11 de abril de 2021

DIREITO PROCESSUAL PENAL / FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO - É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para o Delegado Geral da Polícia Civil

Fonte: Dizer o Direito

Referência: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2021/04/info-1010-stf.pdf

DIREITO PROCESSUAL PENAL / FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO - É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para o Delegado Geral da Polícia Civil 

Extrapola a autonomia do estado previsão, em constituição estadual, que confere foro privilegiado a Delegado Geral da Polícia Civil. A autonomia dos estados para dispor sobre autoridades submetidas a foro privilegiado não é ilimitada, não pode ficar ao arbítrio político do constituinte estadual e deve seguir, por simetria, o modelo federal. STF. Plenário. ADI 5591/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 20/3/2021 (Info 1010). 

A situação concreta foi a seguinte: 

A Constituição do Estado de São Paulo previu foro por prerrogativa de função para o Delegado Geral da Polícia Civil. Em outras palavras, a Constituição Estadual determinou que essa autoridade deveria ser julgada criminalmente no Tribunal de Justiça. Confira: 

Art. 74. Compete ao Tribunal de Justiça, além das atribuições previstas nesta Constituição, processar e julgar originariamente: (...) II - nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os juízes do Tribunal de Justiça Militar, os juízes de Direito e os juízes de Direito do juízo militar, os membros do Ministério Público, exceto o Procurador-Geral de Justiça, o Delegado Geral da Polícia Civil e o Comandante-Geral da Polícia Militar. 

Essa previsão da CE/SP é compatível com a CF/88? NÃO. 

É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para o Delegado Geral da Polícia Civil. STF. Plenário. ADI 5591/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 20/3/2021 (Info 1010). 

Vamos entender com calma. 

O que é foro por prerrogativa de função? 

Trata-se de uma prerrogativa prevista pela Constituição, segundo a qual as pessoas ocupantes de alguns cargos ou funções somente serão processadas e julgadas criminalmente (não engloba processos cíveis) por determinados Tribunais (TJ, TRF, STJ, STF). 

Razão de existência 

O foro por prerrogativa de função existe porque se entende que, em virtude de determinadas pessoas ocuparem cargos ou funções importantes e de destaque, somente podem ter um julgamento imparcial e livre de pressões se forem julgadas por órgãos colegiados que componham a cúpula do Poder Judiciário. Ex: um Desembargador, caso pratique um delito, não deve ser julgado por um juiz singular, nem pelo Tribunal do qual faz parte, mas sim pelo STJ, órgão de cúpula do Poder Judiciário e, em tese, mais adequado para, no caso concreto, exercer a atividade com maior imparcialidade. Ex2: caso um Senador da República cometa um crime, ele será julgado pelo STF. 

Onde estão previstas as regras sobre o foro por prerrogativa de função? 

Em regra, os casos de foro por prerrogativa de função são previstos na Constituição Federal. Exs: art. 102, I, “b” e “c”; art. 105, I, “a”. As Constituições estaduais podem prever casos de foro por prerrogativa de função desde que seja respeitado o princípio da simetria com a Constituição Federal. Isso significa que a autoridade estadual que “receber” o foro por prerrogativa na Constituição Estadual deve ser equivalente a uma autoridade federal que tenha foro por prerrogativa de função na Constituição Federal. Essa autorização para que as Constituições Estaduais prevejam hipóteses de foro por prerrogativa de função no TJ existe por força do art. 125, § 1º, da CF/88: 

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça. 

Assim, à luz do disposto no art. 125, § 1º, da Constituição Federal, o constituinte estadual possui legitimidade para fixar a competência do Tribunal de Justiça e, por conseguinte, estabelecer a prerrogativa de foro às autoridades que desempenham funções similares na esfera federal. O poder dos Estados-membros de definirem, em suas constituições, a competência dos tribunais de justiça está limitado pelos princípios da Constituição Federal (arts. 25, § 1º, e 125, § 1º). Extrapola a autonomia do estado previsão, em constituição estadual, que confere foro privilegiado a Delegado Geral da Polícia Civil. A autonomia dos estados para dispor sobre autoridades submetidas a foro privilegiado não é ilimitada, não pode ficar ao arbítrio político do constituinte estadual e deve seguir, por simetria, o modelo federal. No caso concreto, a CF/88 não prevê foro por prerrogativa de função para o Delegado-Geral da Polícia Federal, por exemplo. Logo, a instituição de foro por prerrogativa de função para o Delegado Geral da Polícia Civil não encontra simetria no modelo federal. 

Julgado correlato: 

É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que confere foro por prerrogativa de função, no Tribunal de Justiça, para Procuradores do Estado, Procuradores da ALE, Defensores Públicos e Delegados de Polícia. A CF/88, apenas excepcionalmente, conferiu prerrogativa de foro para as autoridades federais, estaduais e municipais. Assim, não se pode permitir que os Estados possam, livremente, criar novas hipóteses de foro por prerrogativa de função. STF. Plenário. ADI 2553/MA, Rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 15/5/2019 (Info 940).

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