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5 de maio de 2021

Filigrana doutrinária: Perda do Objeto em Agravo de instrumento - Teresa Arruda Alvim

Todo este raciocínio, deveras sedutor, seria correto, a nosso ver, se não tivesse ocorrido coisa julgada. De fato, a função dos recursos é de manter os processos vivos. No direito brasileiro, a circunstância de não haver mais recurso cabível é significativa de que já houve trânsito em julgado e, por outro lado, o fato de haver recurso pendente significa que não se operou a coisa julgada e que, pois, o processo está em curso. Todo recurso tem o efeito de obstar ou retardar situações “cristalizantes”: ou a preclusão ou a coisa julgada. A questão que se coloca é a de saber se esta preclusão ou se a coisa julgada, cuja formação é obstada pelo recurso, é relativa só àquela decisão que se terá impugnado. Assim, pergunta-se se um agravo, interposto de certa decisão interlocutória, além de obstar que se opere a preclusão sobre esta interlocutória, teria o condão de obstar que se operasse coisa julgada sobre outra decisão, que, embora proferida no mesmo processo, não é aquela de que se está recorrendo. Não me parece que isto ocorra. Escoados os quinze dias dentro dos quais a apelação deveria ter sido interposta, há o trânsito em julgado. Portanto, parece-me que o fato de a matéria da decisão impugnada consistir em pressuposto lógico da sentença, neste caso, pouco importa. 

ARRUDA ALVIM, Teresa. O destino do agravo após a sentença in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. Vol. 7. (Coords.: Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim). São Paulo: RT, 2003. p. 696/697 

25 de abril de 2021

Filigrana Doutrinária: Agravo de instrumento / inutilidade da apelação - William Santos Ferreira

 Uma questão pode ser lançada: se algumas hipóteses de inutilidade de apelação, com cabimento de agravo de instrumento, foram destacadas pelo legislador, será que outras não poderiam ter sido excluídas pelo legislador? Aqui reside a chave mestra da nova sistemática recursal de decisões proferidas em primeira instância: a resposta é: se o legislador desejasse estabelecer o não cabimento de agravo de interlocutórias não expressas além dos incs. I a XI, não deveria ter estabelecido a recorribilidade geral das interlocutórias, pois assim tendo feito, não pode prever um recurso, que seria o de apelação, cujo regime jurídico levará a falta de interesse recursal. Seria como se o sistema fosse concebido para prever um “recurso que não é recurso” ou um “recurso inútil” que é uma contradição de termos (contradictio in terminis). 

FERREIRA, William Santos. Cabimento do agravo de instrumento e a ótica prospectiva da utilidade – O direito ao interesse na recorribilidade de decisões interlocutórias in Revista de Processo nº 263, São Paulo: RT, jan. 2017, p. 193/203.

AGRAVO DE INSTRUMENTO - Em caso de decisões interlocutórias complexas, qual critério será adotado para saber se cabe ou não agravo de instrumento?

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/08/info-651-stj.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - Em caso de decisões interlocutórias complexas, qual critério será adotado para saber se cabe ou não agravo de instrumento? 

Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo, é possível estabelecer como critérios para a identificação do cabimento do recurso: a) o exame do elemento que prepondera na decisão; b) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas; c) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada. STJ. 3ª Turma. REsp 1.797.991-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/06/2019 (Info 651). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João, José, Joaquim, Maria, Mônica e Miriam ajuizaram, em litisconsórcio ativo facultativo, ação contra a Sul América Seguros discutindo um seguro de mútuo habitacional. A ação foi distribuída para a 3ª Vara Cível de Curitiba (PR). A Caixa Econômica Federal interveio no feito e manifestou interesse em integrar a presente demanda, na qualidade de assistente da Sul América, mas somente em relação aos pedidos formulados pelos autores João, José e Joaquim. Diante disso, como a CEF é uma empresa pública federal (art. 109, I, da CF/88), o Juiz de Direito desmembrou o processo em relação aos autores João, José e Joaquim e declinou a competência para a Justiça Federal, permanecendo com o processo no que tange a Maria, Mônica e Miriam. Relembre o que diz o art. 109, I, da CF/88: 

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; 

João, José e Joaquim desejam recorrer contra a decisão alegando que a CEF não teria interesse jurídico de intervir no feito e, consequentemente, o feito deveria continuar tramitando na Justiça Estadual. 

Qual é o recurso cabível neste caso? 

Agravo de instrumento, nos termos do art. 1.015, IX, do CPC/2015: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; 

Pronunciamento judicial de natureza complexa 

Vale ressaltar que, no caso concreto, estamos diante de um pronunciamento judicial de natureza complexa. Isso porque o juiz, acolhendo ou rejeitando a intervenção do terceiro (no caso, a CEF), também se pronuncia sobre a necessidade ou não de modificação da competência em virtude da referida intervenção. São, portanto, duas decisões em uma só. 

Em caso de decisões interlocutórias complexas, qual critério será adotado para saber se cabe ou não agravo de instrumento? Qual das duas “decisões” contidas nessa única decisão é que irá servir de parâmetro para se definir se cabe ou não agravo de instrumento? 

O STJ propôs os seguintes critérios: Em se tratando de decisão interlocutória com duplo conteúdo é possível estabelecer como critérios para a identificação do cabimento do recurso: 

a) o exame do elemento que prepondera na decisão; 

b) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas;

c) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.797.991-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/06/2019 (Info 651). 

Vejamos cada um desses critérios com base no exemplo dado acima: 

a) o exame do elemento que prepondera na decisão O primeiro critério que se pode fixar diz respeito à preponderância de carga decisória, ou seja, qual dos elementos que compõem o pronunciamento judicial é mais relevante. No nosso exemplo, a decisão sobre a intervenção ou não de terceiro (da CEF) exerce relação de dominância sobre a competência. A definição sobre a intervenção prepondera. Isso porque somente se pode cogitar de uma alteração de competência se – e apenas se – houver a admissão do terceiro. 

b) o emprego da lógica do antecedente-consequente e da ideia de questões prejudiciais e de questões prejudicadas Consiste em verificar se a primeira matéria (ex: intervenção de terceiro) influencia o modo de se decidir a segunda matéria (ex: competência). No ponto, conclui-se que a intervenção de terceiro é o antecedente que leva, consequentemente, ao exame da competência, induzindo a um determinado resultado. Assim, se deferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá alteração da competência para a Justiça Federal; se indeferido o ingresso do terceiro sujeito à competência prevista no art. 109, I, da Constituição Federal, haverá manutenção da competência na Justiça Estadual. 

c) o exame do conteúdo das razões recursais apresentadas pela parte irresignada Por fim, deve-se examinar o foco da irresignação da parte agravante em suas razões recursais para que se conclua pela incidência do art. 1.015, IX, do CPC/15, ou seja, se a impugnação se dirige precipuamente para a questão da intervenção de terceiro ou para a questão da competência. Em nosso exemplo, o objeto principal do recurso interposto é alegar que a CEF não teria interesse jurídico para intervir no feito. Desse modo, no exemplo dado, a identificação do cabimento do recurso é feita com base na análise do acerto ou não da admissão da intervenção de terceiros (no caso, a CEF).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - Cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória que fixa data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/06/info-645-stj-1.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - Cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória que fixa data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens 

Cabe agravo de instrumento, nos termos do art. 1.015, II, do CPC/2015, contra decisão interlocutória que fixa data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens. Trata-se de decisão parcial de mérito, considerando que é uma decisão que resolve uma parcela do pedido de partilha de bens. Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: II - mérito do processo; STJ. 3ª Turma. REsp 1.798.975-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/04/2019 (Info 645). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João e Maria eram casados. O relacionamento não deu mais certo e houve a separação de fato, ou seja, eles deixaram de viver como marido e mulher, passando a morar em casas diferentes e perdendo o contato. Cerca de 4 anos depois, João decidiu “regularizar” essa situação e ajuizou ação de divórcio e partilha de bens. O juiz proferiu decisão interlocutória fixando o dia 30/08/2015 como sendo a data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens. Maria não concordou com essa fixação porque isso iria lhe prejudicar na partilha dos bens. Diante disso, ela interpôs agravo de instrumento contra a decisão. O Tribunal de Justiça não conheceu do recurso afirmando que as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento estão elencadas taxativamente no art. 1.015 do CPC/2015 e que neste rol não há previsão de agravo contra decisão interlocutória que fixa a data da separação de fato do casal para efeitos da partilha de bens: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: 

I - tutelas provisórias; 

II - mérito do processo; 

III - rejeição da alegação de convenção de arbitragem; 

IV - incidente de desconsideração da personalidade jurídica; 

V - rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação; 

VI - exibição ou posse de documento ou coisa; 

VII - exclusão de litisconsorte; 

VIII - rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio; 

IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; 

X - concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução; 

XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º; 

XII - (VETADO); 

XIII - outros casos expressamente referidos em lei. 

Agiu corretamente o Tribunal? NÃO. 

Decisão parcial de mérito 

O CPC/2015, inspirado no princípio da razoável duração do processo e no direito que as partes possuem a um processo sem dilações indevidas, passou a reconhecer, expressamente, a possibilidade de que o juiz profira decisões parciais de mérito, ou seja, um ou alguns pedidos podem ser decididos antes da sentença pelo fato de já estarem maduros para decisão. Isso pode ocorrer: 

• quando não houver controvérsia sobre a questão (é um ponto incontroverso, ou seja, as partes não discordam entre si); ou 

• em virtude da desnecessidade de dilação probatória para resolução daquela matéria. 

Veja a previsão do CPC/2015: 

Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles: I - mostrar-se incontroverso; II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355. 

Vale ressaltar que essa decisão parcial de mérito tem aptidão para a formação de coisa julgada material. 

Decisão parcial pode ocorrer em caso de vários pedidos ou mesmo dentro de um só pedido que é desmembrado 

O art. 356 fala em “um ou mais dos pedidos” ou “parcela deles”. Isso significa que esse dispositivo pode ser aplicado em caso de: • cumulação de pedidos que podem ser resolvidos separadamente (ex: danos morais e materiais); ou • um único pedido que é suscetível de fracionamento para julgamento imediato de parte dele. Ex: pedido para pagamento de R$ 100 mil; réu já admitiu na contestação que deve R$ 30 mil; esses R$ 30 mil já podem ser objeto de decisão parcial de mérito. 

Essa é a lição da doutrina: 

(...) 3. Fracionamento do mérito pode se referir a alguns pedidos ou parcela deles. O juiz decidirá de forma parcial o mérito quando alguns dos pedidos formulados (na demanda originária ou na reconvencional) se enquadrar nas hipóteses indicadas nos incisos do texto legal em destaque. O importante é que os pedidos em condições de imediato julgamento sejam independentes dos demais, não podendo haver, por exemplo, cumulação sucessiva de pedidos, sendo aquele que ainda depende de outras provas pressuposto lógico para o acolhimento do outro pedido, que já estaria em condições de ser apreciado. Assim, por exemplo, se o autor deduziu pedidos de indenização por danos morais e materiais, mas se apenas o primeiro está em condições de imediato julgamento, o juiz decidirá conclusivamente o pleito relativa aos danos morais, determinando o prosseguimento do processo quanto à indenização por danos materiais, para que outras provas sejam produzidas. 3.1. O fatiamento pode se dar dentro de um mesmo pedido. Assim, por exemplo, em ação de cobrança em que se postula o pagamento de cem mil reais, se o réu admite ser devido o valor de cinquenta mil reais, esse montante se torna incontroverso e poderá o juiz apreciar conclusivamente essa parcela, prosseguindo o processo para a fase instrutória, relativamente à diferença controvertida.” (GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença: comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2016. p. 163). 

Fixação da data da separação de fato é decisão sobre parcela do pedido de partilha 

A fixação da data da separação de fato do casal é uma questão que versa sobre o mérito do processo, mais especificamente sobre uma parcela do pedido de partilha de bens, de modo que a decisão proferida em 1º grau de jurisdição é, na verdade, uma verdadeira decisão parcial de mérito proferida nos estritos termos do art. 356, II, do CPC/2015. 

A definição da data da separação de fato é uma parcela do pedido de partilha. 

Em suma: Cabe agravo de instrumento, nos termos do art. 1.015, II, do CPC/2015, contra decisão interlocutória que fixa data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens. STJ. 3ª Turma. REsp 1.798.975-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/04/2019 (Info 645).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - Cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória que exclui o litisconsorte; não cabe este recurso contra a decisão que mantém o litisconsorte

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/05/info-644-stj-2.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - Cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória que exclui o litisconsorte; não cabe este recurso contra a decisão que mantém o litisconsorte 

Segundo o inciso VII do art. 1.015, do CPC/2015: “cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre exclusão de litisconsorte”. Essa previsão abrange somente a decisão que exclui o litisconsorte. Assim, cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que exclui o litisconsorte. Por outro lado, não cabe agravo de instrumento contra a decisão que indefere o pedido de exclusão de litisconsorte (decisão que mantém o litisconsorte). STJ. 3ª Turma. REsp 1.724.453-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/03/2019 (Info 644). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João comeu um iogurte e passou mal. Diante disso, ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra a fabricante do iogurte e contra o supermercado onde ele foi adquirido, em litisconsórcio passivo. Em contestação, a supermercado arguiu sua ilegitimidade passiva pedindo a sua exclusão imediata da lide. O juiz, por meio de decisão interlocutória, rejeitou a alegação de ilegitimidade determinando que os dois réus (fabricante e supermercado) continuassem na lide e que o processo seguisse normalmente com a realização de instrução probatória. O supermercado não se conformou com a decisão e interpôs agravo de instrumento afirmando que esse recurso seria cabível com base no inciso VII do art. 1.015 do CPC/2015: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) VII - exclusão de litisconsorte; 

O recurso será conhecido? Cabe agravo de instrumento nesta hipótese? NÃO. 

Não cabe agravo de instrumento contra decisão de indeferimento do pedido de exclusão de litisconsorte. STJ. 3ª Turma. REsp 1.724.453-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/03/2019 (Info 644). 

Taxatividade mitigada 

O art. 1.015 do CPC/2015 prevê as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. Segundo decidiu o STJ, o art. 1.015 do CPC/2015 traz um rol de taxatividade mitigada. O que isso significa? Em regra, somente cabe agravo de instrumento nas hipóteses listadas no art. 1.015 do CPC/2015. Excepcionalmente, é possível a interposição de agravo de instrumento fora da lista do art. 1.015, desde que preenchido um requisito objetivo: a urgência. 

O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação. STJ. Corte Especial.REsp 1704520-MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/12/2018 (recurso repetitivo) (Info 639). 

Interpretação do inciso VII do art. 1.015 

O inciso VII do art. 1.015 prevê que cabe agravo de instrumento contra “decisões interlocutórias que versarem sobre exclusão de litisconsorte”. O STJ afirma que essa expressão prevista no inciso VII abrange somente a decisão que exclui o litisconsorte. Por outro lado, não cabe agravo de instrumento contra a decisão que rejeita a arguição de ilegitimidade passiva feita pelo réu/litisconsorte (decisão que rejeita a exclusão do litisconsorte). 

Erro na exclusão do litisconsorte fará com que a sentença seja anulada

Imaginemos que, logo após a contestação, o juiz, por meio de decisão interlocutória, excluiu um litisconsorte. Suponhamos (para argumentar) que não coubesse agravo de instrumento. O feito prosseguiria normalmente e seriam praticados vários atos processuais. Ao final, o juiz profere sentença de procedência condenando os litisconsortes. É interposta apelação. O Tribunal de Justiça conclui que o juiz errou lá no início do processo ao excluir o litisconsorte e que ele deveria sim ter figurado no polo passivo da lide. O que aconteceria neste caso? O Tribunal teria que anular a sentença e todos os atos processuais praticados após a exclusão do litisconsorte. Perceba, portanto, que haveria um enorme prejuízo. Justamente por essa razão, o inciso VII do art. 1.015 prevê que cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que excluir litisconsorte. Essa decisão deve ser impugnada imediatamente, devendo ser decidida logo para evitar um grande prejuízo no futuro caso seja revertida. 

Erro na manutenção do litisconsorte não faz com que a sentença seja anulada 

Imaginemos agora que, logo após a contestação, o juiz, por meio de decisão interlocutória, rejeitou o pedido de um dos réus (litisconsorte 2) para ser excluído da lide. Em outras palavras, o juiz manteve o litisconsorte. Suponhamos que não cabe agravo de instrumento. O feito prossegue normalmente e são praticados vários atos processuais. Ao final, o juiz profere sentença de procedência condenando os litisconsortes. É interposta apelação. O Tribunal de Justiça conclui que o juiz errou lá no início do processo ao não ter excluído o litisconsorte, ou seja, o réu realmente era parte ilegítima. Haverá nulidade da sentença por conta disso? Não. O Tribunal irá simplesmente reformar a sentença para julgar improcedente o pedido contra esse litisconsorte 2. A manutenção, no processo, de uma parte alegadamente ilegítima não fulmina a sentença de mérito nele proferida, podendo o Tribunal, por ocasião do julgamento do recurso de apelação, reconhecer a ilegitimidade da parte e, então, exclui-la do processo. Perceba, portanto, que, ao contrário da situação anterior, não haverá aqui, para o processo, um enorme prejuízo. Justamente por essa razão, o STJ diz: neste segundo caso (decisão interlocutória mantendo o litisconsorte) não cabe agravo de instrumento, sendo possível esperar mais um pouco e que esse tema seja eventualmente apreciado somente na apelação. 

Na primeira situação há um prejuízo endoprocessual; na segunda, um prejuízo econômico à parte 

Haverá, não há dúvida, transtornos à parte que será mantida em processo do qual não deveria participar, mas, evidentemente, esse prejuízo é infinitamente menor do que àquele causado pela exclusão, prematura e errônea, de quem necessariamente deveria dele participar. Na primeira hipótese, pode-se cogitar um prejuízo meramente econômico exclusivamente da parte não excluída. Na segunda hipótese, contudo, haverá um grave prejuízo endoprocessual, que atingirá todos os sujeitos e invalidará a sentença de mérito, que é o resultado buscado no processo. 

Interpretação teleológica e sistemática 

O legislador, quando quis dizer que cabe agravo de instrumento contra a decisão que acolhe ou rejeita o pedido da parte, ele disse isso expressamente. Como é o caso, por exemplo, do inciso IX: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; 

No inciso VII, por outro lado, ele não mencionou isso expressamente, de forma que se deve interpretar que só cabe o agravo de instrumento se a questão não puder esperar até o julgamento da apelação. 

Não cabimento de intepretação extensiva ou analogia no rol do art. 1.015 

O STJ, no mesmo julgamento que definiu que o rol do art. 1.015 é de taxatividade mitigada, também decidiu que não é possível o uso da interpretação extensiva e da analogia para ampliar as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento. 

Cabe agravo de instrumento contra decisão interlocutória envolvendo LITISCONSORTE? 

Juiz EXCLUIU o litisconsorte: SIM cabe agravo de instrumento 

- Há urgência em se definir essa questão imediatamente. Isso porque se o Tribunal determinar o retorno, os atos processuais terão que ser repetidos com a participação do litisconsorte.

- Há um risco de enorme prejuízo endoprocessual com a anulação da sentença.


Juiz MANTEVE o litisconsorte: NÃO Não cabe agravo de instrumento 

- Não há urgência em se definir essa questão imediatamente. Isso porque mesmo que o litisconsorte seja excluído mais para frente, não haverá prejuízo aos atos processuais praticados. 

- Não há risco de anulação da sentença por esse motivo. O prejuízo, se houver, será meramente econômico da parte que teve que ficar no processo até o final.

AGRAVO DE INSTRUMENTO - Como se deve interpretar a expressão “decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias” presente no art. 1.015, I, do CPC/2015?

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/05/info-644-stj-2.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - Como se deve interpretar a expressão “decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias” presente no art. 1.015, I, do CPC/2015? 

O conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória” previsto no art. 1.015, I, do CPC/2015, abrange as decisões que digam respeito à: 1) à presença ou não dos pressupostos que justificam o deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela provisória (é o chamado núcleo essencial); 2) ao prazo e ao modo de cumprimento da tutela; 3) à adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela provisória; e 4) à necessidade ou dispensa de garantias para a concessão, revogação ou alteração da tutela provisória. STJ. 3ª Turma. REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/03/2019 (Info 644). 

Não cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que impõe ao beneficiário o dever de arcar com as despesas da estadia do bem móvel objeto da busca e apreensão em pátio de terceiro. Tal situação não pode ser enquadrada no art. 1.015, I, do CPC/2015 porque essa decisão não se relaciona, de forma indissociável, com a tutela provisória. Trata-se, na verdade, de decisão que diz respeito a aspectos externos relacionados com a executoriedade, operacionalização ou implementação fática da busca e apreensão (e não com a tutela provisória em si). STJ. 3ª Turma. REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/03/2019 (Info 644). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

A empresa “Top Transportes Rodoviários” celebrou, com o Banco Safra, um contrato de financiamento com alienação fiduciária para aquisição de um caminhão. A Top deixou de pagar as prestações do mútuo. Diante disso, o Banco ajuizou, contra Top, ação de busca e apreensão requerendo a entrega do veículo que estava em garantia (art. 3º do DL 911/69). O juiz concedeu a busca e apreensão de forma liminar (sem ouvir o devedor). 

Indaga-se: será cabível algum recurso contra esta decisão? 

SIM. Essa decisão concedeu uma “tutela provisória”, de forma que, contra ela, é cabível a interposição de agravo de instrumento, nos termos art. 1.015, I, do CPC/2015: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I - tutelas provisórias; (...) 

Vamos aprofundar um pouco mais sobre a tutela provisória 

O Livro V (arts. 294 a 311) do CPC/2015 é denominado “Da Tutela Provisória”. Tutela provisória é aquela concedida antes da tutela definitiva, em caráter provisório, com base em uma cognição sumária. A tutela provisória será sempre substituída por uma tutela definitiva, que a confirmará, revogará ou modificará. Ex: João ingressa com ação pedindo o fornecimento de determinado medicamento. O juiz profere decisão interlocutória determinando que o Estado conceda o remédio. Foi concedida, portanto, a tutela provisória com base em cognição sumária. Ao final, o juiz profere sentença confirmando que a pessoa tem o direito de receber o medicamento do Poder Público. Logo, nessa sentença, foi concedida a tutela definitiva, que confirmou a tutela provisória. 

Espécies de tutela provisória 

A TUTELA PROVISÓRIA é o gênero do qual decorrem duas espécies: 1) Tutela provisória de urgência; 2) Tutela provisória de evidência. Veja o que diz o CPC/2015: 

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. 

Classificação das tutelas provisórias de URGÊNCIA 

O CPC/2015 prevê duas classificações das tutelas provisórias de urgência: 1) Cautelar e antecipada; 2) Antecedente e incidental. 

Art. 294 (...) Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. 

Quanto à satisfatividade 

Em uma primeira classificação, a tutela provisória de URGÊNCIA divide-se em: 

1.1) ANTECIPADA (satisfativa): o órgão julgador antecipa aquele direito ou bem da vida que o autor espera conseguir ao final do processo. Ex: em uma ação de cobrança, o juiz, entendendo que o autor precisa dos valores para sobreviver, determina que o réu entregue a quantia pleiteada enquanto se aguarda o desfecho do processo. 

1.2) CAUTELAR: o órgão julgador confere uma medida para assegurar aquele direito ou bem da vida que o requerente espera obter ao fim do processo. Ex: em uma ação de cobrança, o juiz, entendendo que há receio de que o réu se desfaça de seu patrimônio, determina o arresto dos bens do requerido. 

Voltando ao nosso exemplo: Imaginemos que a Top não interpôs agravo de instrumento contra a decisão que deferiu liminarmente a busca e apreensão. Foram então praticados diversos atos para se tentar localizar o veículo e cumprir a decisão (ex: houve várias diligências do oficial de Justiça na sede da empresa, o juiz expediu ofício aos órgãos de trânsito etc.). Depois de algumas semanas, a Polícia Rodoviária Federal, em uma blitz de rotina, localizou o caminhão e o levou até o pátio daquele órgão. Em seguida, a PRF enviou um ofício ao juiz informando que o caminhão estava à disposição para ser retirado, mas desde que fossem pagas as taxas pelo fato de o veículo ter ficado no pátio do órgão. Ciente do referido ofício, o Banco requereu a liberação do veículo do pátio da PRF sem quaisquer custos para si, pedindo que o juiz determinasse à empresa Top que pagasse as taxas e demais despesas com a guarda do caminhão no pátio do órgão. O juiz proferiu decisão interlocutória indeferindo o requerimento da instituição financeira sob o argumento de que o pagamento das despesas e débitos referentes à liberação do veículo devem ser custeadas pelo proprietário fiduciário (ou seja, pelo Banco) e que, posteriormente, a instituição financeira poderá buscar o ressarcimento do devedor fiduciante. O Banco não concordou e interpôs agravo de instrumento contra a decisão. A instituição alegou que a decisão do juiz que nega o pedido feito pelo credor para que o devedor pague as despesas relacionadas com a entrega do bem representa uma revogação parcial da liminar anteriormente deferida, motivo pelo qual caberia agravo de instrumento com base no art. 1.015, I, do CPC: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I - tutelas provisórias; (...) 

Qual é a abrangência do inciso I do art. 1.015 do CPC/2015? Como se deve interpretar a expressão “decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias”? O STJ identificou quatro grupos de decisões que podem ser enquadradas nesta previsão e que, portanto, são recorríveis de imediato por meio de agravo de instrumento: 

1) Pressupostos que autorizam a tutela provisória (núcleo essencial) 

São as decisões interlocutórias que examinam se estão ou não presentes os pressupostos autorizadores da tutela provisória pretendida pela parte. Aqui estão incluídas as decisões de deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela provisória. 

2) Prazo ou modo de cumprimento da tutela 

A decisão interlocutória que se pronuncia sobre o prazo ou sobre o modo de cumprimento da tutela provisória também se enquadra no inciso I do art. 1.015 e é recorrível de imediato. Ex: a fixação de um prazo demasiadamente longo para cumprimento pode acarretar o perecimento do próprio direito que se pretende salvaguardar, ao passo que a fixação de um prazo insuficiente para o cumprimento pode impor à parte uma obrigação que ela não conseguirá cumprir, sofrendo os efeitos do inadimplemento, como a multa. 

3) Definição da técnica de efetivação da tutela 

A decisão que analisa a adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela também é recorrível por agravo de instrumento. Ex1: decisão que trata sobre o valor, a periodicidade ou a eventual limitação quantitativa ou temporal das astreintes. Ex2: decisão que determina a aplicação de técnica indutiva, coercitiva ou sub-rogatória para cumprimento da tutela provisória, como a busca e apreensão, a proibição de atividade nociva, a proibição de contratar com o Poder Público ou da suspensão temporária de passaporte, carteira de habilitação ou cartões de crédito, dentre outras. 

4) Necessidade ou dispensa de caução 

A decisão que se pronuncie sobre a necessidade ou a dispensa de caução ou quaisquer garantias para a concessão, revogação ou modificação da tutela. Isso porque tais questões, embora acessórias ao conceito essencial de tutela provisória, com ele se relacionam diretamente, podendo, inclusive, influenciar o modo pelo qual se examina a presença dos requisitos autorizadores da tutela pretendida. 

Cláusula de cabimento de amplo espectro 

Assim, é possível concluir que o art. 1.015, I, do CPC/2015, deve ser lido e interpretado como uma cláusula de cabimento de amplo espectro, de modo a permitir a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias que digam respeito não apenas ao núcleo essencial da tutela provisória, mas também que se refiram aos aspectos acessórios que estão umbilicalmente vinculados a ela, porque, em todas essas situações, há urgência que justifique o imediato reexame da questão em 2º grau de jurisdição. Isso não significa dizer, todavia, que absolutamente toda e qualquer questão relacionada ao cumprimento, operacionalização ou implementação fática da tutela provisória se enquadre no conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória e, consequentemente, possa ser impugnada de imediato pelo agravo de instrumento. 

Em suma: O conceito de “decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória” previsto no art. 1.015, I, do CPC/2015, abrange as decisões que digam respeito à: 1) à presença ou não dos pressupostos que justificam o deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela provisória (é o chamado núcleo essencial); 2) ao prazo e ao modo de cumprimento da tutela; 3) à adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela provisória; e 4) à necessidade ou dispensa de garantias para a concessão, revogação ou alteração da tutela provisória. STJ. 3ª Turma. REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/03/2019 (Info 644). 

Agora que já sabemos quais os critérios adotados pelo STJ, pergunto: a tese invocada pelo Banco foi acolhida? Cabe realmente agravo de instrumento naquela hipótese na qual se discutia a responsabilidade pelo pagamento das despesas com a armazenagem do bem? NÃO. 

Não cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que impõe ao beneficiário o dever de arcar com as despesas da estadia do bem móvel objeto da busca e apreensão em pátio de terceiro. Tal situação não pode ser enquadrada no art. 1.015, I, do CPC/2015 porque essa decisão não se relaciona, de forma indissociável, com a tutela provisória. Trata-se, na verdade, de decisão que diz respeito a aspectos externos relacionados com a executoriedade, operacionalização ou implementação fática da busca e apreensão (e não com a tutela provisória em si). STJ. 3ª Turma. REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/03/2019 (Info 644). 

É um consectário lógico do deferimento da tutela provisória que haverá a necessidade de recolhimento de taxas, despesas ou custas para a implementação da medida deferida. Cabe ao beneficiário da tutela, por exemplo, custear: (i) a diligência do oficial de justiça, a quem caberá intimar pessoalmente o réu da tutela provisória deferida; (ii) o cartório, a fim efetivar o registro de protesto cautelar contra a alienação de bem; (iii) as despesas relacionadas às pesquisas de ativos financeiros ou bens móveis ou imóveis, quando pretender torná-los indisponíveis; (iv) as despesas do pátio em que fora estacionado o veículo que fora apreendido em decorrência de ordem de restrição de circulação por ele requerida. Tais providências, todavia, não se relacionam, direta e nem mesmo indiretamente, com a tutela provisória objeto da decisão interlocutória impugnável, mas, sim, com a execução, operacionalização e implementação fática da providência que já foi requerida e obtida, descabendo discutir, em âmbito de tutela provisória, a questão relacionada ao fato de a parte beneficiária da tutela arcar com as despesas e, ao final, ser ressarcida pelo vencido, inclusive como decorrência lógica da necessidade de plena reintegração que permeia a tutela jurisdicional efetiva. Conclui-se que a relação estabelecida entre a decisão interlocutória que disciplina o modo de custeio da execução da tutela provisória e a decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória é, pois, muitíssimo distante e dissociada, quase inexistente, não se podendo enquadrar a primeira na hipótese de cabimento do art. 1.015, I, do CPC/2015, por mais amplo que seja o seu espectro

AGRAVO DE INSTRUMENTO - É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que defere ou indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova ou quaisquer outras atribuições do ônus da prova distinta da regra geral

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/06/info-645-stj-1.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que defere ou indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova ou quaisquer outras atribuições do ônus da prova distinta da regra geral

O CPC/2015 prevê que: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º; 

Esse inciso XI abrange também as decisões interlocutórias que determinem a inversão da prova com base no art. 6º, VIII, do CDC? SIM. O art. 373, §1º, do CPC/2015, contempla duas regras jurídicas distintas, ambas criadas para excepcionar a regra geral do caput do art. 373, sendo que a primeira diz respeito à atribuição do ônus da prova, pelo juiz, em hipóteses previstas em lei, de que é exemplo a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, e a segunda diz respeito à teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, incidente a partir de peculiaridades da causa que se relacionem com a impossibilidade ou com a excessiva dificuldade de se desvencilhar do ônus estaticamente distribuído ou, ainda, com a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. 

Em outras palavras, a hipótese do art. 6º, VIII, do CDC está sim tratada no § 1º do art. 373 do CPC uma vez que esse dispositivo dispõe também a inversão do ônus da prova nos casos previstos em lei. Para o STJ, a hipótese do inciso XI do art. 1.015 do CPC deve ser lida em sentido amplo de sorte que: 

É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que defere ou indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova ou quaisquer outras atribuições do ônus da prova distinta da regra geral, desde que se operem ope judicis e mediante autorização legal. 

STJ. 3ª Turma. REsp 1.729.110-CE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/04/2019 (Info 645). 

NOÇÕES GERAIS SOBRE O ÔNUS DA PROVA 

Se, ao final do processo, o juiz entender que os fatos alegados não foram provados, o que ele deverá fazer? Qual deve ser a sua decisão neste caso? 

O juiz terá que analisar qual das partes tinha o ônus de provar esse fato. A parte que tinha esse ônus e que não conseguiu provar o fato irá suportar as consequências negativas. Em outras palavras, a parte que tinha o ônus e não provou, será “prejudicada” no resultado do processo. Daí a importância de se estudar e analisar o ônus da prova. 

Ônus da prova 

Ônus da prova é a regra que atribui a uma das partes o ônus de suportar a falta de prova de um determinado fato. 

Ônus x obrigação 

Repare que, em nenhum momento eu disse que a parte tem a “obrigação” ou o “dever” de produzir a prova. Eu falei em “ônus”. Quais as diferenças? 

DEVER 

- É a necessidade de observar um comportamento imposto, de forma geral, pelo ordenamento jurídico.

- É possível exigir que a parte cumpra o dever. 

- Ex: dever de expor os fatos em juízo conforme a verdade (art. 77, I, do CPC).


OBRIGAÇÃO 

- É um dever jurídico específico e individualizado de prestação (dar, fazer, não fazer). A obrigação é uma atividade que a pessoa faz em benefício de outrem.

- É possível exigir que a parte cumpra a obrigação.

- Ex: em um contrato de compra e venda, o vendedor tem a obrigação de pagar o preço.


ÔNUS 

- É a necessidade de adotar determinada conduta para defender um interesse próprio. Se a pessoa não adotar essa conduta, não há uma sanção contra ela. No entanto, deixará de ter uma vantagem. 

- Não é possível exigir que a parte cumpra o ônus. 

- Ex: o autor tem o ônus de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC). 


Ônus imperfeito 

Vimos acima que, se a parte tinha um ônus e deixou de adotar a providência necessária, ela terá uma desvantagem, perderá alguma coisa. No caso do ônus da prova, contudo, a doutrina afirma que se trata de um ônus imperfeito. Isso porque, se a parte não se desincumbir do seu ônus (se a parte não conseguir trazer aos autos a prova que deveria), existe a mera possibilidade (mas não certeza) de que ocorra uma situação de desvantagem para ela. Dessa forma, mesmo que a parte não consiga ela própria, provar suas alegações, ainda assim esse fato pode ser provado por outros meios e a parte pode vencer a demanda. Ex: o autor não faz prova de suas alegações; o réu, no entanto, por descuido, juntou determinado documento que prova as afirmações do requerente. Nesse caso, mesmo o autor não tendo feito a prova, ele não sofrerá nenhuma desvantagem e vencerá a demanda. Essa realidade existe em razão do princípio da comunhão das provas: a prova produzida é prova do processo, não interessando quem produziu. 

Aspectos subjetivo e objetivo 

O ônus da prova pode ser analisado sob dois prismas: 

a) Aspecto subjetivo: Consiste em analisar o instituto sob o ângulo de quem é o responsável pela produção da prova (regra de conduta das partes). Trata-se de informar as partes quem será prejudicado com a não produção da prova: autor ou réu. Ex: o art. 373, I, do CPC prevê que o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito. A lei já está avisando que o autor será prejudicado caso não demonstre o fato constitutivo de seu direito. 

b) Aspecto objetivo: Quando se fala em o ônus da prova sob o aspecto objetivo, o que se está dizendo é que se trata de uma regra de julgamento, ou seja, o ônus da prova é uma regra que o juiz deverá verificar no momento da prolação da sentença. 

 Ao decidir, o magistrado irá analisar se as partes juntaram aos autos provas que sirvam para elucidar os fatos controvertidos (ex: o autor alega que o réu bateu na traseira de seu veículo; o requerido argumenta que o autor deu marcha à ré). Caso não tenham sido produzidas provas suficientes e não seja possível elucidar a controvérsia por outros meios (presunções, máximas de experiências etc.), o juiz deverá aplicar as regras do ônus da prova e verificar quem tinha o ônus de provar o fato não demonstrado. A parte que tinha esse ônus sofrerá as consequências negativas e perderá a demanda neste ponto. Os dois aspectos estão umbilicalmente ligados e se trata de uma classificação doutrinária, mas que não tem tanta relevância na prática forense essa distinção. 

Aplicação subsidiária 

As regras do ônus da prova são regras de aplicação subsidiária. Só podem ser aplicadas se não houver mais como produzir prova e o juiz ainda estiver em estado de dúvida. A razão de existir das regras do ônus da prova é “evitar o non liquet, ou seja, a falta de resolução da crise de direito material”, de modo que “as regras sobre o ônus da prova constituem a ‘última saída para o juiz’, que não pode deixar de decidir”. Assim, as regras do ônus da prova “são necessárias, mas devem ser tratadas como exceção, pois o que se pretende com a atividade jurisdicional é que os provimentos dela emanados retratem a realidade, não meras ficções”. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 6ª ed. São Paulo: RT, 2011, p. 127-130). Em outras palavras, o juiz deve sempre tentar decidir com as provas que foram produzidas e com outros elementos de convicção. Somente se não conseguir mesmo, deverá se valer das regras do art. 373 do CPC e decidir em sentido contrário a quem não atendeu o ônus da prova. 

Prova diabólica 

Um tema intimamente ligado ao que estamos estudando diz respeito à prova diabólica. Prova diabólica é aquela impossível ou excessivamente difícil de ser produzida. Ex: o autor alega, na petição inicial, que o réu nunca lhe enviou a notificação extrajudicial. O autor não tem como comprovar isso. Seria exigir uma prova diabólica. Outro bom exemplo “é a do autor da ação de usucapião especial, que teria de fazer prova do fato de não ser proprietário de nenhum outro imóvel (pressuposto para essa espécie de usucapião). É prova impossível de ser feita, pois o autor teria de juntar certidões negativas de todos os cartórios de registro de imóvel do mundo.” (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 137). Ainda segundo as lições de Didier, Braga e Oliveira, a prova diabólica pode ser de duas espécies: 

Prova unilateralmente diabólica 

- Ocorre quando a prova é diabólica para a parte que tinha o ônus de produzi-la (segundo as regras do art. 373 do CPC), no entanto, é uma prova possível de ser juntada pela outra parte.

- Neste caso, o juiz poderá inverter o ônus, determinando que a prova seja produzida pela outra parte que não tinha inicialmente o ônus de juntá-la. Isso está previsto no § 1º do art. 373.

- § 1º (...) diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput (...) poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso (...)


Prova bilateralmente diabólica 

- Ocorre quando a prova é diabólica para ambas as partes, ou seja, é impossível ou muito difícil para ambas as partes. 

- Neste caso, não haverá inversão do ônus por conta da prova diabólica. Não se pode simplesmente transferir a prova diabólica de uma parte para a outra. 

- § 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. 

Distribuição estática do ônus da prova 

As regras gerais de distribuição do ônus da prova estão previstas no art. 373 do CPC: 

Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. 

O sistema processual brasileiro adotou, como regra, a teoria da distribuição estática do ônus da prova, segundo a qual cabe ao autor provar o fato constitutivo do direito e ao réu cabe provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Na distribuição estática do ônus da prova a lei atribui a uma determinada parte, de modo apriorístico, quais são os fatos específicos que deverão ser por ela provados, dando-lhe ciência prévia sobre como se desenvolverá a atividade instrutória, e o fato de que o ônus da prova, nessa perspectiva – estática – é uma regra de julgamento, motivo pelo qual não deve o juiz com ela se preocupar no curso da atividade probatória, mas somente ao final, e somente se porventura da instrução resultar algum fato relevante não esclarecido. 

Inversão do ônus da prova 

O cotidiano forense demonstrou, ao longo dos anos, que as regras de distribuição estática do ônus da prova previamente estabelecidas em lei não eram suficientes ou adequadas para solucionar todas as situações fáticas. Diante disso, chegou-se à conclusão de que seria necessária a criação de algumas regras de distribuição do ônus da prova diferentes daquelas pré-determinadas pela lei. Surgiu, assim, o consenso de que, em determinados casos, haveria a necessidade de modificar (redistribuir, inverter) as regras gerais do ônus da prova. O CPC denomina isso de “distribuição diversa do ônus da prova”. Na prática, é mais comum falarmos em inversão do ônus da prova. A inversão do ônus da prova consiste, portanto, em modificar, em determinados casos excepcionais, as regras gerais do ônus da prova, que são previstas nos incisos do art. 373 do CPC. Essa distribuição diversa pode ser decorrente de acordo entre as partes, da lei ou de decisão judicial. Assim, temos três espécies de inversão do ônus da prova: a) Convencional; b) Legal; c) Judicial. 

Inversão convencional do ônus da prova 

Ocorre quando as partes combinam entre si que não seguirão as regras gerais dos incisos do art. 373, adotando um outro arranjo. É um exemplo de negócio jurídico processual. Trata-se de hipótese de difícil ocorrência na prática, mas que é prevista no § 3º do art. 373 do CPC: Em regra, a lei admite a distribuição diversa do ônus da prova por convenção das partes. Existem, contudo, três exceções. Assim, não cabe a inversão convencional do ônus da prova quando: a) recair sobre direito indisponível da parte; b) tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito. c) a inversão for estabelecida em detrimento do consumidor (art. 51, VI, do CDC). 

Inversão legal do ônus da prova 

Também chamada de inversão ope legis do ônus da prova. Ocorre quando a lei determina que, em certas situações, haverá uma regra de ônus da prova diferente do art. 373 do CPC. São, portanto, exceções criadas pelo legislador à regra geral do art. 373 do CPC. Na inversão legal do ônus da prova, a lei cria uma presunção relativa de determinado fato. É o que acontece no art. 12, § 3º, no art. 14, § 3º e no art. 38, todos do CDC: 

Art. 12 (...) § 3º - O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar: I - que não colocou o produto no mercado; II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 

Art. 14 (...) § 3º - O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 

Art. 38. O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina. 

Inversão judicial do ônus da prova (distribuição do ônus da prova feita pelo juiz) 

Ocorre quando o juiz, diante das peculiaridades do caso concreto, altera a regra geral prevista nos incisos do art. 373 do CPC. A redistribuição judicial do ônus da prova pode ser feita a requerimento da parte ou até mesmo de ofício. 

Inversão judicial do ônus da prova no CPC/2015 

Encontra-se disciplinada nos §§ 1º e 2º do art. 373. Vejamos, de forma organizada, o que dizem esses dois dispositivos. O juiz poderá atribuir o ônus da prova de modo diferente da regra geral prevista no caput do art. 373 em três situações: 

1) nos casos previstos em lei. Ex: art. 6º, VIII, do CDC. 

2) quando for impossível ou extremamente difícil cumprir o encargo previsto no caput do art. 373. Trata-se da inversão do ônus da prova para evitar que a parte tenha que produzir uma prova unilateralmente diabólica. Em outras palavras, quando a regra geral do caput do art. 373 exigir que a parte faça uma prova diabólica, o juiz deverá inverter o ônus. Obs: a decisão de inversão não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. Em outras palavras, a inversão não pode gerar para a parte que recebeu esse ônus a tarefa de produzir uma prova diabólica. Não se pode simplesmente transferir a prova diabólica de uma parte para a outra. Não se admite a inversão do ônus em caso de prova duplamente diabólica (§ 2º do art. 373 do CPC). 

3) quando a inversão gerar maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. Ex: o autor alega determinado fato; pela regra geral, caberia a ele o ônus de provar esse fato; no entanto, as peculiaridades do caso concreto revelam que é muito mais fácil para o réu trazer essa prova. Nesta hipótese seria possível a inversão. A lei exige que essa inversão seja feita por decisão fundamentada do magistrado. Além disso, a decisão que determina a inversão deve ser proferida antes da sentença, em um momento processual no qual se permita que a parte possa se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. Pela sua importância, vale a pena ler os dispositivos do CPC: 

Art. 373 (...) § 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. 

§ 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. 

Obs: este § 1º do art. 373 do CPC/2015 adotou a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. Assim, o caput traz a teoria estática e o § 1º a teoria dinâmica. 

Obs2: a doutrina afirma que o § 2º do art. 373 do CPC traz a proibição de a redistribuição implicar prova diabólica reversa, ou seja, a inversão do ônus da prova “não pode implicar uma situação que torne impossível ou excessivamente oneroso à parte arcar com o encargo que acabou de receber”. (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 2. Salvador: Juspodivm, 2019, p. 148). 

Inversão judicial do ônus da prova no CDC 

O art. 6º, VIII, do CDC permite a inversão judicial do ônus da prova em duas hipóteses: a) quando for verossímil a alegação do consumidor; ou b) quando o consumidor for hipossuficiente. 

Algumas observações sobre o tema: 

• as duas situações acima são alternativas, ou seja, a inversão ocorrerá quando a alegação do consumidor for verossímil ou quando o consumidor for hipossuficiente; 

• trata-se de inversão ope iudicis (a critério do juiz), ou seja, não se trata de inversão automática por força de lei (ope legis); 

• pode ser concedida de ofício ou a requerimento da parte; 

• a inversão sempre ocorre em benefício do consumidor, isto é, nunca pode ser contrária a ele. 

• a inversão do ônus da prova de que trata o art. 6º, VIII, do CDC é regra de instrução, devendo a decisão judicial que determiná-la ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurar à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade para manifestar-se nos autos (STJ. 2ª Seção. EREsp 422778-SP, Rel. para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti julgado em 29/2/2012). 

Aprofundando. Inversão do ônus da prova x distribuição dinâmica do ônus da prova 

É comum falarmos em inversão do ônus da prova e distribuição dinâmica do ônus da prova como sendo expressões sinônimas. No entanto, aprofundando o estudo do tema iremos encontrar alguns doutrinadores fazendo a distinção entre os institutos. 

Inversão do ônus da prova 

- É uma mudança prévia e abstrata das regras de ônus da prova.

- O juiz não tem ampla liberdade na distribuição do ônus da prova. Não existe a possibilidade de se inverter o ônus de apenas um fato, por exemplo.

- Ex: art. 6º, VIII, do CDC.


Distribuição dinâmica do ônus da prova 

- É uma mudança das regras de ônus da prova que se dá no caso concreto, com base na análise de quem está em melhores condições de produzir a prova. 

- Há uma ingerência mais ampla do juiz na distribuição do ônus da prova entre as partes que permitirá, inclusive, o exame e a distribuição de cada fato específico isoladamente. 

- Ex: hipóteses 2 e 3 do § 1º do art. 373 do CPC (veja novamente acima). 

Como leciona Eduardo Cambi: 

“Pela teoria das cargas probatórias dinâmicas, a facilitação da prova para a tutela do bem jurídico não exige a prévia apreciação do magistrado (ope judicis) de critérios preestabelecidos de inversão do onus probandi, como se dá no art. 6º, inc. VIII, do CDC (verossimilhança da alegação ou hipossuficiência do consumidor). Com efeito, na distribuição dinâmica do ônus da prova, não há uma verdadeira inversão, porque só se poderia falar em inversão caso o ônus fosse estabelecido prévia e abstratamente. Não é o que acontece com a técnica da distribuição dinâmica que se dá no caso concreto. O magistrado continua sendo o gestor da prova, agora com poderes ainda maiores, porquanto, ao invés de partir do modelo clássico (CPC-73, art. 333) para depois inverter o onus probandi (CDC, art. 6º, inc. VIII), cabe verificar, no caso concreto, quem está em melhores condições de produzir a prova e, destarte, distribuir este ônus entre as partes (NCPC, art. 373, §1º).” (CAMBI, Eduardo. Teoria das cargas probatórias dinâmicas (distribuição dinâmica do onus da prova) in Coleção Grandes Temas do Novo CPC, vol. 5: direito probatório. Coord.: Fredie Didier Jr. et. al. 3ª ed. Salvador: Jus Podivm, 2018. p. 332/333). 

Destaca a doutrina, ainda, que a distribuição dinâmica do ônus da prova se diferencia da inversão do ônus da prova porque, naquela (distribuição), haverá uma mais ampla ingerência do juiz na distribuição do ônus da prova entre as partes que permitirá, inclusive, o exame e a distribuição de cada fato específico isoladamente: 

“3.4. A possibilidade de redistribuição do ônus da prova não importa na inversão mecânica das regras estipuladas no art. 373, para, exemplificativamente, repassar ao autor a prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do seu direito ou, mesmo, para atribuir ao réu a prova do fato constitutivo. Tal se dá, por exemplo, nas situações relativas à inversão do ônus da prova no Código de Defesa e Proteção do Consumidor (art. 6º, VIII). Diversamente, na dinamização prevista no preceptivo, a redistribuição do ônus da prova pode recair sobre determinado fato, sem que isso envolva necessariamente a atribuição para o onerado de toda uma classe de fatos (v.g., fatos constitutivos). Noutras palavras, o juiz poderá, em demanda indenizatória, atribuir ao réu a demonstração da ausência de nexo causal, permanecendo com o autor o encargo da comprovação da ação culposa e dos danos. Logo, o juiz pode modular o ônus das provas de acordo com as peculiaridades da causa, atribuindo a cada parte a comprovação de determinados fatos, tudo objetivando a formação de um melhor módulo probatório.” (GAJARDONI, Fernando da Fonseca; DELLORE, Luiz; ROQUE, André Vasconcelos; OLIVEIRA JR., Zulmar. Processo de conhecimento e cumprimento de sentença: comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2016. p. 271) 

Segundo a Min. Nancy Andrighi, “embora ontologicamente distintas, a distribuição dinâmica e a inversão do ônus têm em comum o fato de excepcionarem a regra geral do art. 373, I e II, do CPC/15, de terem sido criadas para superar dificuldades de natureza econômica ou técnica e para buscar a maior justiça possível na decisão de mérito e de se tratarem de regras de instrução que devem ser implementadas antes da sentença, a fim de que não haja surpresa à parte que recebe o ônus no curso do processo e também para que possa a parte se desincumbir do ônus recebido”. Vale ressaltar, no entanto, que você encontrará diversos outros doutrinadores (talvez a maioria) afirmando que a hipótese do § 1º do art. 373 do CPC é inversão do ônus da prova. 

RECURSO CONTRA A DECISÃO QUE DELIBERA SOBRE A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA 

Imagine a seguinte situação hipotética: João ajuizou ação de indenização contra a Volvo do Brasil Veículos Ltda., alegando que adquiriu um veículo 0km dessa marca e que, no entanto, o automóvel apresentou inúmeros vícios de qualidade (“defeitos”) que não foram consertados pela concessionária autorizada. O juiz proferiu decisão interlocutória determinando a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC: 

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência; 

Assim, o magistrado determinou que a Volvo provasse que o vício (“defeito”) não existia e que o carro estava funcionando perfeitamente. A Volvo não se conformou com a decisão e interpôs agravo de instrumento afirmando que esse recurso seria cabível com base no inciso XI do art. 1.015 do CPC/2015: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º; 

João apresentou contrarrazões afirmando que não cabe agravo de instrumento nesta hipótese. Isso porque a decisão proferida pelo juiz inverteu o ônus da prova com fundamento no CDC e não com base no instituto da redistribuição dinâmica do ônus da prova previsto no § 1º do art. 373 do CPC/2015. Assim, para João, não se pode aplicar o art. 1.015, XI, do CPC, que é específico para impugnar a decisão que trata sobre a redistribuição dinâmica do ônus prova do art. 373, § 1º do CPC. 

O recurso será conhecido? Cabe agravo de instrumento nesta hipótese? 

SIM. É cabível a impugnação imediata (é cabível agravo de instrumento) da decisão interlocutória que tenha tratado sobre quaisquer das exceções mencionadas no § 1º do art. 373 do CPC/2015. Assim, o agravo de instrumento deve ser admitido não apenas na hipótese de decisão interlocutória que defere ou que indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova, mas, igualmente, na hipótese de decisão interlocutória que defere ou que indefere quaisquer outras atribuições do ônus da prova distintas da regra geral. Conforme vimos acima, o art. 373, §1º, do CPC/2015, contempla duas regras jurídicas distintas, ambas criadas para excepcionar a regra geral do caput do art. 373, sendo que a primeira diz respeito à atribuição do ônus da prova, pelo juiz, em hipóteses previstas em lei, de que é exemplo a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, e a segunda diz respeito à teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, incidente a partir de peculiaridades da causa que se relacionem com a impossibilidade ou com a excessiva dificuldade de se desvencilhar do ônus estaticamente distribuído ou, ainda, com a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. Em outras palavras, a hipótese do art. 6º, VIII, do CDC está sim tratada no § 1º do art. 373 do CPC uma vez que esse dispositivo dispõe também a inversão do ônus da prova nos casos previstos em lei: 

Art. 373 (...) § 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade (....) 

Em suma, decidiu o STJ que: É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que defere ou indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova ou quaisquer outras atribuições do ônus da prova distinta da regra geral, desde que se operem ope judicis e mediante autorização legal. STJ. 3ª Turma. REsp 1.729.110-CE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/04/2019 (Info 645)

24 de abril de 2021

INTIMAÇÃO DO EXECUTADO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL APTO A CAUSAR PREJUÍZO. RECURSO CABÍVEL. JULGAMENTO: CPC/15

RECURSO ESPECIAL Nº 1.758.800 - MG (2017/0023348-8) 

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. VIOLAÇÃO DE SÚMULA. NÃO CABIMENTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. INTIMAÇÃO DO EXECUTADO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL APTO A CAUSAR PREJUÍZO. RECURSO CABÍVEL. JULGAMENTO: CPC/15. 

1. Ação de complementação de benefício de previdência privada ajuizada em 2007, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 06/07/2016 e atribuído ao gabinete em 06/03/2017. 

2. O propósito recursal é dizer sobre a negativa de prestação jurisdicional bem como sobre a recorribilidade do pronunciamento judicial que, na fase de cumprimento de sentença, determina a intimação do executado, na pessoa do advogado, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa. 

3. Não cabe recurso especial para impugnar eventual violação de súmula, porquanto não se enquadra no conceito de lei federal, disposto no art. 105, III, "a" da CF/88. 

4. A mera referência à existência de omissão, sem demonstrar, concretamente, o ponto omitido, sobre o qual deveria ter se pronunciado o Tribunal de origem, e sem evidenciar a efetiva relevância da questão para a resolução da controvérsia, não é apta a anulação do acórdão por negativa de prestação jurisdicional. 

5. A Corte Especial consignou que a irrecorribilidade de um pronunciamento judicial advém, não só da circunstância de se tratar, formalmente, de despacho, mas também do fato de que seu conteúdo não é apto a causar gravame às partes. 

6. Hipótese em que se verifica que o comando dirigido à recorrente é apto a lhe causar prejuízo, em face da inobservância da necessidade de intimação pessoal da devedora para a incidência de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer. 

7. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, parcialmente provido. 

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. 

Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento) 

RELATÓRIO 

O EXMO. SR. MINISTRO NANCY ANDRIGHI (RELATOR): Cuida-se de recurso especial interposto por FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL - VALIA, fundado nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão do TJ/MG. 

Ação: de complementação de benefício de previdência privada ajuizada por ARLINDO GOMES E OUTROS em face de FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, julgada procedente, atualmente na fase de cumprimento definitivo de sentença. 

Decisão: o Juízo de primeiro grau determinou a intimação da executada para comprovar o pagamento no prazo de 15 dias, sob pena de multa de 10% do valor devido, nos termos do art. 475-J do CPC/73, bem como para, no mesmo prazo, implementar as suplementações revisadas, sob pena de multa que arbitrou no dobro devido para cada mês vincendo, a partir da intimação, fixando, desde logo, os honorários em 10% sobre o valor do débito líquido. 

Acórdão: o TJ/MG negou provimento ao agravo regimental interposto pela FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, mantendo a decisão monocrática do Desembargador Relator que havia negado seguimento ao agravo de instrumento. A ementa está redigida nestes termos: 

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO CONHECIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA. DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO DECISÓRIO. IRRECORRIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. 1. Deve ser mantida a decisão unipessoal do Relator que não conheceu do agravo de instrumento interposto contra ato judicial sem conteúdo decisório, que somente determinou a intimação da parte para cumprimento voluntário da obrigação de fazer. 2. Se o comando contra o qual se insurge a recorrente é de mero expediente, não pode ser objeto de recurso, a teor do disposto no artigo 504 do CPC. 

Embargos de declaração: opostos pela FUNDAÇÃO VALE DO RIO DOCE DE SEGURIDADE SOCIAL – VALIA, foram rejeitados. 

Recurso especial: aponta violação da súmula 211/STJ, dos arts. 1.022, 536, § 1º, e 815, do CPC/15, bem como dissídio jurisprudencial. Sustenta, a par da negativa de prestação jurisdicional, que “a decisão que manteve a intimação da Valia, na pessoa de seus advogados, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa não merece prevalecer e possui notório caráter decisório, visto se tratar de uma decisão interlocutória que deu marcha ao processo, instaurando o início da fase de cumprimento de sentença” (fl. 180, e-STJ). 

Afirma “que não se questionou a intimação recebida para efetuar o depósito em garantia, nos termos do art. 475-J do CPC/1973, mas tão somente a necessidade de reforma da decisão para que fosse determinada a realização da intimação pessoal da devedora, sob pena de não se poder fazer incidir (ou ainda que incidisse, não se pudesse cobrar) a multa diária arbitrada” (fl. 182, e-STJ). 

Defende, por isso, o cabimento do agravo de instrumento. 

Juízo prévio de admissibilidade: o TJ/MG inadmitiu o recurso, dando azo à interposição do AREsp 1.051.026/MG, provido para determinar a conversão em especial (fl. 286, e-STJ). 

É o relatório. 

VOTO 

O EXMO. SR. MINISTRO NANCY ANDRIGHI (RELATOR): O propósito recursal é dizer sobre a negativa de prestação jurisdicional bem como sobre a recorribilidade do pronunciamento judicial que, na fase de cumprimento de sentença, determina a intimação do executado, na pessoa do advogado, para cumprir obrigação de fazer sob pena de multa. 

1. DA VIOLAÇÃO DE SÚMULA 

Não cabe recurso especial para impugnar eventual violação de súmula, porquanto não se enquadra no conceito de lei federal, disposto no art. 105, III, "a" da CF/88. 

2. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL 

Constata-se que a recorrente faz mera referência à existência de omissão no acórdão recorrido, mas não demonstra, concretamente, os pontos omitidos, sobre os quais deveria ter se pronunciado o TJ/MG, tampouco evidencia a efetiva relevância das questões para a resolução da controvérsia, a justificar a anulação do acórdão por negativa de prestação jurisdicional. Aplica-se, neste ponto, a Súmula 284/STF. 

3. DA NATUREZA JURÍDICA DO ATO QUE DETERMINA A INTIMAÇÃO DO EXECUTADO, INSTAURANDO A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA S

obre esse pronunciamento judicial, cuja natureza jurídica ora se analisa, registrou o TJ/MG: 

Na hipótese dos autos, não deveria mesmo ser conhecido o agravo de instrumento, pois, a meu ver, ao contrário do alegado pela agravante, o ato judicial que desafiou o agravo de instrumento, sem sombra de dúvida, possui natureza de despacho de mero expediente, por ter determinado tão somente a intimação da agravante para cumprimento voluntário da obrigação de fazer, a teor do artigo 461 do CPC, o qual permite a intimação do devedor na pessoa de seus procuradores. (fl. 148, e-STJ). 

Há julgados desta Corte no sentido de que é “incabível agravo de instrumento contra o despacho que determina a citação dos devedores para pagamento ou oferta de bens à penhora” (AgRg no Ag 550.748/MG, Terceira Turma, julgado em 23/03/2004, DJ 19/04/2004; REsp 460.214/SP, Segunda Turma, julgado em 01/06/2006, DJ 02/08/2006; REsp 141.592/GO, Quarta Turma, julgado em 04/10/2001, DJ 04/02/2002, p. 366), ao fundamento de que tal pronunciamento judicial não contém qualquer carga decisória. 

A Corte Especial, ao julgar o AgRg na Rcl 9.858 (julgado em 17/04/2013, DJe 25/04/2013), consignou que a irrecorribilidade de um pronunciamento judicial advém, não só da circunstância de se tratar, formalmente, de despacho, mas também do fato de que seu conteúdo não é apto a causar gravame às partes. 

Sob essa ótica, verifica-se, no particular, que o comando dirigido à recorrente é apto a lhe causar prejuízo, em face da inobservância da necessidade de intimação pessoal da devedora para a incidência de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer, consoante determinou a Corte Especial, no julgamento do EREsp 1.360.577/MG (julgado em 19/12/2018, DJe de 07/03/2019). 

Isso porque a ordem judicial, ainda que contrária ao entendimento do STJ, produz plenamente seus efeitos até que seja invalidada. 

Então, num primeiro momento, revela-se o prejuízo causado à recorrente, que poderá ser compelida ao pagamento da multa, se não cumprir a obrigação no prazo estipulado pelo Juízo de primeiro grau, ainda que não tenha sido, para tanto, devidamente comunicada por meio da sua intimação pessoal; num segundo momento, entretanto, vislumbra-se o prejuízo para os próprios recorridos, na hipótese de eventual invalidação da ordem judicial. 

Convém ressaltar, por oportuno, que a orientação extraída da súmula 410/STJ é no sentido de que a multa incide desde o momento em que vence o prazo para o cumprimento voluntário da obrigação, ou melhor, a partir da intimação pessoal do devedor se inicia a contagem do prazo para o cumprimento da decisão, sob pena de incidência imediata da multa previamente estabelecida. 

Daí se constata o equívoco do TJ/MG ao afirmar que “a intimação pessoal do devedor tão somente se dá para ensejar a cobrança da multa cominatória fixada, o que não é o caso dos autos” (fl. 149, e-STJ). 

Dessa forma, tendo sido essa questão trazida a debate neste recurso especial, há de ser reformado o acórdão recorrido, a fim de que se determine, desde logo, a intimação pessoal da recorrente para o cumprimento da obrigação de fazer. 

4. DA CONCLUSÃO 

Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, a fim de reformar o acórdão recorrido e determinar, desde logo, a intimação pessoal da recorrente para cumprimento da obrigação de fazer, nos termos da decisão exarada pelo Juízo de primeiro grau. 

Não cabe agravo de instrumento contra a decisão que nega o pedido para que ocorra o julgamento antecipado parcial do mérito

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://www.dizerodireito.com.br/2019/10/nao-cabe-agravo-de-instrumento-contra.html


Julgamento parcial antecipado do mérito
Caso sejam formulados dois ou mais pedidos, o juiz pode constar o seguinte:
• para eu decidir o pedido 1 (ex: danos emergentes) não é necessária a produção de outras provas (os documentos já são suficientes);
• para eu decidir o pedido 2 (ex: lucros cessantes) é indispensável a realização de outras provas (ex: perícia).
Diante desse cenário, o CPC/2015 autoriza que o magistrado faça o julgamento parcial antecipado do mérito, ou seja, que ele decida desde logo o pedido que estiver em condições de imediato julgamento e continue o processo somente quanto ao outro pedido que necessita de mais provas.
Essa possibilidade está prevista no art. 356 do CPC/2015:
Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:
I - mostrar-se incontroverso;
II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355.

A decisão que julga parcialmente o mérito, nos termos do art. 356, é classificada como decisão interlocutória ou sentença? Qual é o recurso cabível que pode ser interposto pela parte prejudicada?
Decisão interlocutória. Trata-se de uma decisão interlocutória de mérito.
A decisão proferida com base no art. 356 é impugnável por agravo de instrumento:
Art. 356 (...)
§ 5º A decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento.

No mesmo sentido é o art. 1.015, II, do CPC:
Art. 1.015.  Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:
(...)
II - mérito do processo;

Imagine agora a seguinte situação hipotética:
João ajuizou ação de rescisão contratual c/c indenização por danos materiais contra o Banco Itaú.
O autor pediu que uma parte do seu pedido fosse julgada antecipadamente porque não dependeria da produção outras provas, sendo suficiente a prova documental juntada aos autos. Em outras palavras, ele pediu o julgamento antecipado parcial do mérito.
O pedido foi baseado no art. 356, II c/c art. 355, I, do CPC/2015:
Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles:
(...)
II - estiver em condições de imediato julgamento, nos termos do art. 355.

Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:
I - não houver necessidade de produção de outras provas;

O réu, contudo, pediu a produção de provas testemunhal e pericial.
O juiz da causa fixou o ponto controvertido da lide e deferiu a produção de provas testemunhal e pericial, negando o pedido do autor de julgamento antecipado do mérito por entender que a matéria não é unicamente de direito e que depende da produção de prova.
O autor interpôs agravo de instrumento contra essa decisão do magistrado. O recorrente afirmou que caberia agravo de instrumento neste caso com base no art. 356, § 5º do CPC.

O recurso foi conhecido? Cabe agravo de instrumento neste caso?
NÃO.
Não é cabível agravo de instrumento contra decisão que indefere pedido de julgamento antecipado do mérito por haver necessidade de dilação probatória.
STJ. 3ª Turma. AgInt no AREsp 1.411.485-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 01/07/2019 (Info 653).

Para que caiba agravo de instrumento com base no art. 356, § 5º do CPC, é necessário que o juiz tenha proferido decisão parcial de mérito.
Assim, o § 5º sóse aplica se o juiz proferiu decisão julgando antecipadamente parte do mérito.
Decidir o mérito significa acolher ou rejeitar, no todo ou em parte, o pedido deduzido na ação ou na reconvenção (art. 487, I, do CPC).
No caso concreto, o juiz não decidiu o mérito, mas apenas afirmou que era necessária dilação probatória, deferindo as provas testemunhal e pericial, decisão que não se enquadra no art. 365, § 5º assim como em nenhuma das hipóteses do art. 1.015 do CPC (que trata sobre o cabimento do agravo de instrumento).
Portanto, não confunda:
• decisão que julga antecipadamente, em parte, o mérito: cabe agravo de instrumento.


• decisão que afirma que não é o caso de julgamento antecipado do mérito: não cabe agravo de instrumento.

23 de abril de 2021

AGRAVO DE INSTRUMENTO - O art. 1.015, VI, do CPC/2015 abrange a decisão interlocutória que versa sobre a exibição do documento em incidente processual, em ação incidental ou, ainda, em mero requerimento formulado no bojo do próprio processo

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/12/info-661-stj.pdf


AGRAVO DE INSTRUMENTO - O art. 1.015, VI, do CPC/2015 abrange a decisão interlocutória que versa sobre a exibição do documento em incidente processual, em ação incidental ou, ainda, em mero requerimento formulado no bojo do próprio processo 

O art. 1.015, VI, do CPC/2015 prevê: Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: VI - exibição ou posse de documento ou coisa; Essa hipótese de cabimento abrange: 

• a decisão que resolve o incidente processual de exibição instaurado em face de parte; 

• a decisão que resolve a ação incidental de exibição instaurada em face de terceiro; 

• e, ainda, a decisão interlocutória que aceite ou rejeite mero requerimento formulado no bojo do próprio processo. 

Assim, cabe agravo de instrumento com base no art. 1.015, VI, do CPC/2015, contra a decisão interlocutória que defira ou indefira a expedição de ofício para que um terceiro apresente determinado documento, mesmo sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental. STJ. 3ª Turma. REsp 1.798.939-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/11/2019 (Info 661). 

Imagine a seguinte situação hipotética: 

João ajuizou ação contra a seguradora pleiteando indenização securitária relacionada com um imóvel integrante do sistema financeiro de habitação. A seguradora requereu do juízo que expedisse ofício à Caixa Econômica Federal requisitando documentos comprobatórios da existência de vínculo entre o autor e o sistema financeiro da habitação. O magistrado indeferiu o pedido. A seguradora não se conformou com a decisão e interpôs agravo de instrumento afirmando que esse recurso seria cabível com base no inciso VI do art. 1.015 do CPC/2015: 

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) 

VI - exibição ou posse de documento ou coisa; 

O Tribunal de Justiça não conheceu do recurso sob o argumento de que houve um mero requerimento de prova documental e que o inciso VI do art. 1.015 somente se aplica para os casos envolvendo incidente de exibição de documento ou coisa. 

O STJ concordou com a decisão do TJ? 

NÃO. Vamos entender com calma. O caso em análise envolve, de fato, um simples requerimento de expedição de ofício formulado pela parte, por meio do qual se pretende que um terceiro apresente em juízo determinado documento. Não houve, portanto, a instauração de um incidente processual ou uma ação incidental de exibição ou posse de documento ou coisa, nos moldes delineados nos arts. 396 a 404 do CPC/2015, que exigem rito e procedimento próprios (com intimação da parte ou citação do terceiro, amplo contraditório, exame das escusas de exibir ofertadas pela parte ou terceiro, produção de provas sobre a obrigação de exibir ou sobre a posse do documento ou coisa e decisão final). Mesmo assim, mesmo não se tratando de um incidente processual, cabe agravo de instrumento. Isso porque o art. 1.015, VI, do CPC/2015 não se restringe às decisões interlocutórias proferidas no incidente processual e na ação incidental. Esse inciso VI abrange quaisquer decisões que digam respeito à exibição ou posse de documento ou coisa. Informativo comentado 

É o que ensina Daniel Amorim Assumpção Neves: “8. Decisão que versar sobre exibição e posse de documento ou coisa. O inciso VI do art. 1.015 prevê a recorribilidade por agravo de instrumento da decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa. Nesse caso, tanto a decisão de indeferimento, como de deferimento do pedido, bem como a determinação de exibição de ofício, devem ser consideradas.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. 4ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2019. p. 1.819). 

Pouco importa, para fins de cabimento do recurso de agravo de instrumento com base no art. 1.015, VI, do CPC/2015, que a decisão que indeferiu o pedido de exibição tenha se dado na resolução de um incidente processual, de uma ação incidental ou de um mero requerimento formulado no próprio processo. Com efeito, o veículo processual é irrelevante. O que importa é que o conteúdo decisório trate sobre a exibição de documento em posse de terceiro, ainda que não tenha sido observado o procedimento previsto no CPC/2015. 

Em suma: O art. 1.015, VI, do CPC/2015 abrange a decisão interlocutória que versa sobre a exibição do documento em incidente processual, em ação incidental ou, ainda, em mero requerimento formulado no bojo do próprio processo. STJ. 3ª Turma. REsp 1.798.939-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/11/2019 (Info 661). 

Assim, cabe agravo de instrumento com base no art. 1.015, VI, do CPC/2015, contra a decisão interlocutória que defira ou indefira a expedição de ofício para que um terceiro apresente determinado documento, mesmo sem a instauração de incidente processual ou de ação incidental. 

18 de abril de 2021

PROCEDIMENTOS ESPECIAIS / AGRAVO DE INSTRUMENTO: Não cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que, na segunda fase da ação de prestação de contas, defere prova pericial

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2019/11/info-654-stj.pdf


PROCEDIMENTOS ESPECIAIS / AGRAVO DE INSTRUMENTO: Não cabe agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que, na segunda fase da ação de prestação de contas, defere prova pericial 

A decisão interlocutória que, na segunda fase da ação de prestação de contas, defere a produção de prova pericial contábil, nomeia perito e concede prazo para apresentação de documentos, formulação de quesitos e nomeação de assistentes, não é imediatamente recorrível por agravo de instrumento. STJ. 3ª Turma. REsp 1.821.793-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/08/2019 (Info 654). 

Ação de exigir contas (ação de prestação de contas) 

No CPC 1973, havia a previsão de um procedimento especial chamado de “ação de prestação de contas”. O CPC 2015 alterou o nome para “ação de exigir contas” (art. 550). 

Duas fases 

O procedimento da ação de prestação de contas (ação de exigir contas) tem como característica a existência, em regra, de duas fases. 1ª fase: nela, o juiz irá decidir se existe ou não a obrigação de o réu prestar contas. Se o julgador decidir que não, o processo encerra-se nesta fase. Contudo, se decidir que sim, será aberta uma segunda fase. 2ª fase: servirá para que o réu propriamente preste as contas pleiteadas pelo autor e para que o julgador avalie se aquele o fez corretamente, reconhecendo a existência de saldo credor ou devedor. 

Em suma, tem-se que a ação de prestação de contas ocorre em duas fases distintas e sucessivas – na primeira, discute-se sobre o dever de prestar contas; na segunda, declarado o dever de prestar contas, serão elas julgadas e apreciadas, se apresentadas (STJ. 3ª Turma. REsp 1.567.768/GO, DJe 30/10/2017). 

“É preciso notar, porém, que não se está diante de dois processos distintos, tramitando simultaneamente nos mesmos autos. O processo, em verdade, é único, embora dividido em duas fases distintas. Há, pois, o ajuizamento de uma única demanda, contendo um único mérito. A análise deste, porém, é dividida em dois momentos: o primeiro, dedicado à verificação da existência do direito de exigir a prestação de contas, o segundo, dirigido à verificação das contas e do saldo eventualmente existente.” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. São Paulo: Atlas, 21ª ed., 2014, p. 391). 

A segunda fase do procedimento é uma fase de conhecimento (cognição) 

A atividade jurisdicional que se desenvolve na segunda fase da ação de exigir contas não é de liquidação ou de cumprimento de sentença. Trata-se de uma fase de cognição própria (fase de conhecimento), em que há o acertamento da relação jurídica de direito material que vincula as partes. 

Imagine agora a seguinte situação hipotética: 

A empresa “A1” ajuizou ação de exigir contas contra a empresa “B2”. O juiz considerou que o autor da ação tinha razão em exigir as contas e, então, proferiu uma decisão determinando que o réu preste as contas no prazo de 15 dias, conforme determina o art. 550, § 5º do CPC/2015: 

Art. 550 (...) § 5º A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. 

A ré não recorreu contra a decisão e fez a prestação de contas no prazo determinado. Iniciou-se, portanto, a segunda fase da ação de exigir contas. A parte autora da ação terá agora o prazo de 15 dias para se manifestar sobre as contas apresentadas: 

Art. 550. (...) § 2º Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar, prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título I deste Livro. 

Suponhamos que a empresa autora pediu ao juiz a produção de prova pericial contábil. 

O juiz proferiu decisão interlocutória na qual: a) deferiu a produção da perícia; b) nomeou o perito; c) concedeu prazo para as partes para a apresentação de documentos, formulação de quesitos e para a nomeação de eventuais assistentes técnicos. A empresa ré não concordou e interpôs agravo de instrumento contra essa decisão interlocutória fundamentando o cabimento no parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015: 

Art. 1.015 (...) Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. 

Agiu corretamente a empresa ré? Cabe agravo de instrumento neste caso? NÃO. 

A decisão interlocutória que, na segunda fase da ação de prestação de contas, defere a produção de prova pericial contábil, nomeia perito e concede prazo para apresentação de documentos, formulação de quesitos e nomeação de assistentes, não é imediatamente recorrível por agravo de instrumento. STJ. 3ª Turma. REsp 1.821.793-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/08/2019 (Info 654). 

Conforme já explicado, a atividade jurisdicional que se desenvolve na segunda fase da ação de exigir contas não é de liquidação ou de cumprimento de sentença, mas sim de cognição própria da fase de conhecimento, em que há o acertamento da relação jurídica de direito material que vincula as partes. Nesse sentido, a fase de cumprimento da sentença na ação de prestação de contas apenas se iniciará após a prolação da sentença condenatória que porventura vier a ser proferida na segunda fase do referido procedimento especial. Nesse contexto, a decisão interlocutória que, na segunda fase da referida ação, deferiu a produção de prova pericial contábil, nomeou perito e concedeu prazo para apresentação de documentos, formulação de quesitos e nomeação de assistentes, não se submete ao regime recursal diferenciado que o legislador estabeleceu para as fases de liquidação e cumprimento da sentença (art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015). Ao contrário, submete-se ao regime recursal aplicável à fase de conhecimento, ou seja, incide o caput e os incisos do art. 1.015. Assim, como não existe previsão legal para a recorribilidade imediata da referida decisão interlocutória no caput e nos incisos do art. 1.015 do CPC, não cabe agravo de instrumento nesta hipótese.