relator ao fundamento de que o conteúdo da decisão interlocutória não se enquadrava no art. 1.015, II, do CPC/2015. A decisão foi mantida pela Câmara Julgadora por ocasião do desprovimento do agravo interno interposto pelo recorrente, assentando-se o seguinte fundamento: 

Neste sentido, não pode, de fato, a irresignação do agravante ser objeto de análise por esta Instância Recursal, eis que a decisão que rejeitou a preliminar de prescrição suscitada em contestação não encontra guarida no mencionado rol, sendo importante esclarecer apenas que tal matéria, sob nenhuma ótica, pode ser vista como julgamento do mérito da ação, não se subsumindo na hipótese prevista no inciso II do mencionado dispositivo legal, tal como pretende fazer crer o recorrente. (fls. 129/130, e-STJ). 

Em primeiro lugar, não há dúvida de que a decisão que reconhece a existência da prescrição ou da decadência, no CPC/73 e também no CPC/2015, é um pronunciamento jurisdicional de mérito. 

Seja como uma “falsa” decisão de mérito (como defende Cássio Scarpinella Bueno), seja como uma “atípica” decisão de mérito (nos ensinamentos de Teresa Arruda Alvim), seja ainda como uma “preliminar” ou “prejudicial” de mérito (como afirma Fredie Didier Jr.), fato é que houve uma indiscutível opção do legislador por qualificar as decisões que pronunciam a prescrição ou a decadência como decisões de mérito, não havendo, nesse particular, nenhuma inovação significativa da recém-aprovada legislação processual. Contudo, no que se refere à decisão que rejeita a prescrição ou a decadência, hipótese do presente recurso especial, havia divergência doutrinária em virtude do conteúdo do art. 269, IV, do CPC/73, que, literalmente, limitava a qualificação da decisão como de mérito somente à hipótese em que o juiz pronunciava a prescrição ou decadência, o que, a contrario sensu, levaria à conclusão de que a decisão que as rejeitava não seria de mérito (posição sustentada, por exemplo, por Enrico Tullio Liebman, dentre outros). 

É preciso estar atento, todavia, que a nova legislação processual modificou substancialmente os dispositivos legais que regem a prescrição, a decadência e o conceito de mérito, o que se refletirá, evidentemente, no cabimento do recurso de agravo de instrumento com base no art. 1.015, II, do CPC/2015. 

A esse respeito, registre-se que o art. 487, II, do CPC/2015 (que corresponde, em parte, ao art. 269, IV, do CPC/73), não mais qualifica como de mérito apenas a decisão que pronuncia a prescrição ou decadência, mas, ao revés, afirma que haverá resolução de mérito quando o juiz “decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição”. 

O conceito de “decidir sobre a ocorrência” é claramente mais amplo do que apenas “reconhecer a existência de”, motivo pelo qual é correto afirmar que o art. 487, II, do CPC/2015, passou a abranger, indiscutivelmente, o acolhimento e também a rejeição da alegação de prescrição ou decadência, com aptidão inclusive para, em ambas as hipóteses, formar coisa julgada material sobre essas questões. 

Diante desse cenário, embora a ocorrência ou não da prescrição ou da decadência possam ser apreciadas somente por ocasião da prolação da sentença, não há vedação alguma para que essas questões sejam antecipadamente examinadas, por intermédio de decisões interlocutórias. 

A praxe forense, aliás, revela que as hipóteses de rejeição da alegação de prescrição ou de decadência ou de reconhecimento de sua ocorrência sobre parte ou sobre algum dos pedidos, na verdade, normalmente ocorrem antes da sentença, mais precisamente na decisão saneadora (como na hipótese do presente recurso especial), ocasião em que usualmente são decotadas as questões de fato e de direito relevantes da controvérsia para a subsequente fase instrutória. 

Nesse contexto, anote-se que o conteúdo do art. 1.015, caput, do CPC/2015 é suficientemente amplo - “cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre” -, de modo que, tendo sido proferida uma decisão interlocutória que diga respeito à prescrição ou à decadência (art. 487, II), o recurso de agravo de instrumento é cabível com base no inciso II do art. 1.015, pois a prescrição e a decadência são, na forma da lei, questões de mérito. 

Sublinhe-se que a doutrina já se debruçou exatamente sobre a questão debatida no presente recurso especial: 

No curso do procedimento, é possível haver decisões de mérito. O juiz pode, por exemplo, rejeitar a alegação de prescrição ou de decadência, determinando a instrução probatória. De decisões assim cabe agravo de instrumento, tal como prevê o art. 1.015, II, do CPC. O disposto no art. 1.015, II, do CPC, confirma a possibilidade de ser proferida, no processo civil brasileiro, decisão interlocutória de mérito definitiva. Se o dispositivo prevê agravo de instrumento contra decisão de mérito, está, em verdade, a admitir a existência de decisão interlocutória que trate do mérito com caráter de definitividade. Se o agravo de instrumento não for interposto, haverá coisa julgada. Não será possível impugnar a decisão interlocutória de mérito ou a decisão parcial de mérito na apelação a ser interposta da sentença que ainda será proferida. (DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 15ª ed. Salvador: Juspodivm, 2018. p. 252/253). (...) 

4.1. Outrossim, as decisões que rejeitarem incidentalmente questões afeitas ao mérito permitem o manejo do agravo de instrumento. Cogite-se da situação em que o juiz rejeite a alegação de prescrição em decisão interlocutória, tal provimento será atacável na via do agravo de instrumento, sob pena de ser coberto pela coisa julgada no particular. (GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Execução e recursos: comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2017. p. 1.072). 

Finalmente, registre-se que esta Corte, em recente julgado, posicionou-se no sentido de que “a decisão sobre prescrição e decadência é, consoante o art. 487, II, de mérito, não havendo razão para somente permitir a interposição de Agravo de Instrumento da decisão que reconhece os dois institutos” (REsp 1.695.936/MG, 2ª Turma, DJe 19/12/2017). 

Em síntese, o acórdão recorrido violou os arts. 487, II, e 1.015, II, ambos do CPC/2015. 

2. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. 

Acolhido o recurso especial pela alínea “a” do permissivo constitucional, fica prejudicado o exame da irresignação sob a ótica da divergência jurisprudencial. 

3. CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial, determinando o retorno do processo ao TJ/MG para que examine a alegação de existência de prescrição suscitada pelo recorrente, afastando-se, por decorrência lógica, as multas aplicadas ao recorrente pela interposição de agravo interno reputado como manifestamente inadmissível e pela oposição de embargos de declaração reputados como manifestamente protelatórios. 

Filigrana doutrinária: Cabimento de Agravo de Instrumento; Art. 1.015 inciso II do CPC e Prescrição - Fernando da Fonseca Gajardoni

 4.1. Outrossim, as decisões que rejeitarem incidentalmente questões afeitas ao mérito permitem o manejo do agravo de instrumento. Cogite-se da situação em que o juiz rejeite a alegação de prescrição em decisão interlocutória, tal provimento será atacável na via do agravo de instrumento, sob pena de ser coberto pela coisa julgada no particular. 

GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Execução e recursos: comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2017. p. 1.072. 

Filigrana doutrinária: Cabimento de Agravo de Instrumento; Art. 1.015 inciso II do CPC - Fredie Didier

No curso do procedimento, é possível haver decisões de mérito. O juiz pode, por exemplo, rejeitar a alegação de prescrição ou de decadência, determinando a instrução probatória. De decisões assim cabe agravo de instrumento, tal como prevê o art. 1.015, II, do CPC. O disposto no art. 1.015, II, do CPC, confirma a possibilidade de ser proferida, no processo civil brasileiro, decisão interlocutória de mérito definitiva. Se o dispositivo prevê agravo de instrumento contra decisão de mérito, está, em verdade, a admitir a existência de decisão interlocutória que trate do mérito com caráter de definitividade. Se o agravo de instrumento não for interposto, haverá coisa julgada. Não será possível impugnar a decisão interlocutória de mérito ou a decisão parcial de mérito na apelação a ser interposta da sentença que ainda será proferida. 

DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 15ª ed. Salvador: Juspodivm, 2018. p. 252/253.  

EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO. AÇÃO INCIDENTAL. JULGAMENTO DE MÉRITO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO UNÂNIME. TÉCNICA DE AMPLIAÇÃO DO COLEGIADO. APLICAÇÃO.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.797.866 - SP (2019/0027674-4) 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

RECURSO ESPECIAL. EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO. AÇÃO INCIDENTAL. JULGAMENTO DE MÉRITO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO UNÂNIME. TÉCNICA DE AMPLIAÇÃO DO COLEGIADO. APLICAÇÃO. 

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

2. A controvérsia gira em torno de (i) aferir se o procedimento estabelecido pelo art. 942 do CPC/2015 possui incidência sobre o caso concreto, (ii) verificar se houve invasão da competência do tribunal arbitral ao se estabelecer o momento de constituição do crédito relativo à multa contratual, (iii) definir se os contratos firmados pela sociedade empresária se resolveram com o pedido de recuperação judicial, (iv) identificar a existência de falha na prestação jurisdicional, (v) determinar se a alteração do critério de fixação da sucumbência depende de pedido expresso e (vi) fixar a norma que rege a sucumbência na hipótese. 

3. Nos termos do artigo 189 da LREF, o Código de Processo Civil se aplica aos procedimentos de recuperação judicial e falência no que couber. 

4. A impugnação de crédito não é um mero incidente processual na recuperação judicial, mas uma ação incidental, de natureza declaratória, que tem como objeto definir a validade do título (crédito) e a sua classificação. 

5. No caso de haver pronunciamento a respeito do crédito e sua classificação, mérito da ação declaratória, o agravo de instrumento interposto contra essa decisão, julgado por maioria, deve se submeter à técnica de ampliação do colegiado prevista no artigo 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015. 

6. Recurso especial provido para, acolhendo a preliminar de nulidade, determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que seja convocada nova sessão de prosseguimento do julgamento do agravo de instrumento, nos moldes do art. 942 do CPC/2015, ficando prejudicadas, por ora, as demais questões. 

ACÓRDÃO 

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator. 

Brasília (DF), 14 de maio de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por RAÍZEN ENERGIA S.A., RAÍZEN TARUMÃ LTDA. e RAÍZEN CAARAPÓ S.A. AÇÚCAR E ÁLCOOL, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, impugnando acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado: 

"RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPUGNAÇÃO AO CRÉDITO. CONCURSALIDADE DO CRÉDITO DAS AGRAVADAS. RECONHECIMENTO. RECURSO PROVIDO. Recuperação judicial. Impugnação ao crédito. Concursalidade. Incidência do art. 49, da Lei nº 11.101/2005. Crédito existente ao tempo do pedido recuperacional. Reconhecimento. Recurso provido" (fl. 2.264, e-STJ). 

Os embargos de declaração foram rejeitados (fls. 2.348/2.359, e-STJ). 

Nas razões do recurso especial, as recorrentes alegam, além de dissídio jurisprudencial, violação dos seguintes dispositivos, com as respectivas teses: 

(i) artigo 942, caput, e § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) - porque o tribunal de origem restringiu indevidamente a aplicação da técnica de julgamento estendido, limitando sua ocorrência apenas aos casos em que se discute a reforma da decisão que homologou o plano de recuperação judicial; 

(ii) artigos 1º, 3º, 4º, 8º, parágrafo único, 32 e 33 da Lei nº 9.307/1996 e 485, VII, do CPC 2015 - porque foi reconhecida a possibilidade de discussão acerca da validade de sentença arbitral em incidente no processo de recuperação judicial, além de ingressar no mérito da controvérsia, especificamente nas razões de rescisão dos contratos, matéria de competência exclusiva do tribunal arbitral; 

(iii) artigo 49, caput, e § 2º, da Lei nº 11.101/2005 - porque reconhecida a possibilidade de resolução de contratos pelo simples ajuizamento da recuperação judicial; 

(iv) artigo 1.022 do CPC/2015 - porque o tribunal de origem deixou de se manifestar acerca dos erros de fato indicados nos embargos de declaração; 

(v) artigo 492, caput, do CPC/2015 - porque o tribunal alterou o critério de fixação dos honorários sem pedido expresso das recorridas, e 

(vi) artigo 85, § 2º, do CPC/2015 - porque a Corte de origem fixou equivocadamente os honorários advocatícios, já que, na hipótese, não há condenação, nem benefício econômico para nenhuma das partes em virtude da procedência do pedido. 

REDE ENERGIA PARTICIPAÇÕES S.A. - em Recuperação Judicial e COMPANHIA TÉCNICA DE COMERCIALIZAÇÃO DE ENERGIA - CTCE - apresentaram impugnação às fls. 2.468/2.477 (e-STJ). 

Afirmam as recorridas que toda a controvérsia gira em torno de se definir o momento em que os contratos firmados entre as partes foram resolvidos, de modo a verificar se os valores relativos às multas contratuais estão sujeitos aos efeitos do plano de recuperação judicial. 

Esclarecem que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concluiu que o crédito já existia ao tempo do pedido de recuperação judicial, esbarrando a reversão desse entendimento na censura da Súmula nº 7/STJ. 

Sustentam que o acolhimento da pretensão das recorrentes dependeria da modificação das Cláusulas 4.1.2., 4.6.1 e 4.10 do plano de recuperação, o que não seria possível em recurso especial diante da incidência da Súmula nº 5/STJ. Além disso, as recorridas não recorreram da decisão que homologou o plano, tendo se operado a preclusão lógica e consumativa. 

Apontam que a modificação dos ônus sucumbenciais não depende de pedido expresso, restringindo-se esta Corte a modificar o montante fixado somente nas hipóteses em que são irrisórios ou exorbitantes, o que não é o caso. 

Destacam não ser hipótese de julgamento ampliado, pois não existe propriamente um julgamento de mérito no incidente, o que somente ocorrerá com a homologação do plano de recuperação. 

Salientam que em recuperações de empresas de grande porte são instauradas centenas de incidentes de impugnação ao crédito, nos quais se decide pela admissibilidade e classificação do crédito, mas não sobre seu mérito, que é assentado em processo autônomo. 

Enfatizam que o tribunal arbitral não estabeleceu o momento da resolução dos contratos, mas tão somente o fato de que a CTCE deu causa à extinção dos ajustes, sendo devido o pagamento das multas. 

Assentam que compete exclusivamente ao Juízo da recuperação determinar se um crédito está ou não sujeito aos efeitos da recuperação. 

Requerem que o recurso especial não seja conhecido e, caso conhecido, não seja provido. 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): O acórdão impugnado pelo recurso especial foi publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 

A controvérsia gira em torno de (i) aferir se o procedimento estabelecido pelo art. 942 do CPC/2015 possui incidência sobre o caso concreto, (ii) verificar se houve invasão da competência do tribunal arbitral ao se estabelecer o momento de constituição do crédito relativo à multa contratual, (iii) definir se os contratos firmados pela sociedade empresária se resolveram com o pedido de recuperação judicial, (iv) identificar a existência de falha na prestação jurisdicional, (v) determinar se a alteração do critério de fixação da sucumbência depende de pedido expresso e (vi) fixar a norma que rege a sucumbência na hipótese. 

A irresignação merece acolhida. 

1. Breve histórico 

Tem-se, na origem, impugnação de crédito apresentada pelas recuperandas em face de Raízen Energia S.A. e outras, pretendendo que o pagamento dos valores devidos às requeridas, decorrentes de multas por resolução de contratos de energia elétrica, seja feito nos termos do plano de recuperação judicial, com a declaração de que as quantias já satisfeitas são suficientes para extinguir a dívida. 

O juízo de primeiro grau julgou improcedente a impugnação, aduzindo em síntese que, 

"(...) Na arbitragem, foi declarado que os contratos foram validamente rescindidos. Na fundamentação da decisão, o Tribunal arbitral reconheceu a validade da rescisão em virtude da cassação pela ANEEL e do consequente desligamento da CCEE. Para os árbitros, 'reconhecida a validade da rescisão, por culpa da CTCE, em virtude da cassação da autorização da ANEEL e do consequente desligamento da CCEE' (sic). Conforme havia previsão contratual, as questões envolvendo os contratos seriam submetidas ao Tribunal Arbitral. No caso, foi o próprio Tribunal Arbitral que determinou o momento em que a rescisão ocorreu. Segundo o título executivo judicial, os contratos foram rescindidos por ocasião da cassação da autorização da ANEEL e do consequente desligamento da CCEE ('108. O fato inafastável é que os contratos se viram frustrados, ou inviáveis de performance, a partir do desligamento da CTCE da CCEE, o que deu azo à justificada rescisão por parte das requerentes'). (...) Cumpre aferir o momento em que ocorreu a cassação da autorização da ANEEL, conforme determinado pelo Tribunal Arbitral. O procedimento administrativo fora instaurado em 08.08.2012 e a revogação somente foi publicada no dia 27.11.2012. A data da cassação pela ANEEL deve ser a data da efetiva publicação da decisão, dia 27 de novembro de 2012. Isso porque é requisito de eficácia do ato administrativo a publicidade. É somente a partir da publicação da decisão da ANEEL que as partes possuiriam ciência inequívoca da cassação da autorização e, portanto, de que o contrato fora rescindido. A rescisão do contrato, ocorrida em 27 de novembro de 2012, nesses termos, é posterior ao pedido de recuperação judicial, realizado em 23 de novembro de 2012. Apenas com a rescisão, por seu turno, é que passa a incidir, sobre o inadimplente, a multa contratual, a qual, portanto, tem existência posterior ao pedido de recuperação judicial" (fls. 201/207, e-STJ - grifou-se) 

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por maioria, reformou a decisão de primeiro grau, destacando: 

"(...) O que deu causa à resolução do contrato e ao crédito das agravadas pela multa arbitrada foi a falta de pagamento dos aportes garantidores que as recuperandas tinham por ônus providenciar junto à comissão que intermediava as vendas de energia, porque dessa falta decorreu a sua suspensão e a impossibilidade de cumprimento dos contratos. Em março de 2012 caracterizou-se a inadimplência das agravantes junto ao órgão intermediador, tendo sido essa a causa da suspensão de novos contratos e posterior perda da autorização para comercialização da eletricidade. O que se tem, assim, é que a causa para a resolução do ajuste firmado com a agravada, apesar de ter sido reconhecida pela ANEEL apenas com a resolução administrativa referida, é muito anterior a ela, tendo restado configurada, como se viu, com a inadimplência em relação aos aportes garantidores junto à CCEE, em março de 2012. (...) Logo, a notificação promovida pela agravada não tem o efeito de alterar ou definir o momento em que o inadimplemento ocorreu. E se o inadimplemento não decorre da referida notificação, ele ocorreu seguramente antes do pedido de recuperação. (...) (...) Acrescente-se que a decisão arbitral não definiu, com efeito de trânsito em julgado, o momento exato em que ocorreu o inadimplemento do contrato, porquanto se restringiu a julgar a pretensão de aplicação da multa contratual. Não fosse por isso, o plano de recuperação judicial apresentado pelas agravantes e que foi aprovado pelos credores especialmente reunidos na Assembleia Geral realizada, previu que os contratos firmados pela coagravante CTCE estariam rescindidos com o pedido recuperacional. (...) (...) Tem-se, assim, que as recorridas reconheceram expressamente que o ajuizamento do pedido de recuperação judicial foi a causa para a rescisão dos contratos, concordando tacitamente com a inclusão de seus créditos (decorrentes do contrato) no processo coletivo. (...) Os contratos firmados entre as partes litigantes são anteriores à recuperação, assim como o é a causa de sua resolução, qual seja a inadimplência das agravantes em relação aos aportes garantidores junto à comissão técnica intermediadora de suas negociações. Tem-se, assim, que a causa da multa aplicada no Tribunal Arbitral é efetivamente anterior ao pedido recuperacional e, portanto, a ele se submete" (fls. 2.267/2.274, e-STJ - grifou-se). 

As recorrentes opuseram embargos de declaração, os quais foram rejeitados em acórdão assim sintetizado: 

"Embargos de declaração - Agravo de instrumento - Decisão de origem reformada por maioria de votos - Pretendido prosseguimento do julgamento com base no artigo 942, § 3º, II, do CPC - Descabimento - Código de Processo Civil que restringe a técnica do julgamento estendido ao agravo de instrumento - Entendimento desta Câmara no sentido de ser cabível o julgamento estendido apenas quando se discute e se reforma decisão a respeito da homologação do plano recuperacional - Argüição de omissões - Hipóteses do art. 1.022 do CPC não verificadas - Inconformismo revelador de natureza infringente dos embargos de declaração - Prequestionamento - Embargos de declaração rejeitados" (fl. 2.350, e-STJ). 

Sobreveio o presente recurso especial. 

2. Da aplicação da técnica de ampliação de julgamento do art. 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015 

A questão que se põe a debate é saber se, no caso de provimento, por maioria, do agravo interposto contra decisão que julga improcedentes os pedidos feitos em impugnação de crédito, reformando a decisão de primeiro grau, como na hipótese dos autos, é aplicável a técnica de ampliação do julgamento prevista no artigo 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015, que tem a seguinte redação: 

"Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores. § 1º Sendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado. § 2º Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento. § 3º A técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em: I - ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno; II - agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito. § 4º Não se aplica o disposto neste artigo ao julgamento: I - do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas; II - da remessa necessária; III - não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial." 

Vale lembrar, no ponto, que, de acordo com o artigo 189 da LREF, o Código de Processo Civil se aplica aos procedimentos de recuperação judicial e falência no que couber. 

A Corte de origem afastou a aplicação da técnica de ampliação de julgamento ao entendimento de que não houve a reforma de decisão que julgou parcialmente o mérito nos termos exigidos pelo dispositivo acima mencionado: 

"(...) Ademais, esta 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial tem entendido ser caso de julgamento estendido no processo recuperacional apenas quando se discute e se reforma decisão a respeito da homologação do plano, conforme se extrai do seguinte julgado, a saber: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. OBSCURIDADE. CONTRARIEDADE. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO. A decisão recorrida deixou claros os motivos do convencimento da Turma Julgadora para a manutenção do crédito do agravado no quadro geral de credores como indicado pelo Administrador Judicial. A matéria em julgamento diz respeito a um incidente do processo de recuperação judicial, cujo mérito, se de mérito se pode falar, é a homologação do Plano de Recuperação ou a Falência. Mérito, no sentido que tem o art. 942, § 3º, inc. II, do NCPC, é o mérito do processo de conhecimento e não dos incidentes do processo. Basta ver que a Lei nesse ponto se refere a 'decisão que julgar parcialmente o mérito', que tudo indica se refere ao julgamento previsto no art. 356 do Código. O mérito não se identifica no incidente, mas na causa principal em julgamento. (...)" (fl. 2.352, e-STJ - grifou-se). 

Essa não parece a melhor interpretação a ser dada ao incidente de impugnação de crédito. 

Com efeito, apesar da nomenclatura "incidente", a impugnação ao crédito não é um mero incidente processual na recuperação judicial, mas uma ação incidental, de natureza declaratória, que segue o rito dos artigos 13 e 15 da LREF. Observa-se que há previsão de produção de provas e, caso necessário, a realização de audiência de instrução e julgamento (art. 15, IV, da LREF), procedimentos típicos dos processos de conhecimento. 

Confira-se, nessa linha, os comentários de José Carlos Barbosa Moreira ao artigo 13 da LREF: 

"(...) A impugnação de crédito(s) constitui autêntico processo incidente, de caráter jurisdicional e contencioso, em que o impugnante assume a posição de autor. A petição do art. 13, portanto, é petição inicial de ação e, como tal, observará, no que couber, o disposto no art. 282 do Código de Processo Civil". (Comentários à Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas: Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005/coordenadores Osmar Brina Corrêa-Lima, Sérgio Mourão Corrêa Lima. Rio de Janeiro: Forense, 2009, pág. 139 - grifou-se) 

A propósito, ainda, a lição de Paulo Marcondes Brincas: 

"(...) Petição inicial da impugnação: a impugnação é uma ação incidental de natureza contenciosa, cujo conteúdo refere-se à discussão sobre a existência, valor ou classe do crédito impugnado. Desta forma, sua petição inicial deverá conter os mesmos requisitos essenciais a qualquer inicial, determinados pelo artigo 282 do Código de Processo Civil". (De Lucca, Newton e Simão Filho, Adalberto - coordenação. Comentários a Nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. São Paulo: Quartier Latin, 2005, pág. 143 - grifou-se) 

A respeito da decisão de impugnação de crédito, afirma Waldo Fazzio Júnior: 

"(...) A decisão que culmina com a inclusão do crédito no quadro geral de credores é declaratória da validade do título e do direito ao pagamento". (Lei de Falência e Recuperação de Empresas. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, pág. 77) 

Sob essa perspectiva, a decisão que põe fim ao incidente de impugnação de crédito, pronunciando-se quanto à validade do título (crédito), seu valor e a sua classificação, é inegavelmente uma decisão de mérito. 

Vale destacar o ensinamento de Humberto Theodoro Júnior: 

"(...) A ação de cognição, que provoca a instauração de um processo de conhecimento, busca o pronunciamento de uma sentença que declare entre os contendores que tem razão e quem não a tem, o que se realiza mediante a determinação da regra jurídica concreta que disciplina o caso que formou o objeto do processo". (Curso de Direito Processual Civil - Teoria geral do direito processual civil - vol. I. 58ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, pág. 173) 

Observa-se que no Decreto-Lei nº 7.661/1945, a decisão que põe fim à impugnação de crédito era denominada de sentença e desafiava o recurso de apelação (art. 97) e, fosse esse o caso, os subsequentes embargos infringentes (REsp nº 150.002/MG, relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira). 

Mais uma vez a lição de Barbosa Moreira, agora comentando o artigo 17 da Lei nº 11.101/2005: 

"(...) Aqui, é preciso considerar que o agravo de instrumento está, a rigor, fazendo as vezes de apelação, que aliás era o recurso cabível segundo a anterior Lei de Falências (Decreto-Lei nº 7.661/1945, art. 97, na redação dada pela Lei nº 6.014), embora com a peculiaridade de não produzir efeito suspensivo (art. 97, § 1º). A decisão sobre impugnação não é interlocutória; tem, na verdade, a natureza de sentença. Isso deve ser levado em consideração para determinar a profundidade do efeito devolutivo do agravo". (Comentários à Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas: Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005/coordenadores Osmar Brina Corrêa-Lima, Sérgio Mourão Corrêa Lima. Rio de Janeiro: Forense, 2009, págs. 154/155 - grifou-se) 

Nesse contexto, levando em conta a natureza da decisão, o caso seria até mesmo de aplicação do artigo 942, caput, do CPC/2015. 

É possível concluir, em vista desses fundamentos, que o agravo de instrumento que, por maioria, reforma decisão proferida em impugnação que se pronuncia acerca da validade e classificação do crédito se inclui na regra legal de aplicação da técnica de julgamento ampliado, pois: (i) o Código de Processo Civil se aplica aos procedimentos de recuperação judicial e falência no que couber; (ii) a impugnação de crédito é uma ação incidental de natureza declaratória, em que o mérito se traduz na definição da validade do título e sua classificação; (iii) a decisão que põe fim ao incidente de impugnação de crédito tem natureza de sentença, fazendo o agravo de instrumento as vezes de apelação, e (iv) se a decisão se pronuncia quanto à validade do título e a classificação do crédito, há julgamento de mérito. 

Cumpre sublinhar que, na hipótese dos autos, a decisão objeto do agravo de instrumento concluiu que "a multa decorrente da rescisão contratual é crédito extraconcursal e não se submete ao plano de recuperação judicial" (fl. 206, e-STJ), julgando improcedentes os pedidos e extinguindo o incidente com resolução de mérito. Houve, portanto, pronunciamento quanto à validade do crédito e sua classificação, mérito da ação declaratória, e não sobre questão de índole processual. 

Nesse contexto, não há como afastar a aplicação do artigo 942, § 3º, II, do Código de Processo Civil de 2015, propiciando o aprofundamento da discussão a respeito da controvérsia jurídica sobre a qual houve dissidência. 

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para declarar a nulidade do acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que seja convocada nova sessão de prosseguimento do julgamento do agravo de instrumento, nos moldes do art. 942 do CPC/2015, ficando prejudicada, por ora, a análise das demais questões. 

É o voto. 

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE ADMITE A INTERVENÇÃO DE TERCEIRO E DECLINA DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA FEDERAL. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. ART. 1.015, IX, DO CPC/15. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL DE DUPLO CONTEÚDO. CRITÉRIOS DE EXAME. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUE É O ELEMENTO PREPONDERANTE DA DECISÃO JUDICIAL. ESTABELECIMENTO DE RELAÇÃO DE ANTECEDENTE-CONSEQUENTE. IMPUGNAÇÃO ADEQUADA DA PARTE, QUE SE VOLTA ESSENCIALMENTE AOS MOTIVOS PELOS QUAIS A INTERVENÇÃO É NECESSÁRIA EM RELAÇÃO A TODAS AS PARTES. DELIBERAÇÃO SOBRE O DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA QUE É DECORRÊNCIA LÓGICA, EVIDENTE E AUTOMÁTICA DO EXAME DA QUESTÃO PREPONDERANTE.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.797.991 - PR (2019/0044742-7) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL SECURITÁRIA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE ADMITE A INTERVENÇÃO DE TERCEIRO E DECLINA DA COMPETÊNCIA PARA A JUSTIÇA FEDERAL. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. ART. 1.015, IX, DO CPC/15. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL DE DUPLO CONTEÚDO. CRITÉRIOS DE EXAME. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO QUE É O ELEMENTO PREPONDERANTE DA DECISÃO JUDICIAL. ESTABELECIMENTO DE RELAÇÃO DE ANTECEDENTE-CONSEQUENTE. IMPUGNAÇÃO ADEQUADA DA PARTE, QUE SE VOLTA ESSENCIALMENTE AOS MOTIVOS PELOS QUAIS A INTERVENÇÃO É NECESSÁRIA EM RELAÇÃO A TODAS AS PARTES. DELIBERAÇÃO SOBRE O DESLOCAMENTO DA COMPETÊNCIA QUE É DECORRÊNCIA LÓGICA, EVIDENTE E AUTOMÁTICA DO EXAME DA QUESTÃO PREPONDERANTE. 

1- Ação proposta em 14/08/2009. Recurso especial interposto em 21/08/2018 e atribuído à Relatora em 12/03/2019. 

2- O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que versa, a um só tempo, sobre a intervenção de um terceiro com o consequente deslocamento da competência para justiça distinta é impugnável desde logo por agravo de instrumento fundado na regra do art. 1.015, IX, do CPC/15. 

3- O pronunciamento jurisdicional que admite ou inadmite a intervenção de terceiro e que, em virtude disso, modifica ou não a competência, possui natureza complexa, pois reúne, na mesma decisão judicial, dois conteúdos que, a despeito de sua conexão, são ontologicamente distintos e suscetíveis de inserção em compartimentos estanques. 

4- Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo – intervenção de terceiro e competência – é possível estabelecer, como critérios para a identificação do cabimento do recurso com base no art. 1.015, IX, do CPC/15: 

(i) o exame do elemento que prepondera na decisão; 

(ii) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas; 

(iii) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada. 

5- Aplicando-se tais critérios à hipótese em exame, verifica-se que: 

(i) a intervenção de terceiro exerce relação de dominância sobre a competência, porque somente se cogita a alteração de competência do órgão julgador se houver a admissão ou inadmissão do terceiro apto a provocar essa modificação; 

(ii) a intervenção de terceiro é o antecedente que leva, consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado resultado – se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência para a Justiça Federal e, se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá a manutenção da competência na Justiça Estadual; 

(iii) a irresignação da parte recorrente está no fato de que o interesse jurídico que justificaria a intervenção da Caixa Econômica Federal existiria em relação a todas as partes e não em relação a somente algumas, tendo sido declinados os fundamentos de fato e de direito correspondentes a essa pretensão e apontado que a remessa do processo para a Justiça Federal teria como consequência uma série de prejuízos de índole processual. 

6- Recurso especial conhecido e provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. 

Brasília (DF), 18 de junho de 2019(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de recurso especial interposto por SUL AMÉRICA COMPANHIA NACIONAL DE SEGUROS, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em face de acórdão do TJ/PR que, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno interposto em face da decisão unipessoal que não conheceu do agravo de instrumento interposto pelo recorrente. 

Recurso especial interposto em: 21/08/2018. Atribuído ao gabinete em: 12/03/2019. 

Ação: de responsabilidade obrigacional securitária ajuizada pelos recorridos em face da recorrente. 

Decisão interlocutória: pronunciou no sentido de que “a Caixa Econômica Federal manifestou interesse em integrar a presente demanda em relação aos autores José Maria, Juracy Medeiros Leal e Lea Aparecida dos Santos”, motivo pelo qual “reconheço a incompetência desta Juízo Estadual para processar e julgar a demanda, declinando-a em favor da Justiça Federal, nos termos do art. 109, inc. I, da Constituição Federal”, determinando-se, ainda, “o desmembramento destes autos em relação aos autores acima citados” e a remessa dos autos à Vara Federal da Subseção Judiciária de Telêmaco Borba após o prazo legal e desde que ausente recurso (fls. 854/855, e-STJ). 

Acórdão: por unanimidade, negou provimento ao agravo interno interposto em face da decisão unipessoal que não conheceu do agravo de instrumento interposto pelo recorrente, nos termos da seguinte ementa: 

AGRAVO INTERNO – AÇÃO DE COBRANÇA – RESPONSABILIDADE SECURITÁRIA – SEGURO HABITACIONAL – INTERVENÇÃO DE TERCEIRO – DISCUSSÃO QUE TRATA, EM VERDADE, DA COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DO FEITO – NÃO CONHECIMENTO DA REFERIDA MATÉRIA – HIPÓTESE NÃO PREVISTA NO ROL TAXATIVO DO ART. 1.015 DO NCPC – DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. O art. 1.015 do NCPC trouxe rol taxativo das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Considerando que nenhuma delas abrange decisão que versa sobre competência absoluta da matéria, o tema não comporta conhecimento. (fls. 924/931, e-STJ). 

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram rejeitados, por unanimidade (fls. 945/952, e-STJ). 

Recurso especial: alega-se violação ao art. 1.015, IX, do CPC/15, bem como dissídio jurisprudencial, ao fundamento de que o objeto de sua irresignação não é a competência para processar e julgar a ação em 1º grau, mas, sim, os motivos pelos quais foi reconhecida a existência de interesse da Caixa Econômica Federal em relação a apenas uma parcela dos autores e não em relação aos demais (fls. 955/966, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): O propósito recursal é definir se a decisão interlocutória que versa, a um só tempo, sobre a intervenção de um terceiro com o consequente deslocamento da competência para justiça distinta é impugnável desde logo por agravo de instrumento fundado na regra do art. 1.015, IX, do CPC/15. 

1. DA IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DEFERE OU INDEFERE INGRESSO DE TERCEIRO E, CONSEQUENTEMENTE, DESLOCA OU NÃO A COMPETÊNCIA. ART. 1.015, IX, DO CPC/15. 

Em primeiro lugar, sublinhe-se que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos recursos especiais representativos da controvérsia nº 1.696.396/MT e 1.704.520/MT, ambos com acórdãos publicados no DJe de 19/12/2018, pronunciou-se expressamente pela impossibilidade de uso da interpretação extensiva e da analogia para alargar as hipóteses de cabimento do recurso de agravo de instrumento. 

Anote-se, aliás, que houve unanimidade da Corte Especial nesse particular, na medida em que os e. Ministros que foram contrários à tese vencedora se filiaram ao entendimento de que o rol do art. 1.015 do CPC/15 era taxatividade irrestrita, negando, por consequência, a possibilidade de interpretação extensiva ou de analogia. 

A tese veiculada no recurso especial, contudo, não está fundada na extensão ou na analogia, mas, sim, no próprio conteúdo e na incidência, na hipótese, da regra contida no art. 1.015, IX, do CPC/15, que assim dispõe, in verbis: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: IX – admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; 

De um lado, não há dúvida acerca da recorribilidade imediata, por agravo de instrumento, da decisão interlocutória que versa exclusivamente sobre a admissão e inadmissão da intervenção do terceiro – art. 1.015, IX, do CPC/15, hipótese que se justifica, como bem destacam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, no fato de que os limites subjetivos da coisa julgada necessariamente precisam estar definidos na época da prolação da sentença de mérito. (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 2.240). 

De outro lado, também não há dúvida de que a decisão interlocutória publicada após 19/12/2018 e que versa exclusivamente sobre competência será, igualmente, recorrível de imediato por agravo de instrumento com base na tese jurídica da taxatividade mitigada (tema 988), especialmente quando se verifica que o precedente vinculante se formou a partir de recursos especiais que envolviam, justamente, competência. 

A questão controvertida está na hipótese de um pronunciamento judicial de natureza complexa, que, acolhendo ou rejeitando a intervenção do terceiro, também se pronuncia sobre a necessidade, ou não, de modificação da competência em virtude da referida intervenção. 

Dada a ausência de doutrina que tenha tratado especificamente desse tema, é preciso construir e estabelecer critérios decisórios para a solução da questão, tendo como fundamento, sobretudo, o conteúdo de cada pronunciamento judicial. 

Nesse particular, anote-se que, embora exista uma profunda imbricação entre os conteúdos de cada parcela do pronunciamento jurisdicional em exame – intervenção de terceiro e competência – é possível inseri-los em compartimentos estanques e perfeitamente definidos para, a partir daí, estabelecer a natureza da conexão havida entre eles. 

O primeiro critério que se pode fixar diz respeito a preponderância de carga decisória, ou seja, qual dos elementos que compõem o pronunciamento judicial é mais relevante, critério que se pode importar, por analogia, da classificação das ações delineada por Pontes de Miranda. 

A partir desse critério, conclui-se que a intervenção de terceiro exerce relação de dominância sobre a competência, sobretudo porque, na hipótese, somente se pode cogitar de uma alteração de competência do órgão julgador se – e apenas se – houver a admissão ou inadmissão do terceiro apto a provocar essa modificação. 

Daí decorre, inclusive, o segundo critério que se pode estabelecer para solver a controvérsia, calcado na lógica do antecedente-consequente e na ideia das questões prejudiciais e das questões prejudicadas que se pode emprestar da própria ciência processual, em que se verifica se a primeira matéria – intervenção de terceiro – influencia o modo de se decidir a segunda matéria – competência. 

No ponto, conclui-se que a intervenção de terceiro é o antecedente que leva, consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado resultado – se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência para a Justiça Federal; se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá manutenção da competência na Justiça Estadual. 

É também relevante examinar, nesse contexto, o foco da irresignação da parte agravante em suas razões recursais para que se conclua pela incidência do art. 1.015, IX, do CPC/15, ou seja, se a impugnação se dirige precipuamente para a questão da intervenção de terceiro ou para a questão da competência. 3

Na hipótese em exame, verifica-se que a decisão interlocutória, a despeito da nítida ausência de fundamentação exauriente, afirma que “a Caixa Econômica Federal manifestou interesse em integrar a presente demanda em relação aos autores José Maria, Juracy Medeiros Leal e Lea Aparecida dos Santos” e que esse é o motivo pelo qual se conclui pela incompetência do Juízo Estadual somente em relação especificamente a esses autores-recorridos. 

Nas razões recursais de fls. 4/30 (e-STJ), verifica-se que, diferentemente do que se consignou no acórdão recorrido, o foco da irresignação é o fato de que o interesse jurídico que justificaria a intervenção da Caixa Econômica Federal existiria em relação a todos os autores-recorridos e não somente àqueles acima nominadas, declinando o recorrente os fundamentos de fato e de direito correspondentes a essa pretensão e apontando – sucintamente, a propósito – que a remessa do processo para a Justiça Federal teria como consequência uma série de prejuízos de índole processual. 

Finalmente, registre-se que não há óbice ao enfrentamento da questão controvertida em virtude do reconhecimento de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal no RE 827.996/PR (tema 1011, definido como “controvérsia relativa à existência de interesse jurídico da Caixa Econômica Federal para ingressar como parte ou terceira interessada nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação e, consequentemente, à competência da Justiça Federal para o processamento e o julgamento das ações dessa natureza”). 

A uma, porque não houve determinação de suspensão de todos os processos pendentes que envolvam a mesma questão de direito e, a duas, porque até que se defina a questão no âmbito do Supremo Tribunal Federal, vigora o entendimento de que a intervenção da Caixa Econômica Federal, quando cabível, se dá na modalidade de assistência simples, que é espécie do gênero “intervenção de terceiro” (EDcl nos EDcl no REsp 1.091.393/SC, 2ª Seção, DJe 14/12/2012). 

Em síntese, por qualquer ângulo que se examine a controvérsia, conclui-se que a decisão que versa sobre a admissão ou inadmissão de terceiro é recorrível de imediato por agravo de instrumento fundado no art. 1.015, IX, do CPC/15, ainda que da intervenção resulte modificação ou não da competência, que, nesse contexto, é uma decorrência lógica, evidente e automática do exame da questão principal. 

2. CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, CONHEÇO e DOU PROVIMENTO ao recurso especial, determinando o retorno do processo ao TJ/PR para que, afastado o óbice do cabimento, examine a presença dos demais pressupostos de admissibilidade e, se admissível o agravo de instrumento, examine a alegação de que deveria a Caixa Econômica Federal intervir também em relação aos demais recorridos. 

5 de maio de 2021

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015.

AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1411485 - SP (2018/0321955-8) 

RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESCABIMENTO CONTRA DECISÃO QUE, NO CASO, FIXOU PONTO CONTROVERTIDO E DEFERIU A PRODUÇÃO DE PROVAS. INEXISTÊNCIA DE DECISÃO PARCIAL DE MÉRITO. INTERPRETAÇÃO DO ART. 356, I E II, § 5º, C/C O ART. 1.015, II, DO CPC/2015. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO NCPC. NÃO CABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. 

1. A jurisprudência desta Corte já assentou o entendimento de que "é possível ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou prejudicado não ofendendo, assim, o princípio da colegialidade. Ademais, com a interposição do agravo regimental, fica superada a alegação de nulidade pela violação ao referido princípio, ante a devolução da matéria à apreciação pelo Órgão Julgador" (AgRg no REsp n. 1.113.982/PB, Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 29/8/2014). 

2. Consoante dispõe o art. 356, caput, I e II, e § 5º, do CPC/2015, o juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrarem-se incontroversos ou estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355, sendo a decisão proferida com base neste artigo impugnável por agravo de instrumento. 

3. No caso, conforme asseverou o acórdão recorrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

4. A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime. A condenação do agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno mostre-se manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória, o que, contudo, não se verifica na hipótese. 

5. Agravo interno desprovido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva e Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Moura Ribeiro. 

Brasília, 01 de Julho de 2019 (Data do Julgamento) 

RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE: Trata-se de agravo interno interposto por Fabracor Serviços Combinados - Eireli e outro contra a decisão que, nos autos da ação de revisão contratual cumulada com indenização por danos materiais proposta em desfavor de Banco Itauleasing S.A., conheceu do agravo e negou provimento ao recurso especial, confirmando o entendimento do acórdão recorrido de que, no caso, não houve julgamento de mérito, sendo inviável se falar, por conseguinte, na impugnação da decisão do Juízo singular, por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

Em suas razões, os insurgentes alegam, preliminarmente, violação ao princípio da colegialidade (RISTJ, art. 13, IV), razão pela qual pedem a nulidade da decisão agravada. 

No tocante ao tema de fundo, reprisam os argumentos deduzidos no recurso especial, de ofensa aos arts. 356, § 5º, do CPC/2015, sustentando, em síntese, a possibilidade de aplicação extensiva do art. 1.015 do NCPC, a fim de admitir a interposição do agravo de instrumento contra qualquer decisão que verse sobre o mérito processual, como no caso, ante o indeferimento do pedido para julgamento antecipado parcial da pretensão inicial. 

Impugnação apresentada às fls. 197-202 (e-STJ), pugnando pela aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015. 

Posteriormente, foi apresentada petição pelos agravantes (e-STJ, fls. 205-210), manifestando oposição ao julgamento virtual do respectivo inconformismo (art. 184-D do RISTJ), e requerendo autorização para a realização de sustentação oral. 

É o relatório. 

VOTO 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR): De início, de acordo com os Enunciados Administrativos do STJ n. 2 e 3, os requisitos de admissibilidade a serem observados são os previstos no Código de Processo Civil de 1973, se a decisão impugnada tiver sido publicada até 17 de março de 2016, inclusive; ou, se publicada após 18 de março de 2016, os preconizados no Código de Processo Civil de 2015" (e-STJ, fl. 1.425). 

Na hipótese, tem aplicação a dinâmica processual estabelecida pelo Código de Processo Civil de 2015, porquanto, à época da publicação da decisão que realizou o exame de admissibilidade do recurso especial, já estava em vigência o novo regramento processual, o qual foi aplicado no julgamento do agravo em comento. 

Vale anotar, outrossim, que este Tribunal tem jurisprudência firmada no sentido de que "(...) é possível ao Relator negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou prejudicado não ofendendo, assim, o princípio da colegialidade. Ademais, com a interposição do agravo regimental, fica superada a alegação de nulidade pela violação ao referido princípio, ante a devolução da matéria à apreciação pelo Órgão Julgador" (AgRg no REsp n. 1.113.982/PB, Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 29/8/2014). 

Convém destacar que o art. 184-A, parágrafo único, II, do RISTJ possibilita o julgamento virtual do agravo interno, como na hipótese: 

Art. 184-A. Ficam criados Órgãos Julgadores virtuais, correspondentes à Corte Especial, às Seções e às Turmas do Superior Tribunal de Justiça, com finalidade de julgamento eletrônico de recursos, excetuados os de natureza criminal. Parágrafo único. Os seguintes recursos podem ser submetidos ao julgamento virtual: I- Embargos de declaração; II- Agravo Interno; III- Agravo Regimental. 

Na hipótese, os insurgentes se opõem à realização do julgamento virtual do respectivo agravo interno. No entanto, não há fundamento suficiente a derruir a conclusão delineada na deliberação unipessoal, razão pela qual indefiro o pedido de realização de julgamento presencial do recurso. 

Também não merece acolhida o pedido de sustentação oral, visto que, nos termos do art. 159, IV, do RISTJ, não haverá sustentação oral no julgamento de agravo interno, salvo disposição legal expressa em contrário. 

A propósito: 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REQUISITOS DO ART. 1.022 E INCISOS DO CPC DE 2015. OMISSÃO CONSTATADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. [...] 2. Não merece acolhida o pedido de sustentação oral formulado pela agravante às fls. 2353-2356, e-STJ, visto que a teor do artigo 159, inciso IV, do Regimento Interno do STJ, não haverá sustentação oral no julgamento de agravo interno, salvo disposição legal expressa em contrário. Ademais, a sustentação oral somente é cabível em recurso manejado contra decisão de relator que extinguir processos de competência originária, conforme artigo 937, § 3º, do NCPC, o que não é o caso. Precedentes. 3. Embargos de declaração acolhidos sem efeitos modificativos. (EDcl no AgInt no AREsp n. 1.225.288/DF, Relator o Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 19/12/2018). 

Em relação à questão jurídica controvertida, verifica-se que, na origem, os ora recorrentes interpuseram agravo de instrumento contra a decisão do Juízo a quo que, nos autos da ação de rescisão contratual c/c indenização por danos materiais movida em desfavor de Banco Itauleasing S.A., fixou como ponto controvertido da lide, entre outros, "ter o banco recebido o valor do resgate de R$ 764.909,82 com dedução do referido valor do saldo devedor do contrato" (e-STJ, fl. 68), deferindo a produção de provas testemunhal e pericial. Opostos embargos de declaração contra essa decisão o magistrado singular indeferiu o pedido de julgamento parcial do mérito formulado pelos agravantes, ao fundamento de que, relativamente à devolução da importância acima, "o documento a fls. 67-77, por si só, não comprova ter o banco recebido indevidamente referido valor", além disso, "o v. Acórdão a fls. 310-316 entendeu que essa matéria em especial (fls. 314) não é unicamente de direito, o que depende da produção de prova" (e-STJ, fls. 67-68). 

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento ao recurso, nos termos do acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 66): 

Processual. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que não conheceu de agravo de instrumento na consideração de que o pronunciamento atacado não se enquadra nas hipóteses permissivas do rol taxativo do artigo 1.015, I a XIII e parágrafo único, do CPC. Pretensão à reforma. Decisão agravada que não se conforma à hipótese do artigo 1.015, inciso II, do Código de Processo Civil. RE CURSO DESPROVIDO. 

Seguiu-se, então, a interposição de recurso especial, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, dando por malferido o art. 356, § 5º, do CPC/2015, ao argumento de que, na espécie, seria possível a aplicação extensiva do art. 1.015 do NCPC, a fim de admitir a interposição do agravo de instrumento contra qualquer decisão que verse sobre o mérito processual, como no caso, ante o indeferimento do pedido para julgamento antecipado parcial da pretensão inicial. 

Em relação ao tema de fundo, a Vigésima Sétima Câmara de Direito Privado do TJSP negou provimento ao agravo interno dos ora insurgentes, aos seguintes fundamentos (e-STJ, fls. 67-70): 

A decisão monocrática de fls. 17/23 consignou que o agravo de instrumento é inadmissível, porquanto a decisão agravada não se enquadra nas hipóteses previstas nos incisos do art. 1.015, I a XIII (inclusive artigo 356, § 5º) e parágrafo único do Código de Processo Civil de 2015, não havendo se cogitar, também, de hipótese de incidência do inciso II de referido artigo, própria para decisões que versarem sobre o “mérito do processo”. E isso ocorre simplesmente porque, à evidência, o MM. Juízo a quo não proferiu decisão parcial de mérito, pressuposto necessário à incidência tanto do artigo 356, caput, e § 5º, quanto do inciso II do artigo 1.015, ambos do CPC. Decidir o mérito, total ou parcialmente, significa acolher ou rejeitar, no todo ou em parte, o pedido deduzido na ação ou na reconvenção (art. 487, I, do CPC). Os agravantes, por seu turno, tecem considerações no sentido de que, quanto ao pedido de restituição dos valores retirados da conta corrente do agravante Paulo Sérgio Boschim, não houve impugnação específica do agravado, o que torna o fato incontroverso (art. 374, inciso III, do Código de Processo Civil de 2015), passível de julgamento antecipado de mérito. Aduzem que o decisum de fls. 365/366 resultou da análise do conjunto fático-probatório, de tal sorte que, adotando-se os critérios estabelecidos nos artigos 489, § 3º, e 356, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015, pode ser equiparado à improcedência do pedido então formulado, cuidando-se, portanto, de uma decisão de mérito. E, nesse cenário, tornou-se o decisum passível de impugnação por meio de agravo de instrumento, nos termos do artigo 356, § 5º, do Código de Processo Civil de 2015. Entretanto, a decisão monocrática de fls. 17/23 consignou que, bem ao contrário, neste caso concreto o juiz da causa fez exatamente o oposto: não decidiu o mérito (ainda que parcialmente, como pretendido pelos ora agravantes), exatamente porque entendeu que não era caso de julgamento antecipado. Bem por isso, o que o juiz decidiu (sem tocar o mérito), sim, foi no sentido da necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial, decisão que também não se enquadra em nenhuma das taxativas hipóteses permissivas do CPC. Sob ângulo inverso, se os agravantes tivessem pedido no agravo de instrumento que fosse determinado ao juiz da causa julgar parcialmente o mérito, obviamente isso não seria possível, tanto quanto não o seria se a pretensão fosse de julgamento antecipado da lide como um todo, porque ausente permissão legal, em ambos os casos, para o agravo de instrumento. Mas não é esse o pedido recursal, tal como ressaltado na decisão monocrática de fls. 17/ 23. (...). Portanto, não se cuida o decisum de fls. 365/366 dos autos principais de pronunciamento de mérito, ficando bem evidenciado que as razões recursais não abalam os fundamentos da decisão monocrática vergastada. Essa circunstância (que torna mesmo discutível a observância do princípio da dialeticidade) impõe a relativização da exigência feita no § 3º, do art. 1.021, do Código de Processo Civil de 2015, porque não é necessário ir além das razões de decidir que animaram a decisão hostilizada. 

Consoante dispõe o art. 356, caput, I e II, e § 5º, do CPC/2015, o juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrarem-se incontroversos ou estiver em condições de imediato julgamento – nos termos do art. 355 –, sendo a decisão proferida com base neste artigo impugnável por agravo de instrumento. 

Ao comentar o dispositivo em questão, esclarecem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero que, como não é justo, do ponto de vista da tempestividade da tutela jurisdicional, obrigar a parte a esperar pela resolução de determinada parcela do litígio que não depende de nenhum ato processual para ser elucidada, o legislador permitiu o julgamento imediato da parcela do mérito que já se encontra madura. Vale dizer, "que é incontroversa – e por isso independe de prova (art. 374, III, do CPC) – ou que não depende de prova outra para sua elucidação do que aquelas já constantes dos autos. Com a previsão da possibilidade de julgamento imediato parcial do mérito, o legislador busca densificar o direito fundamental à tutela jurisdicional tempestiva (arts. 5º, LXXVIII, CF e 4º do CPC). Trata-se de julgamento fundado em cognição exauriente e cuja ausência de recurso gera coisa julgada (art. 356, § 3º, do CPC). A decisão que julga imediatamente parcela do mérito é irrevogável pelo juiz (art. 494, CPC). Em sendo o caso, a decisão que julga parcialmente o mérito pode reconhecer a existência de obrigação líquida ou ilíquida (art. 356, § 1º, CPC)" – (Código de Processo Civil Comentado. 4ª ed. São Paulo: RT. 2018, pg. 488). 

Desse modo, a possibilidade de julgamento imediato parcial do mérito depende desses requisitos, a saber, que um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles mostrem-se incontroversos ou que estejam em condições de imediato julgamento, tendo em vista a desnecessidade de produção de prova diversa daquela já colhida. 

Ocorre que, no caso, conforme asseverou o acórdão recorrido, a decisão do Juízo singular não ingressou no mérito, justamente porque entendeu pela necessidade de dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial. Logo, não havendo questão incontroversa que possibilitasse a prolação de decisão de mérito, inviável se falar, por conseguinte, na impugnação do referido decisum por meio de agravo de instrumento, por não estar configurada a hipótese do art. 1.015, II, do CPC/2015. 

Por fim, a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime. A condenação da parte agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno se mostre manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória. 

No presente caso, contudo, não vejo como considerar abusiva ou protelatória a interposição do agravo interno, razão pela qual rejeito o pedido da parte agravada de cominação de multa. 

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno. 

É o voto.