24 de junho de 2021

As sucessivas revisões dos quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP, da Lei Complementar n. 123/2006, para fazer frente à inflação, não descaracterizam crimes de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório, cometidos anteriormente

Processo

AREsp 1.526.095-RJ, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 08/06/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Inserção de informação falsa, para fins de participação em procedimento licitatório. Enquadramento como ME ou EPP. Quantitativos máximos de receita bruta. Posterior elevação de valores pela LC n. 139/2011. Aplicação retroativa. Descabimento.

 

Destaque

As sucessivas revisões dos quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP, da Lei Complementar n. 123/2006, para fazer frente à inflação, não descaracterizam crimes de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório, cometidos anteriormente.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia é definir se ocorreu abolitio criminis quanto à conduta de (possível) inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório em decorrência da Lei Complementar n. 139/2011.

No caso, a licitação na qual competiram as sociedades empresárias era restrita àquelas enquadráveis como ME ou EPP, nos termos da Lei Complementar n. 123/2006, segundo os limites de receita bruta indicados no art. 3º do referido diploma.

O texto normativo foi alterado pela Lei Complementar n. 139/2011.

É necessário lembrar que a previsão de tratamento mais benéfico às MEs e EPPs tem a finalidade constitucional (ex vi dos arts. 146, III, "d", 170, IX, e 179 da CF/1998) de criar um ambiente jurídico favorável aos empreendimentos que, por seu tamanho reduzido, não detém a estrutura para competir em condições de igualdade com todos os gigantes do mercado.

A forma encontrada pela legislação para tornar objetiva esta condição foi a fixação de um limite de receita bruta, em dinheiro, e como tal suscetível às variações inflacionárias. A propósito, a atualização do teto de receita bruta das EPPs, dos R$ 2.400.000,00 fixados em 2006 para os R$ 3.600.000,00 da Lei Complementar n. 139/2011, corresponde a pouco mais do que a inflação acumulada no período (30,78%, conforme o IPCA).

Esta constatação é fundamental, porque demonstra que as sucessivas revisões dos quantitativos máximos da Lei Complementar n. 123/2006, para fazer frente à inflação, não se aplicam a anos anteriores - ainda que para fins criminais -, sob pena de instituir uma grave distorção concorrencial e atentar contra os próprios objetivos do Estatuto. Afinal, a obtenção de uma receita bruta de R$ 3.600.000,00 no ano de 2012 representa, na prática, um poder aquisitivo menor do que o auferimento, em 2011, do mesmo montante.

No caso, a acusação não diz que as duas empresas não são, hoje, MEs ou EPPs, mas sim que, no específico ano-calendário de 2011, não tinham essa qualificação, falsamente atestada por seus dirigentes. Como se percebe, alterações legais posteriores são incapazes de modificar a dinâmica fática já ocorrida, porque a conduta delitiva imputada aos réus é a falsa declaração de uma situação fático-jurídica então inexistente. Uma modificação legislativa que dê novo enquadramento ao atual regime das empresas não muda o fato de que, em 2011, a informação prestada à Administração Pública foi, em tese, falsa.



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