18 de outubro de 2021

É imprescindível a intimação pessoal para fins de constituição do devedor, assistido pela Defensoria, como depositário fiel da penhora de bem imóvel realizada por termo nos autos

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/10/info-704-stj.pdf


EXECUÇÃO - É imprescindível a intimação pessoal para fins de constituição do devedor, assistido pela Defensoria, como depositário fiel da penhora de bem imóvel realizada por termo nos autos 

O art. 659, § 5º, do CPC/1973 previa o seguinte: “(...) a penhora de imóveis, independentemente de onde se localizem, será realizada por termo nos autos, do qual será intimado o executado, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado, e por este ato constituído depositário.” Assim, o executado que tem advogado constituído pode ser intimado, na pessoa de seu advogado, da sua constituição como depositário fiel. Por outro lado, há necessidade de intimação pessoal do devedor se ele for assistido pela Defensoria Pública. Isso porque: a) o ato possui conteúdo de direito material e demanda comportamento positivo da parte; b) o Defensor Público, na condição de defensor nomeado e não constituído pela parte, exerce múnus público que impede o seu enquadramento no conceito de “advogado” para os fins previstos no art. 659, § 5º, do CPC/1973, possuindo apenas, via de regra, poderes gerais para o foro. STJ. 4ª Turma. REsp 1.331.719-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 03/08/2021. 

Imagine a seguinte situação hipotética ocorrida ainda na vigência do CPC/1973: 

João estava sendo executado. O juiz determinou a penhora de um bem imóvel pertencente ao devedor e ordenou que o executado ficasse na qualidade de depositário fiel. O executado foi intimado, na pessoa de seu representante judicial (Defensor Público), por termo nos autos, para assumir o encargo de fiel depositário do bem penhorado. Essa intimação foi assim realizada com base no art. 659, § 5º do CPC/1973: 

Art. 659 (...) § 4º A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exequente, sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 652, § 4º), providenciar, para presunção absoluta de conhecimento por terceiros, a respectiva averbação no ofício imobiliário, mediante a apresentação de certidão de inteiro teor do ato, independentemente de mandado judicial. § 5º Nos casos do § 4º, quando apresentada certidão da respectiva matrícula, a penhora de imóveis, independentemente de onde se localizem, será realizada por termo nos autos, do qual será intimado o executado, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado, e por este ato constituído depositário. 

João recorreu alegando que, como ele é assistido pela Defensoria Pública, a sua intimação deveria ser pessoal não podendo ser “na pessoa de seu advogado” já que existem diferenças entre a atuação do advogado e do Defensor Público. 

A tese de João foi acolhida pelo STJ? É necessária intimação pessoal do executado para assumir o encargo de depositário se ele é assistido pela Defensoria Pública? 

SIM. Era necessária a intimação pessoal do executado para fins de constituição do devedor assistido como depositário fiel da penhora realizada por termo nos autos. Logo, não foi válida a intimação apenas dirigida à Defensoria Pública. Em se tratando de parte representada pela Defensoria Pública, algumas peculiaridades merecem maior aprofundamento, notadamente as relacionadas ao tipo de intimação, aos seus ônus e às características da assistência/representação realizada pela Defensoria Pública. Existe nítida distinção entre o advogado constituído pela parte e o Defensor Público, sendo certo que este atua em razão de um múnus público legalmente atribuído, em que não há escolha ou relação prévia de confiança entre assistido e representante. Nesse contexto, a representação da parte em juízo, justamente por ser constituída legalmente, dispensa a apresentação de mandato, possuindo o defensor apenas os poderes relacionados à procuração geral para o foro, visto que o exercício de poderes especiais demanda mandato com cláusula expressa, conforme o disposto no art. 38, caput, do CPC/1973 e no art. 16, parágrafo único, “a”, da Lei nº 1.060/50. 

Constituição como depositário do bem não consiste em um ato puramente processual 

Ademais, percebe-se que o legislador fez clara distinção entre os atos puramente processuais e aqueles materiais, que demandam ação positiva pessoal do assistido. Nesse ponto, a doutrina preceitua que a intimação é essencial à garantia constitucional do contraditório, de modo que a distinção dos destinatários da intimação, a própria parte ou o advogado na qualidade de defensor dessa, é feita a partir da natureza dos atos a se realizar. Pertinente, ainda, apontar que, segundo o art. 666, §3º do CPC/1973, “a prisão do depositário infiel será decretada no próprio processo, independentemente de ação de depósito”. No CPC/2015, dispõe o art. 161, parágrafo único, que “o depositário infiel responde civilmente pelos prejuízos causados, sem prejuízo de sua responsabilidade penal e da imposição de sanção por ato atentatório à dignidade da justiça”. Dessa forma, a constituição do devedor como depositário do bem penhorado não pode ser considerada, sob qualquer aspecto, como ato de natureza puramente processual, justamente em razão das consequências civis e penais que o descumprimento do mister pode acarretar. Entendimento diverso implicaria a atribuição ao Defensor Público de responsabilidade desproporcional pelo cumprimento e respeito do comando judicial por parte do assistido que, muitas das vezes, sequer mantém ou atualiza o contato junto à instituição. 

Súmula 319 do STJ 

Segundo a Súmula 319 do STJ, “o encargo de depositário de bens penhorados pode ser expressamente recusado.” Para fazer isso adequadamente, é necessário que o devedor seja efetivamente informado sobre a sua constituição como depositário. Assim, pode-se dizer que a intimação pessoal é pressuposto lógico da adequada observância do comando contido na Súmula 319 do STJ. Com efeito, a possibilidade de recusa expressa do encargo de depositário de bens somente é respeitada caso seja oportunizada à parte, previamente, a opção de fazê-lo, de forma pessoal, não sendo preservado o direito do devedor-depositário pela circunstância de poder, ulteriormente, requerer ao Juízo que preside o feito sua exoneração. Isso porque as situações caracterizadoras de responsabilidade civil e criminal do depositário já podem estar, inclusive, concretizadas em razão da ausência de ciência pessoal do devedor do encargo, que já pode ter alienado ou instituído gravame sobre o bem penhorado. 

Novo CPC traz diversos dispositivos exigindo a intimação pessoal em caso de parte assistida pela Defensoria Público 

Apesar de o antigo CPC/1973 não prever de forma expressa a necessidade de intimação pessoal da parte quando assistida pela Defensoria Pública, o que pode ser justificado também em razão de o citado órgão ter adquirido estatura constitucional somente quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, e a Defensoria ter sido dotada de autonomia funcional e administrativa apenas por força da EC 45/2004, o novo CPC, atento às necessidades verificadas na prática forense e às críticas acadêmicas, foi explícito em diversos artigos a respeito da obrigatoriedade de intimação pessoal do devedor representado pela Defensoria Pública. 

Em suma: Evidencia-se, portanto, que há clara diferença entre a relação representante-representado quando o advogado é designado e não constituído voluntária e pessoalmente pela parte. Dessa forma, há a necessidade de intimação pessoal do devedor assistido pela Defensoria Pública para que seja constituído como depositário fiel do bem imóvel penhorado por termo nos autos. Isso porque: a) o ato possui conteúdo de direito material e demanda comportamento positivo da parte; b) o Defensor Público, na condição de defensor nomeado e não constituído pela parte, exerce múnus público que impede o seu enquadramento no conceito de “advogado” para os fins previstos no art. 659, § 5º, do CPC/1973, possuindo apenas, via de regra, poderes gerais para o foro. 

É imprescindível a intimação pessoal para fins de constituição do devedor, assistido pela Defensoria, como depositário fiel da penhora de bem imóvel realizada por termo nos autos. STJ. 4ª Turma. REsp 1.331.719-SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 03/08/2021.

Nenhum comentário:

Postar um comentário