30 de abril de 2021

A imunidade tributária estabelecida no art. 150, VI, “c”, da CF/88 abrange o IOF incidente inclusive sobre operações financeiras praticadas pelas entidades mencionadas no dispositivo, desde que vinculadas às finalidades essenciais dessas instituições

 Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-1012-stf.pdf


IMUNIDADE TRIBUTÁRIA: A imunidade tributária estabelecida no art. 150, VI, “c”, da CF/88 abrange o IOF incidente inclusive sobre operações financeiras praticadas pelas entidades mencionadas no dispositivo, desde que vinculadas às finalidades essenciais dessas instituições 

A imunidade assegurada pelo art. 150, VI, “c”, da Constituição da República aos partidos políticos, inclusive suas fundações, às entidades sindicais dos trabalhadores e às instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, que atendam aos requisitos da lei, alcança o IOF, inclusive o incidente sobre aplicações financeiras. STF. Plenário. RE 611510/SP, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 12/4/2021 (Repercussão Geral – Tema 328) (Info 1012). 

Imunidade tributária 

Imunidade tributária consiste na determinação feita pela Constituição Federal de que certas atividades, rendas, bens ou pessoas não poderão sofrer a incidência de tributos. Trata-se de uma dispensa constitucional de tributo. A imunidade é uma limitação ao poder de tributar, sendo sempre prevista na própria CF/88. As normas de imunidade tributária constantes da Constituição objetivam proteger valores políticos, morais, culturais e sociais essenciais e não permitem que os entes tributem certas pessoas, bens, serviços ou situações ligadas a esses valores. 

Onde estão previstas as hipóteses de imunidade tributária? 

Como já dito, a imunidade tributária deverá ser sempre prevista na Constituição Federal. As hipóteses mais conhecidas estão listadas no art. 150, VI, da CF/88. Existem, contudo, inúmeras outras imunidades previstas ao longo do texto constitucional. Veja alguns exemplos: 

• Art. 5º, XXXIV, “a” e “b”, LXXIII, LXXIV, LXXVI e LXXVII: imunidade que incide sobre “taxas”. 

• Art. 149, § 2º, I: imunidade referente a “contribuições sociais” e CIDE. 

• Art. 195, § 7º: imunidade incidente sobre “contribuições sociais”. 

Imunidade tributária conferida em favor de partidos políticos, entidades sindicais de trabalhadores e instituições educacionais e de assistência social 

O art. 150, VI, “c” da CF/88 prevê que os partidos políticos, entidades sindicais de trabalhadores e instituições educacionais e de assistência social gozam de imunidade tributária quanto aos impostos, desde que atendidos os requisitos previstos na lei. Vejamos a redação do dispositivo constitucional: 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI - instituir impostos sobre: c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; 

Exemplos dessa imunidade (o partido/entidade/instituição não pagará): 

Ex.1: IPTU sobre o prédio utilizado para a sua sede. 

Ex.2: IPVA sobre os veículos utilizados em sua atividade-fim; 

Ex.3: ITBI sobre a aquisição de prédio onde funcionará uma filial da entidade; 

Ex.4: IR sobre os valores recebidos com doações; 

Ex.5: ISS sobre os serviços prestados pela instituição. 

Patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais: 

Essa imunidade abrange apenas o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais do partido, entidade ou instituição. Isso está previsto no art. 150, § 4º da CF/88: 

Art. 150 (...) § 4º - As vedações (leia-se: proibição de cobrar impostos) expressas no inciso VI, alíneas “b” e “c”, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. 

Para continuar a explicação, é necessário relembrar em que consiste o IOF 

O Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é um imposto federal previsto no art. 153, V, da CF/88:  

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; (...) § 5º - O ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial, sujeita-se exclusivamente à incidência do imposto de que trata o inciso V do "caput" deste artigo, devido na operação de origem; a alíquota mínima será de um por cento, assegurada a transferência do montante da arrecadação nos seguintes termos: I - trinta por cento para o Estado, o Distrito Federal ou o Território, conforme a origem; II - setenta por cento para o Município de origem. 

O IOF ficou conhecido na prática como imposto sobre operações financeiras. No entanto, se você observar bem o art. 153, V e § 5º, poderá perceber que a CF/88 não fala expressamente em “operações financeiras”, mas sim em cinco operações diferentes. Por costume e para facilitar o entendimento, convencionou-se a chamar todas essas hipóteses de “operações financeiras” (como se fosse um gênero). Desse modo, o IOF poderá incidir sobre: 

• operações de crédito (IOF/crédito); 

• operações de câmbio (IOF/câmbio); 

• operações de seguro (IOF/seguro); 

• operações relativas a títulos ou valores mobiliários (IOF/TVM); 

• operações com ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial. 

Assim, é como se fossem cinco impostos diferentes autorizados pela CF/88 nos arts. 153, V e § 5º. 

Discussão sobre a inclusão, ou não, do IOF na imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da CF/88 

A União sustentou no STF a tese de que o IOF estaria fora do alcance da imunidade. Isso porque esse imposto recai sobre “operações financeiras”, e não o patrimônio, a renda ou os serviços das instituições. Logo, estaria fora do que prevê o § 4º do art. 150 acima transcrito. Ademais, a União afirmou que não haveria vinculação entre as operações financeiras oneradas e as finalidades essenciais das entidades que se pretendem imunes. 

O STF acolheu os argumentos da União? 

NÃO. As alegações da União baseiam-se em uma interpretação literal do dispositivo, desconsiderando, portanto, a finalidade da imunidade. Assim, o STF decidiu que a imunidade tributária estabelecida no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal abrange o IOF incidente inclusive sobre operações financeiras praticadas pelas entidades mencionadas no dispositivo, desde que vinculadas às finalidades essenciais dessas instituições. Ex: sindicato de trabalhadores faz aplicações financeiras para proteger o seu patrimônio frente ao efeito corrosivo da inflação. Não haverá incidência de IOF sobre as operações financeiras realizadas. 

Finalidades geral e específicas da imunidade do art. 150, VI, “c” 

A imunidade do art. 150, VI, “c”, tem uma finalidade geral, que é a de proteger direitos individuais dos cidadãos frente ao poder lesivo da tributação. Além disso possui finalidades específicas, que variam de acordo com a entidade imune mencionada no dispositivo. A imunidade dos partidos políticos destina-se a garantir o regime democrático e o livre exercício dos direitos políticos, que seriam severamente abalados caso as agremiações partidárias tivessem de arcar com o pesado ônus tributário que impera no Brasil. A imunidade das suas fundações objetiva tutelar a realização do seu objetivo precípuo, que é o de difundir a ideologia partidária e promover o exercício da cidadania. A imunidade das entidades sindicais dos trabalhadores almeja garantir o pleno exercício da liberdade de associação sindical (art. 8º, caput, da CF/88) e dos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores, que são tutelados e reivindicados pelos sindicatos de suas categorias (art. 8º, III, da CF/88). A imunidade das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, protege direitos sociais de suma relevância, como os direitos à educação, à saúde, ao livre desenvolvimento da personalidade e à assistência social. Portanto, essas instituições desempenham um papel essencial na nossa sociedade, atuando ao lado do Estado na concretização dos direitos fundamentais. 

Interpretação teleológica do art. 150, VI, “c” 

São essas finalidades que devem nortear a definição do alcance da imunidade do art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal. Por essa razão, não se pode conferir aos vocábulos “patrimônio” e “renda”, inscritos no art. 150, § 4º, da CF/88, interpretação demasiado restritiva, que exponha à tributação as movimentações patrimoniais (financeiras) e a renda obtida com operações financeiras. 

IOF acaba atingindo o patrimônio ou renda das entidades 

O chamado IOF é o imposto previsto no art. 153, V, da CF/88, que incide sobre “operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários”. Embora, juridicamente, a tributação incida sobre essas operações, acaba por, efetivamente, alcançar o patrimônio ou a renda dos respectivos contribuintes. No caso das operações de câmbio, se o contribuinte, por exemplo, efetua uma operação de troca de reais por euros para realizar uma operação de comércio exterior, o IOF sobre o câmbio terminará por atingir o seu patrimônio, pois essa operação não lhe trouxe qualquer riqueza nova e ele terá de arcar com o custo do imposto. 

Regulamento do IOF 

Curioso é que, apesar da posição defendida pela União em juízo, o art. 2º, § 3º, do Regulamento do IOF, aprovado pelo Decreto 6.306/2007, estabelece expressamente que o imposto não incide sobre as operações realizadas pelos entes imunes, desde que vinculadas às finalidades essenciais destes. Se o próprio regulamento desonera as instituições referidas, reconhecendo a aplicação da imunidade ao IOF, cai por terra o cerne da linha argumentativa da União, no sentido de que a imunidade do art. 150, VI, “c”, da CF não as abrange, por ser restrita ao patrimônio, à renda e aos serviços do ente imune. 

Exigência de vinculação com as “finalidades essenciais” da entidade imune não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades 

A exigência de vinculação do patrimônio, da renda e dos serviços com as “finalidades essenciais” da entidade imune não se confunde com afetação direta e exclusiva a tais finalidades. A vinculação é presumida, pois as entidades arroladas no art. 150, VI, “c”, da CF estão impedidas de distribuir qualquer parcela do seu patrimônio ou de suas rendas, sob pena de suspensão ou cancelamento do direito à imunidade (art. 14, I e § 1º, do CTN). Foi justamente com base nesse raciocínio que o STF editou a Súmula Vinculante 52: 

Súmula vinculante 52-STF: Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da CF, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas. 

Dessa forma, para o reconhecimento da imunidade basta que não seja provado desvio de finalidade, ou seja, que a entidade está utilizando da imunidade para outros propósitos que não são os relacionados com as suas finalidades essenciais. O ônus de comprovar que houve eventualmente esse desvio de finalidade é do sujeito ativo (no caso, a União).


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